Alma Negra por kpini
Capítulo 24
Marcella
Minha cabeça estava a mil. Como imaginei minha avó havia ficado arrasada. O pior é que eu nada podia fazer para ajudá-la, me sentia impotente diante de tudo, e se tem uma coisa que eu detesto é me sentir assim. Eu estava dirigindo o mais rápido que podia, porém a chuva e a neblina não permitiam que eu aumentasse a velocidade, se estivesse sozinha no carro talvez me arriscasse mais, só que não estava.
Não gostei de deixar Bianca sozinha, mas o que eu podia fazer? Eram tantas coisas presas em minha mente que não conseguia me concentrar em nada. A cada momento uma saltava na frente da outra. Uma dor de cabeça intensa começou a se instalar e nesse instante soube que teria uma bela enxaqueca à noite. Tantas vezes falei com Maria que estava na hora dela se aposentar, mas não, era teimosa como uma porta! E agora isso. Segui meu rumo tentando conter a ansiedade.
A viagem que normalmente é feita em uma hora e meia demorou quase três e quando por fim cheguei ao hospital além de exausta, estava com todos os nervos do meu corpo rígidos pela tensão. A cabeça estalava a cada movimento meu. Dei o braço para minha avó e fomos direto para a sala de espera onde encontramos Amanda, assim que nos viu veio em nossa direção.
- Marcella que bom que você chegou! – Disse a guisa de cumprimento.
- Amanda, por favor, me diga como ela está? – Vovó perguntou preocupada.
- Dona Maria Thereza estou esperando o médico vir dar noticias. Ela ainda deve estar na sala de cirurgia...
- Como assim na sala de cirurgia? – Minha voz se elevou um tom.
- É que a queda foi um pouco...
- Desembucha logo Amanda, não estou com paciência nenhuma. – Respondi ríspida.
- Ela quebrou a bacia e a perna também. Na idade dela, fica mais complicado. – Falou sem jeito.
- Meu Deus! – Vovó gem*u e suas pernas fraquejaram.
- Calma vó. É melhor se sentar. Vai dar tudo certo. Os médicos desse hospital são muito competentes. – Enquanto falava a levei até o sofá mais próximo.
Eu tentava tranquilizá-la, mas meu coração estava apertado no peito. Se alguma coisa mais séria acontecesse jamais me perdoaria. Depois de acomodar minha avó voltei meu rosto em direção da secretária e a questionei sobre a queda.
- Eu não estava perto Cella. Só ouvi os gritos dos criados e quando cheguei ela estava caída aos pés da escada. Então chamei a ambulância. Parece que ninguém viu o que aconteceu.
- É muito estranho. Eu não consigo entender. Maria estava tão acostumada a subir e descer aqueles degraus várias vezes ao dia. Ela não disse nada? – Fechei os olhos e massageei o ponto entre as sobrancelhas. Minha cabeça estava me matando.
- Todo mundo ficou pasmo. Ela só gemia por conta da dor. Só poderemos saber exatamente como foi quando ela estiver em condições de falar. Está com dor? Quer que eu arrume um remédio? - Amanda perguntou
- Seria ótimo se conseguisse, obrigada. – Respondi.
Ela saiu e eu fiquei ali rezando para que tudo fosse apenas um pesadelo. Queria apenas acordar e estar com Bianca em meus braços. Mas era apenas um desejo que eu sabia muito bem não ser realizável. Passei os braços pelos ombros de vovó tentando acalmá-la. Amanda voltou com o analgésico que engoli.
O cansaço começou a me dominar, recostei-me no sofá e sem percebi cochilei.
O lugar era escuro e frio, me senti gelada até os ossos. Um medo intenso tomou posse do meu corpo e por mais que eu quisesse me mover não conseguia, meus pés pareciam grudados. Eu senti que uma coisa rastejante se aproximava de mim, eu queria gritar, mas o som estava travado na minha garganta. Quanto mais perto aquilo chegava de mim mais ficava difícil de respirar. De repente aquele ser estava parado atrás de mim, meu coração disparou e sua voz amarga e odiosa atravessou meu corpo.
- Você acha mesmo que pode ser feliz? Nunca! Você vai pagar! Acredite eu vou te perseguir até o fim da sua vida!
Então soltou aquela gargalhada demoníaca que eu conhecia muito bem. Nesse momento minha voz voltou e gritei em desespero.
- NÃO! ME DEIXE EM PAZ!
Então uma mão me sacudiu e ao abrir os olhos vi que todos ao redor me olhavam espantados, e minha avó tinha os olhos arregalados!
- Filha o que aconteceu? Você gritou. – Vovó estava assustada.
- Desculpe, foi um pesadelo. Eu estou cansada e estressada. E ainda esse problema com Maria. Disse envergonhada
- Tudo bem meu amor. Vai dar tudo certo. - Ela falou passando a mão nos meus cabelos.
Segurei sua mão entre as minhas e depositei um beijo. Então me levantei.
- Vou tomar um café. Quer ir comigo? – Perguntei
- Não Cella. Vou ficar aqui, você pode me trazer uma xícara de chá?
- Claro. – Me voltei na direção de Amanda. – Você fica com minha avó, por favor. Quer algo da cafeteria?
- Fico sim. Se puder trazer café para mim agradeço.
- Eu trago. – Falei e segui pelo corredor.
Minha cabeça ainda estava povoada pelas imagens do pesadelo. Meu Deus até quando isso iria me perseguir? Eu havia cometido um erro, mas não tinha sido minha intenção que tudo terminasse em uma tragédia. Meu celular começou a tocar e atendi distraída.
- Marcella?
- Bianca, meu amor. Tudo bem?
- Sim, está tudo bem. Chegamos agora. Deixei Emilia no orfanato antes de vir pra casa. E como está Maria?
- Ela precisou ser operada. Estamos aguardando noticias.
- Nossa! A queda foi feia então.
- Sim. E ainda não sei como isso aconteceu. Estou tão cansada. Parece que o mundo inteiro esta em minhas costas.
- Quer que eu vá até ai?
- Não precisa Bi. Depois você tem que cuidar de Eduarda. Assim que os médicos vierem falar conosco vou embora. Não podemos fazer nada por Maria. Só nos resta aguardar e rezar pelo melhor.
- Verdade meu amor. Mas se precisar de qualquer cois me avise ok?
- Pode deixar. Fique tranquila.
- Tá bom.
- Beijo meu amor.
- Beijo. Eu te amo.
- Eu também.
Desliguei o telefone, mas minha cabeça em nenhum momento havia estado na conversa, aquele pesadelo tinha inundado os meus pensamentos qual um veneno. Minha pele estava gélida, e o ritmo do meu coração ainda descompassado. Até quando aquilo continuaria? Porque continuava a ter esses sonhos ruins com Viviana? Eu sabia da minha culpa, mas não fora eu que apertara aquele gatilho.
Tomei meu café ainda me questionando e relembrando o passado amargo. Pedi o café de Amanda e o chá de vovó e voltei para a sala de espera. Quando cheguei o médico já estava conversando com as duas, me aproximei para saber como estava Maria.
- Ela está bem. Sedada, mas a cirurgia para colocação dos pinos foi tranquila. – Ele estava dizendo.
- Podemos vê-la? – Perguntei enquanto entregava os copos.
- No momento não. Por ter idade avançada vamos mantê-la no CTI para que possamos monitorá-la. – O médico respondeu. – Mas amanhã ela estará no quarto.
- Então de nada adiantará ficarmos. – Disse olhando para minha avó.
- Sim. O melhor é que descansem também e venham amanhã. – Tornou ele, depois se despediu e foi embora.
- Filha, na há mais nada que possamos fazer aqui. Quero ir pra casa. Estou exausta. – Vovó falou e seu semblante denotava o cansaço.
- Ok. Vamos então.
Caminhamos até o carro sem nada falar. A situação era desgastante para todos e só depois de conversar com Maria iríamos ter paz e realmente descobrir o que acontecera de fato.
A noite estava lúgubre e chuvosa, e o silencio pesado dentro do carro aumentava ainda mais a minha sensação de angustia. Quando estávamos perto de casa meu coração começou a bater mais rápido. Há anos passava em frente daquela casa, e há anos sequer olhava para aquele lado da rua, mas naquela noite instintivamente virei a cabeça e o que vi fez meu coração parar.
A cortina do quarto dela estava puxada para o lado e a silhueta de um rosto observava pela janela. Sem perceber o que estava fazendo pisei bruscamente nos freios fazendo o carro derrapar. Vovó que estava cochilando acordou sobressaltada e Amanda deu um grito.
O ar entrava pela minha boca em golfadas e minhas mãos tremiam descontroladamente.
- Marcella o que aconteceu? Você esta branca como mármore. Parece até que viu um fantasma. – Minha vó disse virando-se em minha direção com a face preocupada.
Eu queria falar mas a voz não saia. O pavor era tão grande que mal conseguia me mover.
- Cella fala comigo. O que houve? Você não esta passando bem? – Agora era Amanda que perguntava ansiosa.
- Na janela...na janela... – Foi tudo que consegui balbuciar.
- Que janela? O que esta acontecendo? – Vovó olhava pra mim sem entender.
- Viviana...na janela. – Falei sem conseguir olhar novamente.
- Filha não tem ninguém na janela. A casa continua fechada. Tudo apagado. Não tem ninguém lá. Foi impressão sua. Olhe. – Ela tornou carinhosamente segurando minhas mãos.
Eu queria olhar, mas meu corpo não respondia o medo de olhar e ainda ver o rosto era maior que tudo. Lagrimas começaram a escorrer pelo meu rosto e comecei a soluçar.
Meu amor, não fique assim. Você esta estressada, teve um sonho ruim, por isso sua mente te pregou uma peça. Acredite em mim. Acalme-se. – Ela continuou a falar.
Respirei fundo e com toda a força que pude tirar de dentro de mim voltei a cabeça em direção a casa, e realmente nada havia na janela. Ela permanecia como um mausoléu, escura e sem vida.
- Marcella quer que eu dirija até em casa? – A secretária se ofereceu.
- Não Amanda, obrigada, mas não há necessidade. Já estou mais calma. – Falei enquanto voltava a colocar o carro em movimento.
Ainda estava extremamente exaltada ao atravessar os portões, e quando parei em frente a porta principal larguei o automóvel ali mesmo. Ajudei vovó descer e pedi que Amanda a levasse até o quarto, já que havia mandado a enfermeira vir antes para deixar tudo preparado.
Entrei e fui direto para a biblioteca onde enchi um copo de whisky e tomei de uma só vez, pra tornar a encher novamente e foi nesse instante que Bianca entrou me virei em sua direção e acho que o que viu em meu rosto fez com que o seu se tornasse pálido.
- Cella, o que aconteceu? Não me diga que Maria...
- Não Bianca. Maria esta bem. A cirurgia correu tranquilamente. – Falei enquanto esvaziava o copo.
- Então o que foi? – Ela caminhou em minha direção – Você está branca como papel.
- Não foi nada. – Respondi enchendo o terceiro copo.
- Nada? Tem certeza? E está bebendo desse jeito sem motivo algum? – Questionou
- Porque eu quero beber, ou será que não posso! Afinal essa porr* ainda é minha casa, e que eu saiba pago pela minha bebida! – Esbravejei.
Bianca se encolheu seus olhos marejaram e isso foi o bastante para me acordar do transe em que estava, coloquei o copo na mesa e fui em sua direção.
- Me desculpe Bi. Por favor. Eu ...Não quero te magoar. – A segurei em meus braços.
- Nunca te vi assim antes. – Sua voz saiu num sussurro.
- Eu estou cansada, é só isso. Foi um dia difícil. Me perdoa. – Disse beijando seus cabelos.
- Tudo bem amor. Mas não gosto de te ver assim. Porque não me conta tudo o que esta na sua cabeça? Quem sabe melhore. – Falou me oferecendo seus lábios que beijei delicadamente.
- O que eu tenho na cabeça não deve invadir a sua. São negritudes da minha alma. Pecados que pelo jeito vai me perseguir durante toda a vida. – Meus olhos se perderam dentro dos dela e uma paz começou a me invadir.
- Marcella, muitas vezes colocar pra fora o que você leva na alma ajuda. Eu te amo, do jeito que você é. Acredite, mas quero que não tenha segredos, assim como não terei com você. – disse enquanto me puxava para o sofá, onde se sentou e colocou minha cabeça em seu colo.
Suas mãos afagavam meus cabelos e fui relaxando. Aos poucos comecei a contar tudo pra ela e deixei que meus delitos viessem à tona.
Fim do capítulo
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Mille
Em: 25/07/2016
"Ser escritor é isto viver no limite das possibilidades e atuar possibilitando o bem, o visto que, refletir com os conteúdos das suas histórias desenvolve a bondade. " Regis Barros.
É graças ao dom da escrita que remete a nós leitores a possibilidade de viajar por lugares conhecidos e desconhecidos, emocionar como se estivessemos assistindo a cena e a vontade de gargalhar em cada momento engraçado.
Parabéns!!!
Srta Petrova
Em: 08/07/2016
Minha linda, como é bom poder saborear mais um capítulo desta maravilha.
Coitada de Cella, quando ela irá se perdoar? Pois só assim apagaremos de vez nossos pesadelos, nos perdoando. Tenho certeza que Bianca fará jus ao seu papel na vida dela, ajudando-a a superar tudo isso.
Beijos minha querida.
Rs seria pedir muito para não demorar kkkkk eu sendo eu rsrs
Bjsssssss
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Luh kelly
Em: 08/07/2016
Oieeee Kpini minha amiga. E aí como esta?
Ainda bem não ter sido nada grave com a Maria, mas claro precisa de cuidados. Ninguém me tira da cabeça que foi essa cobra da Amanda que a empurrou, talvez ela tenha descoberto alguma coisa ou esse foi o único jeito de trazer Cella pra casa pra ela ñ ficar mais com a Bianca.
Nossa nunca tinha visto Cella tão grossa daquele jeito, e esses pesadelos dela, curiosa pra saber do que se trata. Por pra fora esse peso ajuda e muito.
Ps: Mais um maravilhoso capítulo como sempre.
Beijão K e até a próxima. ;)
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Ana_Clara
Em: 08/07/2016
Eita, saudades dessa duas. São lindas! E olha, tbém acho que a Amanda tem tudo a ver com o acidente da Maria. Talvez a Maria tenha descoberto algo e aí a outra causou a queda. Enfim, muitas coisas para se acertar. Ah, e a Cella grossa não rolou. Somente a Bi para acalmar essa mulher. hahaha
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Mille
Em: 07/07/2016
Oi Ka tudo bem.??? Tava com saudades de oce kkk e nosso Verdão só nos dando orgulho tomara que permaneça assim.
E que capítulo tenso, e nesse acidente de Maria algo mim diz ter o dedo da Amanda (cascavel) 😂😂😂😂. Enfim que a Maria diga o que aconteceu mais acho que ela vai ter medo do que a Amanda pode fazer com ela.
E esse pesadelo da Cella, ela tem mesmo que se abrir para ver se essas coisas do passado ficam lá.
Bjus e até o próximo.
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