A noite estava esplendorosamente linda, perfeita para ser admirada. A lua estava cheia e acompanhada por algumas nuvens ao seu redor, mais afastada dela, poderia se ver as estrelas. Era para onde os olhos de Carol miravam, pois assim que saiu do banho Manuela entrou. Ela não queria estar lá dentro para sofrer com a vontade de mirá-la se arrumando, então se vestiu rápido – não mais rápido que de costume – e foi sentar-se na varanda. Não foi difícil desviar os pensamentos da mulher que estava lá dentro, afinal à noite, estava encantadora.

Elas iriam para a abertura do congresso, Carolina não gostava muito das formalidades, mas teria que comparecer. O que a jovem adorava era ver novos projetos e a criatividade com que as pessoas resolviam os ditos “problemas” como a disposição solar, regiões que emanavam demasiados barulhos, a melhor via para se dispor a entrada... Pilotis era a salvação para o mundo? – ri agora, quem faz arquitetura sabe...

Manuela estava ansiosa, não sabia onde Carolina estava, nem se iria demorar... Sentiu um gostinho de abandono quando saiu do banheiro e não encontrou aqueles olhos castanhos. Estava se admirando no espelho quando visualizou sua boca e lembrou daquele beijo...

- Que beijo foi aquele... – Fechou os olhos como se quisesse senti-lo novamente, mas o que sentiu foram outros, muitos outros beijos. Abriu os olhos e espantou-se. – Será? Não pode ser... Eu... Estou lembrando?! – Uma alegria seguida de receio invadiu seu coração. – Porque não posso recordar de tudo de uma vez! Porque tem que ser assim, aos poucos! – Manuela não viu quando a porta abriu-se atrás dela.

- Falando sozinha? – Carol estava curiosa para saber o que ela cochichava consigo.

- Só pensando alto... – Disse se virando e foi à vez de Carolina babar, nem sequer fez questão de disfarçar.

- Você... Você está maravilhosamente linda, tão deslumbrante quanto o luar que eu estava admirando. – Sorriu de lado para a moça.

- Vai começar com as indiretas? – Manu achou linda a carinha de boba de Carol.

- São diretas mesmo! Sério... Terei o maior prazer em ser vista ao seu lado. – Disse com carinho. Manuela percebeu que não havia desejo nos olhos de Carol, que estavam tranquilos... O que ela viu foi outra coisa... Foi amor.

- Bom e o que estamos esperando? – Disse divertida.

- Pelo beijo! É claro! – Não perderia a oportunidade.

- Vai sonhando! – Fingiu esnobar sua chefe. – Esqueceu que é minha chefe?

- Não, jamais esqueceria. Mas se tem alguém aqui que adora sonhar... Esse alguém é você. – Carolina riu, pois sabia que Manuela estava sem jeito. – Então vamos Senhorita Fernandes? – Estendeu o braço para a moça.

§

As mulheres que estavam na recepção não paravam de olhar o homem que ao longe estava se aproximando. Tinha uma pose altiva e um corpo de dar inveja, com certeza academia lhe recebia de braços abertos. Assim que chegou a recepção do hospital o homem reparou nas recepcionistas que mexiam nos cabelos. Mulheres são tão previsíveis, pensou consigo.

Não deu tempo de dirigir a palavra para elas, pois uma voz conhecida lhe chegou aos ouvidos.

- Não aguentou de saudade e veio me ver? – Falou observando suas funcionárias babarem pelo homem.

- Sem dúvidas sua presença irrita qualquer um que possua sanidade! – Disse sério, sem se importar com a cara que ela fez.

- O que quer aqui Félix? – Perguntou já sem paciência.

- Falar com você, Doutora!

- Se for pra fazer cirurgia plástica, pode desistir... Não vai adiantar! – Debochou dele, mas Félix não ficaria para trás.

- Desculpe minha intromissão senhoritas, mas vocês acham que necessito de alguma plástica? – Virou-se pra as recepcionistas, e lhes lançou um olhar sedutor.

- Sem sombra de dúvidas... Não mesmo! – Respondeu uma ruivinha. Félix sorriu vitorioso. Enquanto Ana mandava que elas voltassem ao trabalho e fez um gesto para o rapaz a seguir.

O percurso até a sala de Ana foi feito em total silêncio, até por que Ana não estava com a melhor das caras, depois de ter visto as recepcionistas do hospital, babarem pelo engomadinho. Tenho que rever o quadro de funcionários, pensou adentrando a porta do escritório.

Félix ficou maravilhado com aquela sala, era a cara de Ana, simples, mas aconchegante. Ao sentar visualizou a foto de Ana e Carolina, pensou nunca ter visto duas pessoas tão felizes e divertidas numa mesma foto. Ana observou o olhar de Félix para a foto.

- Então veio aqui pra olhar a foto? – Disse séria.

- Não, apenas estava pensando que eu não poderia ter escolhido alguém melhor! – Respondeu encarrando Ana.

- Como? – Ana não estava entendendo.

- Vou direto ao ponto, Doutora. – “Doutora”, pensou, e olhou para o corpo de Ana. – Eu vim aqui por causa da Manuela. – Ana que até então estava de pé sentou-se.

- Sei... Olha não me leve a mal, mas não estou afim de escutar lamurias! – Disse séria.

- Nem se tiver a ver com a sua amiguinha?

- Em que parte a Carol entra nessa história de vocês? – Sentiu um aperto no coração.

- Na parte que Malvina armou, talvez? – Félix notou o olhar da mulher a sua frente e estava certo... Ela sabia de muita coisa.

§

A abertura foi sensacional. Havia arquitetos de todos os lados do mundo, a diversidade de culturas reunidas num local tão belo só ajudava a abrilhantar aquela beleza. A "Arqui'Corporation" estava dentre as vinte empresas que mais cresceram no ramo em dois anos. Isso porque Carol só tinha tempo para ela, dedicou-se de corpo e alma aquela empresa e seus projetos foram considerados pioneiros no foco da sustentabilidade.

Manuela estava muito orgulhosa de sua chefe, via-se na face de Carolina, como ela estava feliz. Depois haveria o jantar e após todos iriam se reunir no salão de festas, pois a confraternização continuaria num ritmo mais dançante. Manuela visualizou a bela mulher que se aproximava de Carolina, num vestido vermelho, mais provocante que o normal.

- Boa noite Carol! – Carolina que estava de costas para ele, virou-se.

- Excelente noite. – Respondeu sem mostrar os dentes.

- E o que faz a noite ser tão excelente? – Disse sugestiva.

- O prazer de conhecer pessoas tão espertas, para saber quando não são bem vindas. – Sorriu ironicamente. Gabrielly entendeu a indireta, mas não se importou, notou que a mulher ao lado de Carolina tinha um brilho felino no olhar.

- Tenho certeza que você terá um prazer imensurável se aceitar meu convite! – Olhou para Manuela e sorriu. – Traga sua funcionária também, não quero que ela fique sozinha por minha causa.

Manuela sentiu o rosto queimar, estava louca de vontade de tirar Carolina do campo de visão daquela oferecida. Mas o que poderia fazer... Era apenas sua assistente.

- Tens toda razão Gabrielly... – Manu baixou a cabeça. – Manuela me daria à honra de leva-la para jantar, nesta linda noite, que só não tem força para competir com sua beleza? – Gabrielly arregalou os olhos, incrédula. Enquanto Manuela parecia processar aquilo.

- Seria um prazer Carolina! – Respondeu sorrindo.

- Tudo bem. Nos vemos depois Carol... – Piscou para a jovem, como se nada tivesse acontecido. E isso só deixou Manuela mais irritada.

O jantar transcorreu de forma tranquila e Manuela em momento algum viu aquela mulher. Não conseguia esconder a felicidade de estar com Carolina, ainda mais depois de um convite tão fofo.

- Então, onde você aprendeu a falar português? – Estava curiosa sobre tudo que rondava sua chefe.

- Curiosa sobre minha vida? – Perguntou erguendo a sobrancelha.

- Sim... Bom, eu não sei muito sobre você... Ou melhor, não lembro. – Carol percebeu um olhar triste em Manuela e decidiu que deveriam se reconhecer.

- Ok. A Joana é brasileira. Eu era criança quando viemos conhecer o Brasil, meus pais estavam conversando quando sai de perto deles... E acabei encontrando Joana, na verdade Joana me encontrou. Nós duas chorávamos, eu por ter me perdido de meus pais... Joana por ter perdido o filho em um assalto.

- Nossa não sabia que Joana tinha um filho... Mas como ele foi assaltado? – Disse surpreendida.

- Não foi assaltado... O filho da Joana era uns dos assaltantes, que morreu baleado pelos policiais. Joana não tinha mais nada no Brasil. Meus pais se comoveram com a história daquela mulher tão batalhadora, mas sofrida, que lhe oferecem um lugar longe de tudo isso, para ficar. – Falou pensativa.

- Você tinha quantos anos?

- Dois eu acho... Não me lembro muito bem! Desde então Joana é parte da família.

- Seus pais tem um grande coração! – Manuela sabia bem a quem Carolina tinha puxado.

- Amo muito eles! Todos lá de casa são maravilhosos, até o Moisés tem seus momentos de alegria. – As duas riram. – Então Senhorita Fernandes, gostaria de esticar as pernas?

- Vai me convidar para uma maratona? – As risadas se faziam presente.

- Não seria uma má ideia, mas como eu corro todas as manhãs, acho que você teria uma leve desvantagem! – Viu o olhar de Manuela passar por seu corpo e sentiu uma vontade loca de levar aquela mulher para a cama.

- Você corre? – Por isso esse corpo tão sarado, pensou Manu.

- Sim... Eu, meus óculos e os fones de ouvido, às vezes a Alfa vai junto. Mas voltando, quer ir dançar? – Carolina pensou um pouco. – Mas se quiser ir descansar tudo bem...

- Vamos dançar! – “Descansar” e deixar você se aventurando por ai? Nem pensar! Manuela pensou convicta.

Era uma hora da manhã quando elas param para beber uma água. Nenhuma consumiria álcool, pois querendo ou não estavam a trabalho. Manuela não lembrava da ultima vez que havia se divertido tanto em tão poucos dias. Indagou-se se a vida ao lado de Carolina era tão maravilhosa quanto aparentava ser... Sem querer quando pegou a água os braços das duas se rosaram, o suficiente para Manu sentir uma eletricidade atravessar seu corpo. Estava louca por Carolina, não havia como negar... Seu corpo correspondia a cada toque dela.

Manuela vez sinal que iria ao banheiro e Carol apenas assentiu, ficando sentada no banco do balcão a espera dela. Manu entrou no banheiro apenas para dar uma respirada mais fundo, mas quando viu seus olhos no espelho... Sabia o que eles queriam fazer! Assim que Manuela saiu do banheiro, olhou para Carolina e viu, que aquela mulher estava observando a Carol com os olhos enquanto ia em sua direção. Manu sentiu um frio na barriga quando percebeu que a mulher quase roubou um beijo de sua chefe. Aquela noite estava prestes a acabar, pensou Manuela e foi em direção a Senhorita Portman.

Carolina percebeu como Manuela vinha em sua direção... Tão... Tão sedutora! Nem olhou para Gabrielly, que estava prestando atenção a cada movimento da moça. Manuela simplesmente colocou a mão no pescoço de Carolina e a puxou para um beijo cheio de desejo. Manu sentiu como se seu corpo soubesse exatamente o que fazer e confiou nele. Enquanto os braços de Carol enlaçavam sua cintura... Suas mãos se fixavam no pescoço da jovem. Assim que o beijo cessou, Manuela puxou Carol pelo braço indo em direção a saída, mas não sem antes olhar para Gabrielly e lhe retribuir aquela piscadinha... Seguida de um sorriso vitorioso.

Fim do capítulo