Eu não havia dormido na quinta por tensão, na sexta por tesão e no sábado também não dormi, mas foi bem diferente, nós fizemos amor a noite inteira, de manhã estávamos exaustas e saciadas e adormecemos abraçadas.

Acordei com batidas insistentes na porta do quarto e o sol entrando pela vidraça da janela.

- Quem é? – Perguntei sonolenta sem querer abrir os olhos

- Sou eu Ana, sua mãe. Lembra-se de mim e de onde está? – Respondeu zombando

Olhei para o relógio no criado mudo, era mais de meio dia. Caceta, agora não tinha como ela não imaginar o que tinha acontecido.

- Eu me lembro mãe. Como poderia esquecer? Já vou levantar. – E fechei os olhos novamente.

- É muito bom mesmo, visto que você e Clara devem estar mortas de fome pelos intensos exercícios noturnos! – E saiu rindo

- MÃE! – Arregalei os olhos e passei a mão nos cabelos exasperada - Jesus me salva! O que é isso!

E ouvi risadas baixinhas vindas de Clara que estava acordada olhando pra mim com uma cara sacana.  Baixei a cabeça e depositei um beijo delicado em seus lábios e depois na ponta do nariz.

- Bom dia meu amor. Você gosta das loucuras da dona Vânia, né?  Dormiu bem?

- Bom dia.  Dormi como eu não dormia há vinte anos!- Disse sorrindo ternamente. - Sua mãe é um amor, Ana. Uma mulher incrível! Eu a adoro.

- Um amor? Ela esta me matando de vergonha e você a adora. Ela tá ficando doida, só pode. Ficar falando essas coisas...

- Analu você tem certeza que quer brigar com ela depois desta noite? – Disse piscando.

- Não. Depois dessa noite eu quero enchê-la de beijos, igualzinho aos que eu vou dar em você agora.

 E prendendo o seu corpo sob o meu comecei a dar um monte de beijinhos em seu rosto e fazer coceguinhas. Quando dei por mim já estávamos enroscadas uma na outra de novo em uma brincadeira nem um pouco inocente. Sentia-me uma menina de novo, feliz, animada, de bem com a vida. Eu não queria que o fim de semana acabasse, mas infelizmente iríamos embora à noite, e de avião, já que não havia ido de carro. Uns quarenta minutos depois levantei de um pulo, pois se continuasse ali com ela sabia que iria terminar passando o dia inteiro fazendo amor e não levantaria até a hora de ir embora.

Fui tomar um banho enquanto Clara arrumava as mochilas, quando fiquei pronta e me preparei mentalmente para enfrentar minha mãe.

- Bom dia Bete. – Disse ao passar pela sala.

- Boa tarde menina. Hoje você está com a aparência muito melhor. – E sorriu com malicia.

- Obrigada Bete, e se você que é sempre discreta esta me falando isso fico imaginando o que minha mãe vai falar.

E caminhei para a cozinha de alma armada.

Minha mãe estava no fogão e meu pai lia um jornal de esportes, sentado em um canto da mesa. Isso sempre me encantou neles, onde um estava você podia ter certeza de que o outro estaria eu sempre quis um amor assim para mim e acho que agora eu iria conseguir.

- Oi pessoal.

- Oi Pessoal? Isso é jeito de falar? – Ralhou comigo

-Oi mãezinha linda! – E tasquei-lhe um beijo. – Melhor assim?

- Muito melhor! Há quanto tempo eu não via esse sorriso lindo e verdadeiro estampado em seu rosto! A pele chega a estar brilhando, você esta com uma aparência assim radiante...

- Chega mãe eu já entendi. – Disse ficando vermelha

- Viu Henrique como eu estava certa em fingir que o quarto de hospedes estava em reformas?

Olhei incrédula para ela e comecei a rir, como eu não desconfiei disso?

- Você está sempre certa querida! – Meu pai respondeu piscando pra mim

- Mãe você é terrível! Tem uma mente criminosa. Às vezes tenho medo de você. Tá vendo pai, eu falo que ela é uma menina má.

Meu pai gargalhou alto.

- Não fale assim da sua mãe, é pecado! Depois eu tinha certeza de que se eu não interferisse essa história iria longe. Era evidente que as duas ainda estavam apaixonadas, e eram orgulhosas demais. E quando estava conversando com sua tia por telefone e soube que Clara iria visitá-las na segunda feira de manhã, comecei a arquitetar um jeito de colocar vocês frente a frente para que pudessem se acertar.

- Sabia que o tiro podia ter saído pela culatra? Nós poderíamos ter brigado feio. E minha tia não estranhou a sua visita inesperada?

- Não ia sair pela culatra não. Depois se a gente “não arrisca não petisca” como dizia a minha avó. Quanto a sua tia, ela estranhou um pouco sim, mas como me acha meio doida não falou nada.

- Até sua irmã sabe que você não bate bem da bola, mãe – Disse rindo - Pai como você aguenta essa figura?

- Com muito amor minha filha. – Ele respondeu olhando pra ela com carinho.

- Você é muito mal agradecida isso sim! Como pode dizer que não bato bem? Humpf!

- Piois eu sou muito agradecida! – Clara entrou na cozinha e deu um grande beijo em seu rosto. – A senhora é meu anjo da guarda dona Vânia. Muito obrigada por tudo!

- Talvez eu adote você Clarinha, já que esta me tratando muito melhor que a dona Ana Lucia aqui.

- Para de manhã mãe. Você sabe que te amo. – E abraçando Clara por trás pela cintura continuei - E depois isso seria incesto, já que eu não amo Clara como irmã, então é melhor continuar tendo só a mim como filha mesmo. E dê-se por agradecida. – Fiz uma careta pra ela

- De uma forma ou de outra ela será minha filha, e pelo que pude escutar a noite passada será bem rápido! – Retrucou minha mãe

- Mãe. Mãe. MÃE! Não dá pra você ser mais discreta pelo amor de Deus! A gente precisava mesmo saber disso? – Estava escarlate de vergonha

Meu pai baixou a cabeça tentando esconder o riso.

- Hum não falei nada demais e vamos nos sentar que o almoço já esta pronto. Vou chamar a Bete e os meninos.

E ali se encerrou a discussão com a palavra final de dona Vânia, que era a verdadeira vitoriosa daquela estória toda. Eu e Clara passamos o resto da tarde brincando na piscina e namorando como as duas adolescentes que um dia havíamos sido, e na hora de ir embora ela se despediu de minha mãe com lágrimas nos olhos prometendo voltar o quanto antes. Pegamos o avião e dessa vez a viagem foi muito melhor, de mãos dadas,fazendo planos para a semana que estava começando,estávamos muito empolgadas, trocávamos olhares apaixonados e declarações. Quando chegamos ao aeroporto eu muito descaradamente perguntei:

-Vamos pra sua casa ou pra minha? – E pisquei

- Meu Deus Ana, você ainda não esta saciada não? – E mordeu os lábios

- De você? Nunca! Então? Decida logo, pois se continuar mordendo essa boca nós vamos é pro hotel aqui em frente mesmo.

- Tem certeza de que não é melhor você ir pra sua casa sozinha? Talvez Mari apareça. Melhor você conversar com ela primeiro, não acha? – Respondeu séria.

- Ela não vai aparecer. Conheço Mariana, quando se despediu de mim na sexta falou que nos veríamos na segunda. Vai Clarinha, vamos, faz isso comigo não. Quero tanto mais uns beijinhos.

- Sei muito bem o que você quer viu sua insolente. Acha que me engana com essa estória de beijinho.

- Fazer o que se você me conhece tão bem?

- Na sua casa então, na minha eu preciso resolver umas coisas. Mas olha Ana, a gente precisa dormir nem que seja um pouco, amanhã trabalhamos. – E mordeu o canto da boca.

- Continua fazendo isso com a boca pra você ver se vai dormir. – Prometi com um sorriso descarado levantando a sobrancelha.

Assim que entrei em meu apartamento o telefone começou a tocar.

- Fica a vontade Clara. – Disse enquanto corri pra atender. – Alô?

- Oi Ana.

- Devia ter imaginado que era você. Por um acaso você tem um radar que apita assim que ponho os pés no apartamento? Ou é uma câmera? Tô preocupada agora vai que você anda bisbilhotando minhas intimidades...

- Deixa de ser engraçadinha Ana, eu te liguei pra saber da viagem, por isso me trate muito bem, lembre-se que sou sua melhor amiga pra não dizer a única.

- Convencida. – Dei risada – Você pensa que é a única, tá dona Clarice. Eu tenho mais um zilhão de amigas.

- Pode até ter um milhão de mulheres, mas amigas não. E se tivesse, nenhuma seria tão incrivelmente maravilhosa como eu. Nem vou perguntar se vocês se acertaram, porque depois dessa risada gostosa só pode ter dado tudo certo.

- Tá bom sabichona. Já que adivinhou isso a gente pode deixar essa conversa pra amanhã né?

- Ei e o Boris? Vai vim buscar não? Tadinho ele está com saudades.

- Sei. Não vou buscá-lo hoje estou cansada e com preguiça.

- Então eu levo ai pra você.

- Não. Ele não vai morrer sem mim. Eu pego o Boris amanhã.

- Ah mas não me custa...Meu Deus! Não me diga! Você não esta sozinha. – Essa ultima frase ela sussurrou como se pudesse ser ouvida.

- Deixa de ser enxerida. Vai dormir. – Não aguentei e ri

- Ai Ana estou tão emocionada!

Dessa vez gargalhei alto.

- Tchau Sisse. A gente se fala amanhã. Boa noite. Um beijo. – E desliguei

- Quem é Boris?

- O gato mais preguiçoso, safado e mau humorado do mundo.

- Hum adoro gatos, e esse pelo jeito de uma característica da dona. Sisse sabe que eu estou aqui não sabe?

- Sabe sim, ou pelo menos desconfia que seja você.

- Ah cretina! – E foi me dando um monte de tapinhas – Você me paga.

Dei risada, segurei suas mãos e as prendi atrás de suas costas.

- Dependendo da moeda que você quiser pago até em dobro. – Beijei sua boca

E a empurrei para o sofá onde teve inicio nossa primeira noite em minha casa. Regada a muito sex* e amor.

No dia seguinte acordamos, e antes de qualquer coisa fizemos amor. Por mim passaria o dia com ela, trancada ali naquele quarto, mas tínhamos compromissos e cada uma foi cuidar do que precisava ser feito. Quando cheguei ao escritório fui direto para a sala da Mari, afinal essa era a coisa mais importante pra mim, precisava falar com ela por mais difícil que fosse a conversa não podia deixar pra depois. Mariana era muito especial para mim e tinha que ser honesta com ela. A sala estava vazia, as coisas dela não estavam lá. A mesa estava limpa. Nada de documentos, porta retratos, ou vasinho que ela mantinha com uma rosa todos os dias, pra alegra o ambiente como dizia. Fiquei espantada e fui falar com Fatima:

- Fátima bom dia. Onde estão as coisas da Doutora Mariana?

- Bom dia. Ela levou tudo embora doutora Ana.

- Levou embora? Como assim?  Quando?

- Na sexta feira no final do expediente.

- Não estou entendendo. O que houve?

- Não sei doutora, achei que a senhora soubesse. A doutora Mariana deixou um currículo para a Gabriela, dizendo que era pra passar pra senhora. E só pediu que eu lhe entregasse essa carta logo que chegasse. – E me entregou um envelope, que peguei e levei para minha sala.

Já pressentindo o pior, me sentei, abri o envelope e comecei a ler:

“Ana meu amor,

Quando ler esta carta já não estarei mais no Brasil, ao saber que você iria para a chácara com Clara, tomei a decisão mais difícil da minha vida e adiantei a data da minha viagem para domingo de manhã.

Desculpe-me pela covardia, mas não conseguiria te dizer adeus e também não iria conseguir ouvir de você o que tenho certeza que teria para me contar depois deste fim de semana.

Sabe, eu nunca imaginei que um dia fosse me apaixonar, sempre tão ligada na minha profissão achava que amor era uma coisa boba e banal demais, nunca gostei de romances nem em filmes imagina na realidade. Amava minha liberdade, e achei que passaria a vida assim, todavia estava errada.

Eu te amo Ana, tanto que chega a doer às vezes, e isso é o que esta fazendo com que essa carta esteja em suas mãos. Eu agradeço do fundo do meu coração ter te conhecido, porque sem você provavelmente eu não teria vivido esse sentimento tão lindo e teria passado minha vida em branco sem saber o quanto é maravilhoso amar alguém.

Tudo com você foi perfeito, único e especial. Cada segundo de cada minuto eu fui feliz ao seu lado, mas o amor que sinto não é correspondido. Não que seja sua culpa, por favor, não me entenda mal, afinal o amor acontece, e seu coração já esta ocupado demais pra me deixar entrar.

Os dias que passamos juntas foram os mais incríveis e belos da minha vida, adorava tudo com você, e principalmente adorava você, suas risadas, sua voz, seu sorriso metido, seus beijos, suas caricias, o calor do seu corpo junto ao meu, seu cheiro, seu jeito de me fazer mulher sempre tão intenso.

Mas tudo isso tinha que acabar um dia, só eu que não percebi, me iludi acreditando que bastava o meu amor e tudo estaria certo.

Tudo foi mágico, nunca sonhei com algo assim, e por isso me envolvi tanto e tão depressa.

Hoje você já não me pertence nem como um caso, o verdadeiro amor da sua vida voltou e você merece ter a chance de vivê-lo plenamente. Não quero que sinta pena de mim e nem pense que me fez sofrer, não sintas culpa de nada. Quero que saiba que você me fez muito feliz e eu nunca vou te esquecer, nunca. Não me arrependo nenhum milésimo de segundo de ter vivido isso com você, e mesmo que soubesse que isso aconteceria, eu viveria tudo novamente.

Meu amor, eu sentirei saudades, não vou mentir, mas levo um pedaço de você dentro de mim e deixo um pedaço meu pra você. E se um dia, por ventura este seu caso de amor não dê certo e você estiver pronta para um novo começo, seu coração livre e aberto, me chame que eu volto, no entanto se esse dia nunca chegar, não fique triste por mim. Quero que você seja muito feliz, você merece.

Lembrarei sempre de você com o meu coração.

Com amor,

Mariana ( ou se preferir, sua Ruiva)”

As lagrimas começaram a correr pelo meu rosto sem que eu conseguisse me conter. Meu Deus estava doendo muito. De certa maneira acho que também havia me apaixonado por Mari, não cheguei a amá-la por que como ela mesma disse eu tinha outra em meu coração, mas o que senti por ela foi intenso e forte como nunca tinha sentido por outra antes, e abrir mão desse sentimento estava me matando um pouco por dentro. Com certeza, se não amasse tanto Clara, Mariana seria a mulher da minha vida. Mas a gente não manda no coração. Se eu estava sentindo aquilo tudo ao ler, imagine ela ao escrever a carta. Por que tinha que ser assim? Nós não deveríamos conseguir amar um alguém que já ama outra pessoa, porque a dor de amor é uma das piores que existe. Entendia disso muito bem. Eu sabia que não poderia ficar com as duas, e jamais pediria algo assim para elas, mas descobri que era egoísta, pois queria manter Mari perto de mim. Não ter nem a sua amizade era muito triste. E agora ela tinha ido embora sem se despedir. Sabia que havia sido o melhor para mim e para ela, pois a despedida seria dolorida demais. Porém meu coração não queria entender, ele pedia por mais um beijo, um último que fosse, enfim ele pedia por um final, que não aconteceria.  E eu sei que sempre sentiria falta da minha Ruiva.

Fim do capítulo