Júlia treinava em um ginásio perto da escola. Enquanto seguiam, a brasiliense ia mostrando os lugares e explicando os endereços para Alex. A conversa entre as duas fluía fácil, Alex era inteligente e sensível, Júlia era engraçada e espalhafatosa. Perto de Alex sua falta de concentração parecia aumentar.

– Você pode se sentar na arquibancada. Vou me aquecer com as meninas e pedir para o meu técnico me liberar mais cedo, ai damos um jeito de descobrir onde é sua casa – Júlia disse jogando a mochila no chão.

– Não se preocupe, eu espero. Você pode me emprestar suas anotações da semana passada?

– Você não perdeu nada importante. A primeira semana é basicamente dedicada a apresentações – Júlia tirou o casaco e jogou em um banco ao lado da mochila. – Mas se você quiser mesmo assim pode pegar o caderno na minha mochila.

Alex sorriu agradecida e Júlia correu para o vestiário. A canadense pegou o casaco de Júlia e cuidadosamente o dobrou, mas não sem antes reparar no cheiro bom que estava impregnado nele. Sentiu vontade de levá-lo ao nariz e respirar fundo, mas se conteve em guardá-lo na mochila após pegar o caderno de Júlia.

Júlia se aquecia e levantava algumas bolas. Dentro de quadra Júlia era exatamente o aposto do que era fora: focada e extremamente calma.

Alex havia passado as folhas do caderno e visto que Júlia estava certa, não havia perdido nada importante. Guardou o caderno na mochila e prestou atenção nos movimentos de Júlia. Ela parecia leve como uma pena e corria de um lado para o outro sem o menor esforço.

– Vai fazer o teste para o time? – um rapaz perguntou sentando-se ao lado de Alex. Ao lado dele outros dois garotos se sentaram fazendo gracinhas, exibindo-se para Alex.

– Não – Alex reparou que eles usavam uniformes iguais ao do time de Júlia. – Estou só observando uma amiga.

– Qual delas?

– Júlia – Alex apontou para a garota que agora olhava curiosa para eles.

– É a minha namorada – Alex sentiu a garganta secar ao ouvir aquilo. – Eu sou Gustavo. Esses são Rodrigo e Marcos. Somos do time masculino.

– Sou Alex – a menina respondeu acenando para eles.

Júlia olhava a cena e sentiu uma pontada de ciúmes. E curiosamente não era ciúmes de Gustavo. Ela tentou se convencer de que era apenas um sentimento de proteção, Alex havia acabado de chegar, não podia deixar que ela se envolvesse com dois idiotas como Rodrigo e Marcos.

Pediu licença ao técnico, disse que não estava se sentindo bem e que compensaria no dia seguinte.

– Você não é a menina que acabou de se mudar para a Vila Montagne? – Rodrigo perguntou se aproximando. – Vi você passando ontem de madrugada na portaria. Já era bem tarde.

– Hum – Alex balançou a cabeça com uma expressão indecifrável.

De cara já não gostara do tal Rodrigo. Primeiro porque não era ela quem ele havia visto, e sim Natasha e também não gostou da risada cínica que ele deu. O que lhe importava as horas que sua irmã chegava em casa? Mas, pelo menos de uma coisa o idiota havia lhe servido. Agora que sabia o nome do condomínio onde morava poderia pegar um táxi.

– Ei, o que estão fazendo aqui? – Júlia perguntou se aproximando. Gustavo a pegou pela cintura e lhe deu um beijo. – Estou suada, Gustavo.

– Continua linda e cheirosa – Gustavo disse sem soltar a garota.

– Eu já vou embora – Alex levantou-se da cadeira e disse com um pouquinho mais de violência do que pretendia. – Obrigada pela ajuda, Júlia. Até depois.

– Eu te levo – Rodrigo se apressou a dizer. – Afinal somos vizinhos.

Júlia olhou curiosa para Alex, mas não disse nada.

Então era isso que estavam conversando, não acredito que logo esse idiota tinha que saber onde ela mora. Júlia pensou mordendo o canto dos lábios.

– Não precisa, obrigada – Alex agradeceu esperando que Rodrigo encolhesse as pernas para que ela passasse.

– Eu insisto.

– Vou passar em um lugar antes – Alex disse e Júlia sabia que ela estava mentindo, Alex não conhecia nenhum outro lugar. – Obrigada.

– Eu te levo assim mesmo – Rodrigo pegou no pulso de Alex e uma expressão homicida surgiu no olhar da garota.

– Vou te dar dois segundos para me soltar antes que eu quebre seu braço – Alex disse assustando a todos, principalmente Júlia que ainda não havia visto aquele lado não tão tranquilo de Alex.

– Calma, gatinha – Rodrigo tentou dizer despreocupado, mas Alex percebeu que o assustara. – Só queria ajudar.

– Eu agradeço, mas me viro sozinha – sem esperar mais que o garoto a deixasse passar, empurrou as pernas do garoto e saiu marchando sob o olhar admirado de Júlia, enquanto Gustavo e Marcos zoavam Rodrigo que estava visivelmente desconcertado.

Alex chegou em casa e encontrou Natasha jogada no sofá assistindo uma série.

– O que aconteceu com o seu encontro? – Alex perguntou deitando-se ao lado da irmã.

Suas mãos ainda tremiam um pouco, suspirou para afastar a imagem de Rodrigo apertando seu braço.

– Estou nele agora e você está me atrapalhando – Natasha aumentou o volume da televisão.

– Natasha! – Alex pegou o controle das mãos da irmã e pausou o vídeo. – O que aconteceu?

– Nada, eu queria vir para casa assistir Grey's Anatomy. O que tem de errado nisso? – Natasha tentou pegar o controle, mas Alex não cedeu – What the hell! Devolve esse controle, Alex.

– Por que você me deixou sozinha na escola sabendo que eu não conseguiria voltar? E ainda por cima veio para casa!

– Mas conseguiu, olha você aqui me tirando do sério.

– Nat, por que você fez isso? – Alex devolveu o controle e usou sua principal arma contra a irmã: sua incrível habilidade de chorar em qualquer situação.

– Não chora, Alex – Natasha levantou-se do sofá sentindo-se culpada e abraçou a irmã que sorria satisfeita consigo mesma. Natasha sempre caia no truque da culpa. – Olha, eu só te deixei lá primeiro porque eu sabia que você conseguiria voltar e segundo porque pensei que quisesse ficar mais um tempo com a tal da Júlia. Você não parava de olhar para ela.

– É claro que eu não parava de olhar, ela estava nos mostrando a escola. Para onde mais eu deveria olhar? – Alex não queria acreditar no que estava ouvindo. Natasha lhe deixara sozinha porque achou que ela estava flertando com a presidente do conselho. Inacreditável!

– Alex, eu te conheço melhor do que qualquer pessoa no mundo. Você não estava nenhum pouco interessada nas dependências escolares. E o que tem de errado nisso? Confessa que achou a garota bonita e queria olhar para ela.

– Isso é absurdo – Alex saiu do sofá e foi para o seu quarto.

Natasha largou a série de lado e foi atrás da irmã. Sabia que Alex estava se lembrando do que acontecera no Canadá. Encontrou Alex com a cabeça enfiada no travesseiro. Dessa vez a garota chorava de verdade.

– Já falamos sobre isso. Você precisa seguir em frente, little sis – Natasha afagou os cabelos da irmã. – Esse idiota já te fez sofrer demais. Mais de sete mil quilômetros separam vocês, ele não pode mais te machucar. Viemos para cá em busca de um recomeço. Você precisa se permitir ser feliz, ao menos tentar.

– Eu sei, Nat – o choro de Alex era de partir o coração. Natasha tentava ser forte para ajudar a irmã, mas ao vê-la daquela maneira sua vontade era de voltar para o Canadá e acabar com o desgraçado que a machucara.– Eu estou tentando, juro que estou.

– Não precisa chorar, ok? Desculpe-me se peguei pesado e te forcei. Júlia parecia ser uma garota legal e eu só queria que você se distraísse um pouco. E além do mais eu anotei nosso endereço no bloco de notas do seu celular e instalei um rastreador. Você acha que sou louca de te deixar sozinha? Se você não chegasse em duas horas eu ia te buscar.

Alex não pode deixar de rir.

– Você é demais, Nat. Não sei o que eu faria sem você.

– Seria obrigada a aprender a usar um mapa. Você não consegue nem sair do condomínio sem se perder – Natasha provocou a irmã. – Mas me conta, você estava ou não estava olhando para a Júlia?

– Não estava – Alex mentiu. – E além do mais ela tem namorado.

– E daí?

– E daí que ela é hétero. Hétero com um namorado.

– Nada que você não resolva com apenas um beijo seu, irmãzinha – Natasha piscou para a garota e saiu do quarto deixando-a pensativa.

Será mesmo?

Fim do capítulo