Depois de muito rir, pela cena inusitada de par de jarros, se sentaram e pediram uma água de coco emendando uma conversa bem animada. 

Nathalia ficou analisando Cris como se quisesse saber o que se passava em sua cabeça, não sabia qual era a intenção dela com aquele encontro.

Na tarde anterior, no bar, ninguém comentou sobre sua condição sexual, o que deixava a dúvida, mesmo não estando a procura de romance, encontrar uma morena daquela no seu primeiro dia na cidade era muita sorte.

Os pensamentos de Nathalia foram interrompidos pela pergunta mais que direta de Cristina.

--Você é solteira? -Cris perguntou com uma cara sem vergonha.

--Sim! Porque? -respondeu Nathalia querendo saber o motivo do interesse.

--Curiosidade apenas. Uma mulher tão linda, ser solteira e também aceitar o convite de uma desconhecida pra sair em pleno domingo em vez de ficar namorando, então pensei que… - Cristina calou-se, deixando Nathalia com uma interrogação na testa.

--pensou que? -Nathalia falou com um sorriso encantador.

Cristina mesmo com toda sua experiência e tato com as mulheres, não sabia se falava ou não, era apenas o segundo encontro, se fosse muito direta poderia assusta-la e perder a oportunidade de ter aquele monumento.

--Pensei que talvez fosse gostar de encontrar minha galera no "estupidamente gelada" essa semana.

-Oi?! - Nathalia franziu a sobrancelha sem entender do que se tratava.

Cristina gargalhou ao perceber que nathalia não tinha a menor ideia de que esse era o nome do bar que ela costumava frequentar.

--Esse é o nome do bar que sempre vamos depois do trabalho.

--Ah! Sim, agora entendi. - falou rindo. --Onde fica esse bar? Não lembro de ter passado por nenhum lugar com esse nome.

--Fica ao lado da pracinha, atrás da igreja.

--Realmente não conheço, ainda não passei para o outro lado. Moro na rua principal e só conheço ela por enquanto. -comentou meio sem graça

--Posso entender esse seu interesse em saber o local como um sim ao meu convite?

--Na verdade não.

--Não?

--Você não me convidou, apenas pensou em convidar, então não existe o convite. -disse rindo da cara de Cristina que parecia confusa com sua resposta.

--Verdade! Pelo visto a moça da cidade grande está acostumada com convite formal. -falou debochando e Nathalia fechou a cara fingindo raiva. --A senhorita aceitaria conhecer meus amigos no bar que frequentamos? Se quiser posso mandar redigir um convite para senhorita com o horário e endereço. -terminou a frase e caiu na risada.

--Não será necessário tanto, aceito o convite informal mesmo. Mas será que seus amigos vão gostar de ter uma estranha no meio deles? Afinal é o momento de descontração de vocês.

--Eles vão adorar, é sempre bom ter carne nova no pedaço. -Cris brincou.

--Então é assim que você me vê, como o mais novo objeto de desejo da cidade? -fez cara de brava, fingindo estar indignada com o jeito que Cris falou.

--Desculpe Nathalia, não quis dizer isso, é que… - começou a tropeçar nas palavras fazendo Nathalia cair na gargalhada pelo seu embaraço.

--Deixa de ser boba, vou adorar ser a atração da noite e poder escolher entre os presentes, quem será minha conquista da noite! -Nath falou e Cris fechou a cara.

--Não sabia que estava afim de conquistar alguém, mas com certeza alguem da turma deve te interessar, tem todos os estilos na galera. - disse com o rosto queimando de raiva, Cris ficou mais irritada ainda por estar tão incomodada com esse fato, elas não tinham nada e estavam apenas começando uma amizade.

Depois dessa quase D.R Cristina decidiu levar Nathalia pra caminhar na beira da praia do centro, a conversa entre elas fluiu mais tranquila as deixando bem a vontade durante o passeio.

Cristina apontava para o outro lado da lagoa, sinalizando as praias que haviam na cidade, mostrou a base de aeronáutica que tinha um helicóptero exposto bem na frente, mostrou as saidas da cidade para Cabo Frio e Rio das Ostras, por fim pararam na pizzaria ao lado da rodoviária, comeram um rodizio de massas e tomaram um vinho pra acompanhar. Tudo estava maravilhoso,a conversa entre elas fluia com facilidade, até que Nath preocupada com a hora, quebrou o clima que ja se instaurava no ar.
 
--Cris, o papo está muito agradável, mas realmente preciso ir. Amanhã tenho que me apresentar no meu novo emprego as oito e não posso chegar no primeiro dia com cara de ontem, que impressão eu vou causar?. -disse rindo.

--Tudo bem, também pego cedo amanhã e com certeza com um monte de pepinos pra resolver. -as duas riram.

Pediram a conta, foi Cris quem tomou a iniciativa de pedir o MSN de Nath com a desculpa de avisar a ela sobre o dia do encontro com os amigos. Trocaram telefones e na hora de dar o beijo de despedida elas ficaram enroladas, naquele beija não beija, o beijo acabou virando um selinho, deixando as duas sem graça. Se desculparam e riram da situação mais uma vez inusitada entre elas.

***



A segunda feira chegou e com ela a nova jornada de Nath na pediatria do Hospital de São Jorge. Como ainda estava se familiarizando com o hospital, ficaria a primeira semana no ambulatório, só na semana seguinte começaria a se dividir entre os plantões na emergência e o atendimento no ambulatório.

Nathalia mesmo com toda aquela beleza e simpatia entrou na recepção toda insegura, não conhecia ninguém e não sabia como seria recebida pelos seus mais novos colegas de trabalho. Se dirigiu a recepcionista com o seu melhor sorriso e sua simpatia impar.

--Bom dia! -falou paralisada naquela figura de anjo sentada a sua frente.

Tati levantou a cabeça, e nesse momento o mundo parou diante daquele par de olhos verdes ressaltados por seus cabelos ruivos que parecia pegar fogo com o reflexo do sol. Foi Nathalia quem quebrou o silêncio.

--Desculpe, você está bem? -perguntou preocupada com a menina imóvel a sua frente.

--Sim, estou! Me desculpe! Sou Tatiana, em que posso lhe ajudar?

--Meu nome é Nathalia, sou a nova pediatra e preciso me apresentar na administração.

--Estava a espera da senhora, Doutora Nathalia. Eu vou acompanha-la até lá. -"a minha vida inteira esperei por você" Tatiana falava mentalmente enquanto caminhava pelos corredores.

Nathalia estava inquieta, apenas assentiu com a cabeça e acompanhou a recepcionista pelos corredores que pareciam não ter fim. Toda vez que olhava aquela menina caminhando na sua frente ficava desconcertada ao lembrar do jeito que ela a olhou. "Meu Deus Nathalia, essa menina deve ter no máximo 23 anos, isso se tiver, o que está passando pela sua cabeça? Já não acha que sofreu demais com a Duda pra querer se meter em uma fria dessas?" -os pensamentos de Nath eram confusos, não sabia o porquê de estar daquele jeito, mas sabia que não iria dar certo.

--Pronto, chegamos! Está entregue! - Tati disse com um sorriso tão lindo fazendo Nathalia ficar mais desconcertada ainda com aquela menina.

--Obrigada, a gente se vê por aí. -Nathalia falou meio abobada ainda com um sorriso encantador daquela quase criança.

--Tomara que sim! -Tati falou deixando Nathalia perceber que ficou envergonhada pelo que tinha acabado de falar sem querer.

Assim que se despediram Nathalia bateu na porta da administração e entrou, conheceu os três administradores do hospital, Carlos, Vilma e Neide que foram muito atenciosos com ela, entregou os documentos que faltavam e pegou sua escala. Saiu acompanhada de Vilma que ficou encarregada de apresentar os chefes de setores e os funcionários que encontrassem pelo caminho.

Conheceu Camila uma jovem que aparentava ter seus vinte anos estudante de farmácia e Raquel responsável pelo local. No corredor estavam Lia e Viviane do serviços gerais. Passaram no boxe de enfermagem e só encontraram Júlia.

--Oi Julinha, muito trabalho por aí? -Vilma perguntou abraçando com carinho a jovem técnica de enfermagem.

--Por enquanto sim, mas começo hoje no ambulatório com a nova pediatra e sei que vou ralar bastante. -respondeu rindo com toda sua doçura

--Era sobre isso mesmo que queria falar, Cristina ainda não chegou? -Vilma perguntou.

--Chegou antes das sete e está no Pronto Socorro resolvendo uns papeis de internação pendentes do fim de semana. - Júlia respondeu com uma certa indignação pela distração de algumas colegas que sempre deixavam passar algo na AIH(Autorização de internação hospitalar) fazendo Cristina correr como louca atrás de pacientes e familiares para não ter problemas futuro com a Administração do hospital.

--Essas meninas não tem jeito, se eu fosse a Cristina deixava, para que a responsável pelo preenchimento tome vergonha quando levar uma advertência.

--Sabe como ela é, diz que não pode assinar uma coisa que está errada e deixar passar. diz que é o mesmo que concordar em fazer tudo de qualquer jeito. - disse Júlia defendendo sua chefe.

--No fundo ela está certa. Nossa, que falta de educação a minha, essa é a nova pediatra que você vai acompanhar.

--Muito prazer Doutora, sou Júlia Fernandes!

--Satisfação, Sou Nathalia Albuquerque. -Nath falou estendendo a mão e acabou sorrindo ao lembrar do trocadilho.

--Jú, quando ela voltar pede para procurar a Doutora Nathalia no consultório 8 por favor.

--Falo sim, Vilma.

Se despediram de Júlia e seguiram para o consultório que Nathalia ocuparia no ambulatório. Ao passar pela recepção para a decepção de Nathalia a recepcionista com cara de anjo não estava lá.

--"Como assim ela não está lá? Nathalia porque isso agora, nem conhece aquela menina." - falou consigo mesma tentando afastar aquele pensamento.

Os consultórios ficavam em um corredor em frente a recepção, Nathalia entrou em seu novo consultório acompanhada por Vilma, gostou da sala. Era espaçosa, tinha uma maca para atendimento ,uma mesa com três cadeiras, um computador, um arquivo com as fichas de pacientes, um sofá de três lugares confortavel e um banheiro logo atrás de sua mesa.

--Bom Doutora, como sabe não marcamos paciente para a parte da manhã. a Júlia já deve estar vindo pra cá e Cristina a enfermeira chefe deve passar por aqui antes do almoço, segunda feira ela fica presa no P.S consertando as falhas das meninas da enfermagem.

--Eu entendo. Obrigada Vilma.

--Qualquer coisa é só ligar, ao lado do seu telefone tem anotado todos os ramais. Tenha um bom dia Doutora.

--Igualmente. -Nathalia respondeu meio desanimada por não ter visto aquela menina com cara de anjo.

Tentou afastar aqueles pensamentos, ligou o computador, abriu sua agenda, o primeiro paciente que teria seria as 14:00, pegou o prontuário em cima mesa e leu toda ficha clinica do paciente, estava terminando de colocar seu jaleco, quando escutou batidas na porta.

--Entra!

Assim que respondeu Tatiana entrou em sua sala com aquele sorriso que já a deixava abobada.

--Oi Tatiana, entre por favor. - Nath falou sem conseguir tirar os olhos dela.

--Obrigada Doutora, a Cris, quer dizer a Cristina que saber a que horas pode vir até aqui conversar com a senhora.

--Vou sair para almoçar as 12:00, então até esse horário estarei totalmente disponível, só tenho pacientes depois do almoço. Quanto a Doutora e senhora, acho que pode deixar essas formalidades de lado e me chamar de Nathalia ou de Nath se preferir. -Nath falou toda derretida.

--Pode deixar Dou… desculpe, Nathalia. -falou rindo. --Vou falar com a Cris e aviso a que horas ela virá.

Tatiana deu outro sorriso daqueles que estava desestruturando a Doutora desde que chegou no hospital e saiu…

Ainda estava com cara de boba quando o interfone tocou em sua mesa, aquela voz doce que já conhecia bem estava do outro lado da linha.

--Nath, a Cris está indo pra sua sala agora, tudo bem?

--Claro que sim, pode avisar que estou aguardando. -Nath só conseguia ouvir o som daquela voz chamando seu nome.

Duas batidas na porta e ela se abriu para a surpresa de Nathalia, a enfermeira chefe era ninguém menos do que a sua mais nova amiga.

--O que você faz aqui? Não me lembro de ter dito onde eu trabalhava. Nath falou ainda surpresa com a presença de Cris.

--O mesmo que você, trabalhando! -Cristina respondeu com um sorriso safado no rosto.

--Oi? Você é médica?

--Não. Sou a enfermeira chefe.

--Que mundo pequeno.

--Confesso que tomei um susto ao te ver aqui.

--Bom, dispensada as apresentações, agora vamos ao trabalho. -disse Nath sorrindo.

--Nossa que profissional! Você é sempre assim séria no trabalho? -disse Cris surpresa com a atitude de Nath.

--Claro que não, deixa de ser boba, sou nova aqui e não quero ser chamada atenção no primeiro dia por ficar de papo com você.

--Que susto! Achei que iria me tratar com indiferença só porque trabalhamos juntas.

--É impressão minha ou tem alguém carente?

--Ai para, não estou carente. Só que não conhecia esse seu lado sério e sinceramente achei que me trataria formalmente.

--Não faria isso nunca, agora me diga, vamos trabalhar juntas? -disse nath com um sorriso sem vergonha nos lábios.

--Sim e não. Na verdade essa ala tem duas enfermeiras, a Júlia que você já conheceu e vai trabalhar com você, e a Dani que trabalha na Clinica Medica. Eu fico mais por conta da burocracia mesmo, só quando aperta dou uma força para minhas meninas. -Disse com um tom cafajeste na voz.

--Eu tive a satisfação de conhecer a Júlia mais cedo. Estou muito contente com o hospital.

--A enfermeira Júlia vai ficar com você todos os dias. Tudo que precisar ou não estiver do seu agrado é só me procurar que tentarei resolver da melhor maneira possível.

--Como é bom ouvir isso, é muito bom poder trabalhar com condições básicas para um bom desempenho, no ultimo hospital que trabalhei era tanto paciente que mesmo me esforçando muito era quase impossível fazer o melhor sempre.

--Aqui já foi assim, mas lutamos por melhorias e conseguimos um trabalho em equipe que vem dando certo a quase cinco anos.

--Adorei saber que conheço alguem aqui no trabalho, estava meio deslocada.

--Você logo vai se enturmar, até porque o convite que te fiz é pra sair com a galera daqui.

--Então a reunião com a galera, é a minha futura galera? -logo veio a recepcionista com cara de anjo em sua mente.

--Isso mesmo doutora! Você já deve ter conhecido a Tati, ela é um amorzinho, na hora do almoço eu passo aqui e almoçamos juntas as três pra vocês se conhecerem melhor.

--Vamos sim! -Nath respondeu com uma felicidade que não entendia e ao mesmo tempo com um incômodo por Cris ter chamado a Tati de amorzinho.

--Eu vou indo, se precisar de alguma coisa é só mandar me chamar, estarei em minha sala.

--Obrigada Cris e até mais tarde. -disse Nath dando um beijo no rosto de Cris.

Assim que Cristina saiu Nathalia começou a andar de um lado para o outro, sinal de que estava nervosa, não conseguia entender o que estava acontecendo, desde que viu aquela menina não conseguia tira-la de sua cabeça, o jeito com que ela lhe olhava e sorria dava aquela famosa sensação de borboletas no estômago.

-- "Porque será que Cris falou que ela é um amorzinho? Ela também se referiu a Cris com uma certa intimidade, será que tem algo entre elas? Não, não pode ser, Cris parece ser bem solteira e a menina nem tem jeito de entendida. Ai Nathalia, e se tiver? Você não tem nada a ver com isso."

Estava perdida em seus pensamentos, quando ouviu aquela voz meiga, linda e doce.

--Atrapalho doutora?

Fim do capítulo