Primeiro capítulo:

 

Prazer, Cecilie

 

O início desta história, data de 16 anos atrás, começa no dia 7/7/2007.

 

O clima andava tenso na casa dos Miyake. Cecilie e Cristopher estavam preocupados com os constantes conflitos entre os pais.

 

- Irmão, você acha que eles vão se separar?

 

- Menina, não diga uma coisa dessas.

 

- Eles andam brigando tanto.

 

- Vida de casal é assim mesmo (tentou amenizar, mas, no fundo sabia que a situação era crítica e só piorava ainda mais com o passar dos dias).

 

- Antes eles não brigavam assim, ultimamente a mamãe anda gritando tanto e quebrando as coisas. Fico até com medo.

 

- Vai passar, deve ser só uma fase complicada (respondeu aumentando o som da televisão, com intuito de não ouvir mais uma, das inúmeras discussões).

 

- Deus te ouça!

 

O jornal da tarde estava acabando e os dois aguardavam o início do filme. No noticiário viram que naquela data o Cristo Redentor acabava de ser eleito uma das sete maravilhas do mundo moderno. A adolescente pegou uma folha de sulfite e começou a desenhar.

 

- Mana, você desenha tão bem.

 

- Pena que a mãe não deixa eu colar no meu quarto.

 

- Vamos continuar guardando tudo, quando comprarmos as nossas casas, as paredes serão cheias da sua arte.

 

- Vou guardar na minha pasta.

 

- Filha, deixa eu ver. Que lindo, tanta riqueza de detalhes. Parabéns!

 

- Obrigada!

 

- A mãe de vocês não quer mais viajar.

 

- Estamos com as malas prontas já tem uma semana.

 

- Eu sei Cristopher, vamos só nós três, saímos amanhã cedo. Vou dar um pulo no mercado, assinar uns papéis, querem vir junto?

 

Toparam, estavam doidos para sair de casa e ansiosos para iniciar a viagem de férias de meio de ano.

No dia seguinte os três pegaram a estrada e viajaram para o litoral, ficaram quinze dias em outro estado e aproveitaram bastante.

Yuto Miyake nasceu no Japão, sua família mudou para o Brasil quando ele tinha oito anos, se formou em administração e herdou o supermercado que seu pai fundou. Quando os seus familiares decidiram retornar para a sua terra natal, optou por permanecer em terras brasileiras e não se arrependeu, tem muito orgulho dos filhos lindos que possui, ambos estão crescendo e são os seus tesouros.

Christopher tem quinze anos e pretende seguir os passos do pai, gosta de passar as suas horas vagas em um dos supermercados, atualmente são três unidades, pois, Yuto conseguiu expandir os negócios e vem tendo bastante sucesso.

Cecilie, com seus treze aninhos ainda não faz ideia do que vai seguir no futuro, tem muita vontade de viajar para o Japão, seu pai prometeu que será o seu presente de quinze anos e ela vem sonhando com isso. Ela gosta muito da cultura japonesa. Além de desenhar muito bem, tem japonês fluente e inglês também, pois, estuda desde a infância.

Ângela é brasileira e responsável pela área de recursos humanos da rede Miyake, foi desta forma que conheceu Yuto, quando começou a trabalhar como estagiária, se formou e se aproximaram, é de família evangélica, namoraram por pouco tempo, logo casaram e tiveram o casal de filhos. Que parecem muito mais com o pai do que com ela.

O casamento anda desgastado, Ângela reclama que ele não tem mais o mesmo interesse e é a realidade. Até procuram ficar bem por conta dos filhos e da família que construíram, porém, a relação anda insustentável. Já tem aproximadamente um ano que ele vem falando constantemente em separação, ela já pediu para o pastor conversar com ele diversas vezes, mas, sem sucesso, não conseguem reestabelecer o matrimônio, que está arruinando e estão sofrendo muito. Nem mesmo dormem mais no mesmo quarto, ela sente falta do relacionamento que tinham, enquanto ele atualmente só quer amizade, continuar bem com os filhos e seguir tocando os negócios.

Quando retornaram de viagem ele acionou seu advogado, deu entrada no pedido de separação e decidido informou para os filhos.

 

- Jamais os abandonarei, sinto muito, é uma situação muito delicada para todos nós, mas, não temos mais condições de continuarmos desta forma, as brigas só pioram, a convivência anda desgastada, prefiro ser amigo da mãe de vocês, manter o respeito e não continuar vivendo em pé de guerra. Não é uma decisão fácil, mas, não tem mais jeito. Nós tentamos muito, principalmente por vocês dois, que são tão importantes.

 

Acabou sendo melhor para todos, as brigas cessaram, ele saiu de casa, mas, continuou sendo presente na vida dos filhos, encontrando com ambos diariamente, levando ou buscando no colégio, auxiliando nas tarefas escolares, saindo para passear e demonstrando todo o seu amor por eles. Que no começo sofreram com a separação, mas, aos poucos compreenderam que os pais não davam mais certo juntos.

 

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Foi no começo de 2008 que Cecilie, conheceu Aly por intermédio do seu irmão.

 

- Oi, o Cristopher marcou de estudarmos juntos.

 

- Aly? (Perguntou dando passagem para ela).

 

- Eu mesma e você deve ser a Cecilie.

 

- Acertou, meu irmão foi na papelaria aqui perto e já volta. Eu te faço companhia, entra e fique à vontade.

 

- Muito obrigada!

 

Ângela que também tinha escutado a campainha aguardou na sala.

 

- Aly, como vai e seus pais como estão?

 

- Dona Ângela, estamos todos bem e a senhora?

 

Os dois estudam juntos desde o primário, seus pais sempre se encontram nas reuniões escolares.

 

- Também. Meninas, se precisarem estou no escritório.

 

- Vem, vamos tomar um suco, gosta de melancia?

 

- Gosto sim.

 

- Seu cabelo é tão lindo.

 

- Muito obrigada!

 

Tomaram o suco e voltaram para sala.

 

- Deixa eu fazer uma trança enraizada em você?

 

- Só se você for delicada e não puxar.

 

- Combinado, vou pegar um pente e lacinho.

 

Os fios dela já estavam desembaraçados, foi fácil pentear e o fez com cuidado. A trança ficou muito bonita, em seguida Cristopher chegou e se concentraram nas tarefas de álgebra. Enquanto Cecilie foi para o seu quarto e desenhou o penteado que tinha feito na loira.

 

Depois deste dia passou a conversar com frequência com a amiga do irmão, eles sempre marcavam de estudar juntos, tinham até o mesmo professor de reforço quando necessário e Cecilie adorava mexer no cabelo de Aly, que geralmente não gostava que ninguém os tocasse, tinha ciúmes e detestava quando precisava cortar as pontas, tinha o hábito de usar solto e sempre teve cabelo longo.

 

Num dos dias que marcaram de fazer um trabalho escolar:

 

- Vamos dividir, eu fico respondendo as questões, você tem a letra mais bonita que a minha faz os resumos da atividade para nota que é em dupla e a Ciça nos ajuda desenhando a capa.

 

- Pequena não deixa ele te explorar.

 

- Ele me ajudou com a tarefa de matemática.

 

- Sou um bom irmão e você vai ficar devendo um chocolate para ela.

 

- Deu sorte, tenho na minha mochila (falou procurando e entregando em seguida uma barra para ela).

 

- Obrigada!

 

- Gosta deste?

 

- Sim.

 

- Ela é chocólatra, come até aqueles que nem são bons e ficam abandonados na caixa.

 

A capa ficou lindíssima, quando o assunto é desenho, ela sempre se destaca.

 

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- Tua irmã não está em casa? (Perguntou certa tarde estranhando a ausência da mais nova).

 

- Ela até faltou na aula hoje, algum mal estar.

 

- Posso ir até o quarto dela? Para dar um oi.

 

- Vai lá, sobe as escadas e vira a direita, a terceira porta é a dela.

 

- Beleza já volto.

 

Subiu e fez o trajeto que ele tinha indicado. Deu três batidinhas na porta que estava semiaberta.

 

- Cecilie (chamou por ela, o quarto estava escuro).

 

- Oi (respondeu e continuou deitada).

 

- Pequena, o que foi? O que você tem?

 

- Não estou legal hoje.

 

- Já tomou remédio? (Questionou e se aproximou da cama).

 

- Tomei (estava tristonha).

 

- O que você está sentindo?

 

- Fraqueza.

 

- Não é melhor ir ao médico?

 

- Minha mãe disse que não precisa e que vou me acostumar.

 

- Como assim? Ninguém se acostuma a ficar doente.

 

- É que agora sou mocinha (contou fazendo careta).

 

- Agora entendi. Então você não está doente. Que bom! O que está te incomodando é cólica?

 

- Isso, também me deu moleza e tontura quando acordei. Depois do almoço tive que tomar remédio para dor de cabeça.

 

- E melhorou?

 

- Ainda bem.

 

- Vai passar, é chatinho mesmo. Vira de costas, vou fazer a massagem que minha mãe faz em mim, vai te ajudar.

 

Com as duas mãos massageou a lombar dela por alguns minutos.

 

- Agora muda de posição, vira.

 

Voltou a massagear, desta vez o baixo ventre dela, que adorou o alívio que sentiu.

 

- Descansa e se não melhorar peça para a sua mãe te levar numa ginecologista.

 

- Obrigada!

 

- Imagina, toma chá, me ajuda, alongamento também é bom e fica bem!

 

Retornou para sala.

 

- Coisa de mulher né

 

Assentiu em concordância.

 

- Já vou indo, não esquece de levar as coisas de geometria amanhã.

 

- Beleza, vou colocar na mochila para não esquecer. Seu motorista já chegou.

 

Acompanhou ela até o portão.

 

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Foi numa segunda-feira, pela manhã, durante o intervalo no colégio, que Cecilie resolveu se aproximar da moça que vinha observando com certa frequência.

 

- Oi, eu me chamo Cecilie.

 

- Bom dia! Prazer, Brigite.

 

- Nome bonito.

 

- O seu também. Ainda não tinha te visto, você é aluna nova?

 

- Eu estudava a tarde, mudei esse ano para manhã. Posso sentar aqui com você?

 

- Pode sim. Sofrendo para acordar cedo?

 

- Não, estou gostando. Você é de qual turma?

 

- Estou no penúltimo ano.

 

- Desculpa atrapalhar a sua leitura, é que fiquei curiosa, todo intervalo você senta aqui, come uma fruta e fica lendo tão concentrada.

 

- Qual a curiosidade?

 

- O que tanto você lê?

 

Mostrou a capa do livro de poesias.

 

- Falta muito para terminar?

 

- Estou na metade.

 

- Me mostra o poema que mais gostou até agora (pediu demonstrando interesse).

 

- Você é mesmo um ser curioso (comentou folheando algumas páginas).

 

- Só quero saber se você tem bom gosto.

 

- Eu tenho, leia e tire as suas próprias conclusões (entregou o livro e aguardou).

 

Ela leu em silêncio e com muita atenção.

 

- Brigite agora te acho ainda mais bonita. Foi bom não ter ficado só te observando de longe, agora vou te admirar mais. Achei lindo!

 

- Como você é simpática, espontânea e sincera japinha, já gostei de você.

 

Terminou de falar e o sinal tocou.

 

- Até mais (levantou e devolveu o livro).

 

Foi assim, graças a curiosidade de Cecilie, que as suas se conheceram.

 

- Oi, tudo bem?

 

- Sim e você?

 

- Também, qual a leitura de hoje?

 

Estendeu o livro na sua direção.

 

- Nossa que triste.

 

- Cecie, tristeza também é poesia.

 

- Como machucou seu braço?

 

- Ontem cai, estava tentando uma manobra de skate e acabei me ralando.

 

- Doeu muito?

 

- Na hora quase nada, foi ruim no banho e ardeu quando a minha mãe passou antisséptico.

 

A outra fez careta e ela deu risada da sua reação de aflição. No dia seguinte entregou para ela uma pomada.

 

- Não precisava.

 

- Minha mãe fala que ajuda na cicatrização e é bom para evitar marcas na pele.

 

- Me ajuda a passar?

 

- Claro (começou a aplicar com muito cuidado).

 

- Ai aí (reclamou).

 

- O que foi? Te machuquei? Será que você ter alergia? Não sinto nada quando uso.

 

Não conseguiu responder, acabou caindo na gargalhada.

 

- Ah sua boba, eu toda preocupada e você fazendo graça (fez bico e cruzou os braços).

 

- Cecie, desculpa não resisti. Ei não fica brava e agradeço pela pomada.

 

- Não teve graça.

 

- Parei, é que sou brincalhona, não liga. Eu vi colado no corredor o cartaz que você fez, os seus desenhos são lindos. Parabéns!

 

- Obrigada.

 

- Tenho que aprender a desenhar contigo. Sou uma negação.

 

- Eu te ajudo.

 

Continuaram conversando, Aly que estuda no mesmo colégio, observou de longe as duas, até pensou em se aproximar, mas, não é tão comunicativa, achou melhor pedir para que Cecilie apresentasse Brigite, que além de bonita parece ser bem legal.

 

Cecie para Brigite e Pequena para Aly, desta forma que Cecilie é chamada por ambas, com muito carinho. Em pouco tempo, ela se tornou amiga das duas e quando a amizade se intensificou passaram a ser até confidentes, na complexa fase da adolescência, onde começam as descobertas, as mudanças fervilham e as incertezas causam tanta agonia.

E foi por intermédio de Cecilie que o trio se formou.

 

 

 

 

 

Fim do capítulo