Capítulo 6 Era o que faltava
CAPÍTULO 6: Era o que faltava
-- Preciso de Bombeiros aqui no endereço Av. Engenheiros.
-- Qual a ocorrência senhora? -- Perguntou a atendente.
-- Tem uma cachorra e seu filhote aqui nessa avenida em um bueiro, que se encontrava destampado, ela está chorando e... -- foi interrompida pela atendente do outro lado da linha.
-- Senhora, nosso trabalho é sério, tratamos com vidas, não podemos simplesmente ir ao socorro de um cachorro em um bueiro.
Júlia ouviu palavra por palavra da atendente, e ficou indignada. Afinal se tratava de uma vida, um animal indefeso.
-- Olha só, eu sei que é sério o trabalho de vocês, mas eu preciso de ajuda -- passava a mão que não segurava o celular em uma de suas sobrancelhas em um modo de nervosismo -- eu não posso deixar esses cachorros aqui, preciso da ajuda de vocês.
-- Sinto muito senhora, não podemos atender a este chamado. -- foi incisiva.
-- Não virão me ajudar? - indagou incrédula.
-- Sinto muito senhora.
-- E vocês ainda tem a coragem de dizer que estão para Servir e guardar vidas? Uma ova! --esbravejou desligando a ligação sem esperar por qualquer resposta.
Passou a mão sob a sobrancelha direita. -- atitude que tinha toda vez que estava nervosa com alguma coisa. -- Passava os dedos ajeitando-a diversas vezes, como se esse gesto a acalmasse.
-- Ei fica calma tá? Eu vou te tirar daí -- disse olhando nos olhos suplicantes da pobre cadela, e pensou "só não sei como".
********××××××********
Na mansão dos Lancaster
-- Mamãe! -- gritava Olávo andando de um lado para outro -- onde será que essa menina se meteu?
-- Se acalme meu filho, ela deve ter ido dar uma volta conhecer a cidade.
-- Conhecer a cidade? E por que não pediu ao motorista para leva-la? Ela não conhece nada aqui!
-- Olha tente o celular dela novamente, eu vou ligar para Amanda e ver se ela tem notícias.
Cecília saiu deixando para trás um Olávo inquieto, por não saber o paradeiro de sua filha. Sua filha, fruto de seu mais verdadeiro amor. Talvez por esse motivo essa preocupação, por ela ser o fruto de um amor que foi puro.
********××××××********
Ainda na rua Júlia pensava no que fazer para salvar a pobre cadela e seu filhote, nada lhe vinha a cabeça, então resolveu ligar para a mente brilhante de sua prima.
-- Hey Carol?
-- Meu amor que saudades suas, como você está? -- Caroline era todo risos.
-- Carol preciso da sua ajuda. -- Foi objetiva.
-- O que aconteceu Júlia? -- Ficou apreensiva elevando um pouco o tom de voz -- Você está bem?
-- Eu estou bem Carol, mas tem uma cachorrinha, em um bueiro que precisa da minha ajuda.
-- Uma o que Júlia? -- Perguntou incrédula -- você me assustou!
-- Me desculpa princesa.
Júlia contou a sua prima tudo o que aconteceu e ao final do relato, sua prima estava revirando os olhos, ela não gostava de animais, ainda mais cachorros que pra ela só serviam para latir, comer e sujar as coisas, diferente de Júlia que amava os animais principalmente os cães.
Apesar de Júlia sempre gostar de cães, nunca pode ter pois seu "pai" revelado agora padrasto e sua mãe não gostavam de animais, por esse motivo só tinha contato com os de amigos, e com o do canil onde era voluntária sem que ninguém, exceto Caroline e Paul soubesse.
-- Primeiro, por que você me ligou para que supostamente eu te ajude?
-- Ora, porque da dupla Pink e Cérebro, eu sou o Pink que executa seus planos malignos de dominar o mundo minha cara Cérebro -- disse sorrindo como se aquilo fosse obvio.
-- Não gostei de ser o desavantajado de beleza! -- disse em um falso tom de irritação, mas na verdade estava sorrindo, pode também ouvir uma risada gostosa de Júlia -- Segundo, sinto muito informar, mas não tenho ideia de como você possa salvar este animal.
-- Serio que vai me decepcionar? -- disse com uma voz desanimada.
-- Ah Ju, eu não sei o que você pode fazer, precisa de Bombeiros para entrar nesse bueiro, e pelo que me disse só ajudaria caso fosse alguém e como é um animal... -- não terminou de concluir seu pensamento sendo interrompida por uma voz animada.
-- ISSO! Você é uma gênia Carol.
-- Do que você está falando Júlia?
-- Depois te ligo princesa, beijo, beijo e obrigada, sabia que não ia me decepcionar -- disse atropelando as palavras e desligou sem nem ouvir Caroline pedir explicações.
********××××××********
Já fazia mais de 5 horas que Júlia havia saído de casa sem dizer para onde ia, não atendia o celular, e por não conhecer a cidade estava deixando Olávo preocupado e essa preocupação atingiu Cecília.
Assim que Amanda entrou em casa foi abordada.
-- Notícias dela? -- Olávo estava em pé continuava andar de um lado a outro com o rosto vermelho de nervoso.
-- Não, rodei a cidade toda, mas nem sinal.
-- Mamãe e se ela foi sequestrada?
-- Não diga besteira meu filho! -- disse ficando em pé e andando de um lado a outro como o filho.
Com a saída de Júlia e a demora em voltar, colocaram Amanda para procura-la na esperança de que a jovem ruiva a encontrasse em um desses lugares que os adolescentes costumam ir.
Amanda percebeu que todos estavam aflitos com o sumiço de Júlia.
"Essa garota adora chamar a atenção! Só pode ter feito de propósito! Tinha que sumir logo hoje que eu iria sair com a Rachel, agora vou ter que ficar com a família." Pensou.
Depois do incidente no quarto Rachel ligou a chamando para ir em uma balada e a ruivinha prontamente aceitou. Estava precisando espairecer um pouco.
********××××××********
No momento em que Júlia desligou com Caroline, fez o que sua amiga sem saber lhe dissera.
"Eles só virão se for uma pessoa a precisar de ajuda, então eu vou precisar da ajuda deles" sorriu com esse pensamento, colocando-o em prática.
-- Ei lindinha, vai um pouco pro lado e leva o seu filhote, eu vou dar um jeito de tirar vocês daí.
Como se a cachorra entendesse se encolheu, junto de seu filhote que mamava dando espaço. Júlia sentou no chão colocando as pernas para dentro do bueiro e depois se pendurou segurando com os braços para poder diminuir a distância da queda, o que não adiantou de muita coisa. Pulou e ao chegar o chão sentiu uma fisgada em seu joelho e pensou "Droga! Que ideia foi essa? Isso dói!"
Pegou seu celular e discou o número dos bombeiros. Informou que estava em um bueiro e precisava de ajuda.
-- Nós já vamos sair daqui pequena, posso passar a mão em você? -- foi se aproximando esticando sua mão para que a cadela pudesse cheirar, a cadela cheirou e baixou sua cabeça -- Oi garotona, vai ficar tudo bem. Vou tirar vocês daqui, como veio parar aqui ein? -- Enquanto conversava a acariciava.
Estava ficando escuro e frio, já fazia mais de uma hora que havia feito a primeira ligação, desde que entrou no bueiro ligou mais de 6 vezes e nada deles chegarem.
********××××××********
-- Já são 18:00 horas, daqui a pouco escurece, eu vou atrás dela. -- disse Olávo pegando sua carteira e se dirigindo a porta mas antes de sair Cecília falou.
-- Alo? Julia?
-- Ela atendeu? -- perguntou Olávo e Amanda que até então estava calada sentada em uma poltrona.
-- Júlia você está bem? -- perguntou Cecília, fazendo sinal com a mão para que os demais esperassem.
-- Oi Cecília, sim estou bem
-- Por que não atende esse celular menina? Sabe como estávamos preocupados? A onde você está? -- arremessava perguntas sem nem mesmo parar para respirar.
-- Cecília eu estou bem. -- disse com a voz firme, queria dizer que não precisava de ajuda mas teria que pedir ajuda então se controlou apenas deixando a voz firme -- olha só, eu preciso da sua ajuda, estou em um bueiro.
-- VOCÊ ESTA A ONDE? Bueiro? Que história é essa? -- praticamente gritou, Olávo olhou assustado e Amanda sem entender.
-- Cecília se eu não precisasse de ajuda não estaria pedindo, quando eu chegar eu posso te contar tudo, mas agora preciso sair daqui, está frio e eu já liguei diversas vezes para os bombeiros e nada.
-- Tudo bem me passe o endereço. -- Cecília anotou e quando ia dizer que estava a caminho Olávo pegou o celular de sua mão.
-- Garota onde você está? o que pensa que está fazendo?! -- praticamente gritava -- que história é essa de buei...
Antes que terminasse suas perguntas Júlia desligou o celular, o que o deixou extremamente irritado, e sua mãe interveio.
-- Você fazendo isso não vai adiantar Olávo, você já percebeu que ela não aceita ordens.
-- Não me venha com essa mamãe, ela vai ter que aprender a receber ordens, ela é minha filha!
-- Sua filha e tão cabeça dura quanto você. Eu não vou discutir com você, estou indo buscar minha neta. Amanda por favor peça para o Frederico preparar o carro para sairmos.
-- Não é necessário Amanda. Frederico pode ficar eu te levo mamãe, vamos.
Cecília pegou seu casaco e saiu junto de seu filho para o endereço dado por sua neta, no caminho ligou para o corpo de bombeiros informando quem estava entrando em contato.
********××××××*******
Júlia estava com frio e ficando com fome e ouvir o modo como Olávo falou a irritou profundamente, afinal quem aquele homem pensava que era além de seu suposto pai, para se dirigir a ela daquela forma? Tudo bem que ele era seu pai mas para ela não era nada mais que um desconhecido. Ainda estava indignada por não ter ido a ajuda desde a hora que pediu, se fosse em seu país, era só usar seu sobrenomeSan'Germany que todos estariam aos seus pés. Mas e agora? Em um país que não era o seu, agora era uma Lancaster. Ela poderia usar ainda o sobrenome San'Germany porem a descoberta e o ressentimento de tudo e o seu orgulho falavam mais alto, preferia nunca mais usar esse nome.
********××××××********
Já havia escurecido e passava das 18:00 horas quando o carro de Olávo estacionou no endereço que fora lhe dado, ele e sua mãe desceram do carro e sentiram como a noite estava fria.
-- Júlia? -- gritou Cecília
-- Aqui!
Cecília seguiu a voz e encontrou o bueiro que por pouco não caiu lá dentro.
-- O que faz ai dentro?
-- Pode me tirar daqui antes e então podemos conversar? Se fosse caso de vida ou morte eu já teria... -- antes que pudesse falar algo avistou Olávo e se calou.
-- Filha? Você está bem? -- perguntou com preocupação.
-- Vou ficar quando me tirarem daqui.
Cecília ligou novamente para os bombeiros e esperaram cerca de 15 minutos, e nada da ajuda chegar, então resolveu usar de suas amizades.
-- Olá Carlos, aqui quem fala é Cecília Sampaio Lancaster.
-- Cecília minha amiga, quanto tempo?
-- Sim querido faz muito tempo, gostaria de um favor seu.
-- Se estiver ao meu alcance.
-- Liguei diversas vezes para o corpo de Bombeiros, preciso que tirem minha neta de um bueiro na av. Engenheiros.
-- Como a jovem Amanda parou nesse bueiro Cecília?
-- Não foi a Amanda, Carlos. Eu te explico depois -- estava impaciente -- o fato é que minha neta está mais de 1 hora esperando ajuda.
-- Vou resolver imediatamente Cecília, peço desculpas.
Cecília odiava pedir favores, mas quando era preciso não hesitava usar suas amizades e o poder de seu nome. Conhecia Carlos há anos, ele era comandante da corporação de Bombeiros. Ele era sempre gentil, talvez por saber quem realmente era a família Lancaster.
Enquanto esperavam ouviram latidos, Júlia estava quieta, pela situação que se encontrava, odiava depender das pessoas ainda mais daquelas pessoas que supostamente era sua mais nova família.
-- Fica quietinha menina -- disse passando a mão na cabeça da cadela.
-- Júlia quem está ai com você? -- Perguntou sua avó.
-- Esta... -- viu uma movimentação perto de seu pé e gritou desesperada, perdendo sua pose de durona -- ME TIRA DAQUI! TEM RATO AQUI!
-- Calma a ajuda está a caminho -- disse Olávo estranhando aquela reação.
-- Eles disseram isso já faz mais de 2 horas -- disse respirando mas quando viu as baratas começou a chorar e se desesperar novamente -- POR FAVOR tem barata aqui eu preciso sair agora!
-- Calma e respira, eu vou descer ai -- disse Olávo tentando acalmar a filha.
-- Não, não cabe tem uma cachorra aqui e um filhote não tem espaço.
-- Uma cachorra? Mas o que uma cachorra esta fazen...
-- Eles chegaram! -- gritou Cecília
-- Graças a Deus -- disseram os outros dois.
Carlos veio junto com sua equipe pedindo desculpas pela demora e dizendo que iria averiguar o que havia acontecido para ter sido omitido socorro mais cedo.
-- Preciso que tirem esses cães daqui primeiro – Júlia disse antes que pudessem lhe ajudar.
-- Senhorita eu sou o Carlos, amigo de sua avó e comandante dos bombeiros, minha prioridade é você está bem?
-- NÃO, NÃO ESTA BEM! -- disse alterando o tom de voz e sustentando sua postura fria. -- Olha só, é Carlos não é? Pois bem, eu estou aqui a mais de 2 horas porem antes de entrar aqui, eu já tinha pedido ajuda à vocês para retirar esses cachorros daqui, mas a resposta que me foi dada, é que vocês nada podiam fazer, e pelo que vejo não fazem nem com animais e nem com pessoas, como podem usar o lema "Servir e guardar vidas"?
Olávo e Cecília ouviam tudo o que a jovem dizia, cada palavra e a postura típica de um Lancaster, a arrogância e o olhar frio, voz cortante e penetrante, Olávo ao constatar isso deu um sorriso de canto de lábios.
-- Senhorita se acalme, nós vamos tirar os cães também, mas primeiro você está bem?
-- Eu estou falando grego senhor? -- ela já tinha perdido a paciência -- creio que o senhor não sabe com quem está falando, sou Júlia San'Germany.
Ela percebeu a expressão confusa na face do homem, concluiu que sua avó já devia ter lhe dito que ela era uma Lancaster, então resolveu mostrar sua marca de nascença na parte interna de seu bíceps, que todos os San'Germany possuem, e junto desta marca, um pouco abaixo dela a tatuagem de seu sobrenome que todos seus irmãos também possuem. O clã San'Germany.
Carlos ao ver sua marca reconheceu a jovem Júlia, a caçula do clã filha da Senhora Imperatriz, mas não entendeu o porquê de sua amiga ter dito que ela era sua neta.
-- É exatamente isso que o senhor deve estar pensando, sou a caçula da senhora Imperatriz, e também sou uma Lancaster. -- disse encarando os olhos do comandante -- Agora o senhor pode me ajudar e retirar primeiro esses cachorros ou está difícil?
-- Sim senhorita, imediatamente. -- disse, e se virou para sua equipe gritando com eles.
Cecília ficou feliz de ver a postura decidida de sua neta, e controlada ao falar com o comandante, pois sabia que ela estava com pavor dos ratos e baratas que estavam dentro daquele buraco. Já Olávo ficou orgulhoso de sua filha ter usado o sobrenome de sua família. "Sim ela é uma legítima Lancaster" pensava estampando um leve sorriso nos lábios.
********××××××********
-- Amanda que demora pra atender esse celular! -- Rachel estava irritada pela mensagem de Amanda dizendo que não iria mais sair com ela.
-- Desculpa linda, estava ocupada
-- Que história é essa que não vamos mais sair?
-- Preciso ficar com a família, a garota sumiu, e estão todos preocupados.
-- A sua mais nova irmã? -- disse com ironia
-- Não enche Rachel, o negócio é que não vou mais, depois te ligo. -- se irritou com a brincadeira da "amiga" e desligou sem nem ouvir o que Rachel falava.
Amanda e Rachel eram amigas mas além disso ficantes, não era exatamente um relacionamento, ficavam apenas para passar o tempo.
********××××××********
-- Senhorita, eu preciso descer para poder pegar os animais que estão ai dentro, podem estar machucados -- disse um rapaz negro e alto, era um rapaz bonito -- Por favor eu poderia mandar uma corda e te retirar e depois prometo que pego os cachorros.
Júlia sentiu segurança nas palavras do jovem rapaz que não parecia ter mais de 18 anos.
-- Tudo bem, me passe a corda.
E assim foi feito, passaram uma corda a qual passou por volta de seu corpo e foi puxada, assim que saiu dona Cecília foi ao seu encontro com Olávo em seu encalço.
-- Júlia minha filha, você está bem? Se machucou? -- Cecília falava e passando as mãos pelo rosto da jovem e a abraçando.
-- Estou bem dona Cecília, não precisa se preocupar -- se afastou e a olhou nos olhos e logo em seguida se virou para onde estava a equipe de bombeiros e avistou o rapaz que havia conversado com ela e perguntou apreensiva -- Você vai tira-los de lá não é?
-- Sim senhorita, estou descendo agora mesmo. -- disse e logo após desceu o bueiro para resgatar os cachorros.
-- O que aconteceu aqui Júlia, como você foi parar dentro daquele bueiro? -- perguntou Olávo que até então permanecia calado.
Júlia sabia que teria que dar explicações, então respirou fundo e falou.
-- Eu estava andando para espairecer um pouco e conhecer a cidade, quando ouvi latidos e um choro de cachorros, vim aqui e vi que havia uma cadela e um filhote dentro do bueiro, liguei para os bombeiros e eles disseram que como não se tratava de uma pessoa eles não poderiam fazer nada, então já que eles só viriam se fosse uma pessoa, eu entrei no bueiro mas mesmo assim eles não vieram, então tive que apelar e pedir ajuda da dona Cecília.
-- Você o que Júlia?! -- gritou Olávo não acreditando no que ouvia -- Você entrou nesse bueiro se pôs em perigo para salvar simples cachorros?
-- Fala baixo que eu estou ao seu lado! -- disse com firmeza em sua voz se controlando para não gritar -- E não são simples cachorros, são duas vidas, e eu faria qualquer coisa para ajuda-los, já não posso dizer que faria o mesmo por pessoas.
-- Por favor não vão discutir, ainda mais aqui -- interveio a matriarca da família.
Nesse momento saiu o rapaz com a cachorra e seu filhote nas mãos.
-- Senhorita ela parece estar machucada na pata.
-- Obrigada -- disse se aproximando a cadela que estava nos braços do rapaz, pegou o filhote no colo, e passou a mão na cabeça da cadela -- Você vai ficar bem menina.
Olávo junto de sua mãe foram conversar com o comandante e agradecer, ao se aproximarem novamente de Júlia que estava agachada, fazendo carinho na cachorra junto do jovem rapaz que retirou-a de dentro do buraco.
-- Ela é uma cadela muito bonita, está bem magra e machucada, a senhorita vai ficar com ela? -- perguntou o jovem com um sorriso aberto brincando com a cachorra.
-- Eu espero que sim, ainda tenho que solicitar permissão -- disse olhando sua avó e seu pai vindo em sua direção, o rapaz percebeu seu olhar e tratou de se despedir.
-- Bom, senhorita eu vou indo, boa sorte com essa meninona -- disse acariciando a cadela e seu filhote que estava no colo de Júlia, a mesma agradeceu e o jovem foi embora.
-- Agora senhorita somos só nós -- disse Olávo assim que se aproximou de Júlia e os cães.
-- Dona Cecília, eu gostaria de saber se posso ficar com ela, e seu filhote -- disse referindo-se aos cães e ignorando o que seu pai lhe dissera.
-- Claro minha filha -- disse se abaixando e entregando seu casaco para sua neta -- o jovem disse que ela está com a patinha machucada não é?
-- Sim, se eu não puder leva-la ao veterinário posso fazer eu mesma o curativo e dentre pouco tempo ela vai estar novinha em folha não é menina bonita?
-- Não sabia que você entendia de cuidado de cães -- disse Olávo que observava a cena.
-- Tem muita coisa que você não sabe a meu respeito Olávo.
Os dois tratavam uma guerra no olhar, Olávo a achava muito petulante mas gostava dessa atitude da filha, mostrava que ela era bem parecida com ele, mas gostaria que ela o reconhecesse como pai e respeitasse, já o olhar de Júlia era um olhar frio no qual demonstrava que ela não era qualquer um que temia a família Lancaster, ela não iria abaixar a cabeça.
Cecília conversava com os dois, pediu que seu filho pegasse a cadela e colocasse-a no carro com cuidado para não machuca-la, e Júlia levou o filhote, era um filhote com pelo preto e algumas manchas amareladas perto dos olhos e pescoço, os olhinhos ainda estavam abrindo, a cadela era toda preta da raça vira-lata.
Seguiram em silêncio para a casa, e a caminho Cecília ligou para Henrique, o jovem que foi criado por eles e cursava medicina veterinária, era filho de um capataz da fazenda que eles possuíam no estado do Paraná, seu pai era um rapaz humilde que faleceu em um acidente de carro junto de sua esposa que era uma mulher arrogante e metida, deixando seu filho Henrique com 16 anos, logo Olávo que sempre gostou de crianças entrou com processo de adoção, criou Henrique como se fosse seu filho.
--Até que enfim chegaram -- exclamou Amanda indo em direção a eles -- Henrique ligou e disse que está a caminho, vai demorar um pouco porque o pneu do seu carro furou.
-- Certo, bom meus queridos eu vou me retirar até meu quarto, assim que Henrique chegar peçam para me chamar -- disse Cecília já subindo as escadas -- Júlia querida, você deve estar com fome, o jantar sai daqui a pouco, vá tomar um banho para descansar.
-- Se não se importa eu gostaria de ficar aqui na sala com a Nina e o Athos.
-- Como quiser -- disse sorrindo e se foi.
Olávo ouviu que sua filha gostaria de ficar na sala com seus cachorros e foi providenciar com os empregados um cobertor para por ao chão para os cães e logo voltou com a cadela nos braços, só então Amanda percebeu que Júlia estava com um cachorro em seus braços.
-- Onde conseguiu esse cachorro? -- perguntou se aproximando.
-- Achei em um bueiro. -- disse seguindo para a sala e se sentando próximo a onde Olávo havia acomodado a mãe do filhote.
-- Já deu um nome a eles? -- Amanda disse olhando o cachorro que ainda estava nos braços de Júlia.
-- Nina e Athos.
-- Athos? -- perguntou com uma careta. -- não tinha nome mais esquisito?
-- Pelo jeito não conhece a história dos três mosqueteiros, Athos, Porthos e Aramis. -- sorriu debochada.
-- E por que Athos? O que tem demais nele?
-- Athos era um dos três mosqueteiros, ele foi um rapaz apaixonado por uma Dama que o traiu, então ele ficou desiludido com o amor.
-- Nossa, e porque esse nome que carrega uma história tão triste?
-- Porque a vida é bem parecida com isso, Amanda. -- disse com um ressentimento na voz -- As pessoas se apaixonam, e são traídas, iludidas.
Olávo que ouvia com um sorriso no rosto por saber que sua filha gostava de uma história que ele adorava, mais uma afinidade. Porem ao ouvir a explicação do porque a escolha do nome do cão percebeu uma amargura na voz da jovem que o preocupou.
Logo foi tirado de seus pensamentos quando ouviu a porta abrir repentinamente. Era Henrique. Tratou logo de chamar uma de suas empregadas para chamar Cecília em seu quarto.
-- Meninas, venham até aqui, Henrique chegou! -- gritou indo em direção dele e o abraçando -- que saudades filho.
-- Também estava com saudades Olávo, onde estão as mulheres da casa?
Henrique era alto do mesmo porte de Olávo com seus 22 anos, seus olhos de um castanho escuro e cabelos de um corte um pouco grande loiro escuro.
Ele sempre foi um galanteador nato, todas as garotas que ele queria ficar assim o fazia, todas menos a Amanda até o momento.
********××××××********
Na sala assim que Amanda ouviu Olávo as chamarem pois Henrique tinha chego revirou os olhos e bufou "Droga, la vem esse moleque chato!". Júlia observava as expressões da ruiva e não entendeu.
Seguiram para a sala a ruiva na frente e a loira em seu encalço, assim que o jovem loiro viu Amanda estampou um sorriso galanteador e abriu os braços indo abraça-la demoradamente, mesmo com a ruiva o empurrando ele sustentou o abraço.
-- Chega Henrique! -- exclamou já vermelha de raiva.
-- Qual é ruivinha, vai dizer que não gosta do abraço de um homem assim bem apertado.
-- Não!
-- Por favor vocês dois -- disse Olávo achando graça dos dois filhos de criação -- Henrique quero te apresentar a minha filha, Júlia.
Só então que Henrique viu a loirinha, está o encarava pela cena que o rapaz fez com a ruiva. O jovem também à analisou com um olhar malicioso, achou a loira linda, pensou que esta seria presa fácil.
-- Um prazer lhe conhecer Júlia, você é linda -- pegou sua mão e deu um beijo demoradamente.
-- Obrigada -- disse puxando sua mão acabando com o contato -- Você é muito gentil.
-- Parabéns Olávo, apesar de todas as fotos que já vi ela é mil vezes melhor pessoalmente.
A expressão de Júlia foi de desagrado devido à cantada descarada. Olávo nem percebeu e apenas sorriu orgulhoso do elogio, já Amanda sorria percebendo o desagrado da loirinha, e feliz por pensar ter se livrado do rapaz.
Cecília desceu as escadas e seu filho foi recebe-la, logo cumprimentou Henrique, e foram para a sala onde os cães estavam.
Depois de um tempo, Henrique fez um curativo na pata machucada da cadela sobre o olhar atento de Júlia.
Ficaram conversando na sala, e Henrique contando como estava levando a vida, ele e Olávo começaram a conversar sobre os negócios da família. Havia duas empresas uma de vinho e outra de joias que Henrique ajudava Olávo. Após um tempo o jantar foi anunciado e todos seguiram para a mesa de jantar.
Olávo designou os lugares a mesa, sua mãe a cabeceira, ele ao seu lado direito, seguido de Júlia. De frente para ele estava Henrique e Amanda ao seu lado com expressão de desagrado, definitivamente a ruiva não gostava do rapaz.
Conversaram amenidades até que o jovem tentou se aparecer para conquistar a loirinha.
-- Júlia depois gostaria de te ensinar a fazer o curativo na cadela.
-- Não será preciso Henrique, digamos que sei fazer um curativo.
-- Não duvido que saiba -- Henrique não gostou de sua resposta, ele como Olávo odiava receber um não como resposta -- mas posso te ensinar um melhor.
-- Como disse não será preciso.
Henrique ficou levemente irritado com a recusa, mas não desistiria tão fácil, e apelaria para o consentimento do pai de Júlia, ainda mais por ela ser a legítima herdeira da família, seria bem melhor ficar com ela do que com Amanda, foi com esses pensamentos que pronunciou:
-- Olávo sua filha é muito linda, logo te ajudará a assumir os negócios da família, já decidiu seu futuro?
-- Realmente ela é linda não é? Bom logo se ela me ajudar nos negócios será ótimo, referente ao seu futuro tenho alguns plan... -- foi interrompido por sua mãe.
-- Seria um prazer se minha neta se interessasse pelos negócios da família, mas creio que agora esse não é o momento -- disse piscando para Júlia que se manteve calada apenas se concentrando para não explodir de irritação -- e sobre ter planos para ela, não temos nenhum pois ela sabe o que é melhor pra si.
-- Acredito que sim, mas e sobre um bom partido? Seria ótimo se ela se interessasse por alguém de sua confiança não acha Olávo?
-- Se controle Henrique – disse Olávo sorrindo -- ela é apenas uma menina. Respeite por favor.
-- Estou respeitando Olávo, mas ela já tem 17 anos, logo estará namorando, e nada melhor do que alguém que vocês conheçam, eu adoraria conhece-la, você não aprovaria Olávo?
-- Seria um prazer ter você como genro além de filho de coração. – falou com sinceridade olhando para o rapaz a sua frente.
Júlia escutava aquela conversa com o maxilar cerrado, não acreditava no que estava ouvindo, era o que faltava... um babaca para lhe cantar. Respirou fundo vestindo sua armadura. Amanda percebeu por sua feição que estava no limite da sua paciencia e a olhava tentando passar alguma mensagem com o olhar para que a loira se acalmasse, mas nem ela estava calma, pois não acreditava no descaramento de Henrique.
-- Olha só, você poderia ter até um prazer de ter Henrique como genro, mas para isso teria que ter outra filha Olávo -- Júlia se manifestou tentando controlar sua voz -- e quanto a você Henrique, não se iluda pois nunca ficaria com você. Caso não saiba meu caro, eu sou LÉSBICA, entendeu? Espero não precisar soletrar.
Disse firme espantando todos na mesa exceto sua avó que já sabia.
Amanda que bebia seu suco ao ouvir o que a jovem revelou na mesa a frente de todos se engasgou tossindo um pouco, já Henrique ficou sem reação.
-- Como disse Júlia? -- perguntou Olávo ainda em choque com o que ouviu.
-- Isso que escutou Olávo, sou lésbica, algum problema em ter uma filha lésbica? Pensei que tivesse investigado sobre mim, mas vejo que não. -- olhou para sua avó e indagou -- Dona Cecília, pensei que tivesse dito.
-- Não filha, esse era um assunto para vocês discutirem, eu te aceito e é o que importa, e tenho certeza que seu pai não será um ignorante em relação a isso.
-- Então Olávo, te incomoda eu ser lésbica? -- disse provocando com um olhar desafiador.
Todos esperavam a explosão de Olávo, esse respirou fundo e bebeu um gole de água, passou um breve momento então se manifestou.
-- Não há problema algum Júlia, confesso que não esperava isso, mas você continua sendo minha filha, e eu esperei muito tempo para te ter ao meu lado e não vou desperdiçar com preconceitos idiotas.
Júlia com certeza não esperava essa reação de seu pai, agora foi sua vez de ficar em choque, já sua avó sorria de felicidade, sabia que esse tipo de preconceito seu filho não possuía.
-- Nunca mais tentem planejar meu futuro, ouviram? Só quem tem esse direito sou eu mesma, dona de minha vida. -- disse Júlia já recuperada do choque e ainda trajando sua armadura de frieza -- E você Henrique, foi chamado hoje aqui para cuidar dos meus cachorros e não para tentar cantar a filha do senhor Lancaster, mas vejo que nem sua faculdade está cursando não é mesmo?
O rapaz arregalou os olhos ficando pálido, Júlia sorriu de canto de boca sabendo que atingiu seu alvo, Amanda, Olávo e Cecília não entenderam.
-- O... o que você. .. quer dizer? -- perguntou gaguejando.
-- Ora por favor Henrique não se faça de desentendido, estou dizendo que você não está mais cursando a faculdade que meu pai paga para você -- percebeu que tinha chamado Olávo de pai mas já não tinha como voltar atrás -- se é que algum dia já fez não é?
-- Do que você está falando Júlia? -- interrompeu Olávo.
-- Olá...vo eu... -- Henrique disse e respirou fundo -- eu iria contar isso pra você hoje.
-- Contar o que Henrique?
-- Eu tive que parar a faculdade de veterinária, mas posso te explicar, podemos ir ao seu escritório?
-- Claro, venha comigo -- disse se levantando da mesa e pedindo licença a todos, já Henrique levantou-se calado e o seguiu.
Júlia viu eles se retirarem e ficou perdida em seus pensamentos "Como eu pude chama-lo de pai? Saiu sem querer, mas que droga!" Foi tirada de seus pensamentos por sua avó.
-- Como soube que Henrique tinha parado com a faculdade?
-- Ah... pelo jeito que ele "examinou" a Nina e o curativo que fez, coisa de principiante.
-- Nunca o vi ficar tão sem jeito -- disse Amanda rindo.
-- Com licença, vou para meu quarto -- disse Júlia ainda estava irritada com ela mesma por ter chamado Olávo de pai.
********××××××********
Júlia seguiu para seu quarto tomou seu banho e se arrumou para dormir, seu joelho que fisgou quando caiu no bueiro já não doía mais. Adormeceu pensando em toda sua vida.
"Paul eu sinto muito a sua falta." foi a ultima coisa que pensou antes de ser vencida pelo cansaço.
********××××××********
Amanda continuou conversando com Cecília e depois seguiu para seu quarto, afinal no outro dia tinha aula.
Júlia ter chamado Olávo de pai não tinha passado despercebido por Cecília, que ficou radiante ao perceber que aos poucos Júlia aceitaria esse fato.
No escritório Henrique e Olávo conversavam, o jovem rapaz convenceu o homem que teve que parar por uns problemas que teve com a universidade e o dinheiro que recebeu investiu. Olávo acreditou no rapaz e foi compreensivo.
Amanda no seu quarto ficou pensando em como Júlia era destemida, aquela pose dela chegava a irritar a ruivinha, mas ficou admirada com a atitude da loira.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Sem comentários
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook: