CARONA
HELENA
Acordei mais cansada do que quando tinha ido dormir. Rafaela tinha tomado meus pensamentos até que eu adormecesse. Arrumei as crianças para a escola e descemos para o café. Carlos estava na mesa e ao nos ver chegando juntou os seus pertences e começou a se despedir.
- Helena, sexta-feira temos um jantar de boas vindas. Certifique-se de comparecer.
- Que horário?
- 20 horas e sem crianças.
Revirei os olhos e sabia que deveria me preparar para mais uma noite chata. Onde eu deveria distribuir sorrisos para pessoas que certamente estariam falando mal de mim pelas costas. Mas para evitar brigas, busquei não discutir.
- Irei me preparar.
- Você irá sair hoje?
- Sim. Pela manhã irei a algumas lojas e a tarde na academia.
- Como assim academia?
- Fiz a matrícula ontem. Irei iniciar hoje. Falei enquanto levava uma xícara de café a boca.
- E quando pretendia falar sobre isso?
- Preciso?
- Claro que precisa! Eu sou seu marido. Eu devo saber como o meu sobrenome está rolando por aí.
- Só estou cuidando da minha saúde Carlos.
- Na verdade você está precisando emagrecer mesmo. Só tome cuidado com esses Personal Trainner. Não quero sair por ai com fama de chifrudo.
- Minha personal será uma mulher. Fique tranquilo.
Carlos se despediu das crianças apenas “tchau” e um aceno de cabeça.
Depois de deixar as crianças na escola segui para o shopping. Precisava encontrar uma loja fitness e comprar umas roupas para iniciar minha saga na musculação. Comprei roupas, tênis. Na saída do shopping peguei um trânsito e isso me impediria de chegar na escola das crianças no horário certo de buscá-las, então pedi que o motorista e a babá o fizessem por mim. Almocei em um restaurante próximo a praia. Eu amo meus filhos, mas esses momentos de EU comigo mesma são super necessários.Após o almoço fui a consulta com a nutricionista. Ela era super simpática e ficou de me enviar meu plano nutricional até a noite. Cheguei em casa as 14:22min. Precisava tomar um banho correndo, pois meu horário com Rafaela era as 15 horas, não podia deixá-la esperando. Vesti o primeiro conjunto que peguei da sacola. Me olhei no espelho, mas tive vergonha. Parecia que a roupa me marcava mais agora do que quando provei na loja. Mas agora não tinha como voltar atrás. Prendi o cabelo em um rabo de cavalo, pois o calor naquela tarde estava fora de controle. Calcei o tênis e segui dirigindo rumo a academia. Chegando lá a recepcionista me segurou alguns minutos para fazer o registro da digital para liberar a catraca. Assim que consegui entrar vi de longe Rafaela alongando uma mulher e isso me deixou desconfortável. Desci os olhos e pude ver que a mesma estava de top e um micro short. Seu abdômen todo era sarado e acompanhava belos braços longos e definidos. Parei de analisá-la quando percebi seus olhos fixos em mim. Acenei para comunicar minha chegada. Assim que ela terminou o treino da aluna, ela veio até a mim e me cumprimentou com um beijo no rosto. Senti seus lábios macios na face e imaginei como seria se ele tivesse encostado nos meus. Acredito que ela tenha percebido o meu embaraço, afinal pediu um tempo antes de iniciar nosso treino.
Depois que retornou pediu que eu a acompanhasse em um alongamento, me explicou os benefícios e assim fui fazendo. Cada vez que Rafaela tocava em mim era como se acontecesse uma explosão. Iniciamos com um treino de perna.
Rafaela sentou-se em uma máquina chamada extensora e pediu que eu prestasse atenção, pois eu iria repetir o movimento depois. Mas eu só conseguia prestar atenção em como a cor da pele dela suada brilhava e como aqueles músculos da coxa se contraiam e relaxavam (mais tarde descobri que o nome daquele músculo era quadríceps). Ela precisou me explicar mais algumas vezes, pois não consegui me concentrar de primeira. A medida que eu ia fazendo os movimentos ela consertava minha postura e me incentivando todas as vezes que eu dizia “eu não nasci pra isso”.
- Agora vamos para o agachamento no Smith. Ela me falou apontando para um aparelho.
- Agachamento no que?
- Vem que eu te mostro.
Esperamos uma moça que estava terminando seu exercício no aparelho. Eu olhava a quantidade de peso que aquela mulher utilizava e pela sua expressão de sofrimento, parecia que sentia muita dor.
Rafaela foi para baixo da barra e pediu que eu ficasse atrás para analisar a amplitude. E poderia ver toda a postura pelo espelho lateral.
Fiquei atrás de Rafaela e aquilo foi o meu fim.
Ela forçou o corpo um pouco para cima e destravou o equipamento. Rafaela desceu com uma facilidade, tive a sensação que em suas costas estava apenas uma pluma. Ela descia e subia enquanto meu rosto enrubescia e a partir daquele momento eu perdi a audição. Já não conseguia ouvir o que ela falava. Só despertei quando ela disse:
- Entendeu?
- Uhum. Falei sem prestar atenção em nenhuma palavra que ela disse, pois seu corpo me hipnotizava.
Antes que eu fizesse o exercício ela começou a retirar alguns pesos do aparelho com apenas uma mão. Eu me ofereci para ajudá-la e ela agradeceu.
Entrei no aparelho e dei o mesmo impulso que ela deu para liberar. Na hora de descer meus joelhos de abriam e ela ajustou, na próxima descida fiquei nas pontas dos pés, depois respirei enquanto liberava o peso e ela me disse que a respiração correta era quando pegava o peso.
Senti uma presença atrás de mim e vi Rafaela pedindo licença.
Percebi sua mão enlaçando minha cintura e ouvi sua voz rouca dizendo.
- Desce que eu vou te ajudar na postura.
A partir dali não fiz mais nenhum movimento incorreto.
No final do treino ela me alongou novamente e saímos juntas da academia.
Paramos na calçada de frente ao meu carro:
- Já vou andando. Nos vemos amanhã. Ela disse
- Você vai embora caminhando?
- Sim. Não posso dirigir e o tempo que fico esperando UBER, chego em casa andando.
- Entra. Eu te levo. Afinal você está por causa de mim.
- Não se preocupe querida. Eu vou andando. Faço meu cardio assim.
- Negativo. Só saio daqui se for com você.
E eu estava sendo sincera. Ela percebeu a minha insistência e acabou entrando no carro. Falei:
- Já avisa seu marido que vai estar indo de carona. Vai que acham que tem um Ricardão te levando de carro.
- Não sou casada. Ela sorriu me mostrando o dedo anelar sem aliança.
- Que sorte. Com a qualidade de homens que tem nesse mundo é melhor ficar solteira mesmo.
- Você não gosta da vida de casada?
- É complicado. Sorri sem graça, pois não poderia me abrir com uma recém conhecida.
- Entendi.
- Mas você não pensa em se casar?
- Já pensei em me casar, mas não tenho essa ânsia de formar família, ter filhos. Talvez se um dia eu encontrar a mulher certa, eu passe a pensar sobre isso.
- Então você gosta de mulheres?
- Sim, sou lésbica. Isso é um problema pra você Helena?
Falou olhando nos meus olhos e eu gaguejei para responder:
- Cla… Claro que não Rafaela. Só fiquei surpresa porque você não parece.
Ela sorriu e seu olhar se tornou perspicaz.
- É que os héteros geralmente gostam de rotular estereótipos. Eu particularmente sou uma lésbica que estou quase sempre vestida de forma esportiva por causa da minha profissão. No dia a dia, gosto de me vestir feminina, mas tenho amigas meio termo, outras que apenas gostam de se vestir confortável. Não há regras.
- Entendi. Realmente nós pensamos assim. Por isso não imaginei que você fosse lésbica.
Ela sorriu e apontou para uma casa com um portão grande e cinza.
- Eu moro aqui. Muito obrigada pela carona Helena, nos vemos amanhã.
Saí do carro e a abracei para me despedir, mas na verdade queria gravar aquele cheiro doce de seus cabelos em mim.
Fim do capítulo
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Woolf Sam Em: 17/03/2025 Autora da história
Sem querer dar spoiler, mas não podemos esperar coisas boas dele, afinal o tempo não melhora pessoas ruins. Ele apenas refina o que não presta nelas.