Capítulo 27 - Eufemismo
Lindsay não atendeu sua irmã nem respondeu as mensagens enviadas, para angústia de Sam. Naquela noite razoavelmente fria, dormiriam em Aquidauana, MS, num celeiro grande, de dois andares, foi o melhor lugar dada as circunstâncias.
- Eu sei que é estranho dividir o quarto com quatro vacas, nove galinhas, e um cavalo, mas não poderemos escolher muito, andaremos por lugares quase desabitados. - Sam discursava enquanto preparava um banheiro improvisado num canto do mezanino do celeiro.
- Você contou as galinhas? - Theo perguntou, de sobrancelhas baixadas.
- Quatro ruivas, duas brancas, duas marrons, e uma com tons de preto e laranja.
- Nossa, parabéns. Eu acho.
- Como eu ia dizendo, prepare-se porque cruzaremos muito mato nos próximos dias.
- Pantanal, atravessaremos o que chamavam de Pantanal. - Theo colaborava segurando o pequeno reservatório de água no alto, enquanto Sam prendia.
- Isso.
- Nenhum sinal da sua irmã?
- Não, nada... Ok, terminei, quem toma banho primeiro?
- Tá tão frio hoje... E essa água é gelada. - Theo lamuriou.
- Tome um banho rápido.
Theo balançou a cabeça, resmungando algo indecifrável.
- Eu prometo te esquentar depois. - Sam completou.
- Tá bom.
Quase uma hora passou-se, Theo já estava debaixo do cobertor, mais agarrada do que nunca em Sam. Do andar de cima, era possível escutar os ruídos dos animais abaixo.
- Hoje é dia 31. - Sam refletia.
- É?
- É sim. Tenho duas semanas. Na verdade nem isso.
- Duas semanas serão o suficiente, conseguiremos antes, inclusive. - Theo relatizava.
- Duas semanas de vida. - Um nó se formava em sua garganta. - Talvez esta tenha sido minha penúltima sexta-feira. Eu sempre gostei de sextas-feiras, talvez eu tenha apenas mais uma.
- De um jeito ou de outro, você vai sobreviver.
- Espero que sim. Quer virar para lá? Eu durmo atrás de você, acho que te aqueço mais desta forma. - Sam desconversava.
- Você nunca vai me ouvir negar uma conchinha. - Theo respondeu, já saindo de cima dela.
- Por que não veste meias? Eu tenho meias, você tem meias. - Sam disse, já moldada às suas costas.
- Odeio dormir de meias.
- O frio é seu.
Um bip no comunicador fez Sam correr para tomá-lo, do outro lado do colchão.
- Lindsay respondeu? - Theo perguntou.
- Não.
"Eu soube do fim do seu noivado, sinto muito. Espero que vocês reatem em breve. Se quiser conversar, me procure, consegui um comunicador e um lugar seguro para usá-lo." - Maritza.
- Acho que todos no quartel já sabem o que aconteceu, Lynn deve saber também. Meu pai também... - Sam encarava a tela do comunicador.
- Ela é sua irmã, logo o laço de sangue falará mais alto e ela vai conversar com você.
- É... - Sam suspirou desanimada, sentada encarando o aparelho.
- Oficial?
- Sim?
- Concha.
***
- Esta estrada me dá calafrios. - Sam resmungou, passava das nove da noite do dia seguinte.
- Como ela é?
- Estreita, muito estreita. Pouco movimentada, escura, com vegetação ao redor. Parece de filme de terror, não vejo a hora de chegar num lugar aberto.
Theo se ajeitou no banco do carro, se esticando.
- Deve ser parecida com a estrada que dá no litoral. Pegávamos quando queríamos fugir do congestionamento da super via, na volta da praia.
- Para San Paolo? Como um atalho?
- É, tipo isso. Às vezes nós voltávamos domingo à noite, e seguíamos por essa estrada quase deserta, cheia de lendas de assombração, por isso quase ninguém circulava nela.
- Sério? Que lendas?
- Algumas sobre acidentados, mas a mais famosa era a do garoto e a moeda.
- Como é? - Sam perguntava com curiosidade, mas também receio.
- Ah... Uma história de um garoto que morava nas imediações da floresta, devia ter uns oito anos quando morreu. Nossa, ouvi essa história tantas vezes, tantos relatos, impossível não achar que realmente algo acontecia por lá, ocorriam acidentes demais naquela estrada.
- E qual o motivo dos acidentes? Qual é a lenda?
Theo percebeu o medo real de Sam ao ouvir a história.
- Dizem que esse garoto havia ganho uma moeda de seu pai, por ter o ajudado a cortar lenha naquele dia. O garoto saiu de casa feliz com a moeda para ir na venda comprar doces, que ficava longe de sua casa. No caminho ele parou para descansar em cima de uma ponte, tirou a moeda do bolso e começou a brincar com ela, jogando para o alto.
- E então? - Sam perguntava com apreensão, olhando de tempo em tempo para Theo.
- Numa dessas brincadeiras a moeda caiu no rio, e num impulso de impedir que ela caísse, o garoto acabou caindo também. Dizem que morreu na hora.
- Que horror. - Sam disse, assustada.
- Os relatos são que esse garoto aparece no meio da estrada à noite, com a cabeça ensanguentada e um braço todo torto, porque ele quebrou na queda. - Theo sabia que Sam estava assustada, e segurava o riso ao contar, tentava parecer séria.
- Santo Cristo! - Sam disse, impressionada.
- E os motoristas são pegos de surpresa pela visão, acabam desviando do garoto de forma brusca e batendo o carro nas árvores. O garoto vai até o carro e procura por moedas.
Sam arregalou os olhos, e a fitou.
- Isso é mentira, não é? Se as pessoas bateram seus carros e morreram, como sabem que o garoto vai procurar moedas?
- Nem todos morrem. - Theo disse num tom aterrorizante.
Sam dirigiu em silêncio por um instante, os pelos do braço estavam arrepiados.
- Isso é lenda urbana, as pessoas inventam essas coisas. - Sam tentava se convencer que era mentira. Theo fazia um grande esforço para não rir.
- São muitas testemunhas, Sam. E muitos acidentes sem causa aparente. Detalhe: nunca encontram moedas nos carros acidentados.
- O garoto pega todas as moedas?
- Ahan.
- Eu não gostei dessa história, podemos mudar de assunto?
- Você tem medo de assombração? - Theo se divertia.
- Tenho. Não. Quer dizer, prefiro evitar essas coisas, nunca se sabe. - Desconversou.
- Que pena, tenho tantas histórias para contar, conhece a lenda do andarilho canibal?
- Não conte, ok? Isso atrai essas coisas.
- Não contarei. Não hoje. E aí, sua irmã continua te evitando?
- Continua, aquela cabeçuda.
- Tive uma ideia!
- O que?
- Eu agora tenho comunicador, lembra? Eu ligo para ela, que não irá reconhecer a ID, e atenderá. - Theo disse sorrindo.
- Acho que não, acho que ela não costuma atender IDs desconhecidas.
- Podemos tentar, me fale qual a ID que ela usa. - Theo tirou o comunicador do bolso da jaqueta verde.
- Não vai adiantar, estou falando.
- Diga de uma vez.
Sam ditou os números, que foram reconhecidos pelo comunicador e iniciou a conexão.
- Alô? - Theo falou, surpresa por ter sido atendida tão rapidamente.
- Quem fala? - Lindsay respondeu do outro lado.
- Ela atendeu? - Sam sussurrou incrédula, dirigindo.
- Ãhn... Aqui é uma amiga de Sam, ela pediu para te ligar para saber se está tudo bem, ela está preocupada com você.
- Amiga de onde?
- Do exército.
Fez-se silêncio do outro lado, por longos segundos.
- Você é a tal Theo?
Theo hesitou, mas acabou assumindo.
- Sim, Theo, prazer em finalmente conhecê-la!
- Você não sente remorso por ter destruído a vida da minha irmã?
Theo espantou-se com o rompante de sinceridade dela.
- Mas eu não destruí a vida dela.
- Você a corrompeu.
- Lynn, que tal falar um pouco com sua irmãzinha? Ela está ao meu lado.
- Estou brava demais para falar com ela agora, e eu não te dei liberdade para me chamar de Lynn.
- Mas você me chamou de Theo.
Ouviu-se apenas um grunhido abafado.
- Porque eu não sei seu nome. E nem quero saber!
- É Theodora, prazer.
- No dia do juízo final você vai ter muitas contas para acertar, é bom começar a se arrepender de seus pecados, comece deixando minha irmã em paz.
- Pode ser depois? Agora estou focada em ajudar a salvar a vida dela. - Theo rebateu.
Lindsay bufou impaciente.
- Ok, me deixe falar com ela.
- Sam? Ela quer falar com você. - Theo disse já entregando o comunicador.
- Lynn?
- Saiba que ainda estou possessa com você.
- É, imaginei que estaria. Mike te contou?
- Sim, ele me ligou no dia que você o mandou embora, arrasado. Como você teve coragem de fazer isso com seu próprio noivo? Eu não sabia que você tinha tanto sangue frio.
Sam parou o carro no acostamento.
- Não foi sangue frio, pelo contrário, foi uma avalanche de sentimentos contraditórios, mas de repente ficou claro o que eu deveria fazer, e fiz.
- Foi a decisão mais estúpida que poderia ter tomado, já era para ter se livrado dessa garota há muito tempo. Eu falei, eu falei, eu falei, mas você não me deu ouvidos. Ela está fazendo sua cabeça contra ele, você dispensou um homem que faria tudo por você, um homem de bem.
- Ele bateu em Theo.
- Ela deve ter merecido. Escute, ele está disposto a voltar para você, ele pediu que não te contasse porque está magoado, mas ele te perdoaria se você pedisse desculpas por tudo que fez.
Sam apertou os olhos com os dedos.
- Isso não vai acontecer, Lynn.
- Não quero discutir com você, eu nem queria falar com você, essa... essa... essa prostituta me obrigou. Estou decepcionada, estou sem entender o que está acontecendo, então melhor me deixar quieta por alguns dias.
- Que talvez sejam meus últimos.
- Não se coloque como vítima, você abriu mão da ajuda de Mike, está metida nessa pouca vergonha por vontade própria,
- Você precisa rever alguns conceitos, Lynn.
- Mamãe, é a tia Sam?
Sam pode ouvir seu sobrinho de nove anos falando do outro lado, ao longe.
- Não, não é. - Lynn respondeu ao filho
- É o Gerry? - Sam sorria.
- Sim.
- Posso falar com ele? Estou morrendo de saudade dos pequenos.
Lindsay levou algum tempo para responder.
- Espera.
- Quem é? - Sam ouviu uma vozinha pelo comunicador.
- Gerry? Sou eu. - Sam começava a se emocionar.
- Tia Sam?? - O menino respondeu com surpresa e animação.
- Sim, que bom te ouvir, estou com uma saudade enorme de você e de seus irmãos, não vejo a hora de poder ganhar de você no Bonks.
- Eu tenho jogado bastante, agora vou ganhar de você!
- Ah é? Você está treinando?
- Todos os dias, minha mãe deixa eu jogar por duas horas, antes de fazer o dever de casa.
- E como está a escola?
- A professora Merrian disse que eu falo muito durante as aulas, mas o Tommy fala mais do que eu.
- Tudo bem falar durante a aula, mas apenas quando a professora permitir, ok? E Amanda e Oliver, como estão? Você parou de provocar sua irmã no café da manhã?
- Ela que me provoca, ela joga cereais no meu copo de leite e depois sai gritando que eu bati nela, mas eu nem encosto nela!
- Ok, então vamos fazer assim, quando eu voltar vou tomar café com vocês, e sentar entre vocês dois, para ver o que acontece.
- Mamãe disse que você não vai voltar.
- Sam? - Lynn assumiu a ligação.
- Por que você disse isso a ele?
- Para que eles se acostumem com sua ausência, eles viviam perguntando por você. E também se você não... se não conseguir o coração, eles precisam estar preparados.
Sam não conseguiu responder.
- Mas você vai voltar. - Lynn retomou.
- Amém. - Foi o que Sam conseguiu falar.
- Vou desligar, ok?
- Ok.
Pelo barulho da respiração de Sam, Theo percebeu que ela segurava o choro.
- Eu também sou boa em Bonks, então se quiser umas dicas... - Theo disse.
Sam deu um riso fungado, mas permaneceu em silêncio, ainda abalada.
Theo aguardou um pouco, por fim abriu a porta e saiu. Tateou a lataria caminhando ao redor do carro, até chegar à porta do motorista.
- Volte para o carro. - Sam disse, assustada.
- Saia do carro, Sam.
Sam obedeceu, descendo do carro.
- O que foi?
Theo a envolveu, a abraçando de forma firme.
- Prefiro fazer isso de pé. - Murmurou.
Sam rendeu-se ao carinho, a abraçando da mesma forma.
- Ou na horizontal. - Theo completou, com um sorrisinho.
***
Naquela tarde entraram pela primeira vez numa capital brasileira, Campo Grande, que agora era chamada apenas de Campo. Haviam centenas de prédios estreitos e iguais, enfileirados, todos com painéis digitais frontais, eram telas enormes que exibiam propaganda do governo. Sam não demorou a perceber os inúmeros drones cruzando os céus, pareciam inclusive seguir alguns carros. Além de motos azuis sobrevoando a cidade, viu uma moto branca, que andava em velocidade reduzida, com inúmeras câmeras na parte de baixo.
- Já estamos em Campo? - Theo perguntou, espreguiçando-se no banco.
- Sim.
- Como é?
- Ãhn... Acabamos de passar por uns passarinhos gigantes no meio de uma praça.
- Araras.
- Isso. Tem motos brancas sobrevoando, não parecem ser da polícia. - Sam disse.
- É a polícia do governo, são os olhos e ouvidos do presidente Hover.
- Como vocês conseguem viver com essa falta de liberdade?
- O povo acaba acostumando, assim como seu povo se acostumou com a igreja ditando as regras para seus governantes, metendo o bedelho na vida dos indivíduos.
- Não deveriam aceitar isso. - Sam falou.
- Não poderia concordar mais com você.
Ficaram em silêncio por um instante.
- Você faz parte da militância anti governo, não é? - Sam perguntou.
- Mais ou menos, eu era uma simpatizante, mas não sobrava muito tempo para me dedicar a isso.
- Você disse que trabalhava no comércio, que tipo de comércio? De pessoas? Era um eufemismo para prostituição?
- Não, comércio informal. É tão difícil acreditar que me levaram contra minha vontade e obrigavam a me prostituir?
- Você disse que foi vítima de tráfico sexual, achei um tanto estranho, porque dizem que isso não existe nos dias de hoje. Mas eu acredito que você estava no Circus por obrigação, que algo a prendia lá.
- Fizeram uma emboscada para mim e me sedaram, quando acordei estava num bordel na Zona Morta. Fim. E sabe do que mais? Não quer acreditar em mim, foda-se.
- Não se exalte, mocinha.
- Eu sou uma das pessoas mais calmas da porcaria da face da terra, mas você tem uma capacidade inacreditável de testar minha paciência.
- Ok, vamos voltar ao assunto anterior. Você trabalhava, tinha sua vidinha normal, e não sobrava tempo para a militância? O que mais você fazia?
- Eu prestava serviços numa ONG, fazia uns trabalhos sociais.
- ONG de que tipo de auxílio?
- Mulheres.
- Uma ONG feminista?
- Mais ou menos.
- De qual religião era essa ONG?
- Não tinha vínculos religiosos.
- Não?
- Não. Deixe eu adivinhar: na Europa todas as ONGs são da igreja, acertei?
- Sim, são. É trabalho das diversas pastorais, tem uma para cada necessidade. Mas não tem nenhuma ONG feminista, lá as ONGs são sérias.
- E lá vamos nós... - Theo suspirou com força.
***
- Não gosto desta estrada. - Sam resmungou ao estacionar o carro num pequeno restaurante anexo ao posto de recarga, não havia mais nada num raio de dez quilômetros, apenas florestas e vegetação.
- Por que?
- Me dá calafrios.
- Acho que não deveria ter contado aquela história do menino da moeda.
- Nem fale nesse menino, já me arrepiei, olha aqui. - Sam colocou a mão de Theo em seu braço, a caminho da entrada do estabelecimento.
- Você é muito impressionável.
Após finalizarem a modesta janta, dois casais que estavam sentados próximos pagaram e saíram do local. Sam deu uma boa olhada ao redor, dando um gole em seu copo de água por fim.
- Somos os únicos clientes aqui. - Sam constatou.
- Pelo menos tem funcionários ainda?
- Vejo uma moça atrás do balcão, mascando lentamente seu chiclete enquanto assiste TV.
- Bom, eu terminei, quando quiser ir...
- Vamos, vamos sim. Vou ao banheiro, quer ir?
- Não, já fui quando chegamos. Mas cuidado, o banheiro é externo e dizem que tem lobisomem nessa região.
- Muito engraçado.
- Cuidado com o andarilho canibal.
Cinco minutos se passaram, e Sam ainda não havia retornado. Sete minutos, e Theo já dava sinais de ansiedade. Oito minutos, e esfregava o pulso esquerdo. Dez minutos, e nada de Sam retornar. Doze minutos, e a preocupação fez Theo caminhar até o balcão esbarrando nas mesas.
- Moça?
Nada.
- Moça?
Nada.
- Tem alguém aí??
- Pois não? - A garçonete apareceu.
- A garota que estava comigo, você a viu voltar do banheiro? Ela está por aqui, no restaurante? Eu não enxergo.
- Não, não a vi voltar, deve estar lá ainda.
- Me leva lá?
A mulher de aproximadamente quarenta anos olhou pelo recinto, percebendo não haver clientes.
- Ok, venha.
Theo foi conduzida pelo braço até o banheiro, duas portas que ficavam do lado de fora, encobertos por uma parede.
- Sam? - Theo a chamava dentro do pequeno ambiente fétido.
- Não tem ninguém aqui, moça, nem no masculino. - A garçonete disse, ao entrar no banheiro também.
- Tem outras portas nesse banheiro?
- Não, só tem a privada e a pia.
Theo posou as mãos na cintura, pensativa.
- Você pode me levar ao estacionamento?
- Venha, mas não posso demorar.
Chegando ao pátio lateral, Theo foi logo perguntando.
- Tem uma caminhonete azul?
- Tem sim, só tem este, o carro do cozinheiro, e meu carro aqui.
- Você vê alguém dentro?
- Não, está vazio.
- Desculpe abusar da sua bondade, você pode dar uma olhada de perto?
A passos apressados, a moça foi ao carro, voltando em seguida.
- Nadinha.
Um carro estacionou, o farol forte incomodou os olhos de Theo, que os protegeu com a mão
- Ok, vou voltar para dentro.
Foi novamente conduzida ao interior, sentando-se numa das mesas próximas ao balcão.
- Espere mais um pouco, ela deve aparecer.
- Essa região tem assaltos? É perigosa? - Theo perguntou.
- Não, aqui costuma ser tranquilo. Talvez sua amiga tenha pego alguma carona.
- Não, ela não faria isso. - Theo esfregava mais do que nunca seus pulsos, nervosamente.
Um homem calvo, de roupas simples e semblante fechado, adentrou o restaurante, sentando numa mesa ao fundo.
- Preciso atender o cliente, depois volto para te ajudar. - Ela disse, indo na direção do cliente, com o comunicador de anotações na mão.
Theo se esforçava para não entrar em pânico. Já havia tentado ligar no comunicador de Sam várias vezes, sempre como desligado.
Os minutos corriam, Theo insistiu para que a garçonete checasse o banheiro e o lado de fora novamente, mas ela não encontrou nada.
- Ela não pode ter sumido. - Theo disse com apreensão.
- Parece que foi o que aconteceu. Quer que eu ligue para alguém vir te buscar? - Ela perguntou, gentilmente.
- Não, obrigada.
Theo girava o fino comunicador nas mãos, decidindo o que fazer. Tentou novamente uma conexão.
- Alô? - Foi prontamente atendida.
- Theodore?
- Sim, que bom que me ligou! Como você está, Theo?
- Ãhn... Bem, quer dizer. Desculpe te ligar essa hora, mas eu preciso de ajuda e não sei a quem recorrer.
- Mike voltou a perturbar vocês?
- Não, não, esse se foi. Mas Sam sumiu, e estou começando a ficar desesperada aqui, ela desapareceu sem deixar vestígios, disse que ia ao banheiro e não retornou.
- Há quanto tempo?
- Uns vinte minutos. Ou mais.
- Hum... - Theodore aguardou antes de continuar. - Já pensou na possibilidade de Mike ter a sequestrado?
- Já, essa ideia já passou pela minha cabeça, mas estou tentando acreditar que ele não fez isso, que não chegou a esse ponto.
- Lembre-se do que ele fez com você, aquele cara é capaz de coisa pior.
- Theodore, o que eu faço? - Theo apoiou a testa na mão, parecia transtornada.
- Onde você está?
- Numa espelunca no meio do mato, não sei que cidade é essa.
- Um restaurante?
- Isso, com um posto ao lado, o nome da cidade é Para... Para alguma coisa.
- Paranaíba, acho que passei por esse lugar hoje, não estou longe, uns trinta quilômetros. Estou indo até aí procurar por Sam, chego em no máximo vinte minutos.
- Eu só dou trabalho a você, não é?
- Fique tranquila, eu estava aqui assistindo um filme péssimo no hotel. Estou a caminho.
- Ok. Obrigada, Theo dois.
- Fique atenta a movimentações estranhas, se for abordada por algum cliente, não saia do local, peça ajuda a um funcionário.
- Acho que só tem um cliente, mas ficarei alerta.
Assim que Theo desligou o comunicador, o cliente sisudo que estava no canto foi até o balcão, enquanto aguardava a garçonete, olhava fixamente para Theo.
Em pouco menos de vinte minutos Theodore já estacionava no restaurante obscuro, Theo ouviu a freada brusca e imaginou que seria ele.
- Boa noite, garota. - Theodore aproximou-se por trás, lhe dando um beijo rápido em seu rosto, sentou-se à sua frente.
- Oi Theodore, desculpe te importunar, mas só consigo pensar em coisas horríveis, não acredito que Sam tenha ido embora por espontânea vontade.
- Também acho que ela não faria isso. Ela foi ao banheiro, correto?
- Isso, é externo.
- Vou dar uma geral lá fora, eu trouxe uma lanterna. Já volto.
Theodore voltou para o interior do restaurante, com a lanterna em mãos, sentando-se novamente na mesa de Theo. Ia dar onze da noite.
- Nada, infelizmente nada, nenhum rastro da tenente Samantha.
- Que droga... - Theo bufou, mordendo o lábio, pensativa. - Acho que não tenho escolha, vou continuar aqui esperando.
- Você não pode passar a noite aqui.
- O carro está lá fora.
- Muito menos passar a noite sozinha naquele carro.
- Eu nem sei por onde começar a procurá-la. - Theo dizia, com angústia.
- Quer que eu chame a polícia?
- Não, nada de polícia.
- Ok.
Ambos permaneceram em silêncio, pareciam procurar possibilidades.
- Theo. - Ele começou a falar, num tom baixo, discretamente. - Tem um cliente lá no canto, não tira os olhos da nossa mesa. Sabe se ele está aqui há muito tempo?
- Ele chegou depois que Sam sumiu. Ele parece suspeito?
- Me parece um homem comum, mas esses olhares para cá estão estranhos. Ele levantou-se agora.
- Ok, continue monitorando. - Theo disse, fitando a mesa.
- Pagou a conta, está vindo para cá.
- Acho que conheço você de algum lugar. - O homem disse, olhando para Theo.
- Acho um pouco difícil. - Theo respondeu.
- E você, seria quem? - Theodore o indagou.
- Entendi. Não quero atrapalhar seu trabalho tão nobre. - Ele deu um risinho.
- Não sei do que está falando. - Theo disse.
- Eu sei de onde conheço você, do Circus, senti sua falta da última vez que estive lá.
Theo estava agora com um semblante incomodado.
- Não o conheço e não faço ideia do que está falando, eu estou no meio de algo importante agora, então...
- Ela está pedindo para você ir embora. - Theodore disse.
- Claro, sua hora deve ser cara. Espero te ver novamente no Circus, de preferência embaixo de mim. - Deu dois passos e sussurrou próximo ao ouvido de Theodore.
- A coloque de quatro, você não vai se arrepender. - Disse com um sorrisinho, saindo em seguida.
- Onde estávamos? - Theo disse, sacudindo a cabeça.
- Isso está estranho, fique aqui, eu vou segui-lo.
- Melhor não, pode ser perigoso, Theodore.
- Só vou segui-lo, já volto.
Quatro minutos depois, Theodore retornou à mesa.
- E então? - Theo perguntou, ansiosa.
- Nada de mais, apenas deu a partida e saiu calmamente na direção oeste. Em todo caso anotei a identificação do carro, vou pesquisar depois.
- E agora? Saímos procurando Sam pela estrada? - Theo indagou.
- Tem alguma ideia melhor?
Theo esfregava os dedos na testa, com desespero.
- Não, eu não sei o que fazer. Ela não pode ter desaparecido assim, vou tentar ligar novamente.
Theo tentou afoitamente uma conexão com Sam, mas novamente deu como desligado.
- Theo, façamos o seguinte: vamos dar umas voltas de carro pela região, eu vou dirigindo devagar fazendo uma busca visual, irei nas duas direções, leste e oeste. Se não encontrarmos nada, levo você até meu hotel e lá decidiremos os próximos passos. O que acha?
- Ãhn... E se ela voltar aqui?
- Ela tem sua ID, não tem?
- Tem.
- Deixe seu comunicador ligado, eu deixarei um bilhete à garçonete, avisando nosso endereço, ok?
- Ok, ok. - Theo levantou-se rapidamente.
Foram ao balcão, e Theodore conversou com a garçonete. Dali seguiram para o estacionamento.
- Aqui? - Theo tateava a porta do carro branco dele.
- Isso, entre. Sabe a cor da roupa que ela usava? - Theodore ajudou Theo a entrar em seu carro.
- Não...
Assim que Theodore também entrou no carro, deu uma boa olhada em Theo, que continuava com semblante nervoso.
- Theo, me desculpe, não é nada pessoal. Mas negócios são negócios.
Theodore ergueu a lanterna e bateu com violência na cabeça de Theo, a deixando desacordada.
Eufemismo: s.m.: Figura de linguagem baseada na substituição de palavra ou expressão que possa ter sentido triste, grosseiro, ou seja apenas desagradável, por outra de sentido mais suave ou conveniente
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:

Lari Maciel
Em: 18/09/2015
Aiiii não acreditooo que o Theodore se vendeuu!!!! Ou será que o dono do Circus que o mandou? Hummmmm...
Poxaaa vidaa....
E kd Sam? Será que foi o ridículo do Mike?
Tô super anciosa! Rsrss
Beeeijoo
Resposta do autor:
Theodore é realmente um vendido, estava só esperando o momento certo de atacar.
Quem mandou? Hum. Só teremos certeza no último capítulo...
Sam está um tanto enterrada no momento.
Bjos!
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Bruna
Em: 17/09/2015
Não acredito, logo agora que elas estavam se entendendo....
Com certeza o Mike está por trás disso!
Anciosa para o próximo capítulo, parabéns pela bela estória!
Beijos
Resposta do autor:
Olha, acho que Mike não tem capacidade pra elaborar algo assim... rs
Obrigada por me acompanhar e comentar!
Bjos
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