Capítulo 20
Passei o resto da semana ignorando Letícia, ainda estava magoada, confesso que sou um tanto rancorosa e não costumo perdoar fácil. Um defeito péssimo eu sei, mas como diz uma das minhas escritoras favoritas: Cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.
No começo foi dificil me livrar das suas investidas, mas a rotina atribulada que eu levava me deixava atarefada o suficiente para me distanciar dela. Acordava mais cedo, chegava em casa do trabalho mais tarde, nas ocasiões em que era inevitável nossos encontros eu sempre arranja um jeito que não ficassemos a sós, afinal nem eu mesma sabia até que ponto resistiria.
No final de semana haveria uma festa feita por minha mãe, já estava me preparando psicologicamente para aquele evento, ter que fingir aos olhos alheios que éramos uma família feliz, só eu sabia como era custoso aturar todo aquele teatro.
Na quinta-feira ignorei solenemente todas as ligações de Letícia no meu celular, ao todo foram 39 chamadas não atendidas, o que fez questionar como alguem poderia ser tão insistente. Será tão dificil perceber que eu não queria conversar com ela enquanto minha raiva não passasse?
Mesmo tendo-a evitado todo aquele tempo, ela não desistiu. Ligaram da recepção do Escritório para a minha sala, dizendo que haveria uma encomenda no meu nome, o que estranhei muito visto que não esperava nada. Desci pelo elevador com curiosidade para ver o que se tratava.
Fui ao balcão enquanto a secretária me sorria simpática.
--Acho que são para você.
Disse me apontando um buquê de lírios rosa, me fazendo corar completamente, enquanto todos na recepção me olhavam.
''Letícia, você me paga''
--Obrigada.--dei um risinho amarelo.
Ia sair em direção a meu andar, mas estagnei quando vi Dra. Victória adentrando pelo hall do prédio. Não a vi desde a cerimônia de boas vindas no inicio da semana. Ela usava um Tailleur preto que moldava perfeitamente seu corpo, scarpin e óculos escuros enormes vintage.
Sua presença era tão atrativa que todos a olhavam numa mistura de reverência e admiração, acho que a fama de carrasca dela chegou a todos porque quando ela aparecia os funcionários começavam a trabalhar imediatamente, parecia magica.
Caminhou elegantemente pelo hall com dois seguranças a tira colo, que deveriam ter o dobro do meu tamanho, passou por mim lentamente. Eu ainda estava segurando o maldito buquê e ela baixou o óculos como se quisesse ver com mais nitidez alternou o olhar entre as flores e eu.
Predi a respiração.
--Bom dia--disse formalmente dirigindo-se as secretárias.
--Bom dia, doutora--todas responderam em uníssono.
Foi em direção ao elevador, deixando apenas o rastro daquele perfume floral delicioso que ela usava. Não a vi pelo resto do dia.
O dia foi um pouco sobrecarregado, no final do expediente eu ainda analisava alguns processos que haviam prescrevido na minha sala quando a secretária me avisou que uma cliente queria conversar comigo. Autorizei a entrada ainda com os olhos nos papeis, quando senti um cheiro conhecido.
--O que diabos você veio fazer aqui? --arregalei os olhos a encarando completamente incrédula.
Letícia estava ali, em carne e osso me olhando sorridente.
--Boa tarde para você também. Como você me ignorou a semana inteira, pensei que pelo menos aqui você teria a obrigação de me tratar bem...--disse como se aquilo fosse a coisa mais óbvia do mundo.
--Este é o meu local de trabalho, o que você veio fazer aqui?
--Saber como você está? Se o seu dia foi bom? O que achou das flores?Quando pretende me perdoar? Posso me sentar?
Falou pausadamente, mais parecia uma daquelas boneca infantis que faziam perguntas aleatórias quando eram pressionadas.
--Letícia, você não pode vir aqui para isso, esse é um escritório sério e a menos que você tenha um bom propósito para procura-lo, você não deveria estar aqui. --falei irritada enquanto ajeitava os papeis na mesa de forma mecânica.
--Adorei sua sala--disse sentando-se na cadeira com um sorrisinho cínico olhando a decoração ao redor.
Letícia tinha a mania de mudar o assunto quando as coisas não iam ao rumo que ela gostaria. Odiava isso nela.
Suspirei cansada a encarando.
--Dez minutos para você me falar o que quer.
--Tudo bem, vamos lá. O que eu faço para você me perdoar?
--Não faça nada, Letícia. Eu não tenho o que perdoar não é a mim que você deve satisfações.
--Hum, isso soa tão rude. Mas não vou tirar sua razão em estar irritada --levantou-se da cadeira e veio em minha direção -- sei que errei e não deveria ter rido daquela piada de extremo mal gosto, se pudesse voltar no tempo não faria --pegou suas mãos entre as suas e beijou--mas peço que me perdoe, isso não vai mais se repetir, meu amor. Eu prometo.
Eu vi arrependimento no seu olhar, como se implorasse meu perdão. Eu sentia meu ego batalhar com o sentimento que tinha por ela, eu ainda estava machucada, mas não era forte o suficiente para resistir a elas.
Ela ajoelhou-se em frente a minha cadeira, ainda segurando minhas mãos delicadamente.
--Letícia, levanta já daí!
--Olhe como eu estou, literalmente ao seus pés.--fez um carinha tão fofa que senti vontade de rir.
Era mesmo uma sedutora nata, que meu ego fosse para o quinto dos infernos, eu a perdoaria.
--Ok, desculpo você. Satisfeita?
O sorriso que ela deu foi tão radiante fez meu coração errar a batida tamanha emoção causada.
--Ainda não, quem sabe não fique após um beijo? --Me olhou significativamente.
--Nem pensar, não esqueça de onde estamos. E ainda tenho que deixar uns papeis na sala ao lado. --Falei me levantando e organizando alguns papeis.
--Para que a pressa?
Encostou o corpo no meu e uma corrente eletrica passou ela meu corpo me fazendo arfar com sua mão quente pressionando minha cintura, e a outra colocando meu cabelo ao lado, deixando minha nuca a mercê de seus beijos.
--Letícia, pare...
--Não consigo.
Sua mão arranhou minha barriga por baixo do tecido fino da minha blusa, e não pude sufocar o gemido fraco que saiu dos meus lábios. Ela me virou de frente mergulhando a língua em minha boca, me arrancando suspiros entre um beijo e outro e em um movimento firme me suspendeu sobre minha mesa, parando o beijo apenas para sussurrar em meu ouvido.
--Saudades
Lambeu toda extensão do meu pescoço, eu me segurava na mesa apoiando, enquanto Letícia explorava seu pescoço, ombros, colo.
Pus a mão em sua nuca e a puxei pelos cabelos fazendo com que ela me olhasse.
--Aqui não...
Ela ignorou pousando as mãos em minhas pernas e as afastando bruscamente deixando minhas coxas ainda mais expostas enquanto minha saia subia e ela se punha entre minhas pernas. Senti minha calcinha molhar completamente. Minha boca se abriu formando um pequeno círculo, mas logo foi coberta pelos lábios desejosos dela.
Letícia levou a mão até o meio das minhas pernas apertando suavemente.
--Gostosa...--gemeu ao meu ouvido.
Pressionei meus olhos com força e deti as mãos de Letícia.
--Não, aqui não. --falei ofegante.
--Só paro se você me prometer que continuaremos depois-- falou mordendo meu queixo.
--Prometo, agora vai antes que desconfiem da gente... --falei descendo da mesa.
--Mas que mania essa sua de achar que estamos sendo observadas o tempo todo, eu hein. --suspirou irritada.
--Só estou me prevenindo.
--Hum. Melhor eu ir, sua mãe pediu ajuda para decidir a decoração da festa.
--Nem me lembre dessa festa...
Letícia sorriu enquanto me roubava um selinho.
--Vou indo, espero que cumpra sua palavra.--disse desafiadora
--Vou cumprir, quem sabe ainda hoje... --pisquei para ela
Infelizmente não fizemos nada aquela noite, haviam visitas em casa que ficaram até tarde impedindo nossa saída sem que ninguem percebesse.
**
Na sexta o dia foi um pouco menos atarefado, já havia terminado meu trabalho e no final do expediente e a maioria dos funcionários estavam saindo, fui a sala da Patrícia para conversarmos e combinar minha carona com ela, já que meu carro ainda não tinha voltado da oficina.
Estávamos num papo animado quando uma das funcionárias me avisou que a toda poderosa havia mandado me chamar.
Eu e Patrícia nos olhamos surpresas.
--O que será que ela quer comigo?
--Não deve ser nada sério, João disse que ela também o chamou além de outros funcionários. Deve estar querendo conhecer. Melhor você ir logo, até logo.
--Até.
Fui em direção a sua sala com as mãos geladas tamanho nervosismo que sentia. Ficava no ultimo andar só existiam duas salas ali, a outra era do dr. Otávio.
Coloquei meu casaco no cabide e sentei no sofá de couro ao lado da mesa de sua secretária que estava ao telefone. Olhei ao redor brincando com minhas mãos num sinal claro de apreensão, tudo ali estava diferente do que era antes, bem mais sofisticado.
Ouvi um bip soar no ar e a secretária autorizou minha entrada. Abri a grande porta de madeira e adentrei na enorme sala congelante de Victória, logo me arrependi de ter tirado o casaco. Ela estava na sua cadeira--que mais parecia um trono-- de costas para mim e parecia falar ao telefone. Sua sala era toda decorada em preto e branco e alguns detalhes em cor vinho, tentei não parecer tão impressionada com o bom gosto.
Ela virou-se para mim ainda segurando o telefone na orelha e eu continuei caminhando lentamente até sua mesa que de tão distante que parecia não chegar nunca.
--Ok...não quero desculpas, preciso do depoimento até amanhã. Tchau.
Ela falava enquanto tamborilava uma caneta dourada na mesma e se possivel estava ainda mais nervosa ao ouvir sua voz autoritária soar no ambiente.
Engoli ainda em pé entre duas cadeiras a frente de sua mesa enquanto ela me olhava impassível.
--Boa tarde, dra. Victória. A senhora mandou me chamar? --falei quase engasgando.
--Boa tarde...--olhou para uma ficha em cima da sua mesa como se procurasse algo--Alice?
--Sim.
--Sente-se.
Sentei meio sem jeito já sentindo minhas pernas bambas diante daquela mulher tão fria quanto sua sala congelante.
--Bom, estou tentando conhecer os funcionários da empresa individualmente. Aqui diz que ja está a dois anos trabalhando no escritório. Correto? --ela me olhou por cima do óculos de grau delicado que usava.
--Sim, senhora.
--Pretende permanecer conosco? --me questionou.
--Sem dúvida alguma.
--Ok. Sua média acadêmica me parece satisfatória. Espero que permaneça assim se quiser realmente ficar aqui.
--Eu também...quer dizer, vou me esforçar para que permaneça assim, senhora. --falei me arrependendo de não saber escolher bem as palavras.
--Hum ok.
Ficou alguns segundos olhando para ficha e depois para mim, parecendo relutante em falar algo.
--Mais alguma coisa, doutora?
--Não...
Levantei-me da cadeira me virando de costas sentindo uma sensação de alívio enorme por finalmente ir deixar aquela sala, mas mal dei um passo e sua voz grave ecoou.
--Na verdade, preciso falar algo.
Me virei a olhando detidamente voltando a minha posição inicial ainda em pé em frente a sua mesa.
--Pois não.
Ela suspirou.
--Sugiro que procure outro lugar que não seja a mesa do escritório para sessões de amassos.
Arregalei os olhos.
Não podia acreditar no que estava ouvindo.
Me apoiei minhas mãos na mesa em frente temendo cair a qualquer momento.
Meu coração errou a batida e eu podia ouvir nitidamente o som dos seus batimentos.
Pisquei os olhos várias vezes antes de proferir.
--Co-como? --gaguejei ainda sem acreditar.
Ela me olhou friamente.
--Depois do ocorrido no ano passado e nos desfalques que aconteceram, tomei a iniciativa de colocar câmeras nas salas, por razões de segurança.
Meu sangue sumiu, senti meu rosto formigar enquanto minhas pernas pareciam gelatina.
Supirei em busca de ar e não me atrevi a falar nada. Enquanto Victória continuou.
--Ninguém exceto eu, doutor Otávio e agora você, sabe disso. Mas espero que continue em segredo.
Eu pressionava minhas mãos na mesa sentindo um suor frio percorrer meucorpo.
--Os videos passam primeiro por mim, depois vão a uma equipe especialista em segurança da minha confiança.
--Isso não pode estar acontecendo --sussurrei mordendo os lábios nervosamente
--Eu apaguei as cenas antes que elas fossem enviadas, se isso for tranquiliza-la. Mas gravei em dvd caso você queira guardar de lembrança...
Me senti tonta e fechei meus olhos com força sentindo meu rosto arder de tanta vergonha. Ainda tentava olhar Victória quando minha visão ficou turva e tudo que senti foi meu corpo atingir o chão.
--Alice? Alice! --ainda ouvi sua voz distante me chamar
***
Esquecer e perdoar. É isso que dizem por aí. É um bom conselho, mas não muito prático. Quando alguém nos machuca, queremos machucá-los de volta. Quando alguém erra conosco, queremos estar certos. Sem perdão, antigos placares nunca empatam, velhas feridas nunca fecham. E o máximo que podemos esperar é que um dia tenhamos a sorte de esquecer.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
NayGomez
Em: 30/09/2015
Kkkkkkkkkkkk sabia que a Al ia desmaiar depois dessa revelação da Vitória kkkk ain a Lele é linda eu amo a for que ela trata a Al *-* e a vitória gente?! Será que vai ser uma ajuda ou uma pedra na vida da Al e da Lele?! Eu gostei da Patrícia bem que podia ficar coma Vitória rsrs.
[Faça o login para poder comentar]
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]