CAP 21 POV LÍVIA
Sabe aquela sensação de que algo muito ruim está para acontecer? Pois bem, era esse o sentimento que tinha no meu peito desde que vim pra Recife. Eu sabia que era uma oportunidade de ouro na minha carreira e eu não poderia desperdiçar e até o momento a Daniela estava compreendendo muito bem, na minha cabeça ela mudaria comigo tranquilamente, mas as últimas notícias fizeram a sensação no meu peito se tornar desesperadora, eu podia ver o nosso namoro se desfazendo aos poucos, porém tudo se tratava de uma escolha, a carreira ou o coração. Carnaval as portas, eu com vários compromissos e agendas, Daniela de malas prontas pra vim se encontrar comigo quando tudo aconteceu, eu não podia ir ao seu encontro e foi ai que tudo começou a se quebrar. Logo após desligar o telefone depois de uma discussão horrorosa deitei na cama e chorei como a tempos não o fazia, a sensação de perda dentro de mim me matando aos poucos, eu procurava uma solução mas não conseguia ver um palmo à minha frente, eu sabia que com a mãe doente as chances de Daniela vim morar comigo era nula e eu não queria deixar escapar essa oportunidade, eu precisava falar com alguém, precisava de uma segunda opinião. 

- Oi Lidy 

- Oi vaquinha, tá chorando? (Minha irmã só me chamava pelo apelido carinho ou não tanto assim)

- Eu to muito triste. Acho que meu namoro vai acabar.

- O que foi que aquela amarela fez? (Minha irmã muito protetora)

- Se acalma, ela não fez nada mas aconteceram algumas coisas, eu estou precisando me mudar pra cá mas a Daniela não pode, a mãe dela fez uma cirurgia, eu pensei que ela vinha comigo mas ela tirou todas as minhas esperanças. Como vai ser daqui pra frente? Namoro a distância? Ela não vai aguentar, já vive reclamando por causa do mundo que estou inserida, você sabe como é, o povo é muito atirado, ela fica louca com certas coisas imagina sem a possibilidade de ela vim pra cá.

- Vaquinha, a mãe dela não vai ficar doente para sempre. Ela num esta arrumando desculpa pra te dispensar não? 

- Eu não sei Lidy, a gente tava bem, ela ia vim passar o carnaval comigo mas tudo aconteceu rápido demais e ela falou que não vem mais e não é só no carnaval, ela falou que não vem mais pra morar.

- Eu to achando isso muito estranho. O que você acha de eu ter um papinho com ela? - Não mesmo, deixa que eu resolvo, eu só queria conversar com alguém pra tirar esse peso de cima de mim.

- Não tem que sentir peso nenhum. Você está trabalhando Liv, essa é a oportunidade da sua vida, ela está louca de deixar um mulherão desse escapar. Você é linda, uma cantora em ascensão, uma pessoa do bem, o que não é fácil encontrar hoje em dia e ela ainda tá de cú doce. Eu não sei onde tô com a cabeça que não digo umas verdades na cara dela. E você nem ouse abandonar sua carreira por causa de mulher nenhuma, eu te bato Vaquinha se fizer isso.

- Não vou mentir, isso já passou pela minha cabeça, mas eu sei que seria o fim pra mim e pra nós, depois eu iria culpá-la pela minha decisão.

- Você não está nem louca.

- Eu sei, não vou fazer isso, essa era a oportunidade que eu precisava. Lidy eu não contei a ninguém mas eu recebi uma proposta pra ir pra Fortaleza gravar com um cantor de nome lá, nem contei a Daniela. Eu sei que a vida que tenho agora é muito difícil manter um relacionamento, mas porque eu encontrei ela logo agora? Lidy eu amo muito ela, eu já estou sofrendo porque eu sei que ela não vai me acompanhar. O que eu faço?

- Sinceramente, nunca pensei que veria você chorar por causa de uma mulher, mas pelo visto o cupido te acertou em cheio. Conversa com ela, você só vai poder tomar uma decisão depois que conversarem.

- A gente já conversou, na verdade brigou, eu me estressei logo, ela tem uma dependência muito grande da família, não é como a gente super desprendida, eles parecem um grande bando que só anda junto e depois dessa doença da mãe dela aí foi que piorou.

- Mas ela tem que crescer Vaquinha, tem que sair debaixo da saia da mãe. A vida nem sempre é do jeito que planejamos e se ela não te quiser eu sei que você vai encontrar quem não sabe alguém melhor.

- Não tem melhor, se não der certo entre a gente eu não vou encontrar ninguém que supere ela. Lidy sabe aquela pessoa que você encontra que é tão perfeita que qualquer outra que apareça nunca conseguirá superar?  

- Eu não sei, mas imagino.

- Pois eh, ela sempre foi meu amor platônico e quando se tornou real foi melhor dez mil vezes do que imaginei, como que vou ficar com outra pessoa sem comparar, sem querer que seja ela?

- Ah, Vaquinha eu sinto muito, queria poder fazer alguma coisa, você não quer me deixar falar com ela.

- Não Lidy, é uma coisa que precisamos aprender a fazer, conversar.

Fiquei até tarde conversando com Lídia, minha irmã mais velha, sai daquele quarto mais calma e já com um plano na cabeça. No outro dia já era sábado de carnaval e sai no embalo de viagens e shows e disse pra mim mesma que iria focar na minha carreira, não iria entrar em contato com Daniela, caso ela me ligasse tudo bem, mas no momento meu foco era o trabalho, liguei pra Dona Francisca todos os dias pra saber como estava sendo o resguardo dela tentava ao máximo não mencionar o nome da minha namorada, eu estava sedenta por essas informações mas não queria dar o braço a torcer, minha sogra percebeu e fazia questão de mencionar o nome dela de vez em quando, sutilmente ela falava e eu deduzi que Daniela estava praticamente morando com ela. Esses quatro dias foram um terror pra mim, meu coração tão apertado, a saudade dela, da sua voz, do seu cheiro, só me acalmava quando falava com Dona Francisca e ela soltava as informações que eu queria saber mas não tinha coragem de perguntar, nunca tinha feito tanto show na minha vida, nunca tinha ganhado tanto dinheiro em tão pouco tempo mas quem me conhecia percebia que meus olhos não estavam na mesma sintonia do meu sorriso. Na terça-feira fui cumprir minha agenda já com a mala pronta, saí de Recife na quarta-feira em direção a Natal pedindo a Deus uma segunda chance com meu amor. Cheguei em Ceará-Mirim quase meio dia, estava acabada precisando de banho e cama e foi isso que fiz, precisava estar bem pra ter uma conversa que talvez iria destruir meu coração. Ninguém sabia da minha viagem, não contei nem a minha sogra que era com quem mantinha contato, então quando cheguei na porta da casa dela, Jefferson meu cunhado teve um susto.

- Gente do céu, você não estava em Recife?

- Estava sim kkkkkk. Sua irmã tá ai?

- Ta sim entra. Que bom que veio, não aguentava mais o mal humor daquela amarela. Entra, eu vou chamar ela.

Fiquei na sala esperando pelo meu amor que veio do quarto assustada. Ela me abraçou tão apertado que eu achei que iria me partir ao meio. Ficamos naquele momento tão íntimo por um tempo que para mim pareceu pouco pois quando ela se separou eu senti falta. 

- Como assim você aqui em plena quarta-feira de cinzas?

- Eu não estava aguentando. Só fiz cumprir a agenda e peguei um carro direto pra cá. Cheguei quase meio dia mas eu precisava dormir por isso que cheguei agora.

- Eu tava deitada quase dormindo, até escutei a campainha mas não quis levantar, ai você me aparece aqui toda linda, eu tô com tanta saude.

Ela me agarrou novamente e era tudo que eu queria.

- Eu também estava morrendo de saudade e também morrendo de medo de você não me querer mais.

- Não diz isso nem brincando. Eu te amo tanto, eu sei que temos que conversar e que temos muitas pendências mas me deixa ficar assim só um pouquinho.

- Tudo que mais quero é ficar assim com você. 

Me afastei um pouco dela, olhei bem dentro dos seus olhos, nos meus tinha um pedido, quase uma súplica e ela entendeu. Aproximou o rosto do meu e tocou meus lábios com o seu e a sensação de angústia foi saindo de mim. Eu me entreguei aquele beijo com sede, não era nada sexual, era saudade, era os corpos se encontrando e se reconectando, ela era a melhor coisa que tinha acontecido na minha vida e eu iria lutar com todas as forças pra ter ela comigo. Terminamos o beijo e ficamos nos olhando e ela acariciava meu rosto com tanta gentileza, tanto carinho que eu só queria ficar ali pra sempre. Num susto lembrei de Dona Francisca.

- Amor sua mãe cadê?

- Tá lá no quarto, vem vou te levar pra ver ela.

Ela pegou minha mão e saiu me puxando em direção ao quarto de sua mãe.

- Mãe, olha quem tá aqui.

- Daniela, pelo amor de Deus eu fiz uma cirurgia cardíaca e você trás as pessoas aqui no quarto me dando susto e além do mais tô toda bagunçada.

- Deixe de coisas minha véia, a senhora está bem demais e eu não lhe conheci com essa vergonha toda além do mais é a Lívia, sua amiguinha que falava com a senhora todo dia.

Não aguentei e caí na gargalhada, ela estava soltando indireta com ciúmes de mim com sua mãe.

- Eu não acredito que a senhorita está com ciúmes da sua mãe Daniela.

- Isso não é ciúmes. Só estou revoltada, você ligava pra ela e não pra mim.

- Daniela pare com isso que você também não ligou e outra ficava mandando eu colocar no viva voz pra ouvia a voz dela. (Minha mãe tomou as dores da Lívia)

- Mãe, a senhora poderia ter deixado essa passar, não precisava contar.

- Então quer dizer que você estava escutando conversa alheia amor? Não acredito que fez isso.

- Eu não fiz nada, ela não colocou no viva voz nenhuma vez.

- Então quer dizer que só não escutou porque ela não deixou?

- Isso mesmo.

Cai na gargalhada novamente, ela tinha a cara mais linda e lisa do mundo.

- Dona Francisca a senhora tá muito bem, pelo menos a aparência.

- Eu to melhor sim, aliás avise a essa amarela que eu to bem, ela não me deixa sair do quarto, eu já estou ficando transparente sem tomar um solzinho.

- A senhora não pode mãe, a senhora tá parecendo um bebê muito teimoso, tenho que tá correndo atrás dela senão sai de casa, come o que não deve e faz tudo dentro de casa, Lívia acredita que eu peguei ela brigando com a mulher que tá ajudando nas coisas aqui, ela tava falando porque a mulher não estava lavando a louça direito, tem cabimento uma coisa dessa? Aí deixei ela de castigo no quarto.

- Ela me trancou aqui, não posso nem mais ir na minha cozinha, só faz comida sem gosto, eu já estou em desespero.

- Dona Francisca a senhora tem que ter muito cuidado nesses primeiros dias, tente se acalmar que já já passa.

- Ôh coisa triste viu, tô louca pra comer uma comida de futuro.

- Nem tão cedo minha véia, por enquanto só dieta e não reclama que tô tentando fazer o melhor que posso.

- Eu sei que sim mas isso é horrível, tenho que ter pelo menos o direito de reclamar.

- Ah véia rabugenta essa minha viu.

Aquele restinho de tarde foi muito agradável, nunca tive esses momentos de conversas e brincadeiras com a minha família, não sabia que precisava fazer parte de algo tão lindo e agora que tenho não quero perder, esse é o tipo de coisa que o dinheiro não compra, agora eu entendo o motivo daquela família viver em bando e sempre unidos. Jantamos juntos, todos na mesa, uma conversa leve e saudável, Dona Francisca tinha um humor ácido mas no fundo era só zueira, ela era um doce de pessoa, conversar com ela acrescentava tanto na minha vida, essas conversas no telefone com ela me fez pensar bastante, ela é muito sutil, muito astuta e muito inspiradora. Após o jantar ela tomou seu remédio e foi assistir TV, Daniela me chamou pra sair pra um local mais calmo pra gente conversar.

- Amor, que tal a gente ir pra minha casa? Lá é mais calmo, dá pra gente conversar à vontade.

- Mas e sua mãe? Ela vai ficar sozinha?

- Não. Jefferson vai ficar e também ela já tomou os remédios agora só vai dormir e só depois que assistir os negócios dela aí na TV. 

- Então tá, vamos. Dona Francisca a gente vai passear um pouco mas voltamos pra dormir aqui viu.

- Eu não sei se vamos dormir aqui. (Ela falou com a cara mais cínica do mundo)

- Daniela deixe de coisa, nós vamos voltar sim.

- Ah os jovens, vão embora namorar enquanto são novas e se não quiser voltar hoje não tem problema, Jefferson vai ficar aqui comigo, podem ir tranquilas.

- Daniela você tem horas que se supera. Vamos embora antes que eu desista.

Saí daquela casa morta de vergonha, Dona Francisca e Daniela só faziam rir de mim. Passamos na sorveteria pra pegar açaí e levamos pra casa porque segundo minha namorada a casa estava praticamente abandonada.

- Eu estou só esperando o mês terminar pra mim entregar a casa, agora que não estou trabalhando e mãe nessa situação morar sozinha se tornou um desperdício de dinheiro e pra completar a pessoa que me fazia usar a casa vai se mudar pra Recife aí ela ficou sem muita utilidade.

- Amor não fala assim, é o meu trabalho, 

- Eu sei, não to falando por mal, só foi um comentário fora de hora, desculpa.

- A gente precisa conversar.

- E a gente vai, vamos pegar o açaí e vamos pra lá, pelo menos tem alguma coisinha doce pra colocar na boca.

- Oxe, e eu sou o que? Azeda?

- Ah meu Deus, to vendo que essa conversa vai ser a última coisa que vou fazer hoje.

Partimos em direção aquela casa, eu pelo menos com as esperanças renovadas mas lá no fundo com medo. Amor eu sei que tínhamos de sobra, o problema é que um relacionamento não sobrevive apenas de amor.

Fim do capítulo