CapÃtulo 4 - Coincidências existem
POV Alexandra.
Ouvi dizer em algum lugar entre minhas idas e vindas, que a tristeza pode se tornar algum tipo de vício e talvez esse fosse o meu caso. Mas não hoje. Por mais incrível que pareça, nesta manhã eu me via contente e não havia motivos especiais para isso, ao menos não que eu soubesse neste momento.
Subíamos as Escadas Monumentais. Mariana, como sempre animada, escalava os 125 degraus cantando Just be sob a coreografia de “Singing in the rain” – muito mal feita, diga-se de passagem.
Já estávamos atrasadas e desta vez a culpa não foi minha. Não fui eu quem insistiu em tomar café da manhã fora de casa. Conseguimos localizar a sala onde acontecia a primeira aula que, inclusive, já tinha iniciado. Abri a porta com muito cuidado e entramos sorrateiramente. Fui à frente para evitar que a desastrada Mariana esbarrasse em algo, o que não foi de muita valia, já que ela derrubou o celular no chão de taco fazendo um ruído grotesco, todos olharam para nós. Por sorte estava escuro e não fomos identificadas.
Passei os próximos 120 minutos fazendo rabiscos de caras e bocas. Como uma boa aluna que sou, comemorei quando finalizaram. Hoje teria sido mais rápido por se tratar apenas de uma apresentação. Nos dias seguintes teríamos demonstrações práticas e era aí que a emoção começava.
Estava próxima a porta, prestes a sair até que senti alguém me tocar.
-Alexandra!! Não esperava vê-la por aqui. Voltaste quando?
-Olá, Professor Sérgio! Quanto tempo... Vim apenas para o curso.
-Ah! Fico muito feliz que esteja cá. E não pretende ficar?
Fomos caminhando pelo corredor que dava acesso a sala enquanto conversávamos.
-Pois é professor, até gostaria...
Um grupo de pessoas passou por nós, me impedindo de falar.
- Tenho o haras no Brasil e embora tenha estado um pouco distante nos últimos tempos, quando retornar tenho muito trabalho a minha espera.
-Não diga não agora. Tenho uma boa proposta a fazer.
Pensando por algum momento, essa proposta viria a calhar. Sair do Brasil poderia ser bom, afinal, poucos dias que estou aqui já me sinto melhor.
Enquanto conversava com professor Sergio, vi passar uma pessoa por nós, parecia alguém que talvez eu pudesse conhecer... Fiquei em silêncio alguns segundos, até que ele me chamou a atenção.
-Não precisa responder agora, podemos marcar uma reunião pela semana. – Completou.
-Hm... Talvez essa proposta seja boa. – Respondi ainda observando a moça que dobrava o corredor.
-Lhe garanto que é.
-Gostaria de ouvir mais sobre. Vamos marcar um café?
-Combinado.
-Preciso ir agora, nos vemos depois. – Respondi tentando fugir da conversa neste momento.
-Tudo bem, até logo.
-Até.
Sai correndo atrás da moça que já deveria estar longe.
O corredor terminou e não a vi. Continuei até sair do prédio. Olhei de um lado para o outro e nada.
-Está a minha procura?
Mariana sussurrou, bem próxima ao meu ouvido.
-Com certeza. É por isso que estou desesperada assim, saudades tua. – Falei com ironia.
Ela estava acompanhada de um rapaz, encarei-o até que me apresentou.
-Este aqui é o Jorge, um amigo de longa data...
-Prazer. – Nos cumprimentamos com dois beijos no rosto, como era de costume.
-Alexzinha...
Disse Mariana, tentando imitar meu sotaque brasileiro.
-Lá vem. O que tu queres?
-Sabe o que é...
-Desembucha, Mariana.
-O que é desembucha?
Me olhou curiosa, segurei o riso e Jorge também.
-Nada. O que queres?
-Jorge participa de um workshop sobre fotografia e precisa de uma modelo...
-Que bom para o Jorge... – Continuei a caminhada.
-E, bom... É... Sugeri que fosses tu.
- Fizestes o que? – Neste momento acho que meus olhos quase saltaram da órbita.
-Tu és bonita, leva jeito. O que há de mal nisso?
Já estávamos cochichando a esta altura.
-O que há de mal... O que há de mal é que eu não sei fazer isso.
-Vá lá, Alex... Por mim.
-Espera, tem algo errado. Qual sua intenção nisso tudo? Não vá me dizer que... – Apontei para Jorge que estava logo atrás leigo acerca do que falávamos. – Aí meu Deus, tu tens uma queda por ele.
-Sou a favor do amor por pessoas, não tenho problema com gênero, tu sabes.
Ela cruzou os braços demonstrando indignação com minha surpresa.
- A vá... E eu que não sou a favor de amor nenhum tenho que sofrer?
-Por favor, Alexandra...Fico a dever-te, juro que pago.
-Por que não és tu, a modelo?
-Porque sou muito tímida para isto, as fotos ficarão horríveis. Vou estragar o avanço que tive com ele. Ajuda-me, Alex!
Seu olhar suplicava mais que filhotes em feira de adoção.
-Eu vou cobrar caro, senhorita... Muito caro.
-Não importa. Então... aceitas?
-E tenho escolha? Se não aceito corro o risco de ser despejada de casa.
Ela sorriu vitoriosa. Abraçou-me, do jeito caloroso de sempre, mesmo que isso me tirasse do sério.
Era só o que me faltava nesta vida, ser aspirante a modelo. Só poderia vir de Mariana uma proposta desta. Nem sequer sei como me portar em frente a uma câmera. Azar o dele, as fotos ficarão péssimas.
-Então... Jorge, não é?
-Sim.
Respondeu com um sorriso simpático.
-Pois bem... Quando é que temos que fazer o tal ensaio?
Jorge olhou para Mariana com cara de paisagem e eu temi o que parecia não saber.
-A é. Esqueci-me de dizer que era para agora.
Disse com a maior cara de pau que eu já tinha visto.
-É brincadeira, não é? Diga que sim! - Lancei um olhar fulminante em direção a Mariana, que se escondeu atrás de Jorge. – Tu me pagas. – Sussurrei em seu ouvido.
Tudo bem que a timidez passa longe de mim, mas também não precisava ser assim, forçado.
Fomos em direção ao jardim botânico, onde aconteceria a sessão. Segundo Jorge, não tinha com o que me preocupar, afinal, não seria a única. Mesmo assim eu caminhava como se estivesse no corredor da morte.
O lugar estava repleto de aspirantes a fotógrafos, câmeras e equipamentos espalhados por toda parte. “Aí meu Deus, o que estou fazendo aqui?”. Era a única coisa que conseguia pensar. Explicaram rapidamente algumas posições que eu poderia fazer, e que era só pensar que não tinha ninguém lá. Agir naturalmente. De que jeito? Com tantas câmeras apontadas para mim. Olhava para Mariana e ela fazia sinal de positivo com as mãos, como se isso fosse me ajudar.
No momento em que disseram que as primeiras fotos seriam em grupo com mais quatro meninas, me senti um pouco tranquila. Sofrer em grupo é melhor do que sozinha. Minha teoria foi por água abaixo assim que todas elas pareciam saber o que faziam, enquanto eu... Bem, eu apenas estava lá.
Quando pensamos que as coisas não podem piorar, elas sempre pioram.
Chegou o momento de fazer as fotos sozinha, porém, desta vez somente Jorge iria fotografar. Afastamos-nos da multidão de psudo paparazzi e em menos de uma hora estávamos terminando. Fiquei feliz porque já estava faminta e não suportava mais tantas fotos.
-Alexandra, se não for pedir muito, tenho uma amiga que está sem modelo, ela não conhece ninguém por aqui. Só mais duas fotos e prometo que acabamos.
“Era pedir muito sim, mas o que é uma garoa para quem está completamente encharcado?”. Pensei.
-Tudo bem Jorge! Onde ela está? – Falei demonstrando impaciância.
-Vou chamá-la.
Assenti com a cabeça.
Mariana e eu continuamos negociando a forma de pagamento que ela iria preferir, já que me fez passar por todo esse vexame. Entre as opções estavam: Um harém, fechar uma casa de striper ou me doar seu fígado, porque com tanta bebida, algum dia eu precisaria de um.
-Não vou doar meu fígado, Alex. Escolha a casa que vamos fechar.
Parecíamos duas crianças idiotas. Ela se debatia tentando justificar o injustificável e eu gargalhava.
-Alexandra, essa é Ravely, a fotógrafa de quem falei. - Estava de costas para Jorge, apenas o ouvi falar.
Quase caí dura no chão, meus joelhos tremeram e a gargalhada se desfez.
Virei-me devagar, aqueles milésimos de segundos que parecem ser transformados em horas. Assim que meus olhos cruzaram com os dela, um sorriso espontâneo se formou em meu rosto. Mas desta vez ela correspondeu e eu me derreti. Neste momento eu não saberia descrever tal contentamento, apenas soube que queria aquele sorriso para mim.
Ravely não sustentou o olhar por muito tempo. Pude notar por seu rosto completamente ruborizado a timidez transbordando, e para mim tudo só ficava cada vez mais interessante.
-Podemos começar?
Aproximei-me dela, meu estômago parecia se revirar.
-Onde prefere que eu fique? – Não conseguia anular o sorriso persistente que me denunciava.
-Pode ser próxima aquela árvore mais a frente?
Ela indicou com a cabeça.
-Claro. – Respondi cheia de confiança.
Começamos a fotografar e de repente eu poderia ficar naquela posição o resto do dia . Pele clara, bochechas rosadas... Gostei de ter sua atenção toda em mim. Ela se parecia tanto com meu próximo erro. Em uma situação favorável as coisas poderiam ser diferentes. Porque se é errando que se aprende, eu não me canso de saber mais.
-Desculpe, será que poderia amarrar a camisa na cintura?
Eu usava regata branca bem fininha por debaixo. Tirei a camisa bem devagar e amarrei-a de forma errada de propósito.
-Assim?
Ravely se aproximou tentando ajeitar. Deixei que ela prendesse como queria e lutei contra a vontade de mantê-la por mais tempo próxima a mim. Embora a tenha acabado de conhecer, era como se nós já tivéssemos uma conexão e todos os sentidos fossem ampliados.
- Agora está melhor.
Me analisou com o rosto de lado, sorriu meiga e voltou para sua posição.
Passaram alguns minutos e logo vieram nos chamar. Segunda vez no dia que eu quis matar Mariana.
-Terminaram, meninas?
Jorge perguntou.
-Sim
Ravely respondeu enquanto guardava a câmera.
-Que bom que deu tudo certo. Muito obrigada, Alexandra. Não sabe como nos ajudou.
-Que isso, Jorge. Quando precisar pode contar comigo. – Eu soei mais simpática do que imaginava e Mariana me olhou confusa, acho que nem ela esperava tanta simpatia vinda de mim.
Assisti enquanto eles se afastavam. Aquele tipo de cena que se observa com fixação para que jamais fuja da memória. Já me preparava para juntar os pedaços que restaram da minha coragem. Até que tive a brilhante ideia de ligar o automático e dizer qualquer coisa que visse a cabeça. Só não podia deixar que ela se fosse mais uma vez sem sequer saber como encontrá-la novamente.
-O que acham de sairmos hoje à noite? – Quase gritei para que me escutassem. Não podia perder a chance de vê-la de novo. Jorge olhou para Ravely que concordou, enquanto eu quase quebrava os dedos, cruzando-os para que desse sorte e ela respondesse sim.
-Sim, claro. – Ela sorriu educada.
-Então nos vemos a noite, no Broadway. Conhecem?
-Sim, até lá.
Jorge respondeu.
Voltei para casa em silêncio, ainda não conseguia acreditar no que acabará de acontecer. E de certa forma sentia-me caminhar sob as nuvens.
Passei o resto do dia ansiosa, olhava a cada dez minutos para o relógio, como se isso pudesse fazer com que o tempo se fosse depressa.
Me joguei no sofá, minha mente não parava de girar, quais as chances de isso acontecer?
-Muito gira a tal de Ravely. Não achou, Alex?
Mariana disse da cozinha.
-Sim, bastante...
-Foi por isso que a chamaste para sair?
Ela disse sobre risos.
-Chamei a todos.
-Ah sim... Tive que implorar para fazer as fotos para Jorge, quando ela chegou, tu incorporaste a modelo.
Eu podia ouvir suas gargalhadas mesmo estando na sala.
-Não tens ideia de quem é ela...
-E tu tens? Acabaram de se conhecer.
-Na verdade não. – Respirei fundo buscando força para acreditar no que iria dizer - Ravely é a moça do avião.
Ela apareceu espantada na porta, com as mãos recostadas no batente, balançava a cabeça em negação.
-Já vejo tudo... Vê se não vai te met*r em problemas. Estas sempre a complicar as coisas.
-Quem te escuta pensa que sou um monstro.
-És um anjo, quando queres. Não vá engana-la e depois voltas ao Brasil, a pobre fica cá a chorar por ti. Se bem que acho que ela seja hétero...
As palavras de Mariana tinham fundamento. Ravely não parecia ser como as moças que eu costumava me relacionar. Tinha um rosto tão calmo, às vezes parecia até inocente, não conseguiria agir de forma fria com ela.
Fim do capítulo
Gente, neste capítulo fiz menção a uma música: Just be da Paloma Faith, para quem se interessar em ouvir, segue o link.
https://www.youtube.com/watch?v=oGtfcbwQ9ZE
Ps: Gosto muito da versão do Calum Scott.
Espero que gostem.
E finalmente o tão esperado encontro...
Será que agora Alexandra vai querer insistir em algo ou simplesmente aproveitar a situação?
Comentar este capítulo:
EdyTavares
Em: 03/02/2017
kkkkkkkkkkk... Tammy que delícia, estou amando. Parabéns.
Resposta do autor:
Olá Edy
Que bom que está gostando, fico muito feliz, espero que a leitura continue agradando.
Bjos
rhina
Em: 04/10/2016
Olá.
Bom dia.
Alex....o que sentes que já não sentiste...a vida já não te ensinou o bastante....te preparas pois o futuro és incerto e conflituoso ....se achas que sua cota de sofrimento já está ultrapassada....tu não sabes o que é viver.
Adorei o capítulo.
Até.
Rhina.
[Faça o login para poder comentar]
Teresa
Em: 03/10/2016
Nossa como o comportamento de uma pessoa pode mudar de um momento para o outro haha primeiro não queria ir e mal ela apareceu fez tudo de boa vontade haha e ainda conseguiu convidar pra sair :) parece que vai tentar algo com ela :)
Resposta do autor:
kkkkkkkkkk Então... Nem para se dar ao trabaho de disfarçar. Ficou com a maior frescura para ajudar e depois quando Ravely apareceu ela gostou. Vamos ver o que vai rolar nesse proximo encontro. ;)
[Faça o login para poder comentar]
Mille
Em: 03/10/2016
Olá autora tudo bem?
E que encontro delas, fiquei só em duvidas o que significa "Muita gira a Rav"
Ih não quero nem ver se elas tiverem algum rolo, e quando elas voltarem ao Brasil e conhecer a namorada do irmão, ficará tenso dos dois lados.
Bjus e até o próximo
Resposta do autor:
Olá mille, tudo ótimo e contigo?
Gira é o mesmo que bonita. Em Portugal costumam dizer gira ao invés de bonita.
Pois é... me parece que vai dar confusão nesse encontro.
Beijs.
[Faça o login para poder comentar]
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]