Capítulo 32 - segunda parte. 

 

Nova York - dias atuais. 

 

Rebecca analisava atentamente vários documentos. Estava concentrada. Analisava números por números. Usava óculos de grau, que dava um toque sexy na jovem. Escutou quando bateram levemente em sua porta. 

 

-- Entre - ordenou. 

 

-- Olá senhorita... A senhorita Amanda ligou, disse que era importante. 

 

-- Ok Hannah... Pode ir - disse sem olhar para a secretária. 

 

-- Sim senhorita. 

 

Rebecca continuou o que estava fazendo e somente depois de duas horas resolveu ligar para Amanda. 

 

-- Se fosse algo urgente hein... - Amanda disso irônica. 

 

-- O que é tão importante assim Amanda? - a ruiva ignorou a forma irônica que a outra falou. 

 

-- Eu não acredito que você teve a capacidade de esquecer Rebecca! Meu Deus... Olha como você ficou... - desligou na cara da ruiva. 

 

-- Que mulher louca... Eu não fiz nada... Esqueci de que? Que dia é hoje? - a ruiva ficou pensativa, mas arregalou os olhos assim que lembrou - Caramba como pude esquecer de algo tão importante assim... Mas eu não tenho como sair agora... Preciso terminar de rever todos esses documentos... Vou me adiantar aqui... Acho que ainda tenho tempo - disse olhando o relógio. 

 

Depois de muito tempo Rebecca finalmente terminou tudo. Tirou os óculos e respirou fundo. Olhou as horas, estava muito tarde. 

 

"Que droga! Perdi totalmente a noção do tempo"

 

Organizou algumas coisas e rapidamente correu para casa. Quando chegou tudo estava em silêncio, mas assim que entrou na sala percebeu que Amada esperava por ela. Sabia que iria escutar um sermão daqueles. 

 

A mulher loira e alguns anos mais velha a encarou friamente e levantou-se, cruzando os braços sobre o peito. 

 

-- Você não consegue mudar... - disse cansada. 

 

-- Desculpa, eu tive alguns imprevistos de última hora. Não deu para estar aqui mais cedo. 

 

-- Não é para mim que você deve desculpas, Rebecca. 

 

A ruiva abaixou a cabeça e ficou pensativa. 

 

-- Como ela está?

 

-- Como ela está?! Como acha que ela está?... Sabias que ela te esperou durante toda a festa? 

 

-- Eu tentei sair mais cedo, Amanda. 

 

-- Não... Você não tentou... Não minta. 

 

Rebecca ficou em silêncio. 

 

-- Ela não tem culpa dos seus erros Rebecca, entenda isso... Se existe alguém inocente nessa história toda é ela. 

 

-- Preciso vê-la. 

 

A ruiva subiu a escada e seguiu em direção ao quarto da menina. Aproximou-se e abaixou-se, ficando de joelhos. Observou a menina que dormia tranquilamente. Fez leves carícias no cabelo vermelho, idênticos aos seus. 

 

-- Oi meu amor... Desculpa tudo que essa sua mamãe faz... Eu ainda não aprendi a lidar com tudo isso, mas saiba que eu te amo acima de tudo. Você é a luz da minha vida. 

 

Rebecca quando voltou a Nova York estava longe de ser aquela menina de alguns anos atrás. No início ela até tentou ser indiferente a todos aqueles sentimentos que a deixavam mal. Mas ela passou quase um ano sendo uma adolescente rebelde e inconsequente. Seu pai não tinha mais voz ativa sobre ela. Rebecca resolveu deixar tudo de lado e curti a vida. A bonequinha não existia mais. A garota que escutava tudo que os pais falavam, que sempre foi obediente, essa a ruiva tinha enterrado em seu passado. 

 

Rebecca aproveitou, fez tudo que quis. Passava noites bebendo com os novos "amigos" riquinhos, como ela. Tornou-se inconsequente. Ficou com muitas pessoas nesse tempo, mulheres, homens não importava, ela só queria aproveitar. 

 

Marcelo foi visitá-la quase seis meses depois. Iria fazer um curso em Nova York. Os dois tornarem-se inseparáveis. Rebecca adorava o menino, mas somente como amigo. Até ficaram algumas vezes, mas a menina não queria nada sério, principalmente com ele. Em uma das suas noites de bebedeira, ela e marcelo, provaram uma nova "droga". A ruiva não tinha lembrança alguma daquela noite, mas soube no outro dia que havia feito uma grande burrada. Tinha passado a noite com Marcelo. Ficou desesperada e desde então decidiu se controlar. Depois de dois meses veio a notícia bombástica. Estava grávida. Uma menina que tinha acabado de fazer dezesseis anos. No início ficou perdida. Falou com Marcelo que ficou muito feliz. Os dois decidiram contar para os pais da ruiva. Clark, para a surpresa da menina ficou radiante de felicidade. A mãe ficou preocupada com a filha. 

 

Marcelo pediu a menina em casamento, claro que ela pensou antes de aceitar. Deixou claro que entre os dois nunca existiria uma relação de marido e mulher. Marcelo mesmo triste, concordou com as exigências da ruiva, tinha esperança que ela mudasse de ideia com o tempo. Rebecca aceitou se casar apenas pelo filho. Deixou de ser aquela garota rebelde e dedicou-se a aprender tudo sobre a empresa dos pais. Estudou, fez faculdade, cursos, intercâmbios. Nesse tempo sua filha nasceu, Emily. Rebecca não conteve a emoção quando viu a filha pela primeira vez. A menina era idêntica a ruiva em tudo,  somente a cor dos olhos eram diferentes... Verdes... Verdinhos... Isso fez a ruiva lembrar de um passado que sempre lutou para esquecer. Quantas vezes não olhou para Emily e imaginou Luiza. As duas tinham a mesma doçura no olhar. 

 

Falar em Luiza, afinal, era extremamente proibido. Com o tempo lembrar da menina passou a não doer mais... Mas a ruiva ainda guardava uma grande mágoa daquela garota. Evitava qualquer mulher que tivesse alguma semelhança física com sua ex namorada. Percebeu com o tempo que gostava mesmo era de mulher, achava homens bonitos, mas não passava disso. Teve muitas mulheres em sua vida ao longo desses anos, mas nenhuma que despertasse, algo além do desejo físico. Nenhuma até conhecer Amanda vice presidente de uma empresa com a qual havia fechado um grande contrato. Amanda era loira de olhos castanhos e uma sorriso intenso. As duas começaram a conversar e não pararam mais, tinham muitas coisas em comum. Amanda sabia que a ruiva era casada, mas estava gostando de verdade da jovem. Ainda tentou resistir, mas Rebecca era insistente e as duas tiveram um caso de vários meses e finalmente a ruiva comportou-se. 

 

Rebecca pediu o divórcio e assumiu seu relacionamento com Amanda. Clark ficou desesperado, ameaçou a filha de todas as formas, mas Rebecca aprendeu a nunca mais abaixar a cabeça diante do pai. Marcelo apesar de triste, aceitou a decisão da esposa, ele já havia percebido que ela nunca iria amá-lo. Ao menos ainda teria a filha por perto. 

 

Clark e Marcelo faleceram em um acidente aéreo, o jatinho em que estavam caiu e explodiu. Uma fatalidade na vida dos Thompson. Emily era louca pelo pai e sentiu bastante a falta dele. Apesar de tudo que Clark tinha feito, Rebecca sentiu a morte do pai e de Marcelo. Ainda estava longe de ser uma mulher madura, quando teve que assumir todos os negócios da família, tinha  praticamente acabado de sair da adolescência, apenas 19 anos e uma grande responsabilidade pela frente, mas para surpresa de todos a jovem era brilhante para os negócios e tudo que já estava bom, ficou ainda melhor. 

 

Desde que ela havia voltado a Nova York, quase sete anos haviam se passado. Aquela menina inocente e doce, não existia mais. Rebecca havia mudado, não apenas fisicamente, mas principalmente em seu intimo. Tornou-se uma mulher arrogante e fria. Fazia "jus" ao apelido que a Luiza tinha dado a ela no passado. 

 

"Poderosa"

 

Era assim que a ruiva era conhecida na empresa. Era extremamente viciada em trabalho. Gostava de tudo perfeito e enlouquecia se alguém fizesse alguma coisa errada. Tinha a vida profissional perfeita, mas a pessoal... Essa estava longe disso. Depois de quase cinco anos, o casamento da jovem de apenas 22 anos estava acabando. A ruiva dispensava qualquer coisa por trabalho. Quantas vezes em sua vida, não deixou a mulher plantada esperando, enquanto se ocupava com alguma coisa no trabalho. Amanda aguentou muitas coisas. Datas esquecidas, o jantar que nunca aconteceu, a lua de mel tantas vezes desmarcada, às várias vezes em que teve que dormir sozinha. Mesmo quando Rebecca estava em casa, ela só vivia no computador trabalhando. Isso tudo foi cansado Amanda aos poucos. 

 

Emily apesar de toda a ausência da mãe, quando a via pulava de felicidade. Rebecca sabia que não estava sendo uma boa mãe, mas apesar de ter conhecimento disso, não conseguia fazer qualquer coisas para mudá-la. Compensava sua ausência com vários presentes para a menina. Mas estava longe de ser a mãe que toda a criança merece. 

 

Rebecca havia se atrasado para o aniversário de Emily. A verdade é que também tinha esquecido. Ficou horas ao lado da filha, que dormia como um anjo. Depois de ficar todo esse tempo admirando a pequena ruivinha, a jovem decidiu ir para seu quarto. 

 

Amanda lia um livro atentamente e não se deu ao trabalho de encarar a esposa. Rebecca seguiu para o banheiro. Depois de vários minutos saiu com sua roupa de dormir. Ficou um tempo encarando Amanda que fingia não perceber os olhares sobre si. 

 

Amanda era uma mulher muito linda. Tinha quase trinta e nove anos e nem parecia. Gostava de se cuidar e sempre praticou vários esportes. Já era uma mulher vivida quando conheceu Rebecca. Sabia que a garota tinha apenas de 18 anos, era casada e tinha um filho. Tentou resistir de todas as formas, mas a ruiva foi insistente e conseguiu tudo daquela mulher. Amanda sempre foi completamente apaixonada por Rebecca, mas sempre soube que o sentimento não era recíproco. A ruiva podia até gostar dela, mas sabia que não era igual. Rebecca sempre foi mais contida com relação aos sentimentos. 

 

Descobriu o motivo de tanta resistência dois anos depois, por acaso. Rebecca sem querer deixou uma foto cair de sua mão e Amanda conseguiu ver perfeitamente a menina na foto. Uma morena de olhos verdes e sorriso tranquilo. Perguntou quem era, mas Rebecca relutou em falar. Depois de muitas brigas e discussões, a ruiva revoltada pegou a tal foto e queimou na frente da mulher. Contou por alto quem foi Ana Luiza e somente pela forma que ela falava, Amanda percebeu o quanto aquela história a machucava. Depois desse dia decidiu nunca mais falar sobre aquilo e de fato nunca mais havia falado. 

 

Rebecca observava a esposa... Sabia que seu casamento estava se acabando, mas não conseguia fazer nada para mudar a situação. Quando conheceu Amanda encantou-se pela aquela mulher. Foi a primeira vez depois de Luiza, que a jovem tinha se interessado por alguém. Quis aquela mulher desde a primeira vez que a viu. A ruiva ficou encantada. Amanda era tudo que Luiza nunca foi. Tinha muitas qualidades, era incrível e maravilhosa, mas Rebecca insistia em compará-la a Luiza. E mesmo que a mulher ganhasse de Luiza em quase tudo, mesmo assim, Rebecca preferia Luiza. Sentia-se patética por isso, mas não conseguia evitar. Com o tempo a garota conseguiu gostar verdadeiramente daquela mulher, a amá-la. Não como amava  Ana Luiza, mas era amor. Apenas não soube demonstrar esse sentimento. Suas ausências, o trabalho... Tudo a afastou de sua amada família. Rebecca ainda amava Amanda, mas era muito mais um sentimento de amizade que qualquer outra coisa. 

 

A ruiva sentou-se na cama encostada na cabeceira e ficou olhando o celular. 

 

-- Amanhã levarei Emily ao parque para comemorar o aniversário dela... - comentou. 

 

-- Vai mesmo? - disse duvidando. 

 

-- Se eu estou falando é porque eu vou. 

 

-- Aham... Acredito - irônica. 

 

-- Qual é o problema Amanda? - Rebecca se irritou. 

 

-- O problema é que você apenas fala... Fazer que é bom... É raríssimo. 

 

A ruiva calou-se e decidiu dormir. Não valeria a pena discutir naquele momento. Estava cansada. 

 

De fato a ruiva cumpriu a palavra e levou a filha em um parque. Ficaram o resto do dia juntas. Rebecca realmente não pensou em trabalho nesse dia, apenas queria aproveitar o dia com Emily. A menina estava visivelmente feliz por estar ao lado da mãe. Cansada de tanta diversão a menina dormiu no colo de Rebeca que decidiu voltar para casa. Deixou Emily dormindo e decidiu tomar um pouco de uísque para relaxar. Sentou-se no sofá e ficou curtindo o momento. Sentiu seu celular vibrando, olhou quem estava ligando e mesmo sem muita vontade decidiu atender. 

 

-- Boa noite, meu amor! 

 

-- Olá Daniela, boa noite - disse sem muita animação. 

 

-- Nossa quando ânimo hein - a morena disse irônica. 

 

-- Muito - A ruiva também foi irônica. 

 

-- E aí... Quando você vem aqui em casa? - disse com malícia. 

 

-- Difícil... Ando muito ocupada esses tempos. 

 

-- Quando você não está ocupada né, Rebecca... Tô com saudade de você - disse manhosa. 

 

-- Hmmm... 

 

-- Cadê aquela sua mulher sem graça? 

 

-- Já disse pra você não falar assim dela - falou brava. 

 

-- A verdade dói né. 

 

-- Daniela... 

 

-- Ok parei... Mas afinal quando você vai acabar com essa relação? Tá na cara que isso nunca vai dar certo. 

 

-- Já disse que minha vida pessoal não interessa a você - disse arrogante. 

 

-- Ok senhorita. Amanhã eu apareço aí, beijos. 

 

-- Ok. Beijos! 

 

Rebecca ficou um tempo pensativa. Daniela  foi a única com quem a ruiva ainda manteve contato. Claro que sempre lembrava das palavras de Érika. Mantinha certa cautela com a morena, mas nunca deixou de falar com ela. Considerava Daniela uma pessoa legal. Dois anos depois que tinha saído daquela pequena cidade, ela encontrou com a morena e desde então,  as duas mantém contato. Mas nada havia acontecido entre elas durante todo esse tempo. A morena até tentou, mas Rebecca a cortou de forma grossa e nunca mais Daniela tentou qualquer outra coisa. 

 

Amanda não dormiu em casa. Rebecca estava acostumada a ausência da mulher durante algumas noites. Isso não a deixava incomodada. Não demorou a dormir, Estava cansada. Rebecca acordou cedo no outro dia para ir trabalhar. Beijou e abraçou Emily e a levou no colégio. Depois seguiu para a empresa. 

 

Logo pela manhã a ruiva teve uma notícia nada agradável. A empresa no Brasil, estava com problemas com alguns fornecedores. Rebecca ficou muitíssimo irritada, chamando todos de incompetentes e inúteis. Praguejou muitas palavras feias. Depois de muito xingar, a jovem conseguiu se acalmar. 

 

-- Acho que a senhorita vai precisar ir até o Brasil - disse um de seus assistentes.

 

-- Jura? - irônica - Cadê o Charles? 

 

-- Resolvendo alguns assuntos importantes na Itália. 

 

-- É verdade - suspirou pensativa. Charles era o único que ela confiava para resolver aquele problema. Apesar de não suportar a ideia de ter que voltar ao Brasil, após tanto anos, Rebecca precisava resolver aquela situação - Ok... Marque meu voo para amanhã - ordenou saindo da sala de reunião. 

 

A ruiva caminhou lentamente em direção a sua sala. Depois de quase sete anos teria que voltar ao Brasil. Por sorte o país era muitíssimo grande, as probabilidades de encontrar alguém de seu passado eram quase nulas. Não conseguiu mais se concentrar o restante do dia, estava nervosa e pensativa. Apesar de evitar de todas as formas, não conseguia deixar de pensar em seu passado. Ficava irritada com ela mesma. 

 

"Droga, não acredito... Evitei isso por tantos anos... De nada adiantou. Mas acho que está na hora de enfrentar uma parte do meu passado. Não sou mais aquela garota... Ingênua e estúpida... Agora sou uma mulher dona das minhas vontades e de ingênua não tenho nada... Todos que ousarem se meter em meu caminho... Vão pagar bem caro... Eu juro... Ninguém mais vai pisar em mim, ai de quem se atreva!"

 

Fim do capítulo