Minha mente ainda viajava nas imagens de Bárbara. Que visão magnifica aquela mulher que eu sempre via vestida de social na empresa, ou de camisetão nas chamadas do skype, agora de biquíni.

Como era bom vê-la sorrir de novo, leve, descontraída, realizada, mesmo que não fosse comigo.

E cá entre nós, eu fui pra água na hora certa, mais alguns segundos ali e eu teria me apaixonado de novo. Que mistura de sentimentos ela me provocou naquele momento, minha nossa senhora.

E porque eu fui tão grossa com ela? Eu não tinha direito nenhum de sentir ciúme de algo que nunca foi meu. Fora que ciúme foi um dos motivos do meu término com Andressa... então porquê?

Nós éramos duas adultas e precisávamos parar com essa guerra fria entre nós, esse lance de "gato e rato", isso não ia acabar bem. Parece loucura, mas é como se eu sentisse saudade de algo que eu nunca tive, sabe? Esse algo era o carinho e a atenção que Bárbara estava dando a outra mulher na minha frente. Alguém bem mais novo e mais atraente que eu e provavelmente bem menos complicado também. Além disso ter Bárbara tão perto e ao mesmo tempo tão longe era o céu e o inferno pra mim.

Mas estava decidido, chega de loucura. Eu só precisava saber se conseguiria conviver com ela por perto esporadicamente no ambiente de trabalho sem comprometer a minha carreira. Era nítido como saia faísca toda vez que nos encontrávamos e não ia dar pra gente ficar "trocando patada" a cada reunião ou esbarrão na praia.

Ela era minha chefe indireta agora. Eu precisava ser mais fria e profissional e entender que o nosso lance passou, arrumar uma maneira de cortar o acelerar dos meus batimentos toda vez que meus olhos cruzassem os dela. Ah... o foda é explicar isso para o meu coração.

Na semana seguinte voltei para o trabalho inclinada em um projeto pessoal antigo. Juninho era louco pra conhecer a neve e eu tinha férias pra tirar, pensei em finalmente começar a montar nosso roteiro de viagem. Seria bom dar uma sumida por um tempo. Andressa se ofereceu pra ir com a gente, vê se pode? Mulher é mesmo um "bicho" muito louco né?

Estava entrando em casa quando ouvi o celular tocar com uma chamada de um número desconhecido. Nossa, a ligação da Bah no meu celular me surpreendeu muito. Beth nunca passa meu contato pessoal pra ninguém, independente do cargo, é regra da empresa.

E eu também não costumo atender ligações de números desconhecidos, só atendi porque aguardava o retorno de um dos agentes de viagens que entrei em contato.

Quando percebi que era ela eu dei uma gaguejada boa, nossa! Meu lado desastrado se mostrou inteiro, eu deixei cair no chão e quebrei o copo d' água, além disso topei com o ossinho do tornozelo na porta. Eu transpirava, estava inquieta, coração acelerado. Nossa, como aquela mulher ainda mexia comigo.

Ainda estou passando e repassando aquela conversa na minha cabeça. Sou meio lerda, sabe? Queria entender em que momento eu havia aceitado jantar com Bárbara e a namorada.

Não, não foi a Clarice profissional que aceitou o convite, mas aquela Clarice apaixonada pelas palavras daquele e-mail. Eu simplesmente precisava estar perto dela de novo, sob qualquer circunstância.

A vida nos proporciona cada situação né? Agora estou eu, no auge dos meus 40 anos, de frente para o espelho perdida pra escolher uma roupa pra um jantar que eu nem sei onde vai ser. Com o coração batendo na boca de novo, ansiosa, agitada, perdida, sei lá. Tento repetir pra mim mesma o tempo todo que Bárbara é comprometida, pra dar fim a toda e qualquer expectativa, mas não era um processo assim tão fácil.

Sabe que até passou pela minha cabeça ir acompanhada de alguém ao jantar só pra não ficar por baixo? Mas não, eu não sei fingir, sou transparente demais, seria uma catástrofe.

O jeito era encarar de frente esse jantar, que poderia ser o último da nossa "relação", ou quem sabe o primeiro de muitos com a gente pelo menos retomando a nossa amizade de anos atrás. Ah como eu queria a companhia quase diária da Bah de novo pra mim, mesmo se fosse pra sermos só amigas. Ela me fez falta demais.                       

Bem no horário marcado eu estava pronta. Meu filho foi dormir na casa de um amiguinho da escola, estava radiante. Depois de um tira e põe sem fim, decidi por um vestido lilás que ia até o meio das coxas, decote generoso (adoro decote), salto (não gosto muito mas a ocasião pedia), maquiagem leve e um coque com uns fios soltos. Até tirei uma selfie pra postar no meu face, a legenda? "Se faz sentir, faz sentido".

Bárbara, não se atrasou um minuto sequer e ainda por cima fez questão de vir me buscar aqui em casa. Ela e Anna conversavam animadamente fora do carro quando as encontrei. Anna trajava um vestido florido de alcinha e uma sandália baixa. Já a Bah estava com um jeans escuro, uma camisa branca semitransparente, saltos... ah ela sempre os dominou bem melhor que eu. Ela estava muito sexy.

Ambas foram muito educadas e atenciosas, senti os olhos de Bárbara incendiarem enquanto percorriam cada pedaço do meu corpo.

– Nossa... nossa... você está linda! – foi o que ouvi dela.

– Não é todo dia que uma das minhas chefes me chama para jantar – respondi piscando pra ela.

– É verdade, esse vestido fica perfeito na senhora. – Anna disse animada, pelo sotaque parecia portuguesa.

Não pareceu ser maldade, mas aquele "senhora" me colocou de volta na realidade. Tanta coisa pra aquela ninfeta dizer. Eu sei lá porque, mas Anna sentou-se no banco de trás e a Bárbara abriu a porta do carro pra que eu pudesse sentar ao lado dela no caminho até o restaurante. Por mais confiança que eu tivesse, jamais deixaria minha namorada no banco da frente com uma mulher desconhecida. A tal Anna era mesmo uma mulher segura de verdade.

E por incrível que pareça, o clima a caminho do restaurante era mais leve do que nos nossos outros encontros.

Fora que a sintonia delas duas era admirável. Por alguns momentos eu senti que estava sobrando, mas volta e meia a Bah carinhosamente me colocava no meio da conversa e eu me concentrava muito pra não dizer nenhuma besteira no meio da minha afobação.

Até que quando entramos no estacionamento do restaurante ouvi Anna dizer:

– Mãe, então é esse o seu restaurante favorito? – Anna perguntou ansiosa e com um sotaque encantador.

Caramba! Calma! Espera! Mãe!!!! Eu arregalei os olhos em direção a Bárbara. Por essa eu não esperava.

– É sim, filha. Eles têm uma variedade incrível de sucos e saladas, tem carnes magras e peixes também. Fora que o ambiente é um charme. Acho que você vai adorar. – ela respondeu sorridente olhando Anna pelo espelho retrovisor central.

– Como assim ela é sua... – me perdi nas palavras. – Eu achei que você e ela... que vocês duas... nossa que loucura.

Gente, me ajudem, que sentido aquilo fazia? Ela me sai do Brasil e em 6 anos me volta com uma guria de, sei lá, 17, talvez 18 anos no máximo, chamando ela de mãe? Como assim?

Eu não estava conseguindo acompanhar. Porque ela não me disse antes? E outra, será que além de filha tinha uma esposa também? A Anna poderia ser filha da companheira dela, sei lá. Meus pensamentos passaram a pipocar na mente de maneira desordenada.

A Bárbara viu o quanto eu estava constrangida com a minha descoberta e a Anna, tadinha, ficou perdida sem entender nada. A Bah se divertiu com a minha reação e tentou amenizar o clima:

– Sério mesmo que você achou que eu e Anna... ah... Cleo que saudade dessa sua mente fértil. Isso explica muita coisa. Eu também vacilei, entrei no carro e disparamos a falar, nem te apresentei minha filha. – ela encheu a boca pra dizer "minha filha." – Vamos fazer assim, nós entramos, fazemos os pedidos e então eu tento desfazer esse nosso mal entendido, ok?

Fim do capítulo