CAPíTULO 59
O silêncio tomou conta do ambiente, Esther, que começava a guardar seus potinhos, parou na metade do caminho, virou como as estátuas de filmes de terror, olhos arregalados me encarando com aqueles olhos raros e apavorantes a respiração foi cortada, ali dentro os olhos se voltavam repentinamente para Nyxs e para mim, ficando nesse círculo apavorante ora Nyxs recebia tal olhar, ora era dirigido a mim, não suportei o suspense fui a primeira a falar.
— Isso não deve ser possível, Helô, o sangue pode estar sofrendo mutação devido às asas que agora se abrem. — Isso era uma verdade, nós duas estávamos mais uma vez passando por mudanças, nada mais justo que nosso sangue também estivesse em transformação.
— Eu também pensei nisso, para tirar a dúvida fiz um exame detalhado do seu sangue, Nara, que também tenho amostras, para ver qualquer padrão parecido. — Helô tomava notas no tablet que sempre trazia consigo em qualquer bolso da roupa que estivesse usando, nesse pequeno aparelho ela guardava criptografado todo o genoma de cada guerreira, seus dons, e consequências do que ocorre no organismo quando usado.
Heloise apesar da pouca idade, tinha um QI invejável, chegou a ultrapassar a própria mãe em conhecimento, não era à toa que tinha sido designada pela Deusa a ser nossa médica.
— Vou colher outra amostra de sangue de cada uma e comparar, ainda hoje tenho uma resposta. — Helô desligou o tablet e guardou em um dos bolsos de seu jaleco ouvindo atenciosa o que eu dizia nesses momentos, ela se parecia muito com a Ananya.
— Não sei nem o que dizer, eu tenho certeza que eu não estava no cio quando dormimos juntas, você também não estava.—Encarei Nyxs quando falei esperando ela confirmar o que eu achava ser verdade.
Mais uma vez Helô nos fitou e o que falou apagou minhas certezas.
— Mas tem o agravante da Nyxs ter tomado as vacinas em períodos muito curtos para inibir o cio, posso afirmar com toda segurança que ela poderia sim estar no cio de uma forma branda, controlada por remédio. Nara, notou se a aproximação de vocês de alguma forma modificou seu ciclo?—Não somente Helô como todas ali aguardaram em silêncio minha resposta.
— Meu ciclo adiantou em três meses, eu também tomei uma dose extra da vacina, a próxima é no próximo mês.
— Nesse caso, você entrou no cio sem saber. Lembram se trans*ram com frequência pelo menos duas vezes durante o dia?
Esther me encarava como se eu fosse um extraterrestre, Nyxs coitada essa nem falava olhando assustada para a tia e suas perguntas diretas. O que me tranquilizava era que na minha frente estava, minha beta, minha médica e minha companheira, eu não tinha motivos para ter vergonha.
— Sim, na primeira vez que ficamos juntas, quando conseguimos dormir era manhã e mesmo assim foi poucas horas e durante o dia não foi muito diferente da noite.
— Vocês passaram todo o processo de acasalamento, fizeram amor descontroladamente até o momento de engravidar e depois mais vezes como acontece com todo casal que completam o laço. — Heloise abriu novamente o jaleco, retirou uma borracha fina, duas agulhas, seringas e dois frascos—Vou colher uma nova amostra de sangue das duas para ter certeza.
Esther dizia alguma coisa que eu não ouvi olhando para a seringa, injeções me apavoram, tenho a impressão que vou desmaiar.
— Nara criatura, escutou o que eu disse?
Esther me olhava aguardando uma resposta que eu nem sabia qual a pergunta de tão atrapalhada que eu estava com a enxurrada de informação que recebi e aquela agulha pronta para me furar.
— O que disse eu não ouvi.— perguntei levantando da cama onde estava sentada.
Ao meu lado, demonstrando estar bem, Nyxs aproveitou para levantar também.
— Estou preocupada, se tiver engravidado minha neta, o risco para ela dobra de intensidade nessa ilha, com todos esses assassinatos, acho melhor e mais seguro ela voltar para Salem.
— Esther, eu amo você, mais do que amo minhas mães, mas se eu estiver realmente grávida isso é um problema meu e da Nara, não me diga como devo me comportar e não vou voltar para Salém sozinha.
— Não estou falando com você garota atrevida, estou falando com minha alfa, que antes de tudo é responsável pela segurança de todas vocês e se tiver carregando o filho dela faz parte da minha obrigação cuidar da sua segurança também, ou esqueceu do que está acontecendo nessa ilha.
— Helô, colha meu sangue e faça sua mágica acontecer.—Estirei o braço, e como um raio a garota tirou um garrote do jaleco e já veio amarrando no meu braço minha coragem momentânea acabou e senti minhas pernas falharem, Nyxs continuava calada me olhando assustada notei seus olhos lacrimejantes, mas não conseguia saber o que ela estava sentindo ela construiu um escudo de ar ao seu redor não dava para sentir seu cheiro ou de nada que estivesse próximo a ela.
— Acho melhor vir se sentar aqui, Nara. — vendo que a doutora não entendeu, ela explicou — Ela tem trauma de agulhas.
Todas sabiam desse meu medo sem explicação, mas a verdade é que tomar injeção me deixava desconfortável, as vacinas eu só tomava porque era o jeito, só de imaginar qualquer coisa perfurando meu corpo já me dava tonturas, Esther tentou não rir, Helô de uma forma compreensiva cortou a tensão perguntando.
— Nyxs antes de cair você e outros pássaros conseguiram matar a cobra?— Perguntou para desviar minha atenção da agulha puxando meu sangue que descia grosso quase preto para em um tubo etiquetado com as iniciais N.S.
— Não ela conseguiu escapar, mas está bastante machucada, os gaviões arrancaram pedaços generosos de todo o corpo enquanto eu servia de cobaia.
— Conseguiu ver para que lado ela foi, está na hora de dar um fim ao bicho, mesmo eu detestando matar animal.—segurei um bandait infantil em cima do local onde a agulha perfurou minha veia
Nyxs estirou o braço, para Helô colher o seu com uma coragem que eu não tinha, Esther só examinava tudo.
O som de algo sendo quebrado e uma bagunça generalizada lá fora chegou até nós, ouvimos uma pessoa falando palavrões acima do normal enquanto outras lobas riam da situação, corremos para a sala, antes mesmo de Helô furar o braço da Nyxs para a coleta.
Inaê segurava pelo braço uma garota que esperneava e chutava ao ouvir passos, parou escutando e sentindo nossa presença.
— O que está acontecendo, Inaê?
Esther ao perguntar olhou direto para a filha que amava brigas, aguardando impaciente a resposta, eu fiquei calada esperando que Inaê explicasse de maneira curta, a garota nesses momentos fazia uma sinopse de tudo que aconteceu puxando sempre o enredo do acontecimento a seu favor.
— Encontrei essa pestinha espionando o chalé.
— Ela está errada, eu não estava espionando, eu vim ver a alfa, se quiser já pode soltar meu braço.
A garota falou arrogante já sumindo no ar e aparecendo mais a frente, ao fazer isso surgiu com os dentes de fora rindo da cara da Inaê que se deu conta, que o tempo todo ela não estava prendendo a garota e sim ela se deixou prender, o que fez todas rirem do acontecido até mesmo Inaê.
— Então é isso, essa vela branca, o tempo todo podia sumir, porque não fez pedra de gelo— Inaê foi para junto da garota que apareceu ao lado da Nyxs mostrando a língua para a loba.
— Eu queria ver essa sua cara de bocó achando que estava no comando, e eu não sou vela branca e nem pedra de gelo, sua alimária.
— Sua, o quê???
A gargalhada foi geral com a cara da Inaê que pela primeira vez parecia sem palavras ou ironia, Esther para meu espanto parecia admirada com a nossa visitante, e foi mesmo ela quem respondeu para filha.
— Alimária era um termo para xingar nossos irmãos ou irmãs há muito tempo, isso não deveria vir da boca de alguém tão novinha.—Esther arqueava sutilmente as sobrancelhas franzindo levemente a testa enquanto não conseguia disfarçar o interesse na garota, ela sabia que tinha algo de muito estranho, sua curiosidade mudou de local quando ouviu a voz da filha.
— E quer dizer o que mesmo mãe?
— Ela está chamando você de, animal irracional, de pessoa rude, ignorante.---- Inaê correu para pegar a garota atrevida que a insultou, mas quase caí quando tentou agarrar Amina, outra vez e essa apareceu do outro lado, causando mais risos em todas.
— Quem é você meu bem? Não consigo sentir nada quando te observo, nem de bom, nem de mal—Esther perguntou de uma forma carinhosa.
— Essa coisinha linda se chama Amina, foi ela quem me manteve acordada lá no pântano e jogou um glamour evitando a cobra sentir meu cheiro.
Nyxs passou o braço em seus ombros magrinhos e completamente nus com a roupa se desfazendo, aquela garota precisava de roupas novas, nesse momento percebi ela cheirando a Nyxs que fingiu não ter notado.
— Meninas, Amina vem esse tempo todo muito próximo de todas nós, foi ela quem nós vimos quando estávamos na praia, lembram? No dia que quase fomos atacadas pelos tubarões?
As meninas concordaram, Manon no canto da sala nada dizia, só olhava ouvindo tudo.
— Você queria me ver? Aconteceu alguma coisa?
— Não sei, minha protetora não voltou para o chalé e nem está no Darius, também não está na casa de show, eu já fui lá olhar.
— Ela já fez isso outras vezes?
— Não, quando não vem para casa, sempre está no Darius e quando vai demorar na casa de show, deixa recado, hoje era o dia de me alimentar ela não ia desaparecer sem deixar um pote cheio e não tem nada em casa, é muito estranho, eu tenho um pressentimento ruim, e como você é responsável por nós eu vim pedir ajuda.
— Quem é sua protetora, meu bem, será que alguém pode explicar o que está acontecendo?--Pelo tom de voz, Esther estava começando a perder o que nunca teve “paciência”.
— Esther, jaja eu te explico tudo, deixa só eu entender o que está acontecendo. O que você está pressentindo minha lindinha. Consegue sentir a Amkaly em perigo.
— Como é que é???
As meninas formaram uma roda em torno da garota que parecia estar mais branca do que o normal, isso me deixava preocupada. Ela estava com os lábios e unhas arroxeadas, e os cabelos secos além do normal pelo que aprendi nas aulas sobre vampirismos, que quando isso acontece eles ficam inertes, como mortos até que sejam alimentados a quanto tempo ela não se alimentava? — Tomei a frente explicando tentando descobrir o que tinha acontecido.
— Amina é a filha prometida da Amkaly, ela chegou no dia que chegamos e disseram para ela vir para a ilha que a mãe dela estava doente, precisando da sua ajuda desde então, as duas vem cuidando uma da outra.
_ Logo da Amkaly com tanta loba legal, a mãe dela e logo aquela vad…
Não deu para Inaê concluir o que pretendia dizer. Uma nuvem negra escureceu a sala por instantes, quando passou Amina estava deitada em cima de Inaê com as presas afiadas prontas para enterrar no pescoço da loba.
— Retira o que falou da minha protetora, ou eu acabo com você, do jeito que estou faminta vai ser fácil drenar esse seu sangue podre, nem que eu morra outra vez.
Esther não mexeu um dedo para defender a filha, aliás ninguém tomou partido, ao contrário começaram uma aposta para saber quem iria hipnotizar quem em primeiro lugar, se a garota não tivesse com fome e fraca eu apostaria na vampira.
— Eu não vou pedir desculpas, sua mãe era sim uma vadia e uma piranha, sempre foi.
— E sua mãe, é louca. Doída e ..perturbada.
As garotas olhavam admiradas para Esther que nada fazia, seus olhos pareciam ficar cheio de calor ao ouvir as ofensas da garota, e resolveu intervir.
— Já chega Inaê, parece criança peça desculpas a menina, a mãe dela pode ser uma vadia, mas é mãe dela.
Amina sorriu aguardando o pedido de desculpas, sem entender que minha beta tinha ofendido a sua mãe também.
Inaê com a cara mais lisa do mundo fingiu pedir desculpas e ficaram de pé, mas a garota parecia não estar bem e foi caindo. Nyxs a amparou deitando seu corpinho em seu colo.
— O que ela tem? — perguntaram ao mesmo tempo.
— Fome, ela está com fome, —Falei me virando rápido para Heloise que ficou próximo a Nyxs tentando sentir o pulso da garota —Helô Não adianta tentar sentir a pulsação, pegue uma bolsa de sangue e venha rápido fazer uma transfusão ela já está entrando em processo mumificação.
Inaê apareceu do nada com duas bolsas de sangue ela mesma rasgou no dente despejando boa parte do líquido na boca de Amina que estava entrando em colapso, aparecendo e desaparecendo as presas rasgadas na gengiva estavam amostra para todos verem Esther ficou bem próximo a Nyxs acho que com receio da neta ser mordida afinal nenhuma de nós sabia como a falta de sangue afetaria um vampiro.
Manon pela primeira vez saiu de onde estava em silêncio, afastando as garotas de perto.
—A filha da Amkaly é uma vampirinha recém nascida, faz pouco tempo que ela foi transformada.
— Ela não vai beber sangue congelado, tem que ser sangue quente.—Esther completou já tirando um punhal para cortar o pulso. Manom impediu.
— Não Pode ser o seu, por enquanto seus instintos só reconhece o sangue da Amkaly. Não se apavorem, ela não vai morrer se não for alimentada, está sentindo dores, desidratada, e vai virar uma estátua, olhe a cor dos lábios arroxeado, as pontas dos dedos também estão roxas e duras, mas é normal para essa raça.
As garotas não desgrudavam os olhos do corpinho, ficando inerte nos braços da Nyxs até parar de se mover.
— Não dá para fazer a transfusão na veia, o braço dela está petrificado—Helô colocava no depósito de lixo cinco agulhas quebradas na tentativa de perfurar o braço da garota.
— Ela vai ter que beber direto do pulso, é um risco quando ela acordar pode morder sem querer seu doador, além de ter um vínculo com ele.
— Eu faço isso, corta onde?
Era difícil identificar a dona da voz, porque todas se ofereceram, inclusive Nalum, que já estava de pulso estirado.
— Eu faço isso, no organismo dela já tem meu sangue, ela não vai me machucar, quando eu estava no pântano ela já estava sem forças e lambeu minhas penas quebradas, e tomou um pouco do sangue, que escorria.
— Essa pode ser a mudança que estou vendo em seu sangue, o fato de ter alimentado uma vampira em crescimento.
Nyxs olhou para mim e vi a dúvida em seus olhos, pelo jeito de me olhar ela não acreditava muito na hipótese da mistura dos sangues, pela forma como Amina nos cheirava eu também comecei a duvidar.
Nyxs cortou o pulso, o sangue jorrou com facilidade, rápido Manon segurava o braço da Nyxs e levou o pulso a boca da garota que não teve reação alguma, o precioso líquido estava se espalhando rapidamente sujando tudo.
— Nara vem aqui, abre a boca dela, cuidado para não quebrar os ossos.
Abri com delicadeza deixando o líquido se espalhar com bastante cuidado para não usar força, fui lavando os dentes com o líquido, sentindo o gelo começar a esfriar, passei o dedo mais duas vezes empurrando sangue para dentro da sua boca que já dava para notar a mudança de cor.
— Vamos lá pestinha…abra esses olhos lindo — Nyxs falava carinhosa como embalar um BB no sono. Levantou a cabeça para nos olhar mudando o tom de voz. — La no pântano, quando ela estava se alimentando, eu tive uma visão do futuro.
Meu coração gelou, Esther me olhou rápido, e as meninas ficaram aguardando.
— Foram pedaços de visões, eu me vi tendo uma filha com você Nara, muito parecida com a Nalum, eu estava chorando e você também, o Israfil fazia um par de aliança, parecida com essa que às vezes você usa, fui eu que coloquei no seu dedo. Você colocou a minha e quando eu te dei nossa filha, te entreguei junto a minha aliança.
Nyxs olhava para a marca no dedo da mão esquerda, em silêncio, eu não sabia se dizia a verdade ou deixava ela lembrar naturalmente.
— Você viu a gente nas suas lembranças ou foi só a alfa. — Inae impaciente quase cai em cima da vampira, no exato momento em que ela abria os olhos.
— Ninguém se lembra de você sua doida e afasta que tá caindo em cima de mim.— Amina falava com a
boca cheia de sangue respingando na bruxa que pulou para trás ainda as gargalhadas.
Fim do capítulo
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