Capítulo 10
Os Anjos Vestem Branco - Capítulo 10
Assim que Bruna encostou a moto de trilha no galpão, foi até aonde havia guardado as roupas e pegou o celular do bolso da calça. Havia umas vinte e tantas ligações perdidas. Umas de Priscila, outras de Sabrina e a maioria de... Victória. O mais belo sorriso iluminou o seu rosto naquele momento. Bruna estava com lama por todo o corpo, mas nem se importou com isso. Ligou rápido para a morena.
O celular tocou apenas uma vez.
-- BRUNA - berrou tão alto que a loira teve que afastar o celular do ouvido - Aonde você está?
-- Estou em Rio Claro fazendo trilha - respondeu rápido - O que aconteceu?
-- Não aconteceu, mas vai acontecer. Vem pra cá. RÁPIDO - berrou novamente.
-- Estou indo, estou indo - não tomou banho nem tirou o macacão. Trocou a moto de trilha pela moto Sport Touring e pegou a estrada em direção ao apartamento da Tijuca. Fez um tempo recorde de uma hora e meia de Rio Claro até a Barra.
Quando estacionou a moto em frente ao prédio ligou para a morena.
-- Sobe Bruna - falou brava.
-- Não posso, estou toda suja de lama - falou sorrindo.
Victória não fazia ideia de como ela estava.
-- Não importa, vem mesmo assim - desligou.
Bruna bufou.
-- Eu avisei - então subiu.
Quando viu Bruna parada na porta sorridente, Victória a puxou para dentro do apartamento. Em um acesso de raiva, ela começou a dar tapas na cabeça e nos ombros da garota.
-- O que é isso? Pára Vic... -- se defendia como podia - Seja lá o que for, não foi eu. Eu juro - correu e se escondeu atrás de Thiago que olhava a cena atônito.
-- Teus pais não te ensinaram a avisar por onde anda? Fiquei aqui mais nervosa que potro com mosca no ouvido - passou a mão pelo rosto - Mas bah tchê, que guria mais irresponsável - jogou uma almofada que bateu na cabeça de Thiago.
-- Chega mona. Sai daqui Bruna - a olhou de alto a baixo -- De que brejo você saiu? - fez cara de nojo e empurrou a garota - A Vic não vai mais te bater. Né Vic?
Victória não respondeu, simplesmente saiu em direção ao quarto.
-- Caramba. Não foi pra tanto. Só sai para dar uma volta e além do mais avisei a Sabrina - Bruna sempre fazia isso e quando voltava para casa ninguém tocava no assunto.
-- Ela tem motivos para ficar assim. Vai lá conversar com ela - Thiago aconselhou.
Bruna foi até a porta do quarto, respirou fundo e entrou.
-- Sai daqui Bruna - falou brava - Estragou o meu dia.
-- Desculpa - pediu com doçura - Não fiz de propósito.
-- Me decepcionei, você me parecia tão certinha, responsável até demais para a sua idade.
-- Não sou tão perfeita assim Vic, você não me conhece direito - ajoelhou-se em frente a morena e pegou a sua mão -- Infelizmente... Sou atrapalhada, desorganizada, bagunceira, chata, ciumenta, mimada, sonhadora demais e como se não bastasse tudo isso ainda sempre me apaixono pela pessoa errada - sorriu - Como pode ver eu sou a junção de todos os defeitos existentes no mundo.
-- Não precisa exagerar - passou a mão pelo rosto sujo de lama da garota - Você está horrível sabia?
Victória sentiu uma tristeza profunda quando Bruna falou que sempre se apaixona pela pessoa errada. Um desanimo estranho tomou conta de todo o seu ser. Quem seria a pessoa a que ela se referia?
-- Me falaram que lama faz bem pra pele - risos - Você me assustou, saí tão rápido de lá que nem tomei banho.
-- Fiquei tão preocupada Bruna - falou mais calma -- Vem tomar um banho - a puxou pela mão - Você deixou o meu apartamento inabitável.
-- Você vai comigo? - falou e ficou vermelha.
-- Esqueceu de citar, sem vergonha na sua lista de defeitos - saíram do quarto rindo.
Priscila acabava de falar com Thiago pelo celular.
-- Para essa tal de Victória ela ligou - jogou o celular sobre o sofá.
-- Ciuminho, Ciuminho - Sabrina provocava Priscila.
-- Não é isso. Você conhece essa mulher? Sabe de onde ela é? O que ela faz da vida?
-- Eu só sei que ela... "É gaúcha de verdade de quatro costados. Só usa chapéu grande de bombacha e espora" - cantou e dançou pela sala.
-- Eu aqui falando sério e você brincando - jogou-se no sofá.
-- Mas é verdade, só sei que ela é gaúcha. Só isso mesmo - sentou ao lado dela no sofá - Sai comigo hoje. Vamos em um barzinho com a galera.
-- Não. Estou saindo demais com você ultimamente. Não vai fazer bem pra minha reputação.
-- Homofóbica nojenta e horrorosa é louca e ainda acha que "tem Jesus" - brincou.
Priscila não aguentou. Abraçou a amiga e a beijou no rosto.
-- Vou sim. Não tenho coisa melhor para fazer mesmo.
-- Obrigada pela parte que me toca. Você me faz tão bem - levantou para sair - Te pego as 21:00. Se arrumar coisa melhor para fazer me liga - mostrou a língua.
No Hospital Sontag.
-- Débora precisamos conversar - Nestor cercava a esposa no corredor.
-- Sobre? - ficou de frente para o marido com ar de superioridade.
-- Você sabe sobre o que. Não aguento mais ficar mentindo para a Bruninha.
-- Então fala a verdade para ela. Conta que você tem uma amante. Seria bem mais cômodo para você se separar e depois dizer que arrumou uma namorada. Não é mesmo?
-- Não quero magoar a Bruninha Débora.
-- Você fala como se só ela fosse a sua filha. Priscila já sabe de tudo a muito tempo e desde então vive magoada.
-- Eu não sou o único malvado nessa história.
-- Malvado não, mas bobo sim. Deixou que todos soubessem, não teve capacidade nem para esconder. Agora se vira, pede o divórcio. Quero ver você contar para a Bruninha que tem uma amante enfermeira desde 2012 e que ela era a sua funcionária aqui do Sontag - ia saindo mas voltou - Não esqueça Dr. Nestor que você tem apenas 40% das ações do hospital. Nós três juntas temos 60%. Torça para que a Bruna fique do seu lado, caso contrário, comece a providenciar a mudança de sala -- saiu assoviando a música da Família Addams.
Nestor sentiu uma forte dor no peito e que se irradiou por seu braço. Não precisava nem ser médico para saber que seu coração estava dando sinais de alerta. Respirou fundo, procurou acalmar-se e quando achou-se um pouco melhor, retornou para a sua sala.
Mais tarde em um barzinho do Leblon.
-- Papai e mamãe sempre foram ocupados demais. Deixaram a Bruna assim, fazendo o que bem entendesse da vida.
-- Ainda bem que a Bruna sempre foi uma garota responsável, né Priscila?
-- É verdade Ricardo, tirando esses ataques de imaturidade, de resto ela sempre foi bem cabeça.
-- Mudando do saco para a mala, aquele rapaz, o Thiago, vai vir hoje? - Ricardo tentou ser casual mas, não conseguiu.
-- Acho que tem alguém aqui afim do Thiaguinho - Sandra não pode deixar de pegar no pé do amigo.
Ricardo olhou com cara de bravo para ela.
-- Apenas gosto muito da nossa amizade. Apesar de não conhecê-lo direito já deu para perceber que ele é um cara muito legal
Sabrina apontou para Ricardo com a boca cheia.
-- Apoiado Ric. O Thiago é super gente boa.
-- E por falar nele... - Sandra fez sinal com a cabeça mostrando o rapaz que chegava naquele momento.
-- Oi pessoal - cumprimentou de maneira geral.
Ricardo arrumou um espaço ao seu lado para que Thiago colocasse uma cadeira.
-- Senta aqui Thiago que já vamos pedir mais uma rodada de bebidas.
Thiago chegou com o carro de Victória. Sabrina estranhou e nem bem o rapaz sentou já quis saber da morena.
-- A Victória não vem?
-- Vem. Daqui a pouco ela está aí - puxou uma cadeira e sentou do lado de Ricardo - Está vindo de moto com a Bruna.
-- Sério? - Sabrina e Priscila indagaram juntas.
-- Depois de muito bate-boca a Bruna conseguiu convencer a Vic a vir com ela. A minha amiga tem verdadeiro pavor de moto.
-- E quem não tem? Cada vez que a Bruna sai com aquele monstro dela. Eu fico com o coração na mão, mas, viver é que é perigoso. Você pode até morrer! Tudo na vida representa perigo.
-- É verdade Priscila. Vejo cada coisa absurda lá no hospital - Sandra bateu palmas - Alguém lembra de alguma morte absurda?
Thiago foi o primeiro a falar.
-- O poeta chinês Li Po morreu afogado, no rio Yangt-ze, ao tentar abraçar o reflexo da lua na água.
-- Ele estava sóbrio? - Ricardo olhou sério para ele.
-- Não. Estava completamente bêbado - risos.
-- Máquinas de refrigerante matam 13 pessoas por ano, em média. Sabiam? - foi a vez de Sabrina -- Quem nunca sacudiu a bendita máquina, depois que ela não "cuspiu" seu pedido? Eu mesma já havia feito isso várias vezes - demonstrou -- Não façam mais isso! Elas são muito pesadas. Com os trancos que você dá, elas desequilibram e caem em cima de você. O impacto é tão forte, que a pessoa morre por hemorragia interna.
-- Credo que horror - Thiago colocou a mão na boca - Refrigerante mata mesmo. Sabe de algum caso Pri?
-- Sei Thiago. Uma senhora de 60 anos faleceu depois de tomar uma pisada de camelo na cabeça. O animal era seu "pet" de estimação e já havia apresentado comportamento estranho: o bicho tentava "montar" na dona para copular com ela, tipo quando o cachorro faz isso na sua perna. Só que, se o camelo faz isso, já era.
-- Caramba isso é bizarro - risos - Escutem essa: Manoel, brasileiro de 35 anos, estava limpando o tanque de combustível de um caminhão. Mas o local era muito escuro e ele teve a genial ideia de acender um fósforo para iluminar sua visão. Faleceu depois da fatídica combustão.
-- Tem certeza que o Manoel não era Português Sandra?
Risos.
Bruna e Victória chegavam chamando a atenção de todos no bar.
A loira estacionava a moto perto da entrada do bar. Ela estava linda com uma calça preta justíssima, uma camiseta branca e por cima um casaco de couro.
Victória desceu da moto e tirou o capacete, soltou os cabelos que estavam presos num coque e olhou Para Bruna sorrindo.
-- Até que não foi tão mal assim. Você me transmitiu confiança - entregou o capacete para Bruna prender na moto.
-- Moto tem riscos como tudo na vida. Se você souber o que está fazendo, corre tantos riscos andando de moto quanto andando de carro ou outro meio de transporte qualquer - falou isso olhando a morena com os olhos brilhando de admiração. Ela estava usando uma roupa mais descolada. Calça jeans clara bem justa... de detalhe, uma blusinha de algodão dourada e uma jaqueta chamativa e provocante no tom marrom que combinava com a bota cano alto.
No trajeto, Bruna quase enfartou quando a morena enfiou as mãos por baixo da sua camiseta e as entrelaçou em volta de sua cintura reclamando que elas iriam congelar.
Bruna sorriu, pois ao contrário do que ela falou suas mãos pareciam estar pegando fogo.
Tirou o capacete e seu cabelo loiro ficou um pouco bagunçado, Victória começou a ajeitar como se tentasse pentear com as mãos.
Na mesa os amigos observavam a cena, cada um com um pensamento diferente do outro.
-- Essas duas parecem um casalzinho apaixonado - Sandra comentou.
-- Tá mais pra amizade colorida - Ricardo apostou - Colorida, isso é tão... gay.
-- Está é muito esquisito, isso sim - Priscila não gostou muito do que viu e Sabrina preferiu o silêncio.
-- Não é nada disso. Elas se encontraram em uma amizade verdadeira e como dizia Mario Quintana: A amizade é um amor que nunca morre.
Todos bateram palmas.
-- É isso aí poeta Thiaguinho da Tijuca - Ricardo deu um tapa de leve no ombro do rapaz.
-- Posso saber o que conversam com tanta animação assim? - Victória chegou na mesa antes de Bruna.
-- Estávamos falando de vocês duas, tão fofas juntas - Sabrina bateu na cadeira ao seu lado - Loira, vem logo - berrou para a garota que conversava com um rapaz.
Bruna chegou reclamando.
-- Que cara mais chato - sentou ao lado de Victória - Oi para todos os presentes - acenou.
-- O que ele falou para você? - Priscila se esticou e beijou a irmã.
-- Não sou o gênio de Aladim mas posso realizar todos os seus desejos!
-- E você mana, o que respondeu para ele?
-- Desapareça.
-- Grossa - Ricardo falou sorrindo - Ele é tão lindo.
-- Gostou? Pega pra você - deu de ombros - É por isso que agora sou lutadora de MMA, para me defender desses engraçadinhos.
Sabrina não aguentou e caiu na gargalhada.
-- kkkkkkkkk... Apanhou a maior surra já no primeiro dia de aula.
-- Verdade Bruna? - Victória olhou para ela como se não acreditasse no que acabou de ouvir.
-- É verdade sim, mas nem apanhei tanto assim, a professora só estava demonstrando o golpe Arremesso - Luta Greco-Romana.
-- O nome do golpe diz tudo pessoal. Ela levantou a Bruna lá em cima, girou e arremessou. Fiquei com uma peninha - gem*u e fez caretas de dor.
-- Que horror mana. Você não acha esse esporte violento demais?
-- Pode ter certeza que tem mulher na parada Pri - Sandra levantou - Vou no banheiro.
-- Em menos de 12:00 mudei completamente o meu conceito sobre você doutora.
-- Porque Vic?
-- Porque Thiago? Você viu o estado que essa maluca chegou lá em casa hoje? -- riu divertida e deu um tapa de leve no ombro de Bruna que em troca deu um beijo no rosto dela - Gente, ela estava toda suja de lama. Se me contassem não iria acreditar.
-- Fiz trilha em Rio Claro. Victória vai se acostumar com isso - Bruna pegou a mão da morena e segurou entre a sua, fazia carinho enquanto brincava com o belo anel solitário que ela usava.
-- Bruna pratica esse esporte louco desde os quinze anos. Já fraturou perna, braço, costelas e sei lá mais o que.
-- Não sei como você e seus pais aceitaram isso Priscila? - Victória pegou no rosto da loira com as duas mãos - Se fosse eu não tinha permitido nunca - sacudia a cabeça da garota enquanto falava.
-- Uiii, que medo - fingiu estar tremendo.
Sabrina as olhava intrigada. Elas se davam tão bem, eram tão parecidas. Ficavam, mesmo sem perceber, de mãos dadas, brincando com os dedos em um toque sem pressa cheio de cumplicidade e carinho. Sabia qual o sentimento que Bruna sentia por
Victória, mas qual seria o sentimento da morena para com a loira?
E assim seguiu à noite, conversaram muito, beberam muito e quando deixaram o bar já era quase dia.
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Fim do capítulo
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