Nunca Te Amarei -- Capítulo 33

A porta do quarto se abriu com estrondo.

-- Bom dia!

Com o susto, Luciana e Kristen quase caíram sobre a cama. 

-- Poxa! A educação passou longe, né! -- resmungou Kristen, muito irritada.

-- Bom dia, Rick -- disse Luciana, que abraçou o rapaz e lhe deu dois beijos. Precisava tomar um banho e lavar os cabelos antes de enfrentar o senhor Francesco, ela tinha a sensação de que seria necessário mais que um banho para enfrentar o avô de Kristen -- Vou tomar um banho, ainda bem que trouxe uma roupa reserva -- disse e saiu em direção ao banheiro.

Assim que Luciana fechou a porta do banheiro, Kristen virou-se para Rick.

-- Nunca mais entre em meu quarto sem bater.

Rick afastou-se.

-- Vou tentar lembrar disso na próxima vez -- comentou, meio sem convicção.

-- Espero -- ela pegou as roupas jogadas no chão e colocou sobre a cama -- Como foi a festa?

-- Que bom que perguntou. A festa foi boa, apesar do fiasco do sumiço da anfitriã.

-- Foi por uma boa causa.

-- Isso eu sei, mas foi deselegante.

-- Até parece o meu avô falando.

-- Pois foi ele quem falou, só fiz um print da conversa.

-- Bobão, print não é isso.

-- É sim.

Kristen respirou fundo e conteve a irritação enquanto ouvia Rick discursando sobre o fato dos convidados terem ficado decepcionados com a ausência dela. Ouviu o ruído da porta do banheiro e virou-se para ver Luciana encostada no batente da porta. Estava vestindo uma calça jeans e uma blusinha justa. Tinha prendido os cabelos na base da cabeça e não usava maquiagem.

-- Tenho que sair voando, vou passar em casa para trocar de roupa.

Kristen ergueu uma sobrancelha e pegou o celular fingindo estar ligando.

-- Vou chamar um helicóptero para você.

Luciana ficou irritadíssima com a brincadeira.

-- Só por isso vai me levar em casa e depois na cafeteria.

-- Está bem. Mas não tenho o dia inteiro. Tenho que estar no Arpoador em pouco mais de uma hora. 

-- Podemos ir, então -- respondeu Luciana, ajeitando a bolsa no ombro e saindo do quarto.

Na sala, encontraram Francesco assistindo o jornal na tv. 

-- Bom dia, enfim, apareceram -- ele disse sem tirar os olhos da televisão -- Pensei que hibernariam o dia inteiro.

-- Claro que não, senhor Francesco, eu não esqueci do nosso compromisso -- disse Luciana, se dirigindo a porta -- Estarei na cafeteria no horário combinado.

-- Muito bom, prezo pela pontualidade.

Kristen revirou os olhos.

-- Velho chato!

Luciana deu um tapinha no ombro da loira.

-- Tenha mais paciência com ele.

-- Mais do que eu já tenho? Impossível.

Atrasada e quase sem fôlego, Luciana entrou na magnífica cafeteria. Droga, pensou, irritada. Kristen havia feito de tudo para que ela perdesse a hora. Enfim, mesmo assim conseguiu chegar pontualmente.

Como sempre a Cafeteria Colombo encontrava-se lotada. A maioria dos ricaços da região a frequentava em virtude de seus pãezinhos e folhados, recheados com diferentes tipos de geléias. Uma verdadeira delícia! Sem contar os doces e salgados maravilhosos.

Sem tomar conhecimento dos inúmeros olhares masculinos que atraíam, Luciana caminhou entre as mesas até atingir a última dos fundos, onde o senhor Francesco a aguardava. 

-- Bom dia, princesa -- ele olhou para o relógio e sorriu -- Subiu mais um ponto em meu conceito. 

-- Bom dia, senhor Francesco. Sinto decepcioná-lo, mas não costumo ser assim tão pontual.

-- Sendo comigo, já está ótimo.

A garçonete aproximou-se no instante em que Luciana acabava de colocar a bolsa no encosto da cadeira. 

-- Um Folhado de Queijo, um Tartelete de chocolate com avelã e um Expresso com Creme -- Francesco pediu à moça e voltou-se para Luciana -- E você, minha filha, o que vai pedir?

Ela olhou rapidamente para o cardápio e depois fechou, largando-o sobre a mesa.

-- Posso pedir o mesmo que o senhor?

Ele riu.

-- Lógico.

A garçonete balançou a cabeça positivamente e saiu. Depois de fazerem os pedidos, um silêncio constrangedor invadiu o espaço entre eles. Luciana esperou Francesco se manifestar. 

-- Confesso que quase não dormi essa noite na expectativa dessa conversa. Por favor, me conte tudo o que você sabe. Qualquer coisa, por menor que seja. 

Luciana respirava fundo, tentando controlar o enjoo que lhe ameaçava revirar o estômago. Estava assustada, mas não iria se deixar dominar pelo medo. Se o senhor Francesco prestasse mais atenção, perceberia que ela estava apavorada, tremendo como um ratinho assustado. Tentando buscar coragem, Luciana levantou o queixo e respirou fundo, decidida a não se deixar abater. 

-- Eu tenho muita coisa a falar, senhor Francesco e tenho certeza que no fim da nossa conversa o senhor vai me odiar.

Francesco olhou-a admirado. 

-- Você está me assustando.

Luciana deu uma risadinha sem graça.

-- É assustador mesmo. 

O lanche chegou e eles começaram a comer.

-- Está delicioso -- Francesco estava determinado a tornar aquele encontro agradável. Um ambiente tranquilo ajudaria a conquistar a confiança da jovem.

Olhando para o prato de Francesco, ela assentiu e continuou a comer seu folhado de queijo. 

Por alguns segundos, ele a fitou como se estivesse estudando-a com atenção. O Senhor Francesco tinha uma maneira de observar as pessoas fazendo-as sentirem-se intimidadas com o brilho intenso daqueles olhos verdes, tão peculiares na família Donati. 

-- De modo geral, pessoas civilizadas conversam durante a refeição. E nós não somos selvagens, não é? Uma expressão diferente apareceu nos olhos dele. 

Luciana pensou que talvez tivesse feito algo de errado. No entanto, ele sorriu.

-- Você pode começar a contar o que sabe, devagar e com calma, já que me disse que é uma longa história.

Luciana pegou a xícara de café expresso e tomou um longo gole. 

-- Eu fui amante do Arthur por cinco anos -- ela foi direto ao ponto.

Francesco arregalou os olhos, a mente em turbilhão enquanto tentava entender a confissão de Luciana. Ficou sem ação, olhando-a perplexo.

-- Se isso for uma piada, pode ter certeza que é de grande mal gosto. 

-- É sério senhor Francesco, eu era amante do seu filho.

Francesco passou a mão sobre o peito como se estivesse infartando. Luciana olhou-o preocupada. Ela sabia que ele estava chocado.

-- O senhor está bem?

Ele não respondeu a pergunta, apenas, comentou muito irritado:

-- Você acaba de ser brutalmente honesta comigo. Por isso, vou ser brutalmente honesto com você. Estava completamente enganado a seu respeito, você não presta! -- ele disse e se levantou para sair.

-- Por favor, senhor Francesco, permita-me que lhe conte toda a história. Depois o senhor decide se deve ou não me dar uma chance.

Francesco fixou-a com o olhar. Luciana parecia prestes a chorar. 

-- Sou louca por sua neta -- admitiu ela -- Mas estou disposta a abrir mão desse amor em troca da verdade.

Francesco emitiu um som exasperado e voltou a sentar-se.

-- Imagino que isso nem passe pela cabeça de Kristen -- ele disse num tom arrastado.

-- Quando ela souber a verdade, vai me odiar. 

-- E eu não a culpo. Mas você sabe que é apenas uma questão de tempo até que ela descubra que seu coração guarda esse segredo. Ela ainda não descobriu, porque está apaixonada. Quando estamos apaixonados, ficamos encantados pelo outro. Ficamos realmente encantados (no sentido literal da palavra). Quando estamos apaixonados, nosso cérebro libera neurotransmissores relacionados ao prazer. São exatamente os mesmos liberados no cérebro de um viciado ao consumir uma droga. Pergunta: você acha que um viciado, que acaba de consumir sua droga, está apto a ter uma conversa sincera, crítica e racional sobre a sua droga? Por isso que o amor nos cega e é por isso que ela ainda não descobriu com quem está metida.

Luciana abaixou a cabeça, triste e infeliz, mas estava alí com um propósito e não desistiria por nada.

-- Arthur queria apenas um relacionamento casual e eu estava interessada em bem mais que isso. Era jovem, sonhadora e apaixonada -- Luciana jogou a cabeça para trás e ficou olhando para o lustre -- O tempo foi passando e acabamos nos envolvendo de uma forma que tornou-se impossível reverter.

-- Não seria impossível se realmente quisessem.

-- O senhor tem razão -- disse Luciana, em meio a um suspiro -- Mas tempos depois tudo mudou e eu fiquei sem saber o que fazer. 

Francesco levantou a cabeça e cerrou os olhos, esperando que ela continuasse, mas ela não continuou, então ele perguntou:

-- O que mudou?

A jovem Luciana piscou várias vezes e engoliu em seco. 

-- Eu engravidei.

Fim do capítulo