Capítulo 8
Quando cheguei na casa da Denise , pedi pra ela sair e dar uma volta comigo. Desci da bicicleta e fui empurrando-a ao meu lado e a Denise caminhando do outro. Comecei a falar sobre o que tinha acontecido até ela perguntar:
- Você falou sobre a gente?
- Falei!
- E agora? - ela perguntou como se perguntasse a si mesma.
- Calma! Eu disse pra eles que fui eu quem começou e que você não tem culpa de nada e que não aceitaria nenhuma proibição. - e era verdade. Durante a conversa, meu pai sugeriu que eu me afastasse um pouco delas pra pensar melhor e eu disse que não.
Apesar de tudo, eu estava aliviada. Mas a Denise não parecia sentir o mesmo. Ela ficou agressiva de repente e disse que precisava ir embora.
- O que você vai fazer? - perguntei, agora com medo de perdê-la - eu precisava contar pra eles. Eles são meus pais. Não podia mais esconder. Estava me sufocando. Eu não vou deixar que eles nos afastem. - eu praticamente suplicava por um sorriso e um “tudo bem” ou “tudo vai dar certo”.
Mas não foi o que ela fez.
- Agora preciso contar para minha mãe, antes que sua mãe conte.
- Minha mãe não vai falar com a sua mãe. - disse sem ter certeza. Mas sabia que minha mãe não tinha esse perfil.
Mesmo assim, vi a Denise indo embora sem nem olhar pra trás. O dia tinha sido pesado e voltei pra casa. Agora mais triste e confusa do que antes. O que estava passando na cabeça dela agora. Por que ela ficou tão brava? O que ela ia falar pra mãe dela? O que a mãe dela ia fazer?
Voltei pra casa e parecia que nada tinha acontecido. Todo mundo tentava fingir que estava tudo bem e que podíamos seguir nossa vida tranquilamente, mas minha mãe não conseguia nem olhar nos meus olhos. Meu saiu pra trabalhar naquela noite e eu e minha mãe ficamos assistindo tv até a hora de dormir.
No dia seguinte, fui pra aula normalmente. Estava ansiosa para encontrar a Denise e saber o que tinha acontecido. Durante toda a primeira parte da aula não conversamos. No intervalo, ela se levantou para sair e eu pedi que ficasse. Contrariada, se sentou novamente. Quando todos saíram da sala perguntei o que aconteceu:
- Contei pra minha mãe também e ela não quer mais que eu fale com você - ela disse friamente.
- Como assim? O que você disse pra ela?
- Falei que rolou um beijo entre a gente e ela pediu pra eu me afastar antes que aconteça algo pior.
Tive vontade de rir. Um beijo? Por um beijo ela já queria que a filhinha se afastasse de mim? Imagina se soubesse o que realmente aconteceu. Mas eu estava confusa e realmente preocupada com o que a Denise iria fazer:
- E você, simplesmente, vai se afastar de mim?
Ela abaixou a cabeça e disse que sim. Aí eu explodi:
- Não acredito! Eu conto para os meus pais tudo...TUDO que aconteceu entre a gente e digo que não adianta me proibir de te ver porque eu não me afastaria de você e você conta pra sua mãe que me deu um beijo...UM BEIJO… e não vai mais falar comigo? - eu estava desnorteada, irritada, com medo e muito brava com ela. Eu precisava dela por perto. Acima de qualquer coisa, éramos amigas, nunca deixamos que nada interferisse em nossa amizade e agora ela ia para de falar comigo porque a mãe dela pediu.
Nessa hora minha mãe entrou na sala. Pulei da cadeira e fui pra frente da Denise . Do jeito que ela entrou parecia que ia bater na Dê.
- Vamos embora! - Minha mãe disse com raiva.
- Mas eu to na aula…
- Já falei com a diretora. Vamos embora! - repetiu o chamado, dessa vez olhando pra Denise com nojo.
Arrumei minhas coisas, olhei pra Denise e ela olhava pra baixo. Não olhava nem pra mim nem pra minha mãe. Fui embora!
Minha mãe não tinha ido trabalhar naquele dia, sua pressão não estava boa e resolveu ficar em casa. Na verdade, a nossa conversa tinha afetado seu emocional e ela estava confusa com o que estava acontecendo. Imaginar que eu estava na escola, com a Denise , a deixou desesperada. Ir me buscar naquele dia foi sua forma de sentir que estava cuidando de mim. Voltei para casa e nada aconteceu. Meus pais congelaram no tempo e, nos dias que se seguiram, voltei pra escola normalmente, enquanto eles digeriam a situação. Mais tarde, descobri que o ímpeto da minha mãe em me buscar, havia sido um preconceito que nem ela sabia que existia. Não era o fato de ficar com mulheres que havia incomodado tanto, mas o fato de estar “namorando” uma menina negra.
Eu e a Denise nunca mais conversamos. Tentei me aproximar algumas vezes, mas ela estava irredutível. Quem ficou por perto nessa época foi a Camila, namorada do meu irmão, e sua amiga Manuela. A Bia continuava sendo minha amiga, mas já tinhamos outras prioridades e ela só me procurava quando queria “matar a saudade” e eu já não queria mais nada com ela. Então preferia ficar distante e conversar o trivial. Ela tinha um namorado na academia e tinha acabado de perder a virgindade com ele e não curtia usar camisinha. Então, na maioria das vezes que conversavávamos, dizia pra usar preservativo e se cuidar. No ano seguinte, ela engravidou. Demorou alguns meses pra perceber a gravidez e continuou fumando e bebendo sempre que saía com ele. Parece que a criança não aguentou e sobreviveu apenas algumas horas após o nascimento prematuro.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]