POV Cecília

 

Cheguei em meu apartamento e estranhei que estivesse tão organizado, Manuela era um completo desastre se tratando de organização, ela sempre quebrava alguma coisa.

 

-- MANU?? - a chamei um pouco alto.

 

-- "C"! - escutei seu grito vindo do quarto e logo depois uma Manuela eufórica saiu correndo em minha direção, provavelmente querendo me abraçar, mas suas ações foram interrompidas quando a garota tropeçou em seu sapato e se estabanou no chão - Aiii - gritou de dor.

 

-- Você é realmente desastrada, Manuela - me aproximei a ajudando a ficar de pé e recebendo um abraço apertado em seguida.

 

-- Fiquei com saudade - disse carinhosa.

 

-- Foram só dois dias - falei me afastando e observando para ver se estava tudo bem, aparentemente estava.

 

-- Mesmo assim, são anos assim né, então impossível não sentir, sei que logo vocês duas irão casar e morar juntas então vou aproveitar o máximo a companhia da minha melhor amiga - disse voltando a me abraçar.

 

-- Chega, Manu - falei me afastando - Eu não irei casar tão cedo assim, então não se preocupe com isso.

 

-- Como não? Eu vi que sapotões casam uma semana depois de se conhecerem, a menina no vídeo falou. Vocês até que estão demorando, mas tenho certeza que logo estarão juntinhas, pelo menos a Sarah tem a maior cara de que quer logo isso.

 

-- Você deveria parar de ver esses vídeos bobos - falei me afastando - Isso aqui está muito organizado pra quem ficou dois dias sozinha.

 

-- O Marcos me ajudou a deixar tudo em ordem - disse sorrindo.

 

-- Ah tinha que ser, espero que ele esteja te tratando muito bem.

 

-- Ele é um amor de pessoa "C" - Manu falou toda boba - Minha família gosta muito dele e eu também.

 

Parei e a observei por um tempo. Manuela estava com o brilho diferente no olhar, ela sempre foi sonhadora e mesmo em meio a tanta coisa ruim, nunca deixou de acreditar em um mundo melhor e eu não poderia a admirar menos. Manu fazia de tudo para me ver feliz e eu sempre desejei fazer o mesmo por ela. Eu estava sentindo que minha melhor amiga finalmente estava encontrando um caminho a seguir, ela tinha sonhos, completamente o oposto dos meus, mas eram dela, os sonhos dela. Acho que enfim, Manu se casaria e iria morar com Marcos na interior e formariam uma família com 30 filhos( Por Deus, que absurdo, mas eu não duvidava que seriam no mínimo três) Pela misericórdia que loucura, mas quem sou eu pra julgar né? Mas mesmo assim, que sonho bizarro.

 

-- Vou tomar um banho e me deitar um pouco, estou cansada da viagem.

 

Falei parando de pensar no futuro da Manu e indo realmente dormir um pouco. Quando acordei já passava das cinco horas da tarde. Peguei meu celular e liguei a Internet. Havia algumas mensagens de Sarah e eu abri imediatamente o WhatsApp para respondê-la, que saudade da minha namorada perfeita. Ignorei o restante das outras pessoas e abri minha galeria vendo nossas muitas fotos juntas, eu não conseguia parar de rir bobamente. Depois de vários minutos admirando a garota mais perfeita desse mundo, decidir me levantar e ver algo para comer. Manu não estava em casa, então somente fiz um sanduíche e comi com um pouco de suco, liguei a TV e tentei me distrair um pouco. Meu celular apitou anunciando que haviam me mandado mensagem, era óbvio que só poderia ser de uma pessoa.

 

"posso te ligar? Estou morrendo de saudade"

 

Abri o mais lindo dos sorrisos e não respondi, apenas liguei para ela.

 

-- Que saudade, meu amor - falou assim que atendeu.

 

-- Eu também, Sarah... Estou morrendo de saudade. Sinto como se faltasse algo... - confessei.

 

-- Eu também, Cissa. Estou deitada e não consigo parar de pensar em você, a primeira coisa que fiz assim que acordei foi pegar o telefone para ver se tinha alguma mensagem sua.

 

-- Eu fiz a mesma coisa - falei rindo e sendo acompanhada por ela.

 

-- Amor, minha mãe ligou. Ela disse que quer minha presença em um jantar de negócios no sábado, eu pensei que poderíamos aproveitar a oportunidade para falar com ela e ficar esse final de semana em sua companhia, o que acha?

 

-- Odeio esse tipo de jantares, amor - falei sincera, odiava mesmo, até quando eu tinha que trabalhar de acompanhante não era muito fã.

 

-- Você não precisa participar do jantar, no domingo podemos fazer algo todas juntas, por favor... Não quero ficar todo final de semana longe de você.

 

Fiquei pensativa, mas eu também não conseguiria ficar dois dias longe da minha namorada.

 

-- Tudo bem, eu vou.

 

-- Aeeee - comemorou.

 

Ficamos algum tempo conversando, mas eu precisava voltar a dormir porque no outro dia teríamos faculdade. Tinha várias matérias para estudar e sabia que Sarah também tinha.

 

No outro dia a primeira pessoa que encontro assim que entro na faculdade é Bruna. Ela conversava com alguns alunos de seu curso, mas assim que me viu se despediu deles e logo se aproximou.

 

-- Ainda pode falar comigo ou está proibida? - perguntou debochada.

 

-- A Sarah não me proíbe de nada, Bruna - falei enquanto caminhávamos lado a lado.

 

-- Escuta - ela segurou meu braço me fazendo parar - Esse final de semana será meu aniversário, farei um pequena comemoração apenas com os amigos mais íntimos, você está convidada, poderá ir não é mesmo? - perguntou com os olhos brilhando em expectativa.

 

Eu lamentava muito que Bruna possuísse qualquer tipo de sentimento por mim além da amizade, porque não era algo recíproco e ela era uma ótima garota, não queria fazê-la sofrer ou decepciona-la, mas não posso mudar as coisas e mesmo que pudesse, escolheria a Sarah todas as vezes.

 

-- Não posso, vou viajar esse final de semana, sinto muito.

 

Sua expressão rapidamente mudou para uma cara de decepção.

 

-- Você pode ir viajar outro dia, Bia. Aniversário é só uma vez ao ano.

 

Suspirei e a encarei.

 

-- Olha, não me chama mais de Beatriz, me chame de Cecília, está bem? E eu realmente não posso ir pois já prometi para Sarah que iria com ela.

 

-- Ahh tinha que ser - resmungou - Por quê, Cecília?

 

-- É meu nome e eu prefiro ser chamada assim a partir de agora.

 

-- Então Beatriz não é seu nome? - perguntou confusa.

 

-- Também, mas eu prefiro Cecília agora.

 

Bruna sorriu levemente negando com a cabeça e se afastando.

 

-- Cecília combina mais com você - disse antes de virar de costas e seguir seu caminho.

 

Sim, ela tinha razão. Cecília sempre iria combinar mais comigo.

 

Para a minha sorte a semana passou tranquilamente e não tive o desprazer de ver Deborah nenhuma vez. Dormir uns três dias na casa de Sarah e curtimos bastante, assistindo séries e filmes. Manuela também estava ocupada com Marcos, mas juramos que iríamos tirar o final de semana apenas para nós duas, eu sentia falta da minha amiga, ela foi minha única companhia por muito tempo.

 

O sábado chegou ensolarado e bonito. O caminho até a casa de Vera foi feita na mais profunda tranquilidade, eu tive que dirigir pois Sarah estava morrendo de preguiça, inclusive chegou a dormir durante o caminho. Fomos muito bem recebidas por uma Vera que parecia muito feliz por estar em nossa companhia. Eu sempre gostei muito da mãe da Sarah que apesar de suas limitações quando soube sobre mim, sempre foi uma mulher boa, sei que ela havia mudado muito, principalmente em relação ao preconceito que ela tinha. Sarah precisava dos pais e eles a respeitaram quando foi necessário, meus pais nunca seriam nem perto do que os pais da minha namorada eram, eles a amaram acima de tudo. Sarah precisou sair por um tempo e fiquei na companhia de sua mãe. Sentamos em uma área fora da casa que era muito bonita e repleta de flores, tomávamos chá enquanto conversamos.

 

-- Nunca vi minha filha tão feliz como ela está agora, desde que ela tinha 15 anos eu não a vejo sorrir tanto - Vera comentou enquanto tomava um pouco de chá.

 

-- Sua filha é maravilhosa dona Vera... Ela sempre foi - suspirei.

 

-- Sabe quando o brilho da minha filha sumiu? - perguntou séria e eu neguei - Quando você começou a namorar, eu percebi... Como uma mãe observadora, eu sabia quando algo não estava bem. Lembro da tristeza profunda dela quando você foi embora. Eu vi um pouco do brilho voltar quando ela nos apresentou para Carla, aqueles tempos foram complicados - disse sorrindo - Mas no final tudo deu certo, apesar de eu nunca ter gostado da relação entre elas, quando Carla se envolveu com a Sarah, ela ainda era menor de idade e isso foi minha grande briga na época, elas têm uma diferença de idade grande que querendo ou não pesa bastante. Enfim... Você nunca mais falou com seus pais?

 

-- Não, nunca mais os vi - falei pensativa, eu nunca parava pra pensar neles.

 

-- Eu sei de algumas coisas, se você quiser...

 

-- Não, obrigada. Estou bem assim - falei um pouco nervosa.

 

-- Tudo bem, não vamos tocar mais nesse assunto. Você cursa publicidade não é mesmo?

 

Vera mudou de assunto e eu agradeci imensamente.

 

As oito horas o jantar seria servido, não fiquei muito tempo na companhia de Sarah, pois ela ficou ocupada cuidando de muitas coisas junto de sua mãe. Eu decidir que iria participar do tal jantar, não queria fazer desfeita com dona Vera, apesar de Sarah ter dito que mãe não se importaria. Me arrumei com um vestido preto bonito e desci para ajudar em alguma coisa que estivesse faltando.

 

Sarah me viu e correu para me abraçar e beijou meu rosto, ela estava linda com uma roupa social muito elegante.

 

-- Desculpa não ter tido tanto tempo pra você hoje.

 

-- Tudo bem, amor. Eu entendo - falei compreensiva.

 

Eu comecei a suspeitar que o jantar seria uma total desgraça quando vi Caio e sua esposa chegando, mas não sabia que iria piorar tanto ao ver Deborah e Ricardo. Aquela desgraçada abriu um lindo sorriso quando me viu. Claro que tinha outros convidados por ali, mas porque eles também tinha que estar no meio. Que ódio.

 

Sarah parecia tão surpresa quanto eu e se aproximou de mim rapidamente.

 

-- Eu não sabia que eles vinham, somente os pais deles foram convidados, que raiva desses malditos. Eles sabiam que seria aqui em casa - Sarah estava até um pouco vermelha de tanta raiva - A vadia da Deborah nem se importa com os negócios do pai. Piranha de quinta! Eu devia...

 

-- Calma amor... Por favor, isso é importante para sua mãe, não vamos estragar tudo.

 

Sarah respirou fundo e tenho certeza que contou até dez voltando a sorrir e tentando ser simpática ao máximo. Estava tudo um pouco mais tranquilo, Deborah não se aproximou tentando puxar assunto, ela tinha medo dos pais, isso era perceptível. Quase achei graça de toda aquela situação, na certa, ela não devia saber também.

 

Estava tudo indo tão bem que quase morri quando vi quem seria a grande figura da noite. Não conseguir acreditar. Que merd* de vida!

 

Paulo José paixão filho, um dos juízes mais conhecidos do Brasil. O cara tinha rios de dinheiro e era uma grande influência, principalmente no meio político e também para o meu total desespero, era um dos meus clientes mais fiéis e que inclusive tentou me fazer proposta absurdas para ser somente dele, sua amante fixa. Fazia muito tempo que não via esse homem, ele não era tão velho, estava beirando os 50 anos, não era bonito, mas era apresentável.

 

Sarah me encarava de longe e ela percebeu que algo estava estranho, mas depois de alguns segundos acho que sua ficha finalmente caiu, pois ela olhou de mim para o Paulo José e finalmente pareceu compreender tudo.

 

Fechei meus olhos e quase chorei de frustração.

 

Eu estava tão fodida, que desgraça!

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fim do capítulo