Por Helena:

Na sexta-feira de manhã, o ritmo no hospital foi surpreendentemente tranquilo. Os atendimentos correram sem maiores incidentes e, com as consultas finalizadas, eu me senti aliviada. Aproveitei a brecha no trabalho para dar uma rápida olhada nas mensagens e me preparar para buscar Bia no pequeno aeroporto de Vintervile.

A tarde estava clara e ensolarada, o que prometia um ótimo início de fim de semana. Dirigi até o aeroporto, e durante o percurso, não pude evitar que lembranças do dia em que soubera do falecimento de meu pai e a necessidade urgente de retornar a Vintervile viessem a minha mente. 

Quando finalmente avistei Bia saindo do terminal, o impacto foi imediato. Ela estava simplesmente deslumbrante. A maneira como ela desceu do avião, com um sorriso radiante e uma aura de confiança, era inconfundível. Usava um vestido que moldava perfeitamente suas curvas, com um tom de rosa que fazia seu tom de pele brilhar. Eu me aproximei e ela veio ao meu encontro.

— Helena! — Bia exclamou, me envolvendo em um abraço apertado. 

Ela sussurrou no meu ouvido de um jeito sensual:

— É por aqui que você está se escondendo de mim?

Eu me desvencilhei delicadamente do abraço, olhando-a com um sorriso brincalhão.

— Jamais me esconderia de você. — Respondi, tentando manter a leveza na minha voz.

O resto da tarde passou rapidamente. Bia e eu conversamos sobre as mudanças em nossas vidas, as novidades desde a última vez que nos vimos. Ela tinha reservado um período para fazer stories, algo que, ao que parecia, era uma parte essencial do seu trabalho. Observando-a enquanto ela preparava o cenário para as filmagens, não pude deixar de pensar em como o trabalho de Bia era incrivelmente detalhista e cansativo.

— Ossos do ofício, linda — ela comentou ao perceber meu olhar curioso.

Ao final da tarde, Bia se preparou para irmos ao restaurante. Observando a maneira como ela estava vestida — um vestido rosa apertado que realçava suas curvas e chamava a atenção — percebi que talvez eu precisasse caprichar um pouco mais na minha própria aparência para não passar vergonha. 

Antes de sairmos, mandei uma mensagem a Marcos. Expliquei que uma cópia da tag estava com o porteiro e pedi para ele ficar à vontade e se sentir em casa.

Quando chegamos ao restaurante, a coincidência de encontrar Isabela e Lucas foi um choque. Isabela estava simplesmente linda, com um vestido que valorizava sua beleza natural. Ela parecia um pouco constrangida e irritada, algo que eu pude perceber facilmente.

Lucas, ao nos ver, se apressou em cumprimentar.

— Helena! Que coincidência nos encontrarmos aqui!

— Pois é, uma coincidência mesmo. — Respondi, com um sorriso que tentava ser amigável, mas que continha um toque de sarcasmo.

Isabela lançou um olhar para mim, e eu percebi que ela estava desconfortável. Sem perder tempo, decidi que a melhor abordagem era aceitar a sugestão de Lucas para compartilharmos a mesa, suavizando a situação.

Assim que todos já estavam na mesa, fiz as apresentações:

— Isabela, Lucas, esta é Bia Albuquerque, minha amiga de Porto Grande. E Bia, estes são Isabela e Lucas.

Lucas, com um sorriso entusiástico, virou-se para Bia.

— Olá, Bia. Eu a sigo nas redes sociais. É um prazer conhecê-la pessoalmente.

— Olha só, um fã por aqui. — Eu disse, com um tom brincalhão e um sorriso levemente sarcástico.

Bia, com sua usual confiança e charme, sorriu para todos e respondeu:

— Que legal conhecer vocês. Estava ansiosa para jantar aqui e não vejo a hora de também irmos ao festival amanhã .

Lucas, com um olhar de surpresa, exclamou:

— O quê? Vocês vão ao festival amanhã?

— Claro que sim. Vim mais pelo festival do que pela Helena. — Bia disse, piscando para mim, enquanto percebi o olhar de Isabela passando de mim para Bia com uma mistura de curiosidade e desconforto.

— Você havia mencionado que viriam amigos, mas só veio uma. — Isabela comentou, a voz revelando um toque de curiosidade, como se tentasse entender a situação.

— Na verdade, meu amigo Marcos também está por aqui. Ele ficou no meu apartamento. — Eu respondi.

— E por que ele não veio ao jantar com vocês? — Isabela perguntou.

— Porque era um jantar romântico e ele iria atrapalhar. — Bia brincou, lançando um olhar divertido para mim.

— Na verdade, ainda bem que ele não veio. Se não, não conseguiríamos sentar com vocês. — Lucas disse, rindo.

— Lucas! Não percebeu que agora quem está atrapalhando elas somos nós? — Isabela disse, me olhando com uma seriedade que indicava sua insatisfação com a situação.

— A Bia estava brincando. E vocês não atrapalham. — Eu disse, tentando aliviar a tensão e lançando um olhar para Isabela.

Bia, com um sorriso travesso, se inclinou um pouco para a frente e disse:

— Eu não posso acreditar que você não reservou mesa no restaurante.

— Eu não imaginei que estaria tão cheio e, na pior das hipóteses, pensei em usar a influência do meu pai. — Lucas comentou, e eu percebi Isabela fechar ligeiramente os olhos e suspirar com o comentário dele.

— Ah, e quem é seu pai? — Bia perguntou, com um toque de curiosidade.

— O prefeito de Vintervile. — Lucas respondeu com confiança, orgulhoso de fazer a revelação.

Naquele momento, o garçom se aproximou e deixou o cardápio na mesa, interrompendo brevemente a conversa. Isabela, claramente incomodada com a situação, olhou para o cardápio como uma forma de se distrair.

O restaurante estava muito movimentado, e a vibração do ambiente se misturava com o murmúrio das conversas e o tilintar de talheres.

Eu percebia que Isabela estava cada vez mais tensa, uma combinação de frustração e desconforto estampada em seu rosto. Por outro lado, Lucas parecia completamente à vontade, como se a situação estivesse perfeitamente sob controle. Bia, embora visivelmente descontraída, mantinha um olhar atento para todos no grupo. Eu também comecei a folhear o cardápio enquanto tentava manter a conversa fluindo.

— Então, — eu comecei, tentando mudar de assunto para algo mais leve —, já decidiram o que vão pedir?

— Eu ainda estou indecisa. — Isabela respondeu, com um tom que tentava soar casual, mas que carregava uma nota de tensão.

— Vamos ver o que tem de bom aqui. — Bia disse, enquanto começava a examinar o cardápio com interesse.

A conversa foi se ajustando ao novo tema, com todos explorando as opções do menu. Após uma breve discussão sobre o que pedir, decidimos nossos pratos. Bia e Lucas manifestaram interesse em beber uma taça de vinho, enquanto eu optei por um suco, já que estava dirigindo.

— Amor, você se importa de voltar dirigindo? — Lucas perguntou, já tendo solicitado ao garçom uma taça de vinho.

— Claro que não, tranquilo para mim. — Isabela respondeu com um tom de voz baixo, que mal escondia uma leve irritação.

A comida começou a chegar e, à medida que cada prato era servido, ficou claro por que o restaurante era tão renomado. Os sabores eram excepcionais e a apresentação impecável. Todos nós começamos a elogiar o lugar.

— Realmente, vale cada like. — Bia comentou entusiasmada, com um brilho de satisfação nos olhos.

— Por falar em like, Bia, você se concederia um pedido meu? — Lucas perguntou, chamando a atenção de todos na mesa.

— Vai depender do que é. — Bia respondeu, olhando para ele com um misto de curiosidade e diversão.

— Eu sei que está em cima da hora, mas seria muito abuso você gravar um story comigo, convidando o pessoal da redondeza para o festival e contando que você vai participar? — Lucas perguntou.

Isabela olhou para Lucas com uma expressão incrédula, claramente surpresa com o pedido. Bia, por outro lado, respondeu com um sorriso risonho:

— Não me importo não, mas acho que gravar aqui na mesa atrapalharia quem está jantando. — Bia disse, olhando ao redor com um olhar que avaliava a situação.

— Podemos ir para o saguão do restaurante. Pode ser? — Lucas sugeriu, esperando pela confirmação dos demais.

— Por mim, tudo bem. — Eu disse, tentando manter a atmosfera tranquila, e Isabela assentiu com a cabeça em concordância.

Bia e Lucas se levantaram e se dirigiram ao saguão do restaurante. Aproveitei o silêncio que se estabeleceu na mesa para quebrar a tensão.

— Acho que seu noivo mudou o comportamento e esqueceu totalmente das nossas diferenças com a presença da Bia. — Eu disse, sorrindo de maneira amistosa para Isabela, tentando aliviar a tensão que se acumulou desde a saída deles.

Isabela me olhou com seriedade e respondeu sorrindo de maneira irônica:

— Não foi apenas ele que mudou o comportamento.

.— O que você quer dizer com isso? — perguntei, percebendo o tom na voz dela.

— É que justo você que me cobrou mais compostura no local de trabalho, foi a pessoa que passou a semana toda com o celular em mãos no ambiente de trabalho, falando com seus amigos. Os pacientes percebem esse tipo de comportamento e comentam.

— Ah, é? E algum deles reclamou contigo de alguma conduta minha? — perguntei, tentando manter a calma enquanto a tensão aumentava.

Isabela engoliu em seco e disse:

— Os pacientes não, mas os funcionários perceberam.

— Os funcionários? Você se refere a você, chefinha? — perguntei em tom de provocação.

Os olhos de Isabela lançaram um olhar fulminante na minha direção.

— Apenas acho contraditório você falar algo e fazer o contrário.

— Mas eu não estou me agarrando com ninguém no ambiente de trabalho. — Repliquei pausadamente, sentindo minha voz ficar carregada.

— E espero que mantenha isso assim, pelo menos até o fim do expediente. — Ela disse, mantendo o olhar firme. Sentia meu corpo todo vibrando com a tensão, e a presença de Isabela. Não podia negar que ela tinha uma aura sedutora e essa sua atitude desafiadora, apenas amplificava a sensação.

Antes que Isabela pudesse responder, Lucas e Bia voltaram à mesa, quebrando o momento. Lucas, como se nada tivesse acontecido, sentou-se ao lado de Isabela, dando-lhe um beijo rápido.

— Escolheu alguma sobremesa, amor? — Perguntou ele, com um olhar apaixonado.

— Eu não estou com muita vontade de doce hoje. Acho que vou passar a sobremesa. Deu certo o vídeozinho? — A maneira com que Isabela falou, tentando soar desinteressada, me deixou claro que ela estava incomodada com a atenção que Bia recebia. Não havia como negar, ela parecia realmente apaixonada e com ciúmes de Lucas.

— Deu sim, amor. Depois te mostro. Já enviei pro meu pai. Isso com certeza vai impulsionar ainda mais o festival. — Ele disse, sorrindo orgulhoso e olhando para Bia com gratidão.

— Fico feliz em ter ajudado. — Bia respondeu, lançando um olhar travesso na minha direção. — Eu já escolhi minha sobremesa e, se não estivesse com um desejo absurdo de doce, até dividiria com você, linda. — Ela me olhou de forma divertida, simulando apertar minha bochecha, o que me arrancou um sorriso.

— Eu também pretendo passar a sobremesa. — Lucas diisse. — E, se vocês não se importarem, gostaria de me despedir e agradecer pela mesa. Hoje, a Isa e eu estamos comemorando três anos de namoro e noivado, e a noite poderia ter sido um desastre, mas vocês ajudaram a não ser. — Lucas disse, com um tom meloso, enquanto olhava para Isabela.

No instante em que Lucas mencionou a comemoração deles, uma pontada de arrependimento me atingiu. Por que mesmo eu sugeri que eles se juntassem a nós?

— Parabéns pela comemoração! Vocês formam um casal lindo. — Bia disse, Mas meu foco estava todo em Isabela. Ela olhava para Lucas com uma mistura de carinho e cansaço, e começou a se levantar da mesa.

— Agradeço também por vocês compartilharem a mesa. — Disse Isabela, me olhando intensamente. Senti meu coração acelerar, aquele olhar me deixou perturbada.

— Vocês têm certeza de que não querem ficar mais? — Perguntei, tentando disfarçar minha inquietação, mas meu olhar estava fixo em Isabela, que já estava de pé à minha frente.

Ela fez menção de responder, mas Lucas se adiantou:

— Vamos embora já sim. Conheço meu amor. — Ele disse, abraçando-a. — Ela já está com sono e amanhã de manhã ajudarei com tudo no festival, então estarei desde cedo por lá. Provavelmente nos veremos.

— Com certeza. — Respondi, tentando manter o tom leve, mas uma certa tristeza me tomou ao vê-los se afastando de mãos dadas. Não entendia exatamente por que me sentia assim.

Bia percebeu a mudança no meu humor e, sempre atenta, se ofereceu para cancelar a sobremesa se eu não estivesse bem.

— Não, está tudo bem. — Respondi, forçando um sorriso. — Na verdade, estou louca para roubar uma colherada da sua sobremesa.

Bia riu, e a noite continuou, mas a sensação de vazio persistiu, mesmo quando voltamos ao meu apartamento. Bia falava animada sobre os detalhes do restaurante com Marcos, mas minha mente estava em outro lugar, perdida nas contradições de tudo que eu estava sentindo.

Fim do capítulo