• Home
  • Recentes
  • Finalizadas
  • Cadastro
  • Publicar história
Logo
Login
Cadastrar
  • Home
  • Histórias
    • Recentes
    • Finalizadas
    • Top Listas - Rankings
    • Desafios
    • Degustações
  • Comunidade
    • Autores
    • Membros
  • Promoções
  • Sobre o Lettera
    • Regras do site
    • Ajuda
    • Quem Somos
    • Revista Léssica
    • Wallpapers
    • Notícias
  • Como doar
  • Loja
  • Livros
  • Finalizadas
  • Contato
  • Home
  • Histórias
  • Pentimentos
  • Capítulo 1

Info

Membros ativos: 9524
Membros inativos: 1634
Histórias: 1969
Capítulos: 20,491
Palavras: 51,957,181
Autores: 780
Comentários: 106,291
Comentaristas: 2559
Membro recente: Thalita31

Saiba como ajudar o Lettera

Ajude o Lettera

Notícias

  • 10 anos de Lettera
    Em 15/09/2025
  • Livro 2121 já à venda
    Em 30/07/2025

Categorias

  • Romances (855)
  • Contos (471)
  • Poemas (236)
  • Cronicas (224)
  • Desafios (182)
  • Degustações (29)
  • Natal (7)
  • Resenhas (1)

Recentes

  • Entre nos - Sussurros de magia
    Entre nos - Sussurros de magia
    Por anifahell
  • 34
    34
    Por Luciane Ribeiro

Redes Sociais

  • Página do Lettera

  • Grupo do Lettera

  • Site Schwinden

Finalizadas

  • A nova professora
    A nova professora
    Por Bia Ramos
  • Ela será amada
    Ela será amada
    Por Bruna 27

Saiba como ajudar o Lettera

Ajude o Lettera

Categorias

  • Romances (855)
  • Contos (471)
  • Poemas (236)
  • Cronicas (224)
  • Desafios (182)
  • Degustações (29)
  • Natal (7)
  • Resenhas (1)

Pentimentos por Cidajack

Ver comentários: 10

Ver lista de capítulos

Palavras: 7819
Acessos: 3338   |  Postado em: 00/00/0000

Capítulo 1

Todos os dias ela tinha que passar por aquele trecho, sob o elevado. Não gostava de parar nos faróis e várias vezes os avançavam. Receava que aquelas pessoas "acampadas" sob os nichos do viaduto pudessem atacá-la.

 

Naquela manhã, porém, fez o trecho e nem se deu conta das vezes em que parou ao sinal vermelho, demorando para perceber quando ficava verde. Os olhos azuis sob os óculos escuros eram deslumbrantes, porém sem brilho.

 

Luciana estava de saco cheio com a sua vida. Não tinha mais sentido o que fazia. Todo santo dia ir para o hospital, visitar um leito ou outro, assinar papéis, fazer reuniões sobre custos e verbas e depois, ao fim do dia, não querer voltar prá casa ou, como só tinha este lugar para ir, querer voltar correndo.

 

Sem amigos, sem parentes, um monte de empregados, gente para paparicá-la por interesse. Como gostara desta vida, logo que a começou. Porém, agora, não fazia mais sentido.

 

Resolveu que faria uma viagem. Solidão completa. Talvez Nova Zelândia, Austrália, qualquer lugar bem longe. Fecharia a casa, dispensaria todos os empregados e partiria.

 

Entrou no hospital. Falou com sua secretária e pediu uma reunião. Queria saber como poderia iniciar o processo de reformulação administrativa, não só do hospital, mas do grupo de empresas ligadas à área de previdência privada.

 

Naquela noite, ficara até mais tarde e quando chegou em casa, mesmo cansada, fez toda a sua rotina de exercícios. Nem era por vaidade, mas por hábito. Gostava de ter o corpo em forma.

 

Nua, observou seu corpo no espelho e não pode deixar de gostar do que viu. Alta, mais de 1,80 m. pernas esculturais, cabelos negros, olhos de um azul irregular, rosto arredondado, com as maçãs salientes. Aos 37 anos, estava em forma. Foi apenas uma constatação, pois não fazia a menor diferença que ela fosse a beleza que era.

 

Não acreditava em ninguém. Nenhum homem lhe inspirava confiança no amor. Sempre achava que a ganância e a cobiça estavam sob os suspiros apaixonados. Antes, até achava divertido seduzir, usar e abandonar. Mas, como tudo, isto também deixou de ser interessante.

 

As perdas que aconteceram em sua vida, deixaram-na sem qualquer vontade de atar relações. As dores que sentira, não as queria novamente.

 

Raramente dormia antes de vagar pela mansão enorme e se decidir por algum quarto para dormir. Todos os quartos estavam sempre arrumados, pois ela nunca dormia no mesmo. Até isto ela resolvera fazer, a exemplo da Rainha Cristina, para dar um pouco de escolha em sua vida.

 

Ir para o hospital era como sinalizar para ela mesma que ainda estava viva. Gostava de ser médica, embora não exercesse mais, ficando mais com parte administrativa e filantrópica. Teve seu passado de grande cirurgiã.

 

Luciana era independente. Dirigia seu próprio carro, embora possuísse um motorista. Tinha sido alertada para a onda de seqüestros que a cidade atravessava, mas nunca ligou. Sua única defesa era o carro ser blindado e ela possuir porte de arma. Era exímia atiradora. De resto, o destino é que saberia qual era a sua sina.

 

Estava bem mais atenta do que na manhã anterior. Assim, quando foi obrigada a parar sob o tal viaduto, pode observar melhor as pessoas que estavam sob ele. Eram famílias. Adultos e crianças. Tinham feito um lar, com direito a sofá e até cachorros de estimação.

 

Ela desviou o olhar. Não suportava ver aquelas pessoas. Aquelas crianças vivendo. Eram 10 sinais, eram tantas famílias sob o viaduto. Protegida em sua couraça blindada, atrás das películas escuras que cobriam os vidros, Luciana estava salva.

 

Reparou em uma roda de crianças maltrapilhas. O que lhe chamou a atenção foi a moça que retia as crianças ao seu redor. Parecia que ela estava feliz de estar ali. Sorria e contava algo para as crianças, que riam muito.

 

Ficou pensando que ali estava alguém miserável e sorrindo. Ela, com toda a sua riqueza e conforto, não conseguia mais dar uma boa risada. "Mas duvido que você queira trocar de lugar com ela", pensou e foi o último pensamento gasto com a situação sócio--econômica.

 

Deste dia em diante, Luciana passou a reparar que sempre via a tal moça perambulando pelas ruas que beiravam o elevado. Ora rodeada de crianças, ora querendo lavar algum vidro de carro, ora com papelões; enfim, sempre com alguma ocupação e com o sorriso no rosto. Ela fazia sucesso com as pessoas dos carros e sempre levava um trocado.

 

Certo dia, Luciana parou no farol e percebeu que ela se aproximava do carro. Não precisava, mas abriu o vidro e deparou com olhos verdes iluminados por um sorriso que, descontando as condições precárias de vida, era muito bonito.

 

-- Carrão, em dona! Deve correr prá caramba, né?

 

Subitamente, Luciana fechou o vidro e deu partida no carro. Pensava na loucura que tinha feito, abrindo sua guarda daquela maneira. A moça estava com uma espécie de cajado e Luciana temeu sofrer alguma represália posteriormente. Ouvira e lera sobre várias agressões gratuitas. Por mais que soubesse se defender, não iria usar de armas contra aquelas pessoas.

 

Tentou fazer outro caminho, mas tinha que dar muitas voltas pela cidade. Detestava ser desviada de sua rotina, ainda por cima, contra sua vontade. Voltou ao seu itinerário habitual.

 

Por duas ou três vezes, cruzou com a mocinha novamente. Pensou que ela era bonita, se fosse cuidada. "Que olhos!".

 

 

 

 

 

Quando seus pais quiseram ir para cidade grande, tentar a vida, Rebecca gostou da idéia. A vida lá no campo era boa, mas dura. Tinham sua casinha, comida, mas vez ou outra, o tempo provocava um estrago e tudo era perdido.

 

Ela e a irmã mais nova não tinham outra perspectiva, que não seguir os pais. Foi assim que viram o pai se desfazer das terras, arrumar um dinheiro e rumar para a região mais abastada do país. Não tinham muita idéia do que os esperava, mas sabia que seria melhor assim.

 

Com toda a simplicidade, fizeram a peregrinação. Sofreram toda sorte de infortúnios. Quando, finalmente, chegaram a "terra prometida" esta já não era tão maravilhosa. Porém, não tinham mais como voltar. O pouco que tinham, conseguiram dispor para morarem em uma casa de pensão. Todos saíram em busca de trabalho. Em breve, o dinheiro acabou,  foram despejados. Estavam na rua.

 

Aprenderam a sobreviver, como todos os outros que ali estavam. As meninas, para ter um pouco de segurança, andavam armadas com os pedaços de pau e seus cachorros, que além de amigos, eram fiéis guardiões.

 

O pai era esperto e com o tempo, com caixotes, começou a fazer pequenas mobílias e casinhas. Assim, a vida delas era catar caixotes e paletes para a confecção dos trabalhos do pai.

 

Rebecca era mais esperta do que a irmã e se dera melhor nas ruas. Estava sempre alegre, apesar dos imprevistos. Às vezes, a polícia era implacável e elas tinham que fugir mesmo. Outras vezes, os próprios moradores da rua as escorraçavam.

 

Chegaram a invadir um prédio abandonado, junto com outras famílias e foi uma guerra com toda sorte de gente. Numa dessas vezes, ao fugir da polícia, Rebecca perdera-se de seus familiares. Conseguiu até retornar ao local onde ficavam, mas não mais os encontrou. Houve um despejo e as famílias foram dispersas.

 

Atravessou a cidade e resolveu ficar perto do centro, onde tinham mais teatros e cinemas. Gostava de ver os cartazes. Seu sonho era ser escritora de peças. Sabia como ninguém contar uma estória. Aprendera a ler e escrever na escolinha da sua cidadezinha.

 

Fez amizade com um rapaz. Depois se envolveram e ele a ensinou a manobrar carros, desta forma ganhavam trocados e até conheciam os artistas e pessoas famosas.

 

Os dois vagavam pelas ruas. Se amavam mesmo e se protegiam. Era tudo muito selvagem e violento. Várias vezes, outros elementos os atacavam. Nem sempre sabiam quem eram os inimigos. Ora eram salvos pelos travestis e, às vezes, agredidos por eles.

 

Um deles, chamado Renée, ajudou--os certa vez, quando espancaram Pedro e ele quase morreu. Ele acolheu os dois e, quando Pedro se recuperou, tornaram-se grandes amigos.

 

Assim, Rebecca ficava pelas ruas durante o dia e, à noite, dormia num barraco no fundo da casa de Renée. Isto quando não vagasse pela noite, sentindo a brisa e a poluição da cidade, que aprendera a gostar. Tinha fé de que a vida iria melhorar.

 

Incomodava--a o fato de estar com 20 anos e não saber como virar a sua vida. Renée chegou a comentar que ela era uma moça bonita, de uma beleza meio fora dos padrões, com seus olhos verdes e cabelos loiros; desta forma, poderia arrumar "padrinhos" e "se dar bem".

 

Não era tonta e entendera o recado, mas não queria que fosse assim. Não sabia como, mas não queria que fosse desta forma. Nem era pelo fato de obter coisas através do corpo...tinha que pensar mais, mais do que vinha pensando.  Pedro seria uma opção, se ela quisesse se deixar prender por alguém. Além é claro do próprio fato de ser ele um desmiolado. Alguém com o qual ela jamais poderia contar.

 

Não era uma vida confortável, com certeza, mas tinha algumas coisas que a obrigavam a admitir que sua vida tinha lados positivos. Ao menos, era livre.

 

Contava estórias para as crianças de rua. Vendia balas, lavava os vidros dos carros...isto é, quando deixavam. Os homens eram mais legais, porém mais cheios de segundas intenções.

 

Há alguns meses, fixara-se na mesma avenida, sob o grande elevado. Olhava os carros e brincava com as crianças para saber qual daqueles eles queriam.  A imaginação corria solta. E, um dia, um deles acionou todo o imaginário. Era um carro totalmente negro: lataria e vidros. Ele passava no máximo duas vezes ao dia. De um lado e de outro da avenida. Quase sempre, avançava os sinais. Era lindo. Rebecca ficara imaginando quem o dirigia.

 

Naquela manhã, decidira se aproximar do carro. Queria tocar nele. Imaginava-se nele. Sendo ela a pessoa que o dirigia, e que ele a conduzia para um outro mundo.

 

Para sua surpresa, o vidro foi abrindo-se lentamente. Seu coração disparou. Ela iria ver quem o dirigia. Que homem poderoso o conduzia. Aproximou-se com cuidado. Conforme o vidro negro ia abaixando, a figura que se delineava era deslumbrante. Rebecca viu-se diante de olhos azuis tão surpresos quanto ela própria. Um rosto lindo, forte e...para seu espanto, uma mulher. De repente, ela viu medo e desprezo naqueles olhos e sem saber o que dizer, fez o comentário sobre o carro. O sinal abriu, a janela fechou,  o carro partiu e Rebecca tinha uma nova estória na cabeça. O carro negro, a dama de olhos azuis. Aquele foi o dia mais lindo da vida dela. Um sonho tinha se realizado. Ela deveria ter sempre fé.

 

Naquele dia, não viu mais o carro. Só o viu novamente depois de alguns dias. Pensou que iria se aproximar novamente, mas ficara com medo da expressão daqueles olhos. Ela não queria que alguém a olhasse assim, com temor. Ela era boa e nunca faria mal a alguém.

 

*********************************************

 

 

Luciana tinha sido alertada que a reformulação no organograma da empresa não era coisa que se fizesse da noite para o dia. Desta forma, tinha que retardar seus planos.

 

Estava muito contrariada com tudo. Sua irritação era tanta, que  mandara seu motorista embora, pois ele tinha levado o seu carro para a oficina e nem a avisara. Desta forma, fora obrigada a pegar o outro modelo, que não era blindado.

 

Desta vez, não tinha os vidros escuros para dar-lhe privacidade. Parecia que todos olhavam para dentro do carro.

 

Sem perceber, a expressão em seu rosto era carrancuda. Estava muito brava. Além de tudo, estava atrasada para a reunião com os conselheiros, velhos gagás que não admitiam tê-la como sócia majoritária e gerente  das empresas, mas ficavam babando nas suas mãos, com galanteios e bobagens.

 

A bateria do celular acabara e o carro estava sem recarregador. “Que mais vai me acontecer?".

 

Só teve tempo de frear bruscamente, antes de atropelar uma criança de rua. Desceu do carro e, ao invés de ajudar a criança, verificou o carro, dando uma olhadela na pequena pessoa a sua frente. Quando ia voltar para o carro, viu a moça dos olhos verdes, parada com uma turminha de crianças.

 

-- Vocês querem me dar licença.

-- VC não vai ajudar a Du?

-- Ela está bem. Saiam da minha frente. -- ordenou sem muita calma, quase berrando, ainda que com uma ponta de medo.

-- E se ela quebrou algo? -- a loirinha era irritante.

-- Não quebrou. Eu sou médica...

-- ...mas você mal olhou prá ela. Mesmo sendo médica, como pode saber?

-- você quer sair da minha frente. Eu sou uma mulher ocupada e estou atrasada para um compromisso importante....olha, não tenho que dar satisfação.

-- Cadê o carrão preto? -- ela perguntou, inocentemente.

-- O quê?

-- O carrão preto....

-- Olha, pegue este dinheiro e leve os garotos prá tomar um sorvete. -- Luciana falou, atirando uma nota pela janela e arrancando com o carro.

-- VC não é feliz.

 

Luciana pôde ouvir o comentário, mas nem tomou conhecimento, pois estava furiosa agora.

 

O dia inteiro foi enrolado. Nada deu certo. Então, ela tomou uma dose cavalar de calmante e deitou em seu escritório. Acabou dormindo até altas horas. Desta forma, esquecera que queria que o motorista a pegasse, pois temia passar pelo viaduto. "Até o carro eles observaram", pensou. Na verdade não era medo, mas a sensação de incômodo se  algo acontecesse. Não sabia o quê, mas o simples fato de imaginar confusão, polícia e toda a sorte de intromissões, a fazia ser cautelosa.

 

Por outro lado, esquecera que o demitira. Olhou para o relógio. A cabeça estava meio zonza, ainda sonolenta.   "Tudo bem. Vamos lá, Luciana".

 

Ao menos, tinha recarregado o celular.

 

As ruas estavam desertas. "Ótimo", iria avançar todos os faróis.

 

Tudo estava bem, até o carro começar a afogar. Rateando, ele parou. No meio da avenida deserta. Estava sem gasolina.

 

Sem saber o que fazer, Luciana ligou para a seguradora e pediu um guincho, porém foi informada que falta de gasolina não era considerado algo de urgência. Mesmo ameaçando, não conseguiu mudar o tom da voz monocórdica da atendente.

 

Ficar parada no meio da pista não era seguro. Sabia que seria multada, também. Relutantemente, saiu do carro. Pensou na roupa branca, mas começou a empurrar o veículo. Nisto, percebeu um grupo que se aproximava.

 

-- Ei, belezura, tá sem gasosa? Tadinha da madame!

 

Luciana viu o brilho de uma lâmina. Eram quatro rapazes. Instintivamente, olhou para o painel do carro e...percebeu que não era o "seu carro", a arma estava no outro. Poderia lutar. Sabia artes de defesa pessoal.

 

Estava cercada. Quando um deles avançou em sua direção, foi facilmente derrubado por um chute. Outro foi arremessado longe,  mesmo tendo golpeado--a, mas um terceiro veio e a segurou. De repente, ela viu a menina do cajado e outro rapaz vindo em sua direção, o que a distraiu, e a fez  perceber que estava sendo emboscada. Foi a última coisa que pensou.

 

Quando recobrou os sentidos, estava em seu hospital, sendo tratada por uma enfermeira.

 

A cabeça estava dolorida. Levantou a mão e pode sentir uma bandagem na altura da nuca. TB, ao erguer o braço, viu uma mancha esverdeada, puxando para o roxo.

 

-- Diana, o que faço aqui? Como vim parar aqui?

-- Calma, doutora. Eu não sei, estou entrando no plantão agora.

-- Chama a enfermeira--chefe.

 

A estória era bem simples. Tinha sido trazida em seu próprio carro, por uma loirinha maltrapilha e tinha sido socorrida. A menina sumiu, após o médico plantonista querer registrar queixa. Todos os documentos estavam lá, a carteira com dinheiro também. Nada fora tocado.

 

-- Chame um taxi, eu vou prá casa.

-- Ela acabou de sair.

-- Quem?

-- A tal mendiga que a trouxe. Veio saber da senhora.

 

Luciana estava confusa demais, para perceber a própria reação de espanto.

 

****************************************

 

Rebecca tinha gritado para Du parar, mas a criança estava muito  assanhada e nem percebeu que pulara para o meio--fio. O carro parou em cima. Du caiu de bunda no chão e nem chorou, devido ao choque.

 

Mais em choque ficou quando aquela mulherona desceu do carro e parou na sua frente, intimidando a criança. Os olhos azuis estavam gélidos. A expressão era feroz. Após olhar o carro, olhou para a criança, grunhiu algo e ia indo embora.

 

Rebecca a reconheceu. Sem se intimidar, pois sabia que a amedrontava por ser uma pessoa de rua, parou no caminho entre a mulher e o carro e a encarou. "Deus! Ela é linda!".

 

Suas perguntas foram mais para poder continuar ouvindo a voz, que apesar de zangada, era melodiosa. Rebecca quis ser como aquela mulher: linda, rica, elegante, cheirosa. É, ela era cheirosa, Rebecca pode sentir quando passou por ela.

 

Entretanto, em poucos segundos, quando a mulher lhe atirou o dinheiro, percebeu que não queria ser ela, pois a dama era infeliz. Sem pensar, verbalizou seus pensamentos.

 

O dia inteiro, Rebecca pensou naquela mulher maravilhosa. Gostaria de contar para alguém. Foi visitar Renée, mas ela estava dormindo, pois trabalhara a noite toda. Procurou por Pedro, mas também não achou. Resolveu, então, que a iria esperar passar de volta para casa.

 

Não sabia quais seriam as suas chances de revê-la, pois poderia voltar por outro caminho. Ou poderia voltar de táxi, tinha dinheiro. Mas, era muito autoritária e não mudaria seu caminho só por medo. E, medo de quem?  Dela?

 

Rastreando o percurso habitual, ficou esperando em um trecho que era passagem obrigatória para todos os carros. Mas, a madame estava demorando. Assim, resolveu ir procurar Pedro, pois estava com saudade dele, queria ter uns momentos de carinho.

 

Deixou recado com um pessoal e voltou para a avenida. Já era bem tarde quando Pedro a encontrou.

 

-- É aí, vai ficar perambulando a noite toda? -- foi assim que ele chegou.

 

Rebecca e ele ficaram um bom tempo entretidos. Por um momento, ela achou quer poderia comentar sobre a madame, mas achou que ele não entenderia.

 

-- Vem, vamos prá casa da Renée. Tem show hoje e ela não volta cedo.

 

Estavam descendo do elevado, quando lá de cima, Rebecca viu o carro. Sabia que a figura alta e em roupas brancas era a madame. Viu as luzes de alerta do carro e percebeu que ela estava com problemas. Desceu correndo o viaduto, com Pedro vindo atrás, sem entender.

 

-- Pera, qual a pressa?  ele conseguiu alcança-la.

-- Tem uma pessoa precisando de ajuda...

-- E você acha que podemos ajudar? Rebecca, ela vai é achar que queremos assaltá-la. Poderemos ter problemas. Vamos embora.

-- Não.

 

Rebecca saiu correndo e teve tempo de ver os caras que cercavam a mulher. Ela se defendera do primeiro, mas o pessoal era safo e atacou--a com um golpe na cabeça. Sem pensar, berrando com eles, Rebecca veio se aproximando, Pedro corria logo atrás e ajudou a afugentar os caras.

 

A cena era: o carro todo aberto, os dois com a mulher de branco e ensangüentada nas mãos.

 

-- Eu vou dar o fora, Rebecca. Vai sobrar prá gente, mina!

-- Não podemos deixá-la. Verifique o que houve com o carro.

-- Eu posso e vou.

-- Faça logo o que eu mandei, cara. Não discute!

 

Enquanto Pedro verificava o carro, ela pode observar que a mulher tinha uma corrente com informações sobre tipo sangüíneo, alergias e um telefone.

 

-- O carro tá sem gasolina.

-- Arruma gasolina, rápido.

-- Como, criatura?

-- SE vira, mano. Vai.

 

No carro havia a bolsa e a agenda. Pegou o endereço do hospital. Ao ligar para o número, do celular, viu que era do mesmo hospital.

 

Assim que Pedro voltou, ela decidiu que levaria a mulher para o hospital.

 

-- Deixa ela aí. Alguém vai achar, ela acorda...sei lá, porr*! Não quero encrenca. Vê o carrão, as cosias dela, ela é granfa.

-- Eu levo ela. Vai embora, seu covarde.

-- Prá onde...

-- Sai. Cai fora. Se manda. Eu te acho depois. Xô!!!! -- Rebecca estava com raiva e, ao mesmo tempo, preocupada com a "madame".

 

O corte era pequeno, mas sangrava muito, o que se realçava na camisa branca.

 

Sem esperar mais um minuto, Rebecca deu a partida no carro. Seu coração disparou de emoção: era a primeira vez que dirigia.

 

Quando quiseram fazer a ocorrência, Rebecca se mandou do hospital.

 

Os minutos em que teve a "madame" no colo, foram inesquecíveis. Desacordada, mesmo sem os azuis gélidos dos olhos, ela era ainda mais bonita.

 

 

 

 

Luciana quis ignorar o ocorrido. Por vezes, pensou em agradecer a mendiga ou seria sem--teto. Mas não queria dar muita liberdade.

 

Não podia ignorar, entretanto, o fato de ter se admirado com a honestidade. Ela era uma pessoa sem qualquer condição financeira e a carteira de Luciana estava com dinheiro, cheques e cartões de crédito. Além do próprio carro, ali tão facilmente disponível.

 

Também sabia que a jovem não tinha tido participação no ocorrido, como pensara antes. Enfim, era melhor deixar prá lá e se considerar uma pessoa de sorte. 

 

De qualquer forma, sua primeira providência foi readmitir o motorista, com quem já estava habituada. Ele era contratado do marido dela e só o servia. Ela nunca gostou de ter pessoas estranhas em um lugar tão pequeno como o interior de um carro.

 

Naqueles dias, não iria para o hospital. Passaria as manhãs em reuniões nos escritórios administrativos e talvez fosse até a capital, sede do governo, para tratar de assuntos referentes à nova legislação para o seu produto.

 

Entretanto, por um motivo qualquer, teve que ir ao hospital. E, passando pelo viaduto, lá estava ela, a loirinha toda sorridente como sempre. O carrão preto parou no farol e ela se aproximou. Luciana não sabia o que fazer.  Pensou em abrir a janela e dar um dinheiro.  Mas, demorou a se decidir e os outros carros estavam buzinando para ela. Foi embora, deixando a loirinha a meio passo de distância. "Ela está sempre sorrindo", pensou, tentando mudar a própria expressão, que prá variar estava carrancuda.

 

Ficou pensando quando deixou de sorrir. Por que, mesmo sozinha, sua expressão era sempre carregada? Porém, não tinha motivos para rir.

 

 

 

 

Rebecca demorou a rever a madame. Tinha tido uma briga com Pedro. Ele achou que ela havia se arriscado e nem ao menos levara alguma vantagem.

 

-- Você sabe, eu não roubo!

-- Não?!?!?

-- Dinheiro não. Comida quando estou com fome. Mas, agressão e roubo, jamais!

-- Ë, mas a situação era favorável. A dona estava inconsciente e nem saberia quem havia roubado. Ela nem sabe quem você é.

-- Sabe. -- disse engolindo a palavra.

-- Quer saber, não enche o meu saco. você bancou a idiota e ponto!

 

Pedro era um sobrevivente. Fazia de tudo e, é claro, cometia seus furtos. Rebecca sabia, mas não queria ser como ele. Tinha medo.

 

Mas, realmente bancara a idiota; pois, a madame poderia ter ao menos agradecido. Sabia que ela estava sempre perambulando pelas cercanias do elevado. Poderia ter mandado um empregado...não, tinha que ser ela mesma. Enfim, vai ver, ainda estava achando que ela era a culpada de tudo.

 

Depois de muitos dias, aconteceu. O carrão parou. Rebecca pensou em não ir, mas queria ver até aonde ia o orgulho da madame. O carro negro parado nem percebera a presença insignificante. De repente, o vidro chegou a se mover, mas o farol abriu, os outros carros buzinaram e lá seu foi a carruagem negra da madame.

 

-- Será que ela vai me agradecer? Por que é tão importante para mim que ela o faça?

 

 

 

 

Luciana viajou para um fim-de-semana tranqüilo, em uma ilha afastada.

 

Pensava em sua vida. Nas chances que tivera e como as aproveitara. Nada fora fácil. Conquistara tudo o que queria: tinha dinheiro, prestígio, poder, nome. Em seu ramo de negócios era temida. Fazia muitas alianças, lobbies e conhecia pessoas de todas as espécies. Não confiava em nada e ninguém. Às vezes, nem nela mesma.

 

Ao pensar nisto, percebeu que ultimamente vinha se traindo.  Dera para pensar na vida daquela infeliz que a salvara.

 

Os olhos verdes sempre radiantes, a voz cheia de bondade, a criançada paupérrima que a cercava e como ela os entretia, a atitude honesta para com ela. Por um momento, sentiu vontade de falar com ela. Saber como ela podia ser tão alegre vivendo em condições tão precárias. Percebeu que só a idéia de se aproximar, causava-lhe desconforto.

 

Para ela, depois que se casara, tudo tornara-se simples e sem valor. Tinha os carros que queria, as jóias, casas, nem se preocupava com casa, comida...tinha os empregados e estes a detestavam, ela sabia. Era  arrogante com eles, achava que tinha de mantê-los em seus lugares.

 

Amigos? Poucos e todos por interesse.

 

Amores? Bem...não queria admitir, mas estava interessada no seu ....personal trainer. Ele era muito bonito,  malhado, tipo Hércules (sempre gostou de mitologia). Mas, sabia que não seria justo. Jamais acreditaria que ele a queria sem interesse. Porém, ela estava com um desejo muito forte. Percebia que ele seria presa fácil. Mandara buscá-lo. Deveria estar chegando. Já planejara o fim--de-semana com ele.

 

Naquela noite, Luciana ficou muito ansiosa pelo dia seguinte. A madrugada parecia não ter fim. Vagou pela praia até altas horas. Sentia a maré subindo e a água em seus pés. Ficou no píer, olhando o céu. Estava sozinha há muito tempo. Pensou na menina do viaduto. "Será que ela era sozinha?".

 

 

*************************************

 

 

O fim-de-semana sempre era mais animado. Começava na Sexta--feira. Rebecca ia até a boate onde Renée fazia seus shows, "performances", como ela dizia. A princípio, achara esquisito ver aqueles homens todos vestidos de mulher, com seios e tudo o mais. Mas, não era de sua pessoa julgar os outros. Ela mesma, viera parar naquela situação, mas tivera um lar e família.  Até terras ele tivera. E ali estava: como uma mendiga, sendo repudiada e até mesmo temida. Sabia quem era e o porquê da sua vida atual, mas as outras pessoas não lhe davam chances. Pensou na tal "madame".

 

Na porta da boate, conseguia ganhar boas "gorjetas". Era um mundo estranho. Selvagem, cruel, mas divertido. As pessoas estavam ali por luxúria, eram filhas de Baco (achou um livro sobre mitologia no lixo).

De qualquer forma, estavam levando uma vida. Tinha gente de todo jeito e Rebecca era uma dessas pessoas.

 

Aos sábados, de posse de algumas balas, circulava a cidade de ônibus e ia parar nas feiras que invadiam a cidade. Nelas, folheava livros e revistas, via gente rica comprando móveis velhos, pinturas e toda sorte de coisas que para ela lembravam-lhe a sua própria casa, cheia de coisas velhas.

 

Neste bairro, ficava até tarde e ia ver os teatros. Olhava o preço dos ingressos e pensava na grana que o pessoal gastava. Pensou na madame de novo. Ela devia freqüentar lugares assim. Por outro lado, achou que não. Parecia alguém muito triste e sozinha. Tb pensou que se divertia tanto, mesmo sem ter dinheiro.

 

DE madrugada, parava em algum carrinho de cachorro--quente e comia um com gosto. Era legal ver as pessoas que saiam das baladas e paravam para comer. Às vezes, conseguia bater um papo e contar suas estórias.

 

Domingo, ia ao parque. Levava a vida numa boa. Pedro era um largado. Sumia e quase sempre estava em encrenca com o pessoal da rua. Costumava invadir pontos de guarda carros, ou se metia com coisas mais sérias e, desta forma, Rebecca o via quando ele aparecia. Ela estava começando a achá-lo perigoso e diferente.

 

Da última vez que ficaram juntos, ele falava em se dar bem na vida. Queria grana e iria conseguir. Comentou algumas coisas que poderia fazer. Ela tentara dissuadi-lo, dizendo que eles iriam conseguir algo melhor, mas ele riu e disse que ela era uma idiota e sonhadora.

Ela tentara brincar, dizendo que até um carrão ela já tinha dirigido. Ele apenas disse que ela era mesmo boba.

 

-- Deveria ter tirado uma grana daquela dona, isto sim!

 

Ele estava revoltado e ela o desconhecera. Até mesmo o amor não fora como das outras vezes. Se ela o perdesse, estaria sozinha.

 

 

 

 

Segunda--feira. Que dia! Luciana estava, prá variar, muito mal--humorada.

 

Tudo o que queria era ficar na cama. E foi o que fez.

 

Deu ordens para não ser incomodada. Mandou todos os empregados passearem, literalmente. Queria isolamento.

 

O que fizera ? Que situação constrangedora! Intimidara Henrique.

 

Ele chegou de helicóptero. Luciana estava na praia. Um biquíni super generoso, que deixava a mostra suas pernas longilineas e musculosas. A cor da pele estava na tonalidade certa de bronzeamento.  Os cabelos negros estavam presos. E os olhos escondidos sob óculos escuros.

 

Embora Henrique fosse seu personal trainer, poucas vezes ela tinha aparecido em trajes tão sumários. Costumava exercita-se com agasalhos, pois realmente não queria se expor.

 

Mas, agora, a situação era outra. Ela estava sendo a fêmea que queria seduzir.

 

Entrou na casa e foi esperá-lo junto à piscina.

 

Quando ele entrou, acompanhado pelo caseiro, ela percebeu a surpresa em seus olhos.

 

Tirando os óculos, ambos se encararam. Ele engoliu em seco.

 

-- Fez boa viagem?

-- Claro.

-- Troque de roupa e junte-se a mim. --  antes que pudesse perceber,  o que deveria ser um pedido sedutor, virou uma ordem.

 

Ficaram na piscina. Ela não tinha o que falar prá ele. Não queria ser tão objetiva, a ponto de propor sex* e só. Ainda que, naquele momento, era isso que queria. Observava Henrique nadando. Ele era uma bela espécie de homem. Corpo musculoso, sem exageros ou anabolizantes; cabelos negros, nem curtos e nem cumpridos; um cavanhaque superbem cuidado, que lhe dava um ar de Deus grego; olhos negros também e uma boca sedutora, grande e com um sorriso lindo, perfeito!

 

-- você não quer fazer seus exercícios? -- ele perguntou, enquanto se enxugava na frente dela.

 

Os olhos azuis se revelaram sob os óculos e ele pode ver a gula naquele olhar. Luciana não fez a menor força para esconder a lascívia do olhar. Henrique sentiu uma coisa estranha e insistiu.

 

-- Vamos aos exercícios?

-- Vamos, mas hoje eu quero algo diferente.

 

Sem muitas delongas, Luciana levou--o para o seu quarto, onde não possuía nada para ginástica.

 

-- Ei, vai ser sem aparelhos, então?

 

 

"Deus, será que ele é tão burro, assim?".

 

Na verdade, Henrique tentava ganhar tempo. Aquela situação o estava encurralando. Sentia-se mal.

 

Luciana não tinha paciência para jogos de sedução. Avançou na direção de Henrique e fez o que sua vontade mandava: sugou aqueles lábios generosos e fartos como se fossem a fruta mais gostosa da estação. Suas mãos percorriam as costas largas e deslizavam em direção a bunda firme. Ele parecia sem vida. Estava petrificado.

 

Sem mais demoras, ela tirou a pouca roupa que usava. Henrique começou a ficar mais interessado. Não tinha como. Ela era linda. Mas, quando olhava para aqueles olhos, algo o intimidava. "Calma, Henrique! Ela é uma boa cliente, não é a primeira vez, tente agradar", mas o corpo não reagia.

 

Partiu para o ataque. Ela queria e ele daria prazer. Beijou, esfregou e fez tudo o que sabia. Não deu. A ereç*o não aconteceu.

 

-- ...talvez, se você ...sabe...desse uma atenção especial a ele...-- e apontou para o p*nis.

-- Não. Chega! Pára.  -- Luciana estava ofegante.

 

Ela saiu do quarto, para o banheiro. Estava frustrada. Irritada com o ocorrido. Se meteu sob a ducha quente e esperou o vapor inundar o box. De repente, sentiu as mãos fortes de Henrique e todo o corpo se acendeu.

 

-- Agora, você vai ser minha. Eu a quero!

 

E então, foi ótimo. Não se enganara quanto ao potencial do rapaz.

 

No domingo, estranhou o braço sobre seu corpo. Olhou para ele e pensou que poderia tê-lo por mais alguns dias e só. Fazia bem para seu corpo. Entretanto, nada sentira por ele.

 

Na verdade, ele a irritou quando tentou ser dominador. Foi um verdadeiro embate. Ela jamais cederia aos desejos dele. Fez o jogo do prazer dela. Lembrou-se que, para desculpar a falta de ereç*o, ele alegou que ela o intimidara com todo aquele luxo e poder.

 

Levantou-se antes dele e partiu.  Iria vê-lo mais um pouco, porém.

 

Pensou nas vezes que saía pela noite, sozinha, procurando somente sex*. Quando percebeu que era fácil, perdeu a graça. Era por demais fácil ter quem queria. E ela só queria alguém que mandasse às favas todo o poder dela.

 

Olhou para o relógio e o dia nem chegara à metade. Resolveu sair.

 

Foi até a garagem e viu que seus carros não estavam. Deixara o motorista ficar com um deles. O outro estava na revisão. Olhou para os outros carros. Eles eram do seu marido. Um conversível mínimo e um mais encorpado, um Jeep. Verificou a gasolina. O conversível tinha combustível, o outro não. O dia estava lindo.

 

-- Que se dane a segurança!

 

Sem perceber, automaticamente, fez o caminho do hospital. Desta vez, literalmente, todos os olhos estavam nela. O carro era aberto demais. Percebera que o vento no rosto era uma novidade. Gostou da sensação. Mesmo se achando exposta, gostou.

 

E lá estava ela. Estava com outra roupa, mais bem arrumadinha e, como sempre, sorrindo junto com suas crianças. Luciana passou e fez questão de olhá-la, tirando os óculos e dirigindo-lhe um olhar curioso.

 

Quando foi reconhecida, os olhos verdes se arregalaram em uma expressão de falso espanto e a menina ergueu a mão, formando o número "três".  Ela fez um comentário e Luciana não pode ouvir. Sem saber o porquê, parou o carro e esperou. Então ela veio.

 

Pelo retrovisor, ela via os olhos verdes curiosos e alegres. "Que olhos!".

 

******************************

 

Rebecca teve um final de semana bem legal. Ganhara umas roupas de Renée, com quem passara o Domingo, assistindo vídeo. O artista estava caseiro e disse que o namorado não viria naquele dia.

 

Então, ela aproveitou e contou sobre a madame. Fez uma estória muito mais comprida do que a real. Exagerou na cena em que a salvou e ...mentiu, dizendo que tinha sido recompensada com um agradecimento e tal.

 

Tb falou sobre Pedro. Estava querendo largá-lo, mas tinha medo de ficar sem alguém.

 

Tinha passado o Sábado com ele. Foi legal. Mas, ela percebeu que ele estava agitado.

 

Antes de dormir, pensara muito na "madame". Gostava dela, mesmo sem conhecê-la. Mesmo sabendo que ela a repudiava, mesmo sabendo que nunca seria nada para ela.

 

Na manhã seguinte, tomara um banho e colocara as roupas que Renée lhe dera.

 

-- Sabe, Rebecca, não fosse o meu homem e você poderia morar comigo. Gosto tanto de você! Tome cuidado com o Pedro, acho que ele está se metendo com gente graúda. -- foi o que ouviu de Renée.

 

Voltou para rua. Foi ver seus amiguinhos. Levou algumas coisas de comer para eles. Eram crianças, mesmo quando tinham que viver como adultos. Era engraçado ver gente como a "madame" se borrando de medo daquelas crianças. E, o pior, é que muito deles realmente não eram do bem. Tinham sido corrompidos. Rebecca acreditava na reabilitação e no amor.

 

Estava no meio deles. Sabia que a madame já devia ter passado, pois era tarde. O dia estava lindo. Tb, se ela passasse, que diferença faria, uma vez que estaria escondida naquele carro negro.

 

Desta forma, tal não foi a surpresa ao ver a "madame" naquele carrinho invocado, toda exposta e ainda por cima, sem óculos que Rebecca percebeu foram tirados de propósito.

 

Ao vê-la, a reação de Rebecca foi natural. Levantou a mão e exclamou: "TRÊS!! UAU!!!".

 

Então o carro parou. Ela mal pode crer. Mas, a curiosidade nos olhos azuis era magnética. Conforme se aproximava, via pelo espelho retrovisor as emoções naqueles olhos. "Que olhos".

 

******************************

 

Antes que Luciana pudesse fazer algo, a jovem ergueu seu cabelo e olhou a sua nuca.

 

-- Ficou uma cicatriz, né? -- e passou o dedo pela marca.

 

Luciana se arrepiou toda. Pensou que fosse medo, mas não era. Ela sabia que aí era seu ponto fraco.

 

-- É. -- Luciana estava assustada. -- Olha, sei que você salvou a minha vida. Tome, como recompensa.

 

Rebecca olhou para o dinheiro nas mãos dela. Ficou triste, de repente.

 

-- É pouco? Olha não tenho mais, poss....

-- Não quero seu dinheiro, madame.

-- Não vejo o que mais pode querer.

--

-- É, talvez não veja outra coisa mesmo. -- e falando isto, Rebecca se afastou.

 

Luciana ficou estática. Sem reação, observou a garota fazer sinal para um coletivo e sumir.

 

************************

 

Naquela noite, Rebecca estava na porta dos teatros. Eram vários na mesma rua. De repente, o carro negro parou. Desceu o motorista e abriu a porta. Então ela desceu, acompanhada de um homem lindo. Que casal maravilhoso!

 

Rebecca não pode tirar os olhos dela. Mais, se aproximou do carro e foi enxotada pelo motorista. Ela estava com um vestido preto, na altura dos joelhos. Bordados suaves sobre  os seios, faziam o contorno deles como se fosse uma armadura. As mangas eram como braceletes. As pernas...eram perfeitas, coxas firmes. Os cabelos presos em um coque e um colar de pérolas muito discreto. Linda!!

 

O cara era bonitão. Cavanhaque, forte, moreno. Era estranho, mas ele não a segurava, não demonstrava nenhuma forma de intimidade. Rebecca arriscaria dizer que ele estava com receio.

 

Quando ia se aproximando e o motorista começou a enxotá-la, a "madame" fez um sinal e ele parou. Rebecca simplesmente ficou parada na frente deles por um instante. Seus olhos se cruzaram novamente. Foi como se travassem uma guerra silenciosa.

 

-- Dê algum dinheiro a ela. -- a madame ordenou. Rebecca foi embora.

 

Olhou novamente e ainda viu a "madame" parada, olhando para ela, só se movendo quando o homem a chamou para entrar.

 

Ainda naquela noite, viram-se novamente, na saída.

 

-- O que você quer, mocinha? -- o motorista perguntou.

-- Qual é o nome dela?

-- Dra. Luciana, por quê?

 

Rebecca saiu correndo. Sentira o mesmo quando a vira pela primeira vez e quando a salvara. "É, é só ter fé e eu consigo o que quero e era isto o que eu queria, agora. Luciana, não preciso do dra.".

 

Quando deitou-se para dormir, no albergue, Rebecca sonhou com a doutora.

 

Estavam em algum lugar, sozinhas, e conversavam. Ela sorria e era lindo ver o seu sorriso. O pouco que escutara daquela voz fora o suficiente para imaginar diálogos. Tudo o que elas queriam era ter a companhia uma da outra. Luciana precisava de uma amiga e Rebecca de uma família.

 

-- você promete que me fará sua amiga, Rebecca?

-- Como, se você não permite que eu me aproxime?

-- Sua fé permitira. Você me mostrara o caminho. Renderei-me a sua fé.

 

A manhã foi gloriosa, até o momento da fatalidade.

 

Rebecca estava no ponto habitual. Resolvera vender algumas coisas e improvisara uma barraquinha. Estava lá, esperando a sua musa. Ficara pensando e resolvera falar com ela. Se fosse preciso, iria até o hospital. Pensava nisto, quando um carro destes antigos, preto, parou e de dentro dele atiraram Pedro aos seus pés, todo ensangüentado.

 

Ela não sabia o que fazer. Não conseguia gritar. Ele estava sem respirar, com o rosto cheio de sangue e o corpo todo ferido.

 

Neste instante, o carro preto, velho conhecido parou no farol. Rebecca gritou: "Luciana!".

 

*******************************

 

Henrique quis saber porquê ela tinha dado atenção à garota.

 

-- Ela é mais uma pobre coitada. -- Luciana respondeu.

-- Mas você não me parece ter cuidado com esse tipo de gente.

 

Ela o fuzilou com os olhos. Desta vez, ele não se intimidou.

 

-- Olha Luciana, eu vi a sua cara quando ela deu as costas para o seu dinheiro. você não está acostumada a não conseguir comprar as pessoas.

 

-- Você é um bom exemplo, não!

-- Você acha que me comprou? Por que você não pode achar que eu a estou usando?

 

O sangue subiu-lhe a cabeça. Tentou agredi-lo, mas foi segura.

 

-- Calma. Nada de agressões. Você paga pelos meus serviços como seu treinador, nada mais. Você é uma mulher gostosa e um desafio para qualquer homem. Mas é fria. Não como amante, embora distante, mas como pessoa. Eu sou um cara comum. Não quero você.

 

-- Como? Quem não quer você sou eu!

 

-- Tarde demais, eu falei primeiro.

 

Os olhos azuis estavam lutando contra lágrimas.

 

-- Se você quiser meus serviços, tudo bem. Se não, paciência. Será uma injustiça, mas você é a poderosa. Olha só a sua expressão. É a mesma que fez com garota.

 

-- É um truque de você. Fingem não querer dinheiro e depois pedem coisas mais valiosas, ou somas mais altas.

 

Henrique olhou--a com desdém.

 

-- Vou me casar com uma mulher que é bem diferente de você. Eu a amo simplesmente por querer amá-la. Você até me tentou, mas eu não quero ser literalmente "seu". Adeus!!!

 

Luciana sentiu-se como jamais havia se sentido. Ninguém mexera tanto com ela. Fora humilhada sem piedade. Quem eram aqueles que a faziam engolir sua soberba. Tantos outros estavam lá fora, prontos a beijar-lhe os pés.

 

Tomou um calmante e dormiu. Sonhou. Alternava Henrique com a menina loira. AS vozes de ambos diziam-lhe que ela não precisava comprar as pessoas. Bastava dar-lhes amor, tratá-las com respeito. Em seu sonho, saía da cama onde Henrique estava nu e caminhava, também nua, para os braços estendidos da garota. Os verdes dos olhos dela eram ofuscantes. Então ouviu a própria voz: "Ajude-me".

 

Quando acordou, estava bem. Decidiu que dispensaria Henrique.

 

Fez toda a rotina matinal. Pegou seu carro e foi para o hospital. Então, viu a cena terrível. Não queria se intrometer, teve medo. Ouviu o grito por seu nome e lembrou de sua profissão, seu juramento, mas acima de tudo, viu o desespero nos olhos verdes, sempre tão alegres. Desceu do carro.

 

***********************************

 

Foi dispersando a multidão. Sentiu o pulso do rapaz. Olhou para os olhos verdes e falou com uma calma que não era sua.

 

-- Fique calma. Tudo vai dar certo. Ele não está respirando. Deve ter quebrado as costelas e o pulmão está ruim. Tem sinais de hemorragia interna.

 

Correu para o carro e retornou com um canivete suíço. Com precisão, abriu um buraco na traquéia  de Pedro e, pegando uma das canetas que Rebecca vendia, fez um tubo para ele respirar.

 

-- Vá até o carro e tecle 9 no meu celular.

-- É o telefone do hospital.

-- Sim. Está programado para uma ambulância. Rápido, ele não tem muito tempo.

-- Por que não usa o seu carro? Tem medo...

-- Ele não pode ser removido sem auxílio dos paramédicos. -- Luciana falou rispidamente.

 

O sangue de Pedro estava nas mãos de ambas. Rebecca nunca manchara as mãos com sangue. Luciana já não fazia intervenções como estas há muito tempo. Pensou, muito rapidamente, que não usara nenhuma proteção. Estava em contato com o sangue de um rapaz de rua.

 

Rebecca segurava a mão dele e, sem perceber, Luciana afagou o cabelo dela.

 

Rapidamente, a ambulância chegou. Estranhamente, Luciana pegou Rebecca pelo braço e a colocou em seu carro.

 

-- Eles precisam de espaço no interior da ambulância. -- argumentou.

 

Todos os olhos da recepção do hospital fixaram-se sobre elas. Luciana toda ensangüentada, segurando a loirinha e pedindo urgente a sala de cirurgia.

 

O espanto era geral. Há muitos anos, Luciana não operava.

 

-- Quero um quarto e uma enfermeira. Ela está em choque, precisa tomar um calmante e relaxar. Quem está de plantão?

 

Na verdade, Luciana não iria operar. Apenas acompanhou e pode ver a equipe fazer o melhor que podia. Eles estavam apreensivos em tê-la ali, observando. Porém, eram os melhores médicos do hospital. O esforço foi em vão. Pedro tinha várias hemorragias internas e não resistiu.

 

***************************

 

Gritou por Luciana, pois era o único nome que sabia. Foi como uma luz.

 

Ela saiu do carro. Os olhos azuis estavam sérios. Toda de branco, parecia um anjo. Talvez viesse levar Pedro para o seu descanso final.

 

Rapidamente, com autoridade e decisão, ela afastou a multidão de curiosos. Examinou Pedro e fez logo os procedimentos necessários. Eu, pasma, só imaginava sua roupa se manchando de sangue e olhava o mesmo líquido em minhas mãos.

 

Demorei para receber sua ordem de chamar a ambulância. Pensei no desconforto que ela deveria estar sentindo e ainda quis ser sarcástica, mas fui cortada com a mesma precisão daquelas mãos que abriram o buraco no pescoço de Pedro e o fizeram respirar. Agora, eu estava sem reação. Segurei Pedro e senti as mãos em meus cabelos. Ambas estávamos unidas pelo sangue dele.

 

Quando os paramédicos, conforme ela disse, chegaram, fiquei sem saber como ir com Pedro. Com muita surpresa a ouvi dizendo que eu iria com ela. Nunca imaginei ouvir tais palavras. Eu, que tanto imaginara como seria o interior do carro preto, nem sequer pude admirá-lo. Só pensava na mulher ao meu lado e em Pedro na ambulância.

 

Na recepção do hospital, todos correram para acudi-la e pude perceber que ela era poderosa. Ninguém se importou comigo, até ela ordenar que me dessem atenção.

 

Suas ordens eram, como sempre, seguras e precisas. Deu para perceber que não estava acostumada a pedir e sim ordenar. Só podia pensar na beleza que era vê-la em ação.

 

Levaram-me para um quarto e deram-me algo e eu apaguei. Ainda pude ouvir uns comentários como: "quem será esta aí?",  "nunca vimos a dra. tão preocupada", "mulher esquisita!".

 

 

Fim do capítulo

Notas finais:

...lá vamos nós de novo!


Comentar este capítulo:
[Faça o login para poder comentar]
  • Próximo capítulo

Comentários para 1 - Capítulo 1:
Flamy
Flamy

Em: 07/04/2021

Sonho em temrinar... vi que última att foi 2016

Responder

[Faça o login para poder comentar]

Thaci
Thaci

Em: 22/01/2017

Bom dia,Jack!!!

Que bom que você está postando aqui. Eu estou esperando esse conto desde do Fator X. Por favor me diz que você vai terminar. Este conto é um dos melhores que eu já li. A escrita é perfeita. Você está de parabéns. Por favor,por favorzinho, não deixa de postar. Eu não te dou nota mil,porque não tem. 

Responder

[Faça o login para poder comentar]

Gaa
Gaa

Em: 28/11/2016

Até cadastrei pra poder comentar hehehe Que bom q vc voltou, autora!!! Entrei no lance de arrecadação e está falando q ja está encerrado...gostaria de doar, se possível! Seja bem vinda de volta! :D

Responder

[Faça o login para poder comentar]

Thaci
Thaci

Em: 10/10/2016

Boa noite,Jack!!
Estou muito triste porque vc postou o fator x pentimento até o cap 28 parte 4 e aqui no Lettera nem chegou perto disso.Eu amo esta estoria. É uma das melhores que eu já li tanto no Fator X, Sapa cine,ABC LES e agora no Lettera. Por favor continue esta estora. Eu sei que as vezes a correia da vida nos deixa sem tempo. Mas,sei q vc tem leitoras fiéis. Por favor não nos desaponte. Mas,vc ta de parabéns o seu texto é hiper,mega,plus maravilho.

Responder

[Faça o login para poder comentar]

Vi Pereiras
Vi Pereiras

Em: 11/11/2015

Eeeei, Jackie... Não acredito que vc apareceu por aqui, finalmente. Tô feliz pra caramba!

Não sei se lembrará de mim, mas a pouco tempo te mandei mensagens no facebook dizendo do meu amor por essa história e que já a leio a tantos anos, repetidas vezes, que até já perdi a conta rsrs. 

Será que agora aquele final mais do que esperado, sai? 

Já estou com saudades imensas de Luck e Becky, tão grande que vc não pode nem imaginar. 

Bom, como muitas que estão por aqui, estou esperando ansiosamente por novos desenrolares na vida dessas duas deusas maravilhosas. 

Grande beijos no coração 😘😘😘

 

 

Responder

[Faça o login para poder comentar]

patty-321
patty-321

Em: 11/11/2015

Q bela surpresa jack the sampa. Mudou o pseudônimo mas e a mesma maravilhosa escritora e sua espetácular estória. Acredito q agora vc vai nos presentear c o grande final. Bem vinda. Bjs
Resposta do autor:

Não mudei o nome não, cadastrei o usuário e não sabia que seria o nome de escritora. Vou ver como arrumo isso. E, sim, estou terminando essa epopéia.

Responder

[Faça o login para poder comentar]

Crika
Crika

Em: 11/11/2015

Houuu que legal VC postar a história, adoooro esse conto...mas por favor meu bem termina a história, pq VC deu um castigo legal na gente com ela dona moça...mas já está perdoada pq VC voltou e por escrever divinamente bem,meus parabéns... Bjs anjo.

Responder

[Faça o login para poder comentar]

mtereza
mtereza

Em: 11/11/2015

Viva vc voltou a melhor surpresa do mes amei amo essa historia adoro a sua forma de escrever seja bem vinda ao Lettera

Responder

[Faça o login para poder comentar]

KFSilver
KFSilver

Em: 11/11/2015

Own tava com sdds dessas 4!! ♥♥

 

Responder

[Faça o login para poder comentar]

turioni
turioni

Em: 11/11/2015

AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAH! *-* NAO ACREDITO! FINALMENTE!!!

 

Sério, contei cada segundo pra ver mais de Pentimentos! Nossa, que alegria! Arrasooooou! <3

 

Responder

[Faça o login para poder comentar]

Informar violação das regras

Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:

Logo

Lettera é um projeto de Cristiane Schwinden

E-mail: contato@projetolettera.com.br

Todas as histórias deste site e os comentários dos leitores sao de inteira responsabilidade de seus autores.

Sua conta

  • Login
  • Esqueci a senha
  • Cadastre-se
  • Logout

Navegue

  • Home
  • Recentes
  • Finalizadas
  • Ranking
  • Autores
  • Membros
  • Promoções
  • Regras
  • Ajuda
  • Quem Somos
  • Como doar
  • Loja / Livros
  • Notícias
  • Fale Conosco
© Desenvolvido por Cristiane Schwinden - Porttal Web