Sombras e neon por thays_
Pro Bono
O ano era 2077 e a cidade respirava caos. Night City era uma metrópole caótica e cheia de neon, onde o luxo extremo e a miséria absoluta existiam juntas.
Era noite quando Lux estacionou seu esportivo preto, de design elegante, em frente ao bar da Lizzie. O local ganhava esse nome em homenagem a sua dona, uma dançarina, que tinha sido famosa por defender suas funcionárias, principalmente trabalhadoras do sex*, contra abusos. Após ser assassinada por um grupo de homens violentos, o local foi transformado em um ponto de resistência e refúgio para a comunidade, especialmente para as Mox, uma gangue conhecida por lutar por justiça e proteção para mulheres marginalizadas.
Desligou o veículo e desceu. Usava botas e calça de couro. Uma jaqueta com cores chamativas em azul e rosa neon, com o logotipo das Mox estampado, cobria a parte de cima do seu corpo. Seus cabelos eram azuis e metade de sua cabeça era raspada. Em sua nuca havia uma porta de conexão neural, que permitia que ela se conectasse a dispositivos, sistemas de realidade virtual, redes ou até instalasse chips para aprimorar habilidades e acessar informações.
Sua pele era clara e quase não usava nenhuma maquiagem, exceto por seus olhos esfumados em preto que contrastavam com a coloração acinzentada. As unhas curtas e roídas eram pintadas de preto. Tinha a estatura média, visivelmente não parecia ser tão forte quanto realmente era. Contudo, seus músculos e ossos possuíam melhorias tecnológicas sob a pele para aumentar sua força física e seus reflexos, atributos primordiais para seu trabalho como mercenária. Externamente ela não tinha muito cromo visível, exceto por um conector de dados localizada no antebraço esquerdo, que lhe permitia interagir diretamente com sistemas e computadores.
Cumprimentou com um aceno de cabeça uma segurança de cabelo roxo parada em frente ao bar. Ela possuía mãos cibernéticas que seguravam uma submetralhadora, guardando a porta do bar. A porta automática foi aberta, liberando sua passagem. As paredes do local eram cobertas por luzes pulsantes, telas holográficas e projeções digitais. A iluminação tinha uma predominância de tons roxos, azuis e vermelhos.
O bar tinha se transformado, com o passar dos anos, em um refúgio para todos que buscavam liberdade de expressão e era um ponto de encontro popular entre pessoas de todas as orientações sexuais e identidades de gênero. A música ambiente era uma mistura de eletrônica com rock industrial.
Lux caminhou até o bar, sentando-se em um banco. A bancada era feita de algum material futurista que brilhava sob as luzes. Atrás dela havia uma estante cheia de garrafas de bebidas raras e cibernéticas, algumas produzidas em laboratórios e outras tradicionais.
- O de sempre, Lux? - A bartender de traços asiáticos lhe perguntou, enxugando um copo com a precisão de quem já tinha visto de tudo ali. Lux apenas concordou com um aceno breve de cabeça, os olhos distraídos, mas atentos ao ambiente ao seu redor.
Em questão de segundos, a bartender colocou à sua frente uma dose de Red Zone, um shot vibrante e ardente. A mistura, feita com vodka, pimenta híbrida e um líquido vermelho sintético de alto teor alcoólico, era um favorito entre os mercenários que buscavam aliviar a tensão de seus dias perigosos.
Lux não hesitou. Levantou copo e virou de uma vez, sentindo aquele ardor em sua garganta, como um lembrete de que ainda estava viva.
- Noite difícil? - perguntou Kai.
- Já tive piores. - Lux respondeu, a voz rouca, sem se dar ao trabalho de disfarçar o peso em suas palavras.
- Chegou hoje um contrabando de X. - Kai comentou casualmente, inclinando-se levemente sobre o balcão. - Se você tiver interesse...
- Hoje não, Kai. - Lux balançou a cabeça, a voz firme, mas com um toque de cansaço.
O X-22 era um narcótico conhecido por desligar a mente, apagando o caos por algumas horas. Lux conhecia bem seus efeitos. Às vezes, quando as coisas ficavam pesadas demais, ela recorria a ele para escapar, ainda que momentaneamente. Mas havia uma linha que ela se recusava a cruzar. A ideia de se tornar uma viciada a assombrava mais do que os próprios demônios que tentava silenciar.
Sentia-se exausta. Havia acabado de cumprir outro contrato, seu alvo estava morto e o pagamento generoso já tinha caído em sua conta. Contudo, aquela satisfação que costumava vibrar em seu interior pela justiça ter sido feita, atualmente tinha se transformado em apenas um vazio inquietante. Sentia-se muitas vezes lutando contra a maré, contra uma doença que percorria as ruas daquela cidade em uma velocidade incapaz de ser contida.
Ao longo dos últimos quinze anos tinha se tornado especialista em eliminar desgraçados que mereciam um fim pior que a morte. Era um trabalho extremamente necessário, mas emocionalmente devastador, pois em algumas ocasiões, se deparava com situações tão perturbadoras que a assombravam por semanas. Tentou blindar seu emocional com ajuda cibernética, com implantes neurais que prometiam lhe ajudar a trazer novamente aquela sensação inigualável que costumava sentir. Entretanto, a realidade é que estava à beira do colapso. Queria fugir para qualquer lugar longe de Night City, sentia que aquela cidade a estava devorando, dia a após dia.
E aquela era uma daquelas noites em que nada mais parecia fazer sentido.
Judy adentrou pela porta do bar, sua presença imediatamente atraindo olhares, incluindo o de Lux, que a observava da penumbra de um canto do balcão. Havia algo nela que exalava urgência. Ela tinha o cabelo de tamanho médio, com uma lateral raspada, possuindo uma coloração chamativa misturando tons de verde na raiz e rosa neon nas pontas. Era mais baixa que Lux. Possuía um piercing no lábio inferior e um delineado marcante em seus olhos, batom vermelho. Uma tatuagem com o símbolo Mox no braço esquerdo. Usava um macacão de vinil preto com uma alça solta e por baixo um cropped cinza.
Quando os olhares das duas se encontraram, foi como um choque silencioso. Lux hesitou por um momento, como se tivesse sido pega de surpresa, mas manteve o contato visual. Apesar de serem da mesma gangue, Lux tinha pouco ou nenhum contato direto com Judy. No entanto, ela nutria uma admiração silenciosa pela técnica de Neurodança.
Ouvia-se dizer que Judy se importava de verdade com o bem-estar das pessoas envolvidas em suas gravações. Garantia que cada experiência fosse consensual e livre de exploração, um contraste gritante com a realidade daquela época. Em um mundo onde quase todos estavam dispostos a vender suas almas por um punhado de eurodólares, ela parecia ser uma exceção.
Não era só a admiração pelo que Judy representava, havia algo mais, uma atração sutil que Lux não conseguia (e talvez nem quisesse) naquele momento definir. Seu coração permanecia fechado desde Aurora. Não tinha se envolvido emocionalmente com mais ninguém desde sua morte. Mais do que uma parceira de contratos, tinha sido a dona de seu coração.
- Mais uma, Kai. - Pediu desviando o olhar, era melhor manter as coisas como estavam.
Kai serviu a bebida em silêncio, deslizando o copo para Lux.
Lux pegou outro shot e o virou. Quando abaixou o copo, percebeu Judy a sua frente, já bem próxima, pegando-a de surpresa. Não estava esperando por aquilo.
- Você é a Lux, não é? - Judy perguntou, a voz firme, mas com um toque de insegurança.
- E você é Judy Alvarez. A melhor técnica de Neurodança de Night City, se eu não estiver errada.
Judy abriu um pequeno sorriso de canto.
- Me falaram que você é quem se chama quando as coisas ficam realmente feias. - Ela continuou. Por um momento, ambas ficaram em silêncio. - Me dê seu preço. - Judy foi direta.
- É muito mais do que você pode pagar.
Lux sabia que não era uma questão de dinheiro. Não era sobre eurodólares ou sobre não querer ajudá-la. Era porque, no fundo, ela já estava considerando abandonar sua carreira que mais parecia um peso a ser carregado do que uma escolha.
- É só me dizer o que precisa. Eu dou um jeito. - Judy insistiu com uma voz firme, quase desafiadora.
- Paz. - Foi o que a outra respondeu. - Acha que algum dinheiro consegue comprar isso? - Novamente ficaram se olhando até Lux desviar o olhar desiludido.
- Eu estou realmente desesperada, Lux. - Então revelou, quase num sussurro. - Uma amiga desapareceu. A Evelyn. Ela trabalhava no Clouds. Me disseram que eu podia te encontrar aqui, que você era uma das melhores. Eu preciso mesmo que você me ajude. Eu não sei mais o que fazer ou a quem recorrer. E eu não quero envolver as Mox nisso.
Lux engoliu seco ao ouvir aquele nome.
- Evelyn Parker?
- Você a conhece? - Judy pareceu surpresa.
- Já ouvi falar sobre ela. - Ela fez uma pausa - Ela não me parece o tipo de pessoa que se deixa desaparecer tão fácil.
- É exatamente por isso que estou preocupada.
Evelyn Parker não era uma doll comum, mas sim uma acompanhante de altíssimo nível. Sua presença era marcada por um magnetismo quase hipnótico. Uma mulher que combinava sua beleza impecável com uma mente afiada, usava sua inteligência e seu charme com uma precisão quase cirúrgica.
Lux não se orgulhava, mas frequentava o Clouds com mais frequência do que gostaria de admitir. Cada visita deixava um gosto amargo, pois sabia que, de algum modo, estava alimentando um mercado que ia contra os próprios valores. Ainda assim, era lá que encontrava o que nenhum outro lugar poderia oferecer. Na verdade, era exatamente por isso que o lugar era tão estimado. As dolls possuíam um chip que permitia que os pensamentos e emoções do cliente fossem lidos em tempo real. Através dessa leitura, o chip ajustava o comportamento, a linguagem e a atitude da doll para atender exatamente às expectativas e fantasias da pessoa.
As Neurodanças eram imersões digitais que permitiam que as pessoas vivenciassem emoções e experiências de outras pessoas, como se fossem suas próprias. Eram muito populares em Night City e tinham uma ampla gama de usos, como entretenimento, treinamento, terapia, mas também eram disponibilizadas no mercado ilegal com conteúdos criminosos, abusivos e extremamente violentos.
- Vamos conversar em um lugar mais seguro. – Lux disse, sua voz baixa, mas firme.
As duas saíram do bar em silêncio. No estacionamento, um furgão azul estava parado. Judy caminhou até ele com um passo apressado e Lux a seguiu, mantendo um ritmo mais calmo, observando cada movimento da outra. Elas entraram no furgão. O interior estava cheio de parafernálias tecnológicas espalhados pela parte traseira, como telas, cabos e dispositivos desconectados. Judy se acomodou no banco do motorista.
- Desde quando você não a vê? - Lux perguntou enquanto já puxava um cigarro do bolso e o colocava nos lábios. Antes que pudesse procurar um isqueiro, Judy já havia sacado o dela, estendendo-o sem dizer uma palavra. Quando a chama se acendeu, os olhares das duas se encontraram por um instante mais longo do que o necessário, e Lux sentiu uma breve e estranha sensação, como se o tempo tivesse desacelerado.
Lux soprou a fumaça suavemente ao lado, tentando afastar a sensação, mas não conseguiu.
- Uma semana.
- Já tentou conversar com alguém de lá?
Judy revirou os olhos e respondeu, irritada, como se a pergunta fosse desnecessária.
- É óbvio! Já procurei ela em todos os lugares possíveis. Ninguém do Clouds me conta o que realmente aconteceu, só me deram uma desculpa absurda que eu tenho certeza de que é mentira. - Ela fez uma pausa, a raiva bem visível, mas havia algo mais em sua voz, uma vulnerabilidade que Lux não soube identificar.
- Qual desculpa? - a pergunta saiu de forma suave, tentando aliviar a tensão.
- Disseram que ela fugiu com um cliente, mas eu tenho certeza absoluta de que, se isso fosse verdade, eu seria a primeira a saber. - Judy falou de forma quase defensiva, seus olhos fixos no volante, evitando olhar para Lux.
Lux ajustou a postura no banco, seus dedos tocando levemente o cigarro, o olhar de Judy ainda fixo em algum ponto à frente.
- Qual a probabilidade de isso ser de fato verdade? - Lux perguntou sem pressa, a voz quase como um sussurro.
A pergunta pareceu ter deixado Judy ainda mais irritada.
- Você não está entendendo, eu sei que ela não faria isso comigo! - Judy bateu com as duas mãos no volante como se isso fosse a única maneira de expressar a frustração.
Lux ficou em silêncio, sentindo que havia atingido um ponto sensível. Judy olhou pela janela, os olhos marejados, sem saber se queria chorar ou explodir. O silêncio entre as duas se tornou pesado.
- Vocês eram próximas? - A pergunta saiu de forma simples, mas com um tom quase imperceptível de curiosidade
- Sim. - A resposta veio sem emoção.
O silêncio se estendeu por alguns segundos. Lux não sabia se estava indo mais para um lado de curiosidade própria do que profissional.
- Quão próximas? - Lux perguntou com mais ousadia agora, não conseguindo resistir à tentação de descobrir mais.
- Como assim? - Judy voltou a olhar para dentro do carro, seus olhos marejados fixos nos de Lux, como se estivesse tentando analisar o que a outra realmente queria saber.
- Amigas, namoradas?
Judy hesitou. Lux não sabia ao certo por que fizera aquela pergunta.
- Amigas. - Judy disse, mas algo naquela resposta deixou Lux com dúvida. Elas ficaram em silencio novamente até Lux perguntar.
- Você gosta muito dela, não? - A voz de Lux ficou suave, mas a pergunta estava carregada de uma intensidade sutil, como se ela já soubesse a resposta.
- Sim.
Lux suspirou e jogou o cigarro pela janela.
- Eu vou encontrá-la pra você. - Abriu a porta do furgão decidida, sentindo um gás diferente do que sentia há algumas horas, um ímpeto crescente de resolver aquela situação.
Antes de sair, Judy perguntou:
- Quanto você vai cobrar por isso?
- Ah, isso? Vai ser o meu pro bono. – A resposta veio com um meio sorriso, o tom descontraído tentando mascarar algo mais profundo.
Sem esperar por uma resposta, Lux virou as costas, já saindo do furgão com um ar decidido. Ela não viu o sorriso tímido que se formou no rosto de Judy que carregava um misto de alívio e admiração.
Fim do capítulo
Oi pessoas lindas :)
Depois de zerar o jogo Cyberpunk 2077 essa fanfic começou a crescer em minha cabeça. Estou há algumas semanas vidrada escrevendo ela, gostei tanto do resultado que resolvi compartilhar por aqui, já que há tempos não tinha inspiração para escrever absolutamente nada. Espero que vocês se apaixonem pela Judy e pela Lux tanto quanto eu.
Até breve!
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alexvause
Em: 03/02/2025
oi amiga... comentei mas nao foi, tenho que aprender a salvar o comentario porque tava gigante rsrsrs q odio rsrsrs disse que no playstation eles ate tiraram o jogo da loja pq tava cheio de bug e nao dava pra jogar, mas que agora com essa ultima atualização estou pensando em comprar. adorando a luxx beijo sua linda
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thays_ Em: 03/02/2025 Autora da história
Menina, tiraram mesmo, né? No xbox não cheguei a jogar quando lançou justamente por causa disso. Esperei ele ficar um precinho bacana na store e comprei de presente de aniversário kkk gostei bastante. Gosto mto de jogos que vc pode personalizar tudo do personagem, do fio de cabelo até a unha do pé kkk espero que goste da fic!!