************** há algumas horas atrás***************

Fazia tempo que não via minha prima Rika tão feliz, nos meses que se passaram ela parecia ser outra pessoa, estava sempre sorrindo, mamãe falou que até mesmo estava indo a alguns bailes, engraçado o quanto um relacionamento pode mudar uma pessoa, Henrika era a prova disso, de uma mulher submissa e sem opinião á alguém alegre e cheia de vida. Júlio andava calado o que era triste de se ver, minha prima sabia que tudo era a decepção com o pai, eu me senti muito mal ao descobrir que o garoto só tinha presenciado aquela cena por que aproveitou a ausência do pai para ir falar comigo, porém tinha confiança que logo ele voltaria a ser o garoto espevitado de sempre.

De certa forma as coisas estavam melhorando em minha família, meu primo Kaike acabara de noivar com uma das enfermeiras da clínica de papai, primo Marcos ia ser pai, fazia algum tempo que ele estava saindo com uma garota que conheceu na clínica de reabilitação, era bonito de se ver os dois juntos, um apoiando o outro a não cair na tentação de voltar as drogas, Tia Ceci embora continuasse só, esbanjava felicidade pelos filhos, mamãe e papai depois de muitos anos de terapia em casal estavam novamente felizes no casamento, na verdade algumas vezes era até constrangedor estar perto deles, eu não mudei muito, continuava minha vidinha pacata de faculdade, estudos e mais estudos, Giordana também não me parecia muito diferente, continuava uma namoradeira, era engraçado vê-la com uma mulher nova cada vez que saiamos ou melhor, cada vez que ela conseguia me arrastar de casa, por falar na ruiva estava com ela agora indo para casa dos meus pais, pra mais um daqueles churrascos em família, mamãe havia comentado por alto que os papéis do divórcio de Rika finalmente saíram e o churrasco era uma pequena comemoração por terem se livrado de Renato, mesmo que ninguém dissesse em voz alta o motivo da festa.

A ruiva tagarelava algo sobre a nova encarregada do escritório a qual ela estava visivelmente encantada e eu sorria imaginando quanto tempo demoraria para ela resolver chamar a mulher pra sair, mal chegamos na esquina e já dava para ouvir a música que vinha da casa de meus pais, pelo jeito a festa estava boa, assim que entramos fomos direto para o quintal dos fundos, meus primos haviam levado uma das TV´s para lá e tentavam sintonizar no canal do jogo de futebol que aconteceria logo mais, papai contava uma piada boba la da churrasqueira e minha tia Ceci ria fingindo achar graça acompanhada das noras, assim que mãe viu que eu e a ruiva tínhamos chegado veio logo nos cumprimentar, porém meus olhos foram direto para mulher atrás dela, Antonela estava linda no seu jeito despojado, andava distraída carregando uma daquelas travessas de maionese, daquelas que sempre sobram nos churrascos mais que toda vez alguém inventa de fazer, quando me viu a perfeição sorriu, mas logo deixou o riso morrer ao ver Giordana envolver minha cintura, gesto normal que a ruiva repetia com frequência e que pareceu irritar a outra.

-É impressão minha ou a sua perfeição ficou com ciúmes? -Giordana sussurrou em meu ouvido soltando uma gostosa gargalhada.

-Até parece ruiva.

-Vou me divertir com isso. -disse ela passando a me abraçar por trás, eu até pensei em contestar, mas ver Antonela demonstrar alguma coisa por mim mexia com meu ego e não posso negar que a sensação era muito boa.

   A tarde se passou assim, com minha família perfeita, cheia de suas imperfeições, meus primos gritando assistindo ao jogo, meus pais felizes como se voltassem de uma lua de mel, minha tia e primas a os risos, e Antonela espumando de raiva com o atrevimento da ruiva comigo, se pudesse escolher um momento feliz na minha vida acho que este seria o ideal, acho que momentos como este acontecem em nossas vidas para nos lembrar de como são as pequenas coisas que nos fazem verdadeiramente felizes.
   A lua já brilhava forte no céu os risos já vinham fáceis até mim, e a felicidade era plena naquele momento, pedi licença a Giordana e entrei em casa afim de usar o banheiro, segui tranquila com um copo de refrigerante na mão, quando sai do banheiro estranhei o fato de uma das luzes do escritório de papai estar acesa fui ver o que era, minha prima Rika conversava com alguém dava para vê-la por entre uma fresta na porta, já ia me afastar quando ouvi meu nome ser pronunciado.

      -Minha Filha você vai mesmo deixar a Karolina escapar assim?

-Ela parece estar bem acompanhada mãe. -mesmo de longe senti o ressentimento em sua voz, e com cuidado me aproximei afim de ouvir melhor.

-Nela meu amor, eu sei que sou uma das culpadas por essa situação toda, mas você vai mesmo deixar a Karol com aquelazinha? Você é muito mais bonita filha, e a Karol seria boba se não desse um chute naquela lá pra ficar com a minha filhota.

-Mãe... não se trata disso, eu... eu só não sei o que fazer, fiz tanta besteira... já machuquei tanto ela que tudo que consigo pensar é em deixa-la ser feliz com outra pessoa...

   As duas então se calaram, eu já pensava em sair dali quando a porta se abriu de repente, Antonela parecia assustada, as bochechas vermelhas, a perfeição passou por mim de cabeça baixa e sumiu ao virar o corredor, Henrika que vinha logo atrás dela, também me olhou assustada, só que  diferente da filha ela parou me avaliando.

-Faz tempo que está aqui Karol?

-Um pouco.

-Entra aqui, vamos conversar um pouco.

   Rika me puxou pelo braço e fechou a porta atrás de si, ficamos calada durante um tempo, eu processava a conversa que tinha acabado de escutar e minha prima olhava um ponto fixo na parede procurando as palavras certas.

  -Desde que era pequena eu sabia que a Antonela era diferente, pode até parecer bobagem isso, mas de algum modo os pais sempre sabem. -ela soltou um longo suspiro pensando em como continuar. -Quando a Nela era menor nós costumávamos conversar bastante, isso mudou depois que eu conheci o Renato, na época eu não me dei conta sabe? Acho que acabei criando um abismo entre eu e minha filha, as pessoas não percebem o quanto mudam pelo outro Karol, fui deixando de ser eu mesma toda vez que me submetia as vontades dele e deixei minha menina em segundo plano. Quando ela me contou sobre sua sexualidade eu não fui a mãe que ela esperava, hoje eu me arrependo disso, mas naquela época cheguei até mesmo a afastá-la de nós a pedido do Renato, ele acreditava que ela influenciaria o Júlio, mas nada disso me dá mais vergonha do que o que eu vou te falar agora. Quando a Antonela voltou do intercâmbio lembra? Aquele dia na casa da minha mãe eu vi vocês duas juntas na varanda, e eu pedi pra pelo amor de deus ela ficar longe de você, alguns dias depois ela me disse que estava apaixonada, mas eu não dei ouvidos, eu já não aguentava aquela situação toda, quando meu marido enfim parecia aceitar minha filha, ele até mesmo fazia gosto da união dela com a Giordana, ela me vinha com essa, eu queria minha família feliz Karolina, eu não imaginava... eu não conseguia entender... fui dura com ela naquele dia, disse coisas que sei que nenhuma mãe deveria dizer, mas eu não sabia o que fazer, pensei que seria melhor assim, que conseguiríamos ser felizes assim...."

-A senhora está me dizendo que pediu para Antonela se afastar? Henrika me explica isso.

-Eu não pedi Karol, eu praticamente a ameacei, fui uma idiota, deus que me perdoe, mas foi um alívio pra mim quando ela foi morar com Giordana. -minha prima chorava baixinho, e eu não sabia o que sentia, raiva dela, pena, eram muitos sentimentos de uma vez só, sentei na mesa sentindo meu corpo fraquejar. -Quando Antonela e Giordana voltaram a morar aqui eu fiquei morrendo de medo que ela fosse atrás de você, o que sua mãe diria? o que a minha mãe diria? Elas me culpariam por Antonela ser desse jeito, eu me culpava, ficava pensando a onde eu havia errado com ela. Mas agora Karol, depois de toda a desilusão com Renato eu percebo o quanto fui egoísta, não estou te contando tudo isso para justificar os erros dela, Antonela é minha filha e eu melhor que ninguém conheço os defeitos dela, mas eu queria que você soubesse, eu queria poder lhes dar uma chance Karol, pra minha filha a família sempre foi o mais importante e eu me aproveitei disso... não sinto orgulho, depois de tudo eu só quero ver ela feliz.

-Eu nem sei o que pensar...

-Eu nem deveria te pedir isso prima, mas dá uma chance pra minha filha, Antonela ama você, eu sei que ama.

Minha prima então beijou minha testa e secou uma pequena lágrima que escorria livre pela minha bochecha, lágrima que eu nem havia reparado até aquele momento e sem dizer mais nada Henrika saiu do escritório me deixando só.

Fim do capítulo