E assim Victoria ver sua vida mudar como oficial e lutadora de justa. Ela está se descobrindo aos poucos como pessoa, como mulher...
Capítulo 3
3 A revelação
Os cabelos compridos e loiros caíram sobre os ombros, o meu rosto foi revelado, calando-se a multidão assombrada.
_ Mas este não é Irving!
Disse o assistente incrédulo.
_ É claro que não idiota, é uma moça!
Dirigiu-se o Duque irritado.
O nobre, pai do adversário derrotado entrou em defesa do filho:
_ A luta não foi válida, a regra não permite mulheres!
Virou aquela confusão geral e ninguém podia ouvir mais ninguém.
Nesse instante o Duque irritado bradou imponente:
_Calem – se todos! Precisamos resolver essa situação de forma justa, mas antes de mais nada, onde está o jovem Irving?
Assim, pai e filho foram encontrados no meio da multidão e conduzidos imediatamente a presença do Duque.
Forçado, o pai de Irving fora obrigado a confessar tudo na frente de todos e após o relato pediram desculpas ao Duque.
O nobre, pai do vencido insistiu novamente ao Duque para que a vitória fosse dada ao filho.
A confusão retomou e o barulho fez com que o Duque se irritasse novamente:
_Calem-se todos!
_ A regra é clara, a competição é para homens e não para mulheres. Entretanto, consultando meus servos assistentes tive a notícia que em alguns condados já estão sendo feitos torneios com a participação de mulheres. Como a vitória da senhorita...aliás, qual o seu nome senhorita?
Perguntou-me para depois continuar.
_Isabelle.
Respondi rapidamente.
_Então senhorita Isabelle. Como a vitória foi justa e sem subterfúgios técnicos e, considerando que se o oponente não conseguiu vencer você, que é mulher, não podemos garantir que conseguiria um outro resultado em se tratando de um homem, portanto, a vitória será concedida a senhorita pela belíssima luta, parabéns e dê se todos por encerrado este assunto!
A multidão foi abaixo e a comemoração foi geral. Eu não estava acreditando no que estava ouvindo, em fim, eu era a primeira campeã mulher do torneio de justas de Northenhan naquele ano.
Olhei para a tribuna e agradeci acenando positivamente com a cabeça para o Duque e a nobreza presente.
No entanto, quando estava saindo o assistente servo da Duquesa me chamou falando que a Duquesa gostaria de me parabenizar pessoalmente e que era para eu subir a tribuna.
Segui o homem rodeando pelos fundos e subindo as escadas que dava acesso a tribuna. Fui apresentada formalmente pelo assistente:
_ Aqui está a senhorita Isabelle, campeã do torneio de justas do condado de Nortenham.
Assim, fiz o cumprimento dobrando meus joelhos e baixando a cabeça em sinal de respeito à Duquesa que me elogiou:
_ Minha jovem, estamos orgulhosos de sua façanha, você merece todas as honras nesse dia. Disse-me com um sorriso brando e sincero nos lábios.
_ Estou verdadeiramente impressionada com a sua força!
Finalizou o elogio.
Afastando-se de minha frente, em seguida, veio ao meu encontro uma criatura celeste que parecia acabar de sair de uma atmosfera divina. Sua beleza estonteante, os olhos azuis profundos, os cabelos loiros e o corpo delicadamente formado me fizeram retroceder no tempo e reconhecer os vestígios do perfume que a muito não sentia. Enfim era ela, a filha do Duque, no esplendor de sua beleza emudecendo minha fala.
_ Parabéns, você foi muito bem!
Disse lisonjeira.
_Baixei a cabeça em agradecimento.
_Sim, Victorie, ela é ótima. Tão boa que gostaria de convidá-la para estar conosco, trabalhando em nossa segurança pessoal.
_Seria uma honra, alteza.
Respondi timidamente surpresa, no impulso.
_ Que ótima ideia mamãe, serás a única com guarda especial em todos os condados. Continuou animada achando aquilo tudo diferente e emocionante.
_ Tem razão minha família. Então senhorita Isabelle, se quiser poderás começar amanhã mesmo. Basta se apresentar para os oficiais da guarda para receber o treinamento adequado.
_ Estarei lá, alteza. Disse com uma alegria que não cabia em mim.
Dito isso agradeci com a cabeça e me retirei rapidamente.
Durante o caminho de volta pra casa passei a observar as pessoas que vinham até mim me cumprimentar, outras me olhavam incrédulas, até mesmo aterrorizadas. Comecei a sentir os impactos vindos de todos os lados, tanto positivos e negativos. Via o orgulho estampado nos rostos diferentes e comuns, entretanto, via o preconceito e o desagrado refletido na face de outros. Tive que seguir em frente de qualquer maneira.
Chegando em casa, o silêncio tomou conta do ambiente. Caminhei até a cozinha. Observei a figura sentada com expressão séria e indecifrável. Meu pai sentado como se já me aguardasse para uma conversa definitiva.
_ Sente-se.
Levantou os olhos obtusos.
Obedeci à ordem.
Ele me olhou com seriedade, deu um suspiro longo e começou:
_ Não posso concordar com o que aconteceu. Depois que sua mãe morreu, sobrevivemos juntos a todos os tipos de provações e você jamais mentiu sobre qualquer coisa em todos esses anos. É de se admirar o que você passou todos esses dias e o seu pai, a pessoa que mais se importa com você nesse mundo foi praticamente ignorado dessa sua atitude absurda que poderia ter lhe custado a vida. Vencer um campeonato implica em grandes responsabilidades, as quais você não teve sequer uma. Estou muito aborrecido, não foi isso que eu tentei te ensinar. Espero que isso nunca mais se repita.
De cabeça baixa continuei em silêncio vendo as minhas lágrimas escorrem banhando meu rosto. Realmente sabia que com meu pai não seria fácil e que o mesmo estaria coberto de razão sobre qualquer coisa que dissesse naquele momento. Pelo meu sonho ignorei as responsabilidades que tinha com a minha família e isto seria quase impossível de ser esquecido.
Ao levantar-se disse as últimas palavras do dia:
_ Melhor ir descansar porque amanha terá um dia cansativo no palácio! Disse antes de desaparecer pela porta. Com certeza ele havia sido informado da minha função no palácio. Agora não havia mais nada a ser feito, somente o tempo poderia acalmar toda situação formada entre meu pai e eu. Fui para o meu quarto e o desabafo veio num choro que me fez adormecer rapidamente até o interromper da alvorada, num convite para um recomeço.
Fui conduzida pelos corredores do palácio. Não havia qualquer um que passasse por mim que não tivesse qualquer tipo de espanto ou me olhasse de forma estranha.
_ Bom dia senhora!
Cumprimentei a dama de companhia da Duquesa que me respondeu com seriedade.
_ Bom dia! Vamos ao que interessa.
De repente passou a caminhar rapidamente pelos corredores tendo eu no mesmo passo como escolta ouvinte.
_ Você terá a função principal de prover a segurança da Duquesa e de sua filha. Deverá manter-se pontual e três vezes por semana dormirá no palácio fazendo a guarda noturna com 1 dia de descanso por semana. Nos horários em que sua alteza não estiver precisando dos seus serviços deverá seguir em treinamento com os homens. O capitão Justin já fora informado para recebê-la. Ah, deverá estar disponível para viagens também.
_ Sim senhora.
Respondi quase suando da correria.
_ O que está esperando?
Voltou-se a mim sem paciência.
_ O que senhora?
_ O seu treinamento começa agora, dirija-se até o capitão Justin, ele já deve estar te esperando.
_ Sim senhora.
Respondi sem graça me apressando pelos corredores.
Fui conduzida até o alojamento e instalações dos soldados onde vários jovens estavam concentrados na escuta de um oficial devidamente trajado que passava todas as informações. Fui apresentada e recebida pelo tal, que então descobri ser o capitão Justin, o mesmo me posicionou juntos com os demais. Como já imaginasse fui vitima de diversos tipos de olhares, sendo na sua maioria olhares de desprezo e indignação, afinal era a única mulher no local.
_Senhorita Isabelle, este é o seu nome ou estou errado?
_ Sim senhor!
Respondi firme.
_ Muito bem! Você foi recomendada pela Duqueza para seguir em treinamento, mas precisamos fazer uns esclarecimentos antes de começar. Em primeiro lugar, as coisas por aqui não são fáceis, trata-se de um treinamento de guerra e aqui não existe exceções, independente da sua qualificação de soldado mulher, todos serão forçados até o seu limite. Espero ter sido claro. Fui?
_ Sim senhor!
Respondi apreensiva.
_ Separem-se em fila para o aquecimento. Iniciou o homem sem muita delonga.
Durante duas horas realizei treinamentos diversos, com espada, de auto defesa, ataque e tive aula sobre estratégias de guerra.
No começo os jovens me olhavam com indignação, mas após os esforços extremamente cansativos ninguém mais reparava qualquer um ao seu lado.
Sai do treinamento direto para a sala de banho onde coloquei o uniforme vermelho indicado pela serva pessoal da Duquesa, que era idêntico ao da segurança principal do Duque, me sentindo feliz e envaidecida até certo ponto. Penteei bastante o cabelo fazendo um rabo de cavalo para ficar com uma aparência mais limpa, coloquei a chapeleira vermelha e me dirigi até os aposentos da rainha montando guarda na porta.
A dama de companhia entrou levando a bandeja com o desjejum da Duquesa, todavia, antes me orientou a aguardar a decisão sobre sair para tomar sol, cavalgar ou banhar num riacho próximo ao palácio. Eu deveria conduzi-la ao local e fazer a segurança durante o trajeto. Assentei com a cabeça e aguardei as próximas ordens.
Não demorou muito e a Duquesa sai acompanhada da dama de companhia zelosa:
_ Bom dia Isabelle!
Falou com delicadeza.
_ Bom dia alteza!
_ Laurie, você saberia me dizer se Victorie acordou!
Ultimamente ela tem dormido demais. Avise-a que desejo sua companhia para um passeio no campo, quem sabe iremos ao riacho.
_Sim alteza!
Saiu apressada.
_Isabelle!
_ Alteza!
_Providencie a carruagem, em meia hora sairemos!
Baixei a cabeça positivamente e saí em direção ao estábulo onde o cocheiro da rainha encontrava-se no aguardo.
Uma luz ofuscou meus olhos quando vi o anjo saindo pelo portão acompanhada de sua mãe em direção ao portão principal. Passou por mim respondendo com a cabeça ao meu cumprimento formal. Precipitei-me a frente, conduzindo filha e mãe até a carruagem. Conforme o recomendado, segurei a mão da Duquesa apoiando-a na subida da carruagem, em seguida a dama de companhia e por último Victorie, que delicadamente tocou minhas mãos. Quase flutuei, acho que meus olhos se iluminaram naquele momento, mas o que pude enxergar foram minhas pernas ficarem levemente bambas. Afastei-me automaticamente, sem a deixar perceber. Não queria estar sentido aquilo. Porque eu me sentia daquela forma com ela? Isso não era certo, parecia até desrespeitoso. Subi com o cocheiro na frente da carruagem e seguimos para o passeio.
Da mesma forma, ao chegar tive que oferecer minhas mãos como apoio as senhoras que desceram. Tentei não olhar para Victorie deixando-me sentir apenas a delicadeza das rendas das luvas que tocavam diretamente a pele das minhas mãos.
As senhoras se dirigiram até a margem do riacho armaram seus guarda-chuvas e com os pés dentro d’agua permaneceram por algum tempo naquela posição.
Retornamos após umas duas horas aproximadamente. Continuei o meu posto na porta do quarto da Duquesa que preferiu se recolher. De longe via Victorie se dirigindo para o pátio junto com algumas moças, provavelmente membros da nobreza local.
Assim, seguiu o primeiro dia de trabalho, cansativo devidos aos excessos dos treinamentos realizados.
Chegando em casa o meu dia finalizou-se com uma tristeza terrível:
_ Irving, aconteceu alguma coisa? Assustei com o garoto sentado na porta de casa.
_ Eu passei apenas para me despedir!
_ O quê? Despedir por quê? Falei assustada.
_ Meu pai decidiu ir para o sul, está envergonhado com toda a situação que se formou. As pessoas zombam dele quando passam. Disse que não aguentará sobreviver a tanta humilhação.
_ Nossa Irving, eu não acredito que isso está acontecendo. O seu pai não pode ir embora assim, e você? Ele não se importa com o que você pensa?
_ Você sabe que eu não posso fazer nada. Infelizmente tenho que obedecer e ir a trás.
_ Ai Irving, se eu soubesse disso jamais teria competido no seu lugar. Olha só o que eu fiz. Estraguei a sua vida. Falei desesperada iniciando um choro.
_Não diga isso. Você não teve culpa nenhuma do que aconteceu, só quis me ajudar.
_Não, eu fui egoísta, não raciocinei as conseqüências que isso poderia trazer. Estou com problemas com meu pai e agora você está indo embora.
_Não é hora de pensarmos nessas coisas. Eu só passei para te dar um abraço.
Neste instante o desespero havia tomado conta de mim, não consegui dizer mais nada, somente corri até o meu amigo e o abracei chorando profundamente.
_Como vão ficar as coisas daqui pra frente. Será que eu não irei mais te ver?
Falei aos soluços revelando uma fragilidade que me assustou e assustou também meu amigo.
_Um dia eu voltarei, quando ficar mais velho e conseguir viver sozinho, pode ter certeza que estarei por perto. E não adianta falar que vai ficar com medo. Agora que você está treinando com os soldados, não vai precisar de mim pra te proteger.
Disse me tentando me fazer rir.
Continuei chorando vendo meu melhor amigo se afastar para talvez nunca mais voltar. Ele havia crescido comigo, conhecíamos um ao outro mutuamente, era o irmão que nunca tive e essa separação foi como se uma parte do meu coração houvesse sido tirada de mim.
Os meses se passaram e minha vida se transformou de uma forma inesperada. Comecei a me destacar de todas as formas diante a minha dedicação aos treinamentos, às funções minhas funções de uma forma geral.
Sobre mim, o que eu pensava sobre o que estava acontecendo, só desejava crescer de todas as formas possíveis e num futuro não muito distante, obter uma vida melhor para mim e para meu pai, na sua velhice.
Se tinha uma coisa que me dava prazer, era minha função de segurança da Duquesa e sua filha. Era um prazer indescritível levá-las para os seus passeios favoritos. Enquanto as mesmas descansavam eu sempre arrumava jeito de agradá-las incondicionalmente não ser apenas a segurança, colhia frutas silvestres e pescava as anchovas para o jantar que a Duquesa adorava.
De longe observava a movimentação da Duquesa e suas acompanhantes. Elas riam, tomavam sol, conversavam e volta e meia sentia como se falassem de mim. Me tornei consideravelmente tímida por isso.
Eu gostava de ficar ali no meu canto observando. Meus olhos sempre tinham um ponto predileto, Victorie. Ela parecia um pouco tímida, reservada. Às vezes sorria, conversava, mas de um modo geral gostava de observar, assim como eu. Algumas vezes também dirigia seus olhos pra mim e este era o momento no qual eu sempre baixava minhas vistas, porque morria de vergonha que ela me flagrasse admirando-a.
Victorie era o ponto de maior insegurança naqueles passeios. Eu não entendia porque me sentia tão diferente perto dela, desde o primeiro instante que nos vimos, quando tinha oito anos perdida nos corredores infinitos daquele palácio. Na certa talvez porque jamais havia visto criatura mais bela e com certeza, num futuro próximo havia de ser uma princesa fazendo bom casamento com um rei ou príncipe distante.
Nesse ano, as coisas aconteceram muito rápido, muitos ganhos e perdas se misturaram e pesaram-se as dores das perdas, primeiro de Irving, depois de Victorie que fora enviada para um condado estudar e aprender artes.
O momento mais difícil foi levá-la até o condado de Windsor. Foram três dias muito longos e tristes, fazia frio e a paisagem estava cinza como o meu coração, como aquela viagem. Lembro-me da chegada no casarão de sua tia, naquele povoado grandioso, cheio de casas, comércios, realmente muito diferente de onde vivíamos, era o ponto central da côrte e a alta nobreza vivia ali com todo seu luxo, desenvolvimento e riqueza. De qualquer forma sabia que seria quase uma despedida definitiva de Victorie. Na chegada já estávamos sendo aguardados. Eu, como de costume, abri a porta da carruagem, segurei a mão da dama que desceu arrumando o vestido e se dirigiu rapidamente a porta para anunciar nossa chegada. Logo em seguida estendi minha mão à Victorie. Ela demorou alguns segundos pra descer. Nesse momento apertei meus lábios ansiosa e pela primeira vez fiz algo que nesses últimos meses jamais ousei fazer, olhei fundo em seus olhos, como da primeira vez que nos vimos. Ela olhou-me como que já me pedisse ajuda para descer. Estendi minha mão para apoiá-la e olhando para os seus olhos aconteceu o inevitável, estremeci. Pela primeira vez pude sentir sua pele, pois estava sem as luvas de costume. Impossível descrever a maciez da sua tez que escorregou por sobre os meus dedos como seda, como as águas puras de uma fonte recém descoberta. Desceu bem devagar apoiada em minha mão. Senti que estava cansada. Olhou nos meus olhos e baixou a cabeça me cumprimentando pela primeira vez, antes que eu fizesse meu cumprimento formal.
_ Alteza!
Baixei a cabeça cumprimentando - a logo em seguida. Ela continuou o passo lentamente, deixando em minhas mãos a sensação do toque macio e do perfume que entranhou minha alma quando lentamente ergui minhas mãos até minhas narinas ansiosas e fechei os olhos enchendo-me da presença daquela criatura, que em toda a perfeição representava o próprio significado da vida durante minha insignificante existência. Tudo nela me atraía, até o seu caminhar que naquele momento era como uma facada no peito a cada passo que se distanciava. Nunca precisei fazer tanta força na vida e tinha certeza que em nenhum torneio teria um oponente que me fizesse fazê-la como naquele momento. Só consigo descrever a minha vontade de correr atrás dela e dizer:
_ Por favor, volte!
Anos se passaram. Os torneios anuais me beneficiaram quando abriram a competição para mulheres. Venci todos os torneios, recebi grandes premiações sendo a principal delas o prestígio que agora me guiava nas mais diversas direções, como representante do Ducado de Nortenham, principalmente porque o Duque, visando aumentar sua visibilidade passou a freqüentar outros torneios e eu representava uma atração que levantaria o bom nome do Ducado.
Com 21 anos e eu já havia sido promovida a oficial do exercito pessoal do Duque, todavia, jamais me afastara das minhas funções de segurança da Duquesa, uma vez que a afeição que havia crescido era recíproca, onde o seu carisma me fazia tratá-la com respeito de uma mãe, o que muito era apreciado pela tal, que conhecia minha história e sempre me tratava com carinho, mais um motivo pelo qual daria minha vida em seu favor.
Nas vésperas do meu aniversário fui presenteada com a posse da casa de meu pai pela Duquesa que com muita insistência fez o marido assinar o ato.
Estava feliz e radiante com a notícia. Meu pai até passou mal quando soube que finalmente teríamos um lugar nosso por direito e que na sua velhice não seria um sem teto.
_Mas quando as coisas estão boas, nunca subestime, podem ficar melhores ainda!
Pensei quando a Duquesa me chamou e me deu a melhor notícia dos últimos anos.
_ Vá a Windsor buscar Victorie! Arrume suas coisas, você sairá pela manhã!
Quase dei pulinhos de felicidade quando recebi a ordem e com certeza as pessoas notaram a total satisfação na expressão de contentamento que devo ter feito.
No outro dia coloque a carruagem para viajar com força total. Tinha uma necessidade inexplicável de revê-la. Eu ia imaginando a maciez da sua mão, seu perfume, sua voz, o corpo delicado e esguio, os olhos azuis profundos, dentre cada detalhe que pude absorver, imaginando que ela estaria lá, da mesma forma que a deixei.
Com a rapidez que viajamos, chegamos muito adiantados. O casarão estava silencioso. Desci e fiz-me anunciar na porta.
_Oficial Isabelle, segurança da Duqueza de Northenhan, senhor. Por ordem do Duque de Northenhan vim buscar sua filha Victorie.
Disse com segurança e firmeza.
A senhor bem trajada que me atenderá, pareceu levar um susto.
_ Estávamos esperando para amanhã, mas, pois bem. Aguarde que avisarei sobre sua presença.
Esperava ansiosa quando nos informaram que deveríamos dormir para seguir viagem no outro dia porque Victorie não havia organizado sua partida e tinha pendências a resolver antes da viagem.
Desde que cheguei a Windsor vi Victorie durante o embarque. Nesse momento a imagem que eu tinha da mocinha frágil de 16 anos havia caído por terra quando aquela expressão surreal da mulher adulta, linda, forte e prepotente passou por mim sem responder o meu cumprimento dirigindo-se com certo aborrecimento para a carruagem.
Não esperou para que eu estendesse-lhe a mão e entrou reclamando sobre um monte de coisas, principalmente por ter que voltar pra casa.
A viagem foi muito complicada. Durante o trajeto, muita chuva e ventos fortes nos obrigaram a nos hospedar em mais lugares que o previsto.
Numa das hospedarias que havia no caminho tive um mau pressentimento com alguns hospedes que nos olharam de forma estranha e cochichavam uns com os outros durante o breve jantar antes do pouso.
Saímos bem cedo e continuamos o trajeto abusando da velocidade dos cavalos já cansados. Num determinado ponto do trajeto uma árvore cai abruptamente fazendo os cavalos pararem assustados quase tombando a carruagem. Nesse momento, cerca de uns 10 homens apareceram em cavalos na tentativa de um assalto. Eu e o cocheiro ficamos inertes ao sinal da violência dos mesmos, todavia com a ameaça de abrir a porta da carruagem e a possível ameaça a Victorie saltei num dos cavalos dos bandidos e derrubei o inimigo num golpe fatal fazendo-o cair e o resto dos integrantes voltarem-se contra mim.
Foi uma luta desigual e covarde onde com muito esforço pude vencer, todavia, com um ferimento de espada na coxa deixado por um dos bandidos que fugiu. Quando voltei à carruagem, o cocheiro que havia se rendido estava atônito, a porta da carruagem estava aberta e Victorie havia sumido restando a dama de companhia, que também estava paralisada de medo num canto.
Rapidamente confirmei que estavam todos bem. Retirei um dos cavalos da carruagem e dei a instrução ao cocheiro para correr o mais rápido possível ao Ducado para buscar ajuda. Enquanto isso eu tentaria encontrar Victorie.
Saí em disparada rumo ao norte seguindo uma pequena trilha que indicava as pegadas dos cavalos dos bandidos.
Cavalguei o dia inteiro atravessando montanhas e vales até que um clarão e umas fumaças me fizeram encontrar o esconderijo dos bandidos.
Haviam várias barracas armadas em círculos, uma grande fogueira que iluminava o ambiente, homens e mulheres que circulavam por todo ambiente.
Escondida atrás da árvore tentei imaginar uma forma de achar Victorie e fugir daquele lugar. Infelizmente eu era uma e a quantidade de pessoas ali tornaria um ataque direto inviável. Eu precisava de astúcia e rapidez para sair dali com vida.
Cheguei mais perto esqueirando-me pelas arvores e vi Victorie com as mãos amarradas sendo levada por uma mulher até o interior de uma das barracas.
Bolei um plano. Se eu conseguisse colocar fogo numas duas barracas próximas da dela poderia tira-la dali e foi o que eu fiz causando uma imensa confusão entre eles. Aproveitando a correria de todos tentando apagar o fogo, cortei a barraca pelos lados dos fundos, rendi um dos bandidos e tirei Victoria que demorou a reconhecer minha ajuda tentando lutar contra os meus braços assustadas.
_ Alteza, quero tirá-la daqui, mas preciso que você me ajude e faça o que eu disser!
_ Por favor me tira daqui!
Disse-me quase implorando.
Foi a primeira vez em anos que ela olhou-me nos olhos novamente. Puxei-a pelas mãos e corremos em disparada entre as árvores até que avistei o cavalo. Subimos e fomos em disparada sem rumo tentando acertar a direção.
O cavalo já cansado pela madrugada adentro já não conseguia mais correr. Em fim estávamos todos muito cansados. Ela estava na frente entre meus braços que conduziam as rédeas do animal exausto. Sentia o perfume e a maciez dos seus cabelos tocando o meu rosto com o vento. Ela suspirava, mas não dizia uma só palavra até que num momento pediu-me:
_ Estou exausta, não estou conseguindo mais. Falou com a voz fraca.
_ Alteza, temo pela sua segurança, se pararmos aqui eles podem nos alcançar, precisamos cruzar as montanhas e achar a estrada ou um lugar seguro.
Ela calou-se e fomos andando até que ouvi um barulho de água caindo. Estava com muita sede, alias todos estávamos, pensei que talvez fosse melhor pararmos naquele lugar.
Desci primeiro do animal, depois apoiei Victorie que acabou caindo nos meus braços ao descer. Tremi por dentro quando tive que segurar sua cintura para que ficasse em pé, o que fez com que nossos corpos se aproximassem até os nossos rostos se encontrarem. Ela levantou os olhos e o queixo esgueirado no meu ombro pela lateral do meu rosto devagar. Continuei segurando-a pelos braços até a beira do riacho onde ela conseguiu saciar a sede e se sentou na grama perto de umas pedras.
O cavalo estava completamente sedento e faminto. Nem precisei levá-lo para o riacho, pois o instinto já o havia levado.
Saciei minha sede e lavei meu rosto a fim de melhorar minha visão que estava turva mas que agradecia a lua cheia pela claridade natural que fornecia aquela noite.
_ Alteza, sei que deve estar com fome e frio neste momento. Infelizmente não temos como resolver o problema da fome porque não posso deix’a-la sozinha e ir atrás de alimentos, tão pouco de frio, pois se fizermos fogueira poderemos indicar aos bandidos nossa localização.
_ Não precisa se importar com isso, agradeço por me manter viva, a fome e o frio podem esperar.
Disse – me tranqüila.
Nesse momento sentei-me um pouco próxima a ela que tentava adormecer na grama dura. Fui até o cavalo e retirei duma bolsa pendurada na cela uma capa utilizada em chuva pelo cocheiro, dobrei-a e fiz um travesseiro para apoiar sua cabeça. A mesma agradeceu-me baixando a cabeça.
Deitei-me próximo a ela a uma distancia que em outra ocasião jamais teria ficado. Sonolenta, ela tremia com o vento, cochilava, acordava, virava-se de um lado para o outro. Eu também não conseguia dormir pelo desconforto e pelo frio, embora soubesse que precisávamos descansar para ganharmos força e seguir viagem.
Nessa hora tomei uma decisão que jamais faria noutra ocasião. Aproximei-me dela bem devagar, me esgueirando aos poucos até encostar perto do seu corpo. Notando o que eu estava tentando fazer, Victorie fez a mesma coisa e aproximou seu corpo do meu encolhendo-se próxima aos meus ombros. Senti um calor percorrendo minha coluna que parecia crescer continuamente deixando meu rosto fervendo. Eu também me aproximei mais um pouco, deitando minha cabeça no travesseiro improvisado e fiquei face a face com ela, sentindo seu hálito doce e quente invadir cada centímetro do meu rosto. Virei minha cabeça devagar tentando buscando um ponto de estrelas no céu. Suspirei vendo como o céu parecia um mapa de estrelas coloridas e rezando pedi para que o mesmo pudesse nos levar para casa. De repente, algo inusitado aconteceu, quase desmaiei quando ela passou os braços sobre o meu peito, se espremendo a ele com frio. Fiquei completamente comovida e com pena, tamanho era o frio que o corpo dela estava sentindo. Já não tinha mais controle de mim e, principalmente, do meu corpo que agora ardia em chamas que explodiam no ar como um vulcão se derramando em larvas. Podia sentir a adrenalina e o calor absurdo expelido por ele. Nesse momento cruzei as pernas e notei uma situação estranha, algo estava muito diferente. Senti um líquido levemente consistente escorrer e grudar-se a cada movimento de minhas pernas espalhando-se por toda aquela região. Criei coragem e fiz o inevitável, passei meus braços embaixo da nuca apertando-a mais contra meu peito e ficamos ali abraçadas até que finalmente pegamos no sono.
Acordei antes do fim da madrugada vendo o corpo de Victorie agarrando a mim, como uma criança ao seu brinquedo favorito, dormindo serenamente sob um sono profundo. Seu rosto expressava calma e tranqüilidade como se aquela noite fosse uma outra qualquer de sua vida comum. Quase morri por ter que tira-la aos poucos dos meus braços para não assustá-la. Caminhei até o Riacho onde já podia visualizar meu rosto no espelho d’agua que se formava. Lavei-me rapidamente arrumando meus cabelos pretos e longos sob um rabo de cavalo. Voltei até Victorie, olhei mais uma vez para aquela criatura perfeita que dormia docemente na mais calma tranqüilidade, tive que acordá-la para seguirmos a viagem.
_ Alteza!
Falei baixinho para não acordá-la, mas não surtiu qualquer efeito. Então agachei-me perto do seu corpo e segurei levemente no seu braço.
_ Alteza, por favor, acorde.
Continuei no mesmo tom de voz mas agora sacudindo levemente seu braço.
De repente seus olhos se abriram vagarosamente e ela os manteve fixamente em minha direção, parecia me questionar alguma coisa, se aquilo tudo era real ou não, simplesmente me olhava de um jeito que eu jamais conseguiria decifrar porque eu não conseguia entender. Como num estalo ela se levantou rapidamente e pareceu recordar todos os sentidos naquele momento.
_ Aconteceu alguma coisa?
_ Não alteza é que precisamos seguir viagem, é perigoso continuarmos aqui.
_ Me dê alguns segundos.
Disse-me afirmativamente quando desceu até o Riacho para lavar-se rapidamente.
Subi no cavalo e em seguida ofereci minhas mãos para que ela subisse também. Senti as mãos macias fazendo força para alcançar-me.
_ Segure-se alteza, teremos que ser rápidos.
Alertei-a de que correríamos muito.
Ela se agarrou a minha cintura de repente. Um calor subiu-me ao rosto quando senti seu corpo macio se espremer as minhas costas. Saí em disparada rumo ao norte em direção a Northenhan acreditando que em algum momento teria que alcançá-lo.
Foram horas cavalgando até que meus olhos se iluminaram. Depois de uma longa travessia de vales e montanhas a estrada conhecida iluminou-se ao nosso encontro me fazendo sorrir.
_ Achamos alteza, lá está a estrada.
Disse com uma felicidade que não tinha tamanho.
_ Meu Deus, muito obrigada.
Suspirou e agradeceu a moça que a esta altura já apresentava fortes incidências de cansaço.
Avancei o passo do cavalo sentindo um vento forte bater no meu rosto. Sentia que tínhamos chances de sobreviver e não iria desperdiçá-la por nada neste mundo. Foram algumas horas correndo no silêncio sem parada, onde o barulho que ouvíamos era o da força do cavalo e suas passadas largas. O animal parecia não se cansar, estava determinado, parecia conhecer o seu destino.
Foi assim que meus olhos se encheram de lágrimas ao avistar as entradas do Ducado. Estava começando a escurecer. Quando aproximávamos do nosso destino, as pessoas espantadas no meio do caminho íam gritando. A essa altura dos fatos todos já sabiam o que tinha acontecido e pareciam espantados com o que viam. Vi minha casa enquanto corríamos em direção ao palácio. Nesse momento todos saíram de suas casas festejando aos gritos e aplausos que se seguiam ecoando por onde passávamos. Passei pela ponte voando em direção ao portão principal onde todos já estavam aguardando ansiosos. Atravessei o portão de longe avistando a pequena multidão que se formara junto aos rostos conhecidos do Duque e Duquesa.
Parei o cavalo sendo ajudada pelos meus colegas oficiais na decida. Logo após observei os aplausos da multidão e o rosto meio desfalecido de Victorie. Aproximei-me oferecendo as mãos como apoio para sua decida. Ela quase desmaiou em meus braços. Em seguida Duquesa e Duque tomaram sua filha nos braços comovidos e seguiram adiante.
De longe via meu pai olhando fixamente para cena. Ele parecia comovido. Esperou a multidão se afastar e veio até mim. Abraçou-me sem dizer nada chorando por alguns instantes e seguimos em silêncio para casa juntos.
Fim do capítulo
Mais um capítulo, obrigada por acompanharem...Aguardo sugestões, amores mio!
Comentar este capítulo:
Anonimo 403998
Em: 21/09/2015
Estou amando =]
Resposta do autor:
Obrigadaaaa
Fico muito feliz de ouvir isso, viu, geralmente as pessoas nao gostam muito de historias de ~epoca, espero muito conseguir agradar. beijos
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