Um ano que começou com pé esquerdo
Capitulo 1 A CHEGADA
Nunca pensei que meus pais poderiam fazer isso comigo. Eu sei que não temos essa ligação emocional que os pais normais devem ter, mas não pensei que, por algo tão banal, eles me mandariam para um fim de mundo como forma de castigo. Me sinto lesada, para falar a verdade, nem sei o que sentir em relação a isso.
Ao sair, dona Laura ainda me disse:
“Filha, é para o seu bem. Eles são nossos amigos, vão cuidar bem de você, e você ainda vai ficar muito bem. Alugamos um chalé por um ano. Entretanto, quem vai pagar o chalé é você, com serviços que irá prestar ao recinto em que ficará alojada. É uma forma de você aprender o valor das coisas.”
É inacreditável. Laura Bitencourt falando sobre valores… Só pode ser brincadeira.
O caminho foi massante. Tive que ir de carro, e o pior, o carro não ficaria comigo. Nada comigo. Só um cartão, com gastos regulados. Meu mundo estava desabando, e eu já nem sabia o que esperar, naquela estrada de chão, vendo minha vida entrar em decadência. Parece exagero? Mas não é. Estou sendo distanciada de tudo que amo. Dos meus amigos, das festas. Esse fim de mundo nem deve ter nada. Já fico desnorteada só de imaginar.
Entramos em Itamaré quando o sol já dava sinais de que iria se pôr. Ao descer do carro, a brisa bateu sobre meus cabelos e, por um breve momento, eu esqueci tudo. Todas as minhas dores, a raiva... Mas foi só por um breve momento mesmo. Olhei em volta e vi uma pousada muito bonita, bem mais sofisticada do que eu esperava, à beira de alguns chalés espalhados. Tudo muito bem organizado. Preciso admitir que baixei a guarda enquanto observava tudo.
Um senhor se aproximou, já pegando minhas malas e falando animadamente:
– Vamos entrar, minha filha, vou te acomodar no chalé onde você vai ficar.
Observei tudo ao meu redor enquanto caminhávamos rumo ao chalé. O homem era muito animado e falante.
– Olha, inicialmente pode ser complicado para você se acostumar, mas garanto que vai gostar de Itamaré. A propósito, me chamo Hugo. Eu e Mauro somos amigos de longa data. Seu pai me ajudou muito na juventude, e quando ele me pediu para te acolher aqui, a minha única resposta foi “claro”.
– Ah, muito obrigada... (não acredito que estou agradecendo pela prisão).
– Disponha. A propósito, eu queria muito te levar para conhecer um pouco da cidade, mas infelizmente estou muito atarefado. E Helena ainda não chegou. Vida de pai solteiro e empreendedor é complicada.
– É longe?
– Não é tão perto, mas dá pra ir a pé sem problemas.
– Teria problema eu dar uma volta sozinha? Acho que até prefiro ficar um pouco só.
– Acho uma ótima ideia. Tem uma sorveteria muito boa, chama Icetamaré. É só sair da pousada e ir reto.
– Okay.
Ele me deixou nos aposentos e saiu para resolver os problemas dele. Naquele momento, já estava mais calma. A brisa parecia mais fria, e o sol estava sumindo no céu. Olhei ao redor e segui as instruções de seu Hugo.
A cidade tem pouca movimentação, o que me assusta um pouco. Gosto do movimento da cidade grande, gosto de espaço para ser eu, para me expressar. Cheguei onde ele havia dito: o tal Icetamaré, um local muito aconchegante. Algumas decorações com pranchas e remos, achei uma graça, mas ainda não me convenceu. Pedi um sorvete de morango com cobertura de limão e fiquei esperando enquanto observava o movimento do local. Alguns garotos muito animados em outra mesa... Como conseguem, né? Animadíssimos nesse fim de mundo.
Antes de meu sorvete chegar, levantei para lavar as mãos, e alguém esbarrou bruscamente em mim e derramou sorvete de chocolate na minha roupa. Logo chocolate, eu odeio sorvete de chocolate!
– Não olha por onde anda, garota? Olha o que você fez…
Respirei fundo e levantei a cabeça para olhar a pessoa que teve a capacidade de fazer algo tão estúpido.
– Sinto... muito.
Por um momento, pensei ter entrado em transe. A menina era muito bonita, entretanto... sonsa, né?
– Adianta muito você sentir alguma coisa? Minha roupa vai continuar suja, e você ainda está aí parada com essa cara de sonsa.
Ela me olhou dos pés à cabeça e simplesmente me ignorou. Virou as costas e foi para a mesa de jovens felizes. Era só o que me faltava... Uma raiva começou a subir. A garota me ignorou por completo e nem se desculpou direito. Que... que... nem sei o que pensar.
Peguei meu sorvete, paguei e voltei para a pousada. Para mim, esse momento foi a carta de boas-vindas da cidade.
“Bem-vinda a Itamaré, o fim de mundo que vai fazer do seu ano o mais insuportável, monótono e sem vida.”
Fim do capítulo
Itamaré traz em suas ondas muitos conflitos e muitas emoções para Emanuele e Helena.
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Azul Em: 13/02/2025 Autora da história
Muitos acreditam que é só uma cidade bonita e pacata, mas tudo indica que essa cidadezinha tem muito a nos oferecer.