Domingo havia começado muito bem para Alice! Apesar do susto, acordar nos braços de Bruna havia sido muito bom! Ela sabia que não deveria ter gostado tanto, mas não conseguia se segurar. Aquela massagem em sua cabeça e a forma como dormiram instintivamente abraçadas na cama, havia sido de uma intimidade ainda maior que o sex*. O cheiro da menina estava em sua cama e ela se pegou respirando mais fundo deitada em seus travesseiros.

Ela e Ana haviam marcado de passarem a tarde juntas ali no seu apartamento, para que seus filhos pudessem brincar juntos e elas pudessem relaxar um pouco. Quando a amiga chegou com uma garrafa de vinho, seu dia ficou ainda melhor!

Gael e o filho de Ana rapidamente foram se divertir sozinhos com brinquedos, vídeo games e jogos. Eles até conseguiram entreter um pouco Enzo, que não costumava interagir muito com outras crianças, mas Alice só conseguiu relaxar mesmo quando seu filho mais novo tirou a soneca da tarde e as duas aproveitaram a paz para abrir o vinho. No entanto, a paz durou apenas até o momento em que Ana viu a marca enorme da mordida em seu ombro, mesmo com Alice tendo escolhido especificamente uma blusa que cobrisse.

– O que é isso? – ela perguntou afastando o tecido para ver melhor – O Enzo te mordeu?

Só nesse momento em que ela reparou no quão vermelha Alice ficara com a menção da mordida.

– Não – foi tudo que conseguiu dizer enquanto escondia a marca novamente por debaixo da blusa.

– Então é uma mordida de um homem adulto? – falou levantando as sobrancelhas sugestivamente.

– Não! – Alice falou com veemência.

– Ah, vamos lá! Por que você está mentindo logo para mim? – perguntou quase que realmente ofendida – O Gustavo já falou para o Pedro que você estava dormindo com alguém! Até o seu ex-marido sabe e eu não. Me fala logo do seu boy novo!

– Eu não estou mentindo! Não tem nenhum homem!

Alice olhou para a cara de incredulidade da melhor amiga e não pôde deixar de pensar na conversa que tivera com Bruna. Ana nem conseguia cogitar outra possibilidade além de outro homem. Como ela havia passado anos sem conversar sobre isso com a sua melhor e única amiga?

– E você espera que eu acredite que essa mordida gigante não foi feita por conta de sex*? Você tem estado toda alegre! É claro que está dormindo com alguém!

– Sim... – Alice admitiu – Eu estou dormindo com alguém, mas não é um homem.

Ela achou que aquela frase seria declaração suficiente, mas aparentemente não porque Ana olhava para ela ainda sem entender. Bruna estava certa. Ela vivia uma vida muito hetero mesmo.

– É uma mulher – falou quase como se fosse óbvio e foi recebida com olhos arregalados.

– Não acredito! Você é... – ela não terminou a frase como se a palavra “lésbica” fosse um xingamento.

– Lésbica? – quando a amiga assentiu, ela rapidamente corrigiu – Não, eu sou bissexual.

– Meu Deus! Como eu não sabia disso? – perguntou ainda muito claramente chocada – Mas você tem certeza?

Aquela era uma pergunta real?

– Não está só curiosa agora porque se separou? – continuou.

– Não! – Alice falou ofendida – Essa não é minha primeira relação com uma mulher! Eu estive em um relacionamento de anos antes de casar com o Gustavo.

– Meu Deus! – ela repetiu – Como eu não sabia disso? E você foi casada com o Gustavo por anos!

– Sim – Alice falou sem entender a relação.

– Como isso funcionava? – perguntou legitimamente sem compreender – Vocês tinham um relacionamento aberto? Um acordo e você dormia com mulheres? Ou vocês faziam juntos?

Alice nem conseguia acreditar. Sua melhor amiga era realmente sem total noção sobre sexualidade?

– Não é porque eu sou bi que eu preciso estar em relacionamentos simultâneos com homem e mulher – falou o que ela achava ser óbvio – Você gosta de homem e apesar de terem milhares pelo mundo é casada com um só e te basta. Para mim é a mesma coisa, só que as minhas opções são um pouco maiores...

– Claro – sua amiga ao menos reparou no absurdo que disse – O Gustavo sabe?

– Sim, ele sempre soube. Ele foi a primeira pessoa para quem eu contei.

– E ele aceitava numa boa? – falou com incredulidade.

– Claro! Não é nada demais... – ela ainda não estava acreditando na reação de Ana.

– Eu não consigo acreditar que você nunca me falou! – ela estava um pouco magoada.

– Eu não escondi intencionalmente, só nunca veio o assunto... – então lembrou-se novamente da conversa com Bruna – Acho que eu estava vivendo uma vida muito hetero.

– E agora você quer se relacionar com mulheres?

Ela queria se relacionar com a Bruna.

– Não necessariamente... Eu admito que depois de anos casada com um homem eu estava querendo sex* com outra mulher, mas eu não estava procurando nada...

– Eu tenho tantas perguntas! – Ana falou animada, mas vendo a feição nada animada de Alice, justificou-se – Desculpa, mas eu nunca conheci uma pessoa bi – parando para pensar – Na verdade, eu nem conheço nenhuma pessoa gay também. Sem contar a Bruna, né – lembrou-se e Alice precisou controlar melhor suas feições para que Ana não reparasse nada – Você sabia que a professora do Enzo é gay?

Ela perguntou daquela forma que pessoas hetero acham que todos os queers se conhecem e Alice reviraria os olhos, mas a menção de Bruna a deixou nervosa.

– Como eu saberia disso? – disfarçou.

– Você nunca ouviu uma fofoca sobre isso? Ela não esconde! Tudo mundo sabe – falou como se fosse um escândalo.

Deus do céu! A sua amiga era mesmo tão alienada assim desde sempre?

– Não deve mesmo ser um segredo...

Ana olhou para ela com um olhar de “e você está falando isso?”.

– Eu não estava escondendo! Eu só não sou muito de falar da minha vida, você sabe... Mas você pode contar para todo mundo que conhece se quiser e eu não ligo...

Ela realmente não tinha nenhuma intenção de esconder quem era.

– Bom, já que você está tão despreocupada das pessoas saberem, eu quero detalhes sobre essa mulher com quem você está saindo!

Alice ficou vermelha novamente e pensava em como iria sair daquele enrascada.

– Você me deve! Você não me contou sobre você durante todos esses anos! Eu acabei de descobrir que tem um lado da sua vida que eu nem fazia ideia que existia! Agora eu quero saber de tudo! – falou um pouco sentida e Alice teve que admitir que a chantagem emocional estava fazendo efeito.

– Está bem – falou rendendo-se – O que você quer saber?

Era uma pergunta perigosa, ela sabia, mas o vinho provavelmente estava começando a fazer efeito.

Ana fez uma feição animada quase como o Gael fazia quando ela deixava ele assistir vídeos do tik tok.

– Como você conseguiu essa mordida? Você gosta de sex* mais pesado?

Alice riu.

– Não é nada que você está pensando! – ela sempre ficava um pouco sem graça ao falar de sex*, mas o vinho estava ajudando um pouco – É que o lugar onde estávamos exigia silêncio – mais sem graça ainda ela completou quase sussurrando – E quando ela gozou, para não gritar, ela me mordeu.

– E onde vocês estavam que precisava de silêncio? – perguntou com um tom provocativo – Ela é do seu trabalho?

Alice não poderia sob hipótese alguma dizer que era Bruna. Então ela decidiu aproveitar a oportunidade e mentiu.

– Sim.

– Nossa! E um orgasmo gritando? – Ana olhava para ela divertindo-se com os detalhes – Isso deve ter sido bom! Estou com um pouco de inveja! Você sabe que o Pedro consegue realizar bem o serviço, mas gritar? Nunca! – então mais ainda curiosa – É verdade que o sex* com mulher é melhor?

– Não necessariamente – Alice não sabia como explicar – Depende da preferência pessoal de cada um.

– Você tem preferência entre homem e mulher?

Alice precisou parar para pensar no assunto.

– Minha preferência não é necessariamente com um gênero específico, é mais com a pessoa.

A sua preferência no momento era simples: Bruna.

– Mas o sex* com essa mulher é melhor do que com o Gustavo?

Ana realmente não media as perguntas.

– Sim – falou sem nem precisar pensar, depois sentiu-se um pouco culpada – Não que o sex* com o Gustavo não fosse bom. Era muito bom! Mas é que com a... – ela quase falou Bruna – ...essa mulher... – trocou na última hora – É de outro mundo! É tão bom!

Alice precisou se segurar para não deixar as lembranças tomarem conta. Ana parecia estar adorando os detalhes.

– Ela é muito gostosa! – admitiu – Ela é outro nível, eu nem faço ideia de como ela está interessada em mim! Sério... eu nem sei como te descrever...

– Como ela é? Você tem uma foto? Eu quero ver!

– Não... – Ana negou rapidamente.

– Como você não tem uma foto? Há quanto tempo vocês estão juntas?

– Não estamos juntas! – falou com veemência – Não é nada sério!

Ana olhou para ela novamente sem acreditar.

– Há quanto tempo?

– Desde por volta do dia das mães – admitiu – Mas não é nada sério! De verdade! É só sex*! Eu não tenho a menor condição de ter um relacionamento sério com ninguém nesse momento.

– Qual o nome dela? – perguntou pegando o seu celular.

– Por quê? – perguntou desconfiada.

– Eu vou procurar ela no insta, óbvio! Você não tem foto, mas eu quero vê-la!

– Não! – Alice falou firme – Nem pensar!

– Por que não?

Ela precisava de uma desculpa boa, mas o que saiu de sua boca foi a mais pura verdade.

– Eu preciso que minha relação com ela fique na bolha que está. É tão bom! É o meu momento de me desligar do meu mundo e de todas as minhas preocupações – falou sinceramente e completou vulnerável – Eu não posso deixar a vida real estragar isso!

– Mas por que a vida real estragaria?

Ela não podia falar para Ana um dos motivos. Bruna era professora do Enzo. Ela perderia o emprego se alguém descobrisse e Alice não gostaria de ter um relacionamento sério em segredo, mas esse era apenas um dentre tantos outros motivos pelos quais elas nunca conseguiriam ficar juntas.

– Somos muito diferentes – resumiu.

– Como assim?

– Para começar ela é muito mais nova que eu.

– Quantos anos ela tem?

– Vinte e cinto.

– Isso não é muito – Ana tentou incentivar – Homens tem relacionamentos com mulheres mais novas o tempo inteiro e ninguém fala nada.

– Verdade – teve que concordar – Mas estamos em estágios totalmente diferentes das nossas vidas. Eu sou mãe de duas crianças, divorciada, cheia de bagagem. Ela é só uma menina! Mal está começando a vida adulta...

O que possivelmente Bruna iria querer com ela além de sex*? Ela não tinha muito mais a oferecer.

– E como eu falei, somos muito diferentes... Em praticamente tudo! A única coisa que a gente concorda é em como o sex* é maravilhoso!

A sua tentativa de fugir do assunto principal não colou com Ana.

– Você quer uma relação mais séria com ela, não é?

A amiga conseguia ver a verdade estampada em seu rosto.

– Não importa o que eu quero... Não é algo realístico e eu preciso medir as minhas expectativas.

Sentindo que Alice se fecharia se continuassem naquele assunto sério, Ana rapidamente mudou o foco da conversa.

– Eu preciso saber mais sobre sex* com mulheres! Você é ativa ou passiva? – perguntou em tom de brincadeira, mas ainda deixando claro que queria a resposta – Vocês usam vibrador em diferentes tamanhos de p*nis? O que essa garota tem de tão especial que você falou que o sex* era de outro mundo?

Alice não conseguiu não rir.

– Eu vou precisar de mais vinho para essa conversa!

Fim do capítulo