Capítulo 9

 

Érika estava dormindo tranquilamente ao lado de Luiza, que havia acordado durante a noite e não mais conseguiu dormir. Luiza estava pensativa e não parava de pensar numa certa ruiva. Érika tinha um braço ao redor da cintura da prima e a abraçava de forma protetora. Luiza fez um esforço para enxergar a prima naquela penumbra, mas apenas os cabos loiros de Érika se sobressaíam em meio aquela escuridão. Luiza fez uma leve carícia no cabelo da prima e sorriu tristemente. 

 

"Seria mais fácil se fosse você, Érika"

 

Luiza viu a dia amanhecer perdida em pensamentos. Estava com os olhos fechados e tentava voltar a dormir, mas estava difícil. A porta do quarto de Érika foi aberta de forma delicada e um pequeno furacão entrou por ela. Carol sorriu com um cantinho da boca. Ficou um tempo observando as meninas e depois correu em direção a cama se jogando em cima delas. Luiza abriu os olhos assustada e Érika estava visivelmente perdida. 

 

-- Carol, que susto! - disse Luiza. 

 

-- Oi maninha, meu amor! - disse com um sorriso sapeca. 

 

Érika finalmente se encontrou e olhou para a baixinha a fuzilando. 

 

-- Porr* sua tampinha! Isso é jeito de acordar os outros e ainda mais a essa hora? - falou irritada. 

 

-- É legal isso. E já são nove horas... 

 

Érika arregalou os olhos e pegou o relógio que estava na cabeceira. 

 

-- Sua idiota, são seis e meia! - disse bufando e levantando - Boa madrugada pra vocês! - saiu do quarto irritada. 

 

-- Essa Érika é comédia demais - Carol falou rindo. 

 

-- Carol acordar as pessoas desse jeito não é legal. 

 

A baixinha observou a irmã e percebeu os olhos inchados. 

 

-- Mamãe disse que você não estava bem e que dormiria com a Érika, isso por si só já é estranho demais... Fiquei preocupada. O que realmente aconteceu, Luiza? 

 

Luiza respirou fundo. 

 

-- Ok, vou te falar... 

 

Luiza contou tudo o que havia acontecido a irmã, as vezes tinha que secar as lágrimas. Carol segurava a mão da menina com carinho. Depois que Luiza acabou de falar,  Carol a abraçou apertado. Ficaram longos minutos assim. 

 

-- Você precisa escutar o que a ruiva tem a dizer...

 

-- Eu sei, mas agora não me sinto bem para vê-la - disse olhando fixamente para os desenhos no lençol da cama. 

 

-- É... Você tem esse direito - Carol falou pensativa - Mas aquela carniça da Daniela é uma cobra mesmo. Não aguento essa criatura. Se eu desejar que um raio a acerte em cheio, será um desejo ruim? 

 

Luiza riu. 

 

-- Não podemos desejar o mal das pessoas,  Carol. 

 

-- Mas no caso a Daniela não é pessoa...  Aquilo é um “abutle”.

 

-- É abutre Carol, e não devemos desejar o mal ao próximo.

 

Carol revirou os olhos. 

 

-- Que saco hein... Vou até assistir um desenho pra distrair um pouco - disse ligando a TV. 

 

Luiza deitou no colo da irmã. Carol fazia Cafuné em seus cabelos, com os olhos fixos na TV, foi assim durante todo o dia. 

 

***************

 

Rebecca não conseguiu dormir, seus pensamentos estavam todos em Luiza. A ruiva foi na casa da garota para tentar conversar, mas para sua decepção, Luiza não estava lá. Voltou para a casa cabisbaixa e para sua surpresa tinha alguém lhe esperando em frente ao portão da mansão. A menina respirou fundo e saiu do carro para ser educada com a visita inesperada. 

 

Marcelo quando a viu deu seu melhor sorriso e caminhou em sua direção a abraçando e beijando. A ruiva se afastou delicadamente. 

 

-- Marcelo que surpresa! 

 

-- Eu espero que seja uma surpresa boa. 

 

Rebecca forçou um sorriso. 

 

-- Claro. 

 

-- Eu gostaria de conversar com você... - disse timidamente. 

 

Rebecca não queria conversar com ninguém que não fosse Luiza, mas a menina não queria ser grossa com Marcelo e por isso concordou. O menino a convidou para irem em seu carro e a ruiva assentiu sem ânimo. Marcelo a levou na mesma sorveteria que Luiza a tinha levado e isso trouxe lembranças a menina. Algumas pessoas olhavam para os dois e cochichavam, isso estava deixando a ruiva muito incomodada e Marcelo percebeu. 

 

-- Ignore essas pessoas, minha linda... 

 

Marcelo tentou segurar a mão da ruiva que estava sobre a mesa, mas ela retirou a mão de forma delicada. O menino ficou triste com o gesto. 

 

-- O que você quer conversar, Marcelo? - disse direta. 

 

Marcelo a fitou com aqueles olhos azuis como o céu. 

 

-- Rebecca eu posso ter qualquer tipo de esperança em relação a nós dois? - o menino também foi direto. 

 

Rebecca desvio os olhos, que ficaram fixos nas folhas das árvores que balançavam por causa do vento. Folhas verdes... Verdes, como os olhos de Luiza. Sorriu com esse pensamento. 

 

-- Marcelo você é um garoto muito legal e tenho certeza que não tem nenhum tipo de dificuldade com qualquer garota - suspirou - Mas eu só consigo te enxerga como um amigo e nunca teremos algo mais do que uma amizade. Sinto muito, mas não posso te iludir - disse sincera e o encarando. 

 

-- Poxa, mas a gente já é amigos e poderíamos tentar... Tenho certeza que posso te conquistar é só você me dá uma oportunidade - insistiu. 

 

-- Não posso e não quero.

 

-- Por que? 

 

-- Porque eu gosto de outra pessoa - Rebecca achou melhor dizer a verdade. 

 

Marcelo ficou um tempo em silêncio. Estava pensativo. A ruiva voltou a se distrair com as folhas das árvores. 

 

-- Eu invejo esse cara... 

 

Rebecca o encarou e sorriu. 

 

"Você inveja uma garota, Marcelo. A menina mais linda que conheci na minha vida. Luiza!"

 

-- Você irá conhecer alguém digna dos seus sentimentos e será correspondido. 

 

-- Assim eu espero - sorriu. 

 

Os dois conversaram sobre coisas banais e o papo fico um pouco descontraído. Marcelo foi levar a ruiva de volta para casa. 

 

"É Marcelo, pelo visto com essa, você não tem nenhuma chance. Melhor eu tentar esquecê-la, antes que eu sofra mais"

 

***************

 

-- Érika você viu a cha.... - Fernando havia entrado no quarto da irmã sem bater e ficou estático quando viu quem estava ali. 

 

Luiza estava penteando os cabelos e levou um susto quando Fernando entrou no quarto daquela maneira tão brusca. Estava sozinha, pois Carol havia ido comer alguma coisa com a tia. 

 

Fernando sorriu com malícia. 

 

-- Oras, se não é minha prima favorita que está aqui... O que faz por aqui a essa hora? 

 

Luiza evitava encarar o garoto. 

 

-- Eu dormir aqui. 

 

-- Ah, como eu não fiquei sabendo disso - lamentou - Nós poderíamos ter brincando a noite toda... 

 

Luiza fez uma cara de nojo. 

 

-- Nunca que deixaria você chegar perto de mim.

 

-- Luiza... Você poderia me aceitar. Assim você ficava curada dessa doença que você tem de gostar de garotas.

 

Luiza se irritou e encarou o garoto. 

 

-- Você é desprezível, Fernando! Eu não tenho doença alguma! O único doente aqui é você! - tentava se controlar para não gritar. 

 

-- Luiza... Qualquer menina que prove disse aqui - disse segurando as partes íntimas - Não consegue resistir, elas adoram e pedem por mais... Tenho certeza que quando você provar vai ficar viciada e vai querer dá pra mim todos os dias - disse sorrindo malicioso. 

 

A menina sentiu ânsia de vômito. 

 

-- Você é um ser humano asqueroso, Fernando. Qualquer menina que se prese, jamais ficaria com um homem como você. Se você acha que vai conseguir mudar o que eu sou apenas por sex*, fique sabendo que está enganado. Eu espero que nenhuma menina fique com você, pois sinceramente nenhuma merece ter uma pessoa como você por perto. Seja um pouco mais humano e tenta se inspirar no seu irmão, porque ele sim, é digno de ter uma mulher maravilhosa, já você... - fez cara de nojo - Talvez só mereça as putas que tem por aí e nunca me compare a essas meninas ridículas que você fica! A única coisa que você desperta dentro de mim é nojo!...  Quero distância de você! Vai se tratar, pois tá precisando!

 

Fernando estava com a respiração alterada e apertava as mãos que estavam fechadas. 

 

-- Sua... 

 

Antes que ele pudesse falar qualquer coisa a porta se abriu e Carol entrou percebendo o clima pesado que estava ali. 

 

-- O que... 

 

-- Cala essa boca! - rosnou o garoto.

 

Fernando passou pela baixinha como um furacão e bateu a porta fortemente. 

 

-- Luiza você está bem? 

 

Carol perguntou preocupada, pois percebeu que Luiza estava tremendo. Abraçou a irmã. 

 

-- Eu odeio o Fernando... Sinto um imenso desprezo por ele - disse com raiva. 

 

-- Então somos duas. 

 

-- Cadê a Érika? 

 

--  A tia Marta disse que ela saiu faz pouco tempo. 

 

-- Acho melhor a gente voltar pra casa,  quero ficar o mais longe possível desse garoto.

 

-- É melhor mesmo - Carol disse soltando a irmã. 

 

***************

 

-- Maldita! - Fernando gritou irado, chutando a cadeira que ficava no quarto. 

 

Felipe se assustou com a fúria do irmão. 

 

-- Que isso Cara, enlouqueceu? 

 

-- Aquela vagabunda da Luiza! - estava descontrolado. 

 

-- Você não devia falar assim da nossa prima, Fernando. Você deveria respeitá-la, Luiza é uma menina de respeito. 

 

Fernando gargalhou. 

 

-- Respeito? Piada né... Ela não passa de uma lésbica imunda! 

 

-- Não vejo nada demais nisso - Felipe disse ajeitando os óculos - Isso não faz dela uma pessoa inferior e que mereça ser xingada. 

 

-- Você é um otário, Felipe! Nem parece meu irmão e ainda por cima gêmeo. Não passa de um mané, eu nem fico surpreso de você ainda ser um virgem. 

 

-- Não gosto de usar as garotas como você. Ainda vou encontrar a menina certa para mim e não preciso ficar com qualquer uma. 

 

-- Felipe tu precisa mesmo e comer esse bando de piranhas! Mulher nasceu pra ser comida por nós e ser submissa também. 

 

-- Acorda, Fernando. Estamos no século XXI. As mulheres já são donas do seu próprio nariz e tem o direito de escolher com quem ficar. Elas não são objetos. Esses tipos de pensamentos como o seu são ridículos. 

 

Felipe saiu e deixou o irmão sozinho remoendo toda a raiva que estava sentindo. 

 

"Um dia você vai se arrepender amargamente, Luiza! Eu juro!"

 

*************

 

Rebecca desceu do carro de Marcelo e acenou para ele. Estava quase entrando em casa quando escutou aquela voz conhecida. 

 

-- Rebecca! 

 

A ruiva virou-se para encarar aqueles olhos verdes, tão parecidos com os de Luiza. 

 

-- Érika... - disse surpresa. 

 

-- Continua amiguinha do Marcelo - disse irônica. 

 

Rebecca ficou séria. Lembrou que não gostava de Érika. 

 

-- O que você quer? 

 

-- Precisamos conversar! - disse seriamente.

 

-- Não tenho nada pra falar com você, Érika. Nem nos damos bem.

 

-- Não precisa me lembrar de algo que é óbvio. Eu quero falar sobre a Luiza. 

 

A ruiva a encarou curiosa.

 

-- O que você tem para falar sobre a Luiza? 

 

-- Será que podemos conversar em outro lugar? - disse olhando em volta. 

 

-- Claro, Érika. Entre por favor, vamos para o meu quarto. 

 

As duas ficaram em silêncio durante todo o caminho até o quarto da ruiva. Érika entrou e Rebecca fechou a porta. O silêncio ainda persistia enquanto Érika observava tudo ao redor. 

 

"Nossa, que luxo"

 

-- Sente-se - Rebecca apontou uma poltrona e sentou em outra. 

 

Érika também se sentou.

 

-- Então, o que você tem a dizer sobre a Luiza? 

 

-- Nunca pensei que um dia faria isso - disse a loira irônica. 

 

-- Faria o que? - Rebecca estava curiosa. 

 

-- O que eu disser aqui ficará aqui. Sei que você não vai espalhar tudo por aí,  ruiva. Você é uma pessoa confiável. Não me atrapalhe enquanto eu estiver falando, ok? 

 

Rebecca fez sinal afirmativo. 

 

-- Não gosto de enrolar, por tanto irei direto ao ponto. Há algum tempo atrás eu e a Luiza nos envolvemos.... 

 

Rebecca arregalou os olhos. 

 

-- Éramos novinhas e sempre fomos muito unidas e a Luiza foi a primeira menina que eu beijei e eu fui a primeira dela também. Tudo foi intenso entre a gente... E isso durou alguns meses, até a Luiza colocar um fim naquilo... - disse pensativa - Eu já estava completamente envolvida por ela, mas o sentimento não era recíproco. Luiza se sentia culpada, pois eu realmente estava sofrendo e como resultado de tudo isso eu resolvi me afastar dela. Nossa relação nunca mais foi a mesma, apesar dela ter se esforçado para se reaproximar, mas eu me fechei em meu mundo e não deixei mais ela entrar. 

 

Rebecca estava de boca aberta. 

 

-- Então você ainda... 

 

-- O que eu disse sobre não me atrapalhar... É surda, ruiva? 

 

Rebecca se calou. 

 

-- Sim, eu ainda gosto da Luiza e acredite, já tentei esquecê-la de todas as maneiras possíveis. Foram tantas meninas.... Mas nenhuma conseguiu me fazer esquecê-la... Eu também namorei rapazes, não queria que minha família tivesse qualquer desconfiança sobre mim... Fico imaginando a decepção da minha mãe... Infelizmente nem toda a família é como a de Luiza...  Eu sou adotada, Rebecca. Minha mãe teve problemas no parto dos gêmeos e não pôde mais engravidar. Ela sempre sonhou em ter uma menina e conseguiu depois de um tempo convencer o Júlio a adotarem. Eu tinha três anos quando cheguei na vida daquelas pessoas, não lembro de nada da minha época do orfanato, todas as minhas lembranças são com minha família. Fui muito bem recebida por todos, menos pelo Júlio, ele nunca me considerou uma filha e eu por consequência nunca o considerei um pai. Júlio só me aceitou por causa da minha mãe... Ele nunca gostou de mim e eu nunca entendi o porquê, pois sempre fui uma menina brilhante que nunca deu trabalho, que tinha boas notas... Quando eu era criança sentia falta do carinho dele, pois ele só dava atenção para os meus irmãos... Depois que cresci finalmente entendi que ele só aceitava os filhos legítimos dele - disse com mágoa - No fundo ele sempre vai me ver como a garotinha  que foi adotada... Imagina quando ele souber que sou lésbica... Será o fim... - Érika lágrimava. 

 

Rebecca não sabia o que falar e Érika acabou sorrindo da cara da garota. 

 

-- Eu nem vim aqui para falar disso, mas acho que estava precisando desabafar... E eu vi você com essa cara de pastel e te escolhi - sorriu. 

 

A ruiva percebeu que não havia deboche naquele sorriso e também sorriu. 

 

-- Você ama a Luiza, Rebecca? - Érika perguntou a encarando seriamente. 

 

Rebecca também a encarou.

 

-- Amo...  Eu amo muito a Luiza - disse sincera com os olhos brilhando. 

 

-- É meio improvável não gostar da Luiza...  Pois fique sabendo que você é correspondida da mesma forma. Portanto, acho bom você ir atrás da Luiza. 

 

Rebecca abriu o mais lindo dos sorrisos. 

 

-- Ela também me ama? - perguntou encantada. 

 

-- Sim... Eu nunca vi ela gostar de alguém como gosta de você...

 

-- Eu quero tanto ficar com ela,  Érika. 

 

-- Então fique, vocês merecem. Só não a Magoei... Isso não é nada legal. 

 

-- Eu só quero fazer a Luiza feliz. 

 

-- Isso é bom...  Eu vim aqui pra te falar algumas coisas também...

 

Rebecca ficou séria. 

 

-- O que? 

 

-- É sobre a Daniela... Eu e ela somos amigas, mas o que a Dani tá fazendo é loucura... Rebecca tenha cuidado... Só quero abrir teus olhos... Eu e a Dani fizemos uma coisa nada legal no passado. 

 

-- Do que você está falando? 

 

-- Bom, foi isso que vim falar aqui...  Quando a Dani se envolveu com você houve um... 

 

-- Oras, mas será que estou atrapalhando essa conversa tão íntima?

 

Érika ficou de pé assustada e Rebecca também. Ambas olharam para a morena que estava perto da porta. Daniela tinha os olhos fixos na amiga. Érika ficou com receio daquele olhar. 

 

-- Posso saber o que as duas estavam conversando? - disse se aproximando. 

 

Érika afastou-se rapidamente. 

 

-- Eu preciso ir... Lembrei que tenho que sair com minha mãe - disse nervosa e sumiu dali. 

 

Rebecca ficou sozinha com Daniela. 

 

-- O que vocês tavam conversando? 

 

-- Isso não te interessa, Daniela. Aliás, o que você está fazendo aqui? 

 

-- Esqueceu da festa hoje? Vim te ajudar com a roupa. 

 

Rebecca bufou. Havia esquecido da maldita festa. 

 

-- Vai precisar de ajuda? 

 

-- Não. 

 

-- Ótimo, porque eu preciso resolver uma coisa com urgência. Depois eu volto.

 

Rebecca ficou sozinha e pensativa, estava suspeitando de alguma coisa. Érika havia ficado muito nervosa com a presença de Daniela, isso era muitíssimo estranho. Queria saber o que ela tinha a lhe dizer. Não conseguia acreditar que a loira amava Luiza. A ruiva estava muito confusa com todas aquelas revelações. 

 

Daniela andava a passo largos em direção a casa da amiga. 

 

"Vamos resolver esse assunto agora mesmo, Érika!"

 

A morena estava queimando de raiva. 

 

 

Fim do capítulo