Estava ligando pela milésima vez para o Júlio, desde que a Flávia foi internada, que ele mal fala comigo, está sempre me dando uma desculpa, às vezes sendo um pouco grosso. Eu não entendia o porquê de sua repentina mudança. Confesso que fiquei um pouco pra baixo com essa situação.

 

Fazia poucas horas que a Flávia havia saído da UTI e estava em um quarto, já se passavam das duas da tarde, estava terminando o meu suco, quando avisto Cássia, Paloma e Isa. Elas se aproximaram, Isa me abraçou de lado e ficamos as quatro conversando até que terminei meu suco. Saímos da lanchonete e fomos para o quarto da Flávia, encontrando no caminho a enfermeira ranzinza, Cássia e Paloma, mostraram a língua para a mulher, enquanto Isa ria e eu revirei os olhos.

 

Chegamos à porta, Amanda estava com a minha irmã, minha mãe e meu pai haviam ido resolver alguns detalhes da transferência da mana para o hospital deles.

 

- Elas estão sozinhas? – perguntou Isa.

 

- Estão... – os olhos das três brilharam. Na certa queriam pegar as duas em uma situação constrangedora.

 

- Cadê o teu celular, Isa? – Cássia olhou com um sorriso travesso. Estava doida para ver o que elas iriam aprontar.

 

- O que estão fazendo? – nos assustamos com a voz de Emi.

 

- Essas vão aprontar... – Becca concluiu.

 

- Que caras de bem comidas... – não pude deixar de comentar, aquelas duas estavam com os olhos brilhando. Becca ruborizou e Emi me lançou um olhar safado.

 

- Acho que não é só a cara... – Isabela apontou para o pescoço marcado da Emily, que não se deixou envergonhar. Emi sempre foi desprovida de vergonha, já Becca, parecia um pimentão.

 

- Noite divertida... – Cássia mexia com sobrancelha.

 

- Vocês nem imaginam o quanto. – Emily soltou uma risadinha.

 

- Acho que podemos voltar ao assunto anterior... – Becca interviu. – O que estão fazendo? – mudou rapidinho de assunto. Cássia, Paloma, Isa e eu rimos baixinho.

 

- Queremos pegar aquelas duas com a boca na...

 

- Botija... – Paloma cortou a Cássia, sabendo que ela iria dizer uma das suas pérolas.

 

- Aqui o celular... – Isa entregou, Cássia acionou a câmera.

 

- Essa eu quero ver... – Emi esfregava as mãos uma na outra.

 

- Abre bem devagar para não assusta-las... – me vi no meio da algazarra.

 

Ficamos todas em silencio total, Cássia posicionou o celular, segurou na maçaneta da porta e a abriu bem devagar, mas para o nosso total azar, Flávia e Amanda, nos olhavam com as sobrancelhas arqueadas. Amanda com os braços sobre o busto, sentada ao lado da minha irmã. Flávia balançava a cabeça em forma de negação, com um sorriso vitorioso nos lábios.

 

- Olha só, meu amor... Elas queriam nos pegar em uma situação constrangedora. –  Flávia soltou uma piscadela. Cássia rapidamente empurrou o celular para a Isa, estávamos com uma feição de derrota na face.

 

- Que coisa feia, meninas... – Amanda fez um som com a boca.

 

- Oi... – dissemos juntas, entramos e ficamos nos olhando.

 

- Da próxima, eu consigo, senhorita Freire.... – Cássia empinou o nariz.

 

- Tente, Duarte... – Flávia cerrou os olhos.

 

- Já notaram algo de diferente no nosso casal fofura? – perguntei olhado para Becca e Emi e depois para Amanda e Flávia. As duas fitaram-nas de cima a baixo até que...

 

- Quer uma gaiola? – Amanda perguntou para Emi e todas nós começamos a gargalhar, deixando a Rebecca muito envergonhada. – Amiga, que periquito foi esse que deixou na sua namorada... – e mais gargalhadas, meus olhos lagrimaram.

 

- Amor... Nos defenda... – ela abraçou a Emi pelas costas, escondendo o rosto.

 

- Ei... Deixem a minha mulher em paz... – Emi segurou as mãos da namorada que circulavam a sua cintura, piscou para nós. – Ontem foi perfeito e nada mais justo de ficarem algumas marquinhas para deixar tudo mais real...

 

Por um instante, todas ficamos a fita-las, o amor delas era muito bonito de ver, chegava a emanar e contagiar. Por um momento desejei ter um alguém assim, ou já tinha? Olhei para as meninas, Cássia abraça a Paloma por trás, com o queixo apoiado sobre o ombro da minha irmã, Amanda aconchegou a minha mana sobre o seu colo, com o braço em volta de seu corpo. Olhei para Isa, que também parecia pensar o mesmo que eu, ela saiu do lado da Paloma e se pós do meu, me lançou um sorriso, antes de dizer o que eu também estava concluindo:

 

- Sobramos... – rimos da situação, abracei Isa de lado, até que ouvimos a porta ser aberta, olhei muito surpresa para a pessoa parada ali. Ele olhou da Isa para mim, arqueou uma sobrancelha e eu estranhei o que vi em sua face.

 

- Podemos conversar? – ele ao menos falou com ninguém, olhou estranho para Flávia e Amanda, não gostei daquilo. Retirei o braço que estava em volta da cintura da Isa, e sai do quarto que ficou extremamente silencioso.

 

- O que deu em você? Desde quando ficou tão grosso? – o questionei muito chateada.

 

- O que fazia abraçada àquela menina? – fiquei bestificada. Aquilo era mesmo real?

 

- E qual é o problema? – passei a mão em meus cabelos, nervosa com o rumo daquela conversa.

 

- Ainda me pergunta? HEIN? – Júlio ficou muito alterado, nesse momento escutei a voz de Flávia, querendo levantar e Amanda pedindo que ela permanecesse na cama. Logo elas saíram do quarto, excerto, Becca.

 

- O que acha que está fazendo? – Paloma o olhava com ódio.

 

- Não se mete, pirralha... – Júlio cuspiu as palavras. – O meu assunto é com a minha mulher... - o olhei incrédula. Quem era aquele homem a minha frente?

 

- Aumenta o tom com ela mais uma vez e eu esmago isso que você chama de p*nis... – Cássia o ameaçou, com a voz carregada de raiva.

 

- Pode vim, sua...

 

- O que deu em você? – o interrompi. Ele estava com uma veia do pescoço quase explodindo.

 

- Vai me deixar por uma mulher também? – meu queixo quase foi ao chão. – Vai me trocar por essa vadiazinha ai? – olhou para a Isabela.

 

- Lava a sua boca para falar da Isa, seu imbecil... – ele começou a gargalhar, me tirando totalmente do sério.

 

- Já vi que assim como o meu irmão... – ele olhou fixamente para a Amanda. – Vou ser trocado por uma piranha...

 

- Fala isso mais uma vez... – Amanda se aproximou com o rosto vermelho, parecia tentar se controlar.

 

- O que está acontecendo? – Flávia abriu a porta.

 

- Ela é teimosa, Amanda... – Becca tentou se explicar. – Ameaçou tirar o gesso do braço...

 

- Amor... Vem... – Amanda se colocou ao lado da minha irmã.

 

- Amor? Que coisa mais nojenta... – Júlio ironizou, vi minha irmã trincar o maxilar. Rebecca foi imediatamente para o lado de Emily, quando a viu se mover para avançar em Júlio. Paloma segurava Cássia. Eu não reconhecia aquele homem, minha mente estava prestes a explodir. – É assim que vai ser? Vai me trocar pela vadia que a tua irmã estava comendo? Eu deveria saber que era uma abominação assim como as tuas irmãs, sua vadia...

 

A cena a seguir foi muito rápida, Júlio foi ao chão, causando um barulho alto quando o corpo dele se chocou. Todas olhamos bestificadas para a figura a nossa frente, que balançava a mão e fazia uma careta de dor. Olhei para o Júlio e o nariz estava em cascata de sangue, olhei para quem o acertou, ela me olhou e parecia surpresa consigo mesma.

 

- Merda! O que foi isso? – Cássia se manifestou. – Cuidado que temos uma máquina de derrubar idiotas... Mandou bem, Isa...

 

- Caraca... Isabela... Me ensina esse golpe? – Emily se empolgou...

 

- Isa? – Paloma, Flávia, Amanda, Rebecca e eu ainda estávamos embasbacadas.

 

- Isso vai ter volta... – Júlio se levantou e estava com as mãos no rosto.

 

- Só se você quiser apanhar de novo... – fiquei bem próxima dele. – Se tiver um pingo de dignidade, não ousará nem olhar para as minhas irmãs ou minhas amigas, pois se não, eu mesma faço questão de te socar até não restar mais nem um misero dente. E outra, eu realmente achei que você era um cara incrível, mas ficou muito agradecida que tenha mostrado de fato a tua verdadeira face, seu canalha...

 

- Sua...

 

- Shiu!! E outra... Prefiro mil vezes ter como namorada a Isabela, que é uma grande mulher, do que um idiota que se acha muito homem e que gem* mais que eu na hora do sex*... Rasga fora, idiota...

 

- Ouviu a Nick... Se manda, seu banana... – Flávia completou.

 

- Rala peito, zé ruela... – Paloma o empurrou. – Toca aqui mana... – Paloma e Flávia bateram uma na mão da outra.

 

- Você está bem? – me aproximei da Isa, peguei a mão dela e estava ficando inchada.

 

- Estou... Não sabia que isso doía tanto... – ela deixou um sorriso escapar.

 

- Obrigada... – disse sincera.

 

- Por ter socado o teu namorado? – ela fez uma careta e eu não pude deixar de rir.

 

- Por ter me defendido... – ela sorriu. – Obrigada meninas... É bom ter vocês em uma discussão...

 

- É bom ter a Isabela Popo Pantoja, em uma discussão... – Flávia falou e todas rimos.

 

- Mana, vai na lanchonete e ver se consegue gelo... – olhei pra Paloma.

 

- Claro... Vamos amor?  - chamou a Cássia.

 

- Vamos amor... – Flávia, Isabela e Emily as imitaram.

 

- É claro, amor... – Cássia mostrou a língua.

 

- É claro, amor... – fizeram de novo e rimos.

 

- Ninguém veio ver o nosso showzinho... – Rebecca comentou.

 

- Eu pensei que a velha mal comida viria nos expulsar... – Emily comentou.

 

Entramos no quarto, Amanda ajudou a minha irmã a subir na cama, Becca sentou sobre as coxas de Emily, sentei ao lado de Isa. Por um momento, minha mente viajou e fiquei a pensar no momento em que Júlio e eu nos conhecemos, nos momentos bons que tivemos, nas palavras e planos. Será que ele sempre foi daquele jeito e eu nunca percebi? Como pude ser tão cega? Como alguém pode ser tão preconceituoso? Aquele ódio todo, sempre esteve escondido? Eu estava magoada, sentia muita vontade de chorar e certamente o faria assim que ficasse sozinha.

 

Observei aquele quarto, os leitos vazios, o sol alaranjado da tarde era visto, adentrava o quarto, o deixando inevitavelmente melancólico. As meninas conversavam, mas eu não entendia nada, quando senti um toque sutil em meu braço. Voltei a atenção para as mãos ainda unidas, senti um negócio estranho, mas resolvi não pensar sobre.

 

- Vai ficar bem? – Isa me perguntou baixo, para que apenas eu ouvisse.

 

- Espero que sim... – sustentei o olhar.

 

- Sei exatamente o que estais sentindo... – ela também não se intimidava com o olho no olho. – E lhe digo que você vai tirar de letra, Nicole...

 

- Espero ser forte assim como você, Isabela... – ela sorriu.

 

- Tenho certeza que é muito mais... – sorri em acordo.

 

- Aqui está... – Paloma foi entrando com um saco com gelo e me entregou.

 

- Obrigada, mana... Dá a mão, minha guarda-costa... – ela soltou uma risada.

 

Ficamos ali, as meninas tentavam me distrair e conseguiram, ainda rimos muito do casal Emi e Becca, Flávia insistia em saber como havia sido a noite delas, Emi falou sobre o jantar e surpresa que a Becca havia feito, mas não falou absolutamente nada da parte mais quente. Logo a minha mãe chegaria para dormir com a mana, todas as noites desde o ocorrido ela não deixava ninguém fazer isso. Paloma e Cássia foram embora, levando junto a fofa da Isa, que estava de carona com elas, Emi e Becca logo se despediram, a cara de quem queriam ficar a sós estava estampada nelas. Me despedi da mana e da Amanda, depois de alguns minutos eu já estava na BR, a discussão, o olhar, tudo que ocorreu há pouco jorrava em minha cabeça, algumas lágrimas escaparam, nublando os meus olhos. Entrei na Augusto Montenegro e depois de alguns minutos, já estava no condomínio.

 

A casa estava silenciosa, Marcinha e Lili, já deveriam ter ido, minha irmã ainda não havia chegado. Joguei a bolsa sobre o sofá e fui procurar algo para comer na cozinha, revirei a geladeira, tirei de lá um pedaço enorme de lasanha, botei no micro-ondas, enchi um copo com suco. Liguei a tv que havia ali e no jornal local, o assunto era a minha irmã, troquei de canal, pois não aguentava ver o momento do ocorrido. Coloquei em uma canal qualquer, ouvi os bips do aparelho e tirei a minha comida. Passei a devorar tudo e em pouco tempo já não havia mais nada. Lavei a louça e subi para o meu quarto, me pus na sacada e foi inevitável não pensar no Júlio, as lágrimas já se faziam presentes em abundancia, as pernas não suportaram e então sentei no chão, tirei a rasteirinha que eu usava e joguei em um canto qualquer, a noite chegava, e com ela a tristeza.

 

- Como pude me enganar tanto... Júlio...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fim do capítulo