Após mais de um mês do acontecido em meu apartamento, meu relacionamento com Camila havia melhorado consideravelmente. Ela estava mais aberta e brincalhona, como era antes. Ainda não havíamos conversado sobre aquela noite, porém isso não trazia mais o mesmo mal estar do início entre nós. A meu ver algo tinha mudado dentro dela, mas não sabia exatamente o que. 

Numa quarta-feira um pouco tediosa, ao perceber uma brecha que Camila me deu no meio de uma conversa, criei coragem suficiente e resolvi colocar meu plano em prática. Ela disse que estava louca para assistir um filme que estava em cartaz. Nem escutei o nome, mas nem me importava, mesmo que fosse de terror, que eu odeio, para ficar do lado dela, não ligaria.

Quando estávamos indo em direção ao estacionamento da universidade aquele dia e logo após Gabi se despedir de nós, decidi começar a tentar criar um clima propício para uma investida da minha parte. Mais cautelosa dessa vez, gente!

-- Cam, estava pensando aqui, e também queria assistir esse filme que você falou mais cedo, e não gosto de ir sozinha ao cinema. O que acha de irmos juntas na sexta a noite ou no sábado? – disse tudo com o coração aos pulos e nervosa com a perspectiva tanto da sua recusa quanto da sua aceitação.

Ela me olhou pensativa, aumentando ainda mais meu estado de aflição, mas logo respondeu:

-- Vamos sim Sô, seria legal. Também não gosto de ir sozinha, mas como não tenho muitos amigos aqui ainda, era o que teria de fazer. Que bom que me convidou. Estou ansiosa pra assistir, vamos sexta mesmo? Tenho que assistir na estréia, não aguento esperar mais que isso. – disse, me presenteando com seu sorriso incrível.

-- Ótimo, então. Está combinado. Como faremos? Te pego em casa, você passa na minha ou vamos separadamente? – respondi, certamente com um sorriso super aberto, devido minha felicidade no momento.

-- Acha que sou louca para aceitar uma carona sua? Embora esteja mais calma ultimamente, ainda não esqueci do seu jeito furacão de ser não, viu? É melhor eu passar na sua casa, para evitar que você cause uma ameaça ao ministério da defesa dos Estados Unidos. Você é perfeitamente capaz disso, tenho certeza. – disse tudo de forma meio que debochando da minha cara.

Mas a verdade é que não estava ligando pra nada disso, só conseguia visualizar sua boca perfeita e seu lindo sorriso e estava completamente realizada, porque o clima entre nós já era como no começo, com aquelas piadinhas de sempre.

Teria de conquistá-la de qualquer jeito ou iria enlouquecer de desejo. E, se não conseguisse, precisaria encontrar uma mulher urgente, não aguentava mais permanecer nessa seca toda em que me encontrava desde o término do meu namoro.

Nos despedimos e depois de verificar que ela já tinha partido, deixei extravasar toda a minha alegria, pulando e gritando como uma louca no meio do estacionamento da faculdade. Só me toquei que estava pagando um mico daqueles, quando apareceram dois jovens apontando-me e rindo da minha cara. Mas nem me importei, estava mesmo completamente feliz, sei que era puro recalque e inveja da parte deles. Você aí, não venha me chamar de maluca não, viu? É só felicidade!

Isso ocorreu na quarta-feira e como não poderia deixar de ser, os outros dois dias foram intermináveis pra mim. Estava numa ansiedade crônica para que chegasse logo a sexta-feira. Não consegui trabalhar direito, dormir direito, prestar atenção nas conversas, ou seja, estava mais autista que o normal. Cheguei até a ensaiar falas e gestos na frente do espelho. Não me lembro quando foi e se eu já havia ficado tão ansiosa antes com um encontro, que convenhamos, nem era um encontro na sua concepção romântica. Mas, pra mim, era até melhor que isso, devido minha companhia para a noite.

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Finalmente chegou a tão esperada sexta. Consegui sair um pouco mais cedo do serviço. Decidi me produzir um pouco mais que o normal, ir a um salão e tal, afinal precisava de todas as armas possíveis para tentar obter algum avanço mais concreto com Camila. Tínhamos combinado, faltaríamos da faculdade e ela passaria em casa as oito da noite para me buscar.

Tinha planejado tudo, depois do cinema a convidaria para comer em algum lugar para prolongar nossos preciosos momentos. Lembrei-me também que ela tinha comentado que desejava um DVD, que havia sido lançado recentemente, e o adquiri para lhe presentear.
  
Estava tudo saindo muito bem, Murphy não havia dado nenhum sinal de vida e eu estava mais tranqüila, acreditando que finalmente teria um período maior de paz. Tinha colocado um vestido, raramente me vestia assim, só quando desejava algo muito especial, pois não era muito meu estilo, sou muito estabanada e desligada e não me sentia confortável tendo que me preocupar-me constantemente se estava deixando minha calcinha a mostra, mas claro que adorava mulheres femininas.

As oito e três, ela me mandou uma mensagem que estava me esperando na porta do meu prédio. Desci toda apressada e absolutamente contente com tudo o que estava me acontecendo.

Quando a avistei, meu coração se rebelou em meu peito, batendo descompassadamente. Entrei na porta do carona e não consegui evitar a apreciação ao seu visual, ela utilizava uma saia curta, blusa transpassada, que deixava parte de suas costas a mostra e sandálias de salto. Como sempre, estava incrível. Ela também pareceu ter ficado um pouco impressionada com minha aparência, pois comentou:

-- Nossa! Como você está diferente hoje. Tem certeza que só vamos ao cinema? Pretende esticar a noite depois? Parece mesmo que está tentando conquistar alguém com essa produção toda. Nunca havia a visto de vestido, fica ótima, deveria usar mais vezes.

Fiquei um pouco sem graça e não sabia o que falar, afinal estava mesmo tentando conquistar alguém, mas era ela mesma. E para me livrar do meu desconforto, tive que passar a bola pra ela.

-- Olha quem fala! Você que está sempre espetacular e quer que nós simples mortais a acompanhemos. É simplesmente impossível para qualquer pessoa concorrer com sua beleza e charme naturais.

Ela pareceu ficar um pouco encabulada com minhas palavras e mudou de assunto rapidamente, falando do quanto estava ansiosa para ver o tal filme, que mesmo agora não sabia qual era.

Dei-lhe o DVD que havia comprado e ela ficou exultante. Foi baratíssimo, a melhor aquisição da minha vida, pois em troca recebi um maravilhoso abraço e um beijo no rosto como agradecimento. Teria que lembrar de comprar-lhe mais presentes, pois a recompensa era extraordinária.

Chegamos ao shopping e fomos direto comprar nossos ingressos para a sessão, senão nos atrasaríamos. Na hora de comprar os quitutes na entrada, achei melhor intervir para evitar algum envio especial de Murphy.

-- Eu pego os refrigerantes, acho mais prudente que você carregue as pipocas, pois já paguei altos micos derrubando esses potes. Uma vez acertei uma garota, que ficou toda “empipocada”, da cabeça aos pés. Ela ficou uma fera comigo, mas com razão, né?!

Camila riu e concordou e assim entramos na sala de exibição. Fiquei curiosa e um pouco apreensiva quando descobri que se tratava do filme Jogos Vorazes, pois pelo nome parecia um pouco forte. Mas na verdade achei muito bom, embora não tenha conseguido prestar muita atenção. Era uma tarefa complicadíssima com aquela deusa tão próxima. Mais que nunca estava consciente de sua presença e do seu perfume.

Na hora que a garotinha do distrito 11 estava morrendo, Camila ficou emocionada e não pude evitar a ação impulsiva de colocar minha mão sob seu ombro. Meu coração estava apreensivo e em descompasso, mas como ela não fez nada para impedir e pareceu não se importar, fiquei exultante e continuei assim por um tempo.

Em outro momento, Camila pareceu-me ficar um pouco impressionada com uma cena de morte um pouco mais forte e eu fiquei um pouco preocupada, mas logo relaxei, pois foi ótimo isso, uma vez que ela procurou minha mão e a segurou bem forte e eu acabei me aproveitando da situação para continuar segurando em sua mão direita por um bom tempo. Ela estava tão concentrada que nem deve ter percebido, mas pra mim foi uma sensação inenarrável sentir o calor dos seus dedos nos meus. Quando as luzes se acenderam, lamentei por não poder ficar mais tempo tão pertinho dela. 

Assim que saímos e foi possível manter uma conversa longe de holofotes, convidei-a para comer algo e ela aceitou, apesar de dizer não estar com fome. Eu também não estava, só queria mesmo prolongar nossos momentos juntas. Então decidimos por algo leve. Ela não se cansava de falar como o filme era ótimo e eu claro que concordava com tudo, apesar de não saber quase nada do que aconteceu, pois não assisti mais que alguns minutos.

Ficamos conversando por quase uma hora e como sempre era maravilhoso tê-la como companhia, ainda mais por não ter que dividi-la com mais ninguém. Estava muito feliz por ter sua atenção voltada só pra mim e pelo clima gostoso entre nós. Foi com muito pesar que concordei quando ela disse para irmos embora, pois já era um pouco tarde. O tempo passava muito rápido quando estava em sua presença, como sempre acontece quando fazemos algo que apreciamos.

No caminho de volta, só conseguia pensar que teria de fazer algo mais que urgente, pois estava mesmo muito apaixonada por ela. Teria que ter cuidado dessa vez para não assustá-la, mas na verdade não tinha a menor ideia do que fazer para conquistá-la.

Quando já estávamos na portaria do meu prédio e chegou a hora de me despedir, simplesmente não conseguia sair do carro. Relembrei da noite da boate em que a convidei para subir e quase chegamos as vias de fato e não pude evitar lançar-lhe um olhar de desejo. Ela também me encarava de uma forma totalmente diferente. Parecia também se lembrar de algo e estava aparentemente desconfortável.

Olhando para seu rosto de proporções perfeitas, os olhos brilhando e aquela boca convidativa, não consegui novamente levar a cabo minhas resoluções de ir com calma. Não conseguia entender, sabia que não devia agir dessa forma, mas era impossível me controlar em sua presença.

-- Cá, eu preciso fazer isso, juro que segurei o quanto pude, mas não aguento mais...

Joguei tudo na lama de novo, quando lacei seu pescoço e beijei-lhe os lábios. Ela não esboçou nenhuma reação contrária dessa vez, o que me deixou exultante de alegria. O beijo começou meio urgente devido minha ação intempestiva, mas depois de um tempo se acalmou. Tornou-se diferente, mais lento, mais suave, sem nenhuma pressa, como se fosse o primeiro e estivéssemos conhecendo todas as sensações que ele poderia nos despertar, que eram definitivamente incríveis.

Tive que me separar meio a contragosto dos seus lábios, quando finalmente perdemos o fôlego. Não sei quanto tempo durou o beijo, mas foi muito pouco pra minha vontade daqueles lábios. Iria querer sempre mais. Nos olhamos, eu estava totalmente apreensiva, mas pude perceber algo diferente em sua postura, ela não estava mais com aquele ar de desespero de antes, como se tivesse cometido um crime ao me beijar. Fiquei aliviada e decidi partir para o tudo ou nada. Não conseguiria mesmo ser somente uma simples amiga, a queria como mulher e não dava mais para esconder, por isso as palavras saíram sem que pudesse controlar:

-- Camila, tenho que te dizer ou então acho que vou morrer... A verdade é que estou completamente apaixonada por você. Não consigo mais ter apenas um papel de amiga. O seu beijo é disparado o melhor que já provei na vida e olha que já beijei uma porção de bocas por aí! – respirei fundo, para tomar coragem para falar as próximas palavras, e disparei – Então Cá... o que gostaria de te perguntar é: quer namorar comigo?

Fim do capítulo