I

 

Quando o sol estava se pondo naquele domingo Layza observava com contentamento o crepúsculo na varanda do seu apartamento. Cerca de meia hora depois começou a ouvir um barulho, começou a prestar atenção e percebeu que alguém chorava no apartamento ao lado. Com o decorrer dos minutos o choro não cessava e ela decidiu ao menos tentar auxiliar.

 

- Boa noite! Não quero atrapalhar e também não sei quem esta chorando, mas se quiser conversar... (falou e aguardou, porém do outro lado ninguém respondeu).

 

O céu já estava estrelado e a lua muito bonita, quando a vizinha resolveu responder.

 

- Boa noite e obrigada! (uma voz feminina e triste ecoou).

 

- Olá! Você esta bem? Precisa de algo? (questionou preocupada).

 

- Só estou um pouco entristecida coisas do coração, mas já estou melhor, vou deitar. Boa noite!

 

- Melhoras e fique bem. Boa noite!

 

Depois do diálogo estranho com a vizinha, Layza ficou observando a noite por mais alguns segundos, em seguida tomou seu banho e logo se deitou em sua confortável cama, decidiu dormir cedo e descansar bastante, para enfrentar a nova semana.

Na segunda-feira, Layza acordou bem cedo trocou de roupa tomou um suco e saiu para fazer seu habitual exercício matinal, adepta de uma vida saudável, toda manhã corre cerca de uma hora e meia no parque próximo do seu condomínio. Quando retornou viu a nova vizinha fechando a porta.

 

- Bom dia! Quer que eu segure o elevador? (perguntou cordialmente).

 

- Bom dia! Sim, por favor! (a ruiva respondeu com certo desânimo).

 

- Prazer, Layza. Você é nova por aqui né

 

- Sou sim, mudei na semana passada. Prazer, Vitória! (respondeu estendendo a mão).

 

As duas se cumprimentaram e Layza ficou encantada com a beleza da ruiva que estava na sua frente.

 

- Bom eu já vou indo, tenho muito trabalho hoje. Até mais (falou Vitória se despedindo).

 

- Foi um prazer te conhecer, bom trabalho e uma ótima semana!

 

Layza foi tomar banho pensando na vizinha. Já Vitória resolveu deixar seus problemas de lado e se jogou no trabalho.

Durante toda a semana as duas não voltaram a se encontrar. O reencontro ocorreu no estacionamento do hospital. Layza é fonoaudióloga e Vitória pediatra.

 

- Olá! Boa tarde, tudo bem? (Layza se aproximou dizendo).

 

- Boa tarde, tudo sim e contigo? (Vitória falou surpresa).

 

- Tudo em ordem. Então além de vizinhas somos também colegas de trabalho?

 

- Que coincidência, seu nome é Layza, correto?

 

- Sim e o seu Vitória. Trabalho como fonoaudióloga aqui no hospital (explicou).

 

- E eu sou pediatra (revelou).

 

- Quer uma carona?

 

- Não, obrigada! Também estou de carro.

 

- Então até mais (despediram-se com um aperto de mão).

 

As duas voltaram a se encontrar ao acaso nos corredores e apenas se cumprimentaram rapidamente. Certa noite, Layza voltou a ouvir o choro de Vitória, desta vez optou por fazer um suco e tocou a campainha da vizinha.

 

- Boa noite! Desculpe a intromissão, ouvi seu choro, aceita um suco?

 

- Boa noite e obrigada, por favor, entre! Fique a vontade, vou só lavar meu rosto e já retorno.

 

Layza acomodou a jarra e os copos na mesa de centro e aguardou o retorno da outra.

 

- Layza, eu sou uma chorona e ultimamente tenho enfrentado problemas no meu relacionamento.

 

- Vitória, quando precisar conversar não hesite e me procure! Gosta de suco de maracujá?

 

 - Sim, é um dos meus preferidos.

 

As duas tomaram o suco em silêncio.

 

- Você é paulista também? (Layza puxou assunto).

 

- Não. Nasci no nordeste, mas na minha infância meus pais mudaram para Campinas, conhece?

 

- Conheço sim.

 

- Eu me formei na Unicamp e moro aqui na capital tem uns três anos, antes eu morava na zona norte e você?

 

- Eu sou paulista e moro neste apartamento tem uns cinco anos, antes eu morava com os meus pais, não muito longe daqui.

 

- Já é a segunda vez que te incomodo porque estou a chorar na varanda, desculpa (falou envergonhada).

 

- Ei não precisa se desculpar. Você quer desabafar?

 

- Obrigada! Prefiro conversar sobre outras coisas, não quero voltar a chorar.

 

- Compreendo. Você esta gostando do hospital?

 

- Estou sim, a estrutura é excelente. Faz tempo que você trabalha lá?

 

- Tem um ano e meio e lá é muito bom, um dos melhores da cidade.

 

- Você gosta de esportes? Eu já te vi com roupas de ginástica algumas vezes.

 

- Sim eu adoro esportes, principalmente os radicais e toda manhã eu costumo correr.

 

- Uau que legal toda atleta, eu só faço academia umas três vezes na semana.

 

- Amanhã vou para uma chácara junto do meu irmão e amigos, lá vamos jogar bola. Tem piscina também e vai rolar um churras. Quer ir conosco?

 

- Estarei de plantão amanhã, quem sabe numa próxima oportunidade.

 

- Que pena. Então você nem vai aproveitar o feriado e ainda caiu numa quarta-feira.

 

- Melhor assim viu, ando tão desanimada, ao menos trabalhando ocupo minha mente.

 

- Verdade tem isso. Bom, vizinha o papo esta ótimo, mas você trabalha amanhã e eu tenho que arrumar minha mochila. Precisando já sabe conte comigo (falou levantando).

 

- Obrigada e a sua jarra.

 

- Depois você me entrega. Fica bem e boa noite!

 

Elas se despediram. Vitória tomou banho e logo adormeceu. Layza organizou sua mochila e ficou até altas horas conversando com amigos no whats app.

No dia seguinte as duas pegaram o elevador juntas.

 

- Vitória, bom dia! Dormiu bem?

 

- Bom dia! Sim e você?

 

- Dormi pouco e combinamos de sair cedo, meu irmão já esta me esperando.

 

- Bom passeio para você e divirta-se!

 

- Valeu! Bom trabalho!

 

Elas se despediram e Luiz, já aguardava a irmã, que logo se acomodou no banco do passageiro.

 

- Irmãzinha você e seu bom gosto com as mulheres. Achei bonita sua nova namorada.

 

- Luiz, ela não é minha namorada. É a minha vizinha (esclareceu).

 

 - Lay, você esta bem de vizinha hein!

 

- Reparou na aliança dela também?

 

- E desde quando isso é problema?

 

- Você é um safado!

 

- Ei você nem fica atrás.

 

- E por falar nisso, quem tanto vai?

 

- Uma galera viu, hoje promete.

 

O feriado dos irmãos foi muito agradável, aproveitaram bastante entre os amigos, no dia seguinte Layza chegou muito atrasada no hospital e com uma ressaca terrível.

Vitória já estava adaptada com a rotina do novo hospital, a pediatria é a sua grande paixão, desde muito nova colocou em sua cabeça que cuidar de crianças é um ato nobre e sempre o fez com muita alegria. Para ela era gratificante zelar por um recém-nascido e acompanhar todo o desenvolvimento do bebê. Nem mesmo o berreiro que as crianças fazem incomoda a médica, ela tem paciência até para lidar com as mães neuróticas e super protetoras.

As duas jovens voltaram a se ver no domingo, quando Vitória tocou a campainha do apartamento da outra, visando devolver a jarra e os copos. Aproveitando também para devolver a gentileza, levando algumas fatias de bolo para a morena.

 

- Vitória, bom dia! Entre!

 

- Layza, bom dia! Como vai?

 

- Tudo ótimo. Então essa é a... (parou uns segundos tentando lembrar o nome da loira que estava de pé no centro da sala).

 

- Rafaela e eu já vou indo. Tenham um ótimo domingo e a gente se fala gata (disse dando um selinho em Layza e saindo em seguida).

 

- Desculpa, eu não sabia que você estava com visita, que indelicadeza.

 

- Deixa disso e fique a vontade.

 

- Eu trouxe suas coisas e um bolo, espero que você goste.

 

- Sou quase uma formiga, adoro doces. Muito obrigada!

 

- Por nada. Eu nem imaginava que você se relacionava com mulheres.

 

- Eu sou lésbica, espero que não seja um problema para você.

 

- Problema algum, na época da faculdade eu também me relacionei com mulheres.

 

- Ah que legal! (afirmou já comendo o bolo).

 

- E você namora?

 

- Não, namorar dá muito trabalho e eu gosto de ser solteira fazer tudo o que eu quiser, sempre que eu desejar, sem precisar dar satisfações e o melhor não tem cobranças.

 

- Entendi, então você gosta da liberdade e curte muito a vida.

 

- Exatamente. Já você namora né (falou apontando para aliança).

 

- Sim, namoro o Gabriel já tem uns dois anos.

 

- Bastante tempo e que bolo delicioso, é de prestígio né e você que fez?

 

- Sim!

 

- Novamente obrigada e sempre que fizer lembre-se da sua vizinha.

 

- Pode deixar e você trate de lembrar o nome das suas acompanhantes viu

 

- Nossa que chato, passei a noite inteira chamando-a de linda (revelou).

 

- Você é uma maluquinha isso sim, bom eu já vou indo.

 

- Vitória, fica mais, eu gosto de conversar com você.

 

- Ufa, ao menos o meu nome você sabe, mas eu já tenho que ir, vou almoçar na casa do meu namorado hoje.

 

- Nossa então vai lá e boa sorte!

 

Layza ficou pensando em Vitória, mal se conheciam, se encontraram poucas vezes, mas já admiravam uma a outra. Ambas inteligentes, bonitas e com grande senso de humor. Em comum o trabalho na área da saúde e aos poucos uma sólida amizade começou a ser construída.

O almoço de Vitória com Gabriel foi agradável e ele estava muito atencioso naquele dia, até massagem nos pés da moça ele fez.

 

- Era melhor eu lavar os pés né

 

- Eu não ligo para isso e seus pés são lindos.

 

- Gosta é?! Você tem fetiche por pé?

 

- Acho que sim e sou apaixonado pelos seus.

 

Minutos depois os dois estavam aos beijos deitados na cama de Gabriel. Ele é engenheiro e trabalha na empresa da família, uma das maiores companhias de engenharia do estado e na questão profissional ela tem orgulho do namorado. Mas ela também sabe que ele não é e nunca foi um namorado exemplar. O casal se conheceu ainda na adolescência, por intermédio de suas mães que são amigas e começaram a namorar logo que terminaram a faculdade.

 

- Vitória, tudo bem?

 

- Sim.

 

- Você esta pensativa, algum problema?

 

- Não. Estou com um pouco de sono.

 

- Fique por aqui esta noite, amanhã eu te levo bem cedo, pode ser?

 

- Pode sim, preciso de um banho, me arruma uma camiseta?

 

- Claro. Estou te achando tão séria e calada hoje.

 

- Bobagem sua, vou para o banho.

 

- Ok! Vou junto.

 

Depois do banho os dois logo dormiram e conforme o prometido na segunda bem cedo Gabriel levou Vitória para a casa. A semana seguiu tranquila e sem grandes novidades.

Na quinta-feira Layza correu atrás de Vitória no estacionamento do hospital.

 

- Boa tarde! Não te encontrei mais, tudo bem?

 

- Boa tarde! Sim bem e você?

 

- Também. Hoje, vai rolar um happy hour num barzinho, vamos?

 

- Não obrigada! Vou ao cinema com o meu namorado.

 

- E amanhã você pode? Marquei uma reuniãozinha com uns amigos lá na minha casa e você pode levar seu namorado, ele será bem recebido.

 

- Obrigada! Mas amanhã ele nem vai poder ir, vai jogar com os amigos.

 

- Então vá sozinha, a galera é legal, você vai gostar.

 

- Nem sei se é uma boa ideia e eu durmo cedo.

 

- Vai ser divertido, vamos papear e beber.

 

- Bom talvez eu vá.

 

- Legal, então até amanhã! (despediu-se beijando o rosto e abraçando a outra que ficou surpresa com a proximidade).

 

 

 

 

 

 

 

 

Fim do capítulo