Capitulo 1 - Sophia
Sophia
Um som distante e agudo me incomodava, ficando cada vez mais próximo, até que...
-Sophiaa!!!! Tá surda menina? O despertador já acordou o prédio inteiro e você nem pra se mexer? Quer perder a hora já no primeiro dia do semestre? – gritou Dona Flávia, arrancando minhas cobertas. Mamãe, como sempre, demonstrando toda sua gentileza e paciência.
-Tá bom, mãe. Tô indo, tô indo. – disse, me levantando sob aquele olhar de reprovação.
Olhei meu travesseiro tão sedutor e me despedi dele mentalmente.
A festa com Pedro ontem havia sido muito boa, mas aquela bebida barata me premiou com uma grande dor de cabeça. Bacana Sophia, início do quarto ano de Medicina e você de ressaca.
Enquanto eu tomava café no modo automático, refletia sobre a ironia do meu nome. Sabedoria, em grego. Ha ha. E minha vida era uma sequência infinita de besteiras. A única coisa certa era minha vida profissional. Me esforçava para que tudo nela fosse impecável. Boas notas, seriedade e muitas noites em claro. Aos poucos eu conquistava o respeito que sempre desejei ter. Confiavam na minha capacidade e o novo período prometia ser de grandes realizações.
Em meio a esses pensamentos, cheguei à faculdade. Estava cheia, como sempre. Acenei para alguns conhecidos de forma discreta e logo avistei Ana, que pulou em cima de mim:
-Sophis, que saudade!!!
-Ana, eu te vi faz dois dias. – falei, segurando o riso.
-Ah, eu sei, é que não consigo ficar longe da minha melhor amiga por muito tempo. E vamos que já estamos atrasadas. – falou sorrindo com aquela carinha meiga e me arrastando logo em seguida.
Ana era uma grande amiga minha desde a infância. Compartilhamos a paixão pela medicina durante toda a adolescência e nosso sonho estava se concretizando. Ultimamente ela andava enciumada porque eu passava muito tempo com meu namorado, o Pedro, mas no fundo ela torcia para que meu relacionamento com ele desse certo. Afinal, éramos, os três, amigos próximos. O Pê foi meu vizinho durante um bom tempo. Desde que nasci, conheço a família dele. São todos muito legais comigo e sempre desejaram que nós ficássemos juntos. Após alguns relacionamentos curtos que tive com outros caras, o destino convergiu para nossa união. Pedro era bonito e... uma companhia agradável. Às vezes até humanas demais pra quem fazia engenharia.
Enfim, Ana e eu chegamos à sala, quase lotada, e fomos nos sentar na última fileira. Eu estava contente porque seria aula de bioquímica, minha matéria preferida, com um professor super bonzinho, adorável. Porém, para minha surpresa, entra na sala uma mulher. E que espetáculo de mulher...
Era jovem demais para ser... professora? Sim, foi o que ela disse. Chamava-se Marcela e iria substituir o professor Daniel nos próximos dois semestres. Não era possível! Quantos anos ela tinha? No mínimo deveria ter saído da maternidade já com o Ensino Médio completo.
Enquanto ela preparava suas coisas, eu reparava em suas curvas. Sim, estranhamente eu estava olhando para as pernas de uma mulher...e de modo bem insistente. Suas roupas eram elegantes e discretas, a pele bronzeada e os olhos...indescritíveis.
De forma séria, ela começou a apresentar o curso:
- Antes de iniciarmos a matéria, que será bem densa esse semestre, gostaria de falar que sou muito rígida em relação a provas e seminários. Além disso, exijo o respeito mútuo e a dedicação integral dentro desse ambiente, o que exclui conversas aleatórias durante a exposição do assunto. Ah ...perguntas apenas no final das aulas. Certo?
Nesse momento vi alguns balançarem a cabeça afirmativamente e cochicharem a respeito da postura autoritária da nova professora. Ela então se virou para a lousa, iniciando o conteúdo. Confesso que estava confusa com o que aquela mulher havia provocado em mim e fiquei pensando nisso até ouvir uma colega da frente me chamar:
-Sophis, você sabe o significado desse termo aqui? – disse, apontando o livro.
Eu sabia e iniciei a explicação bem baixinho para não atrapalhar o andamento da aula. Estava quase terminando, quando percebi um repentino silêncio no ambiente. Sim, a professora estava a alguns metros de mim, parada, com uma cara nada legal. Opa, senti que comecei bem. Eu era mestre em criar primeiras impressões positivas.
-Senhorita...?
-Sophia. – falei tímida e roxa já a essa altura.
- Qual parte do respeito não ficou clara para você?- ela disse, com uma sobrancelha erguida.
-É...eu...desculpa...eu só estava explicando...
-Ahh, então você gosta de parecer inteligente, não é? Vejam só, turma! A senhorita Sophia acha que sabe o suficiente para dar aula no meu lugar!
Ouvi risinhos pela sala. Como ela era debochada...
Tentei pedir desculpa novamente, mas fui interrompida:
-Vamos ver então se você conhece alguma coisinha de bioquímica... Continue a sequência de reações a partir daquela primeira escrita no quadro.
Tudo o que eu menos queria era confusão, mas ela mantinha aquele sorriso irônico nos lábios. Meu sangue fervia de raiva:
-Ok, professora!
Iniciei o processo, mencionando inclusive catalisadores e condições favoráveis à ocorrência de cada uma das reações. Na medida em que eu falava, o semblante de Marcela mudava. Ela ficava cada vez mais séria e, no fim, quem estava com um olhar de desafio era eu. Ela demorou alguns segundos para se manifestar:
- Olha só, até que você decora bem os textos do livro, hein?
E continuou sua aula, dessa vez sem transtornos.
Quem estava transtornada era eu. Tive vontade de xingá-la e fazê-la engolir toda aquela arrogância gratuita, mas não me movi. Poxa, eu não pude nem me explicar! Ela deixou claro naquele instante que não ia com a minha cara. E eu? Eu a achava...achava...irritante? Isso, isso mesmo. Muito irritante.
Quando a aula terminou, um monte de bajuladores foram até ela tirar dúvidas, enquanto eu tratei de arrumar minhas coisas o mais rápido possível e sair daquele lugar. Não estava conseguindo compreender o que se sucedeu, nem definir o que eu sentia no momento. Ao passar pela porta, senti a professora me analisando, mas não olhei para trás. Definitivamente eu precisava de um café naqueles quinze minutos de intervalo. Ana logo me encontrou:
-Sophis, tá tudo bem? Você saiu correndo da sala agora...
-Você não viu, Ana? Aquela professora arrogante me tratou como um lixo, me envergonhou diante da sala! Tive vontade de... sei lá...falar umas verdades na cara dela!
-Calma, calma...a Marcela é uma pessoa bacana e excelente profissional, tenho certeza que esse mal-entendido entre vocês vai se resolver.
-Como você pode ter tanta certeza de que ela é esse poço de virtudes, hein? Por que pra mim ela parece uma sem noção, sem ética para estar à frente de uma sala de aula.
-Sophia, ela é namorada do meu pai! – Ana disse, rindo.
O quê? Não podia ser! Eu detonando a mulher e ela é namorada do tio Marcos! Como assim?
- Ana, você só pode estar de brincadeira! Nunca a vi na sua casa e você nunca falou nada a respeito dela...
-Claro, não falei porque nunca foi necessário. Mas você sabe que desde que meus pais se separaram, meu pai só fica com mulheres bem mais jovens do que ele. E pelo visto ele curtiu mesmo a Marcela, porque já faz três anos que eles estão juntos.
-E quantos anos ela tem? – perguntei, fingindo desinteresse. Mas porque eu estava interessada naquela grossa se eu não tinha nada a ver com a vida dela?
-Tem trinta e dois.
Confesso que eu imaginava menos, uns vinte e oito, talvez.
- Então ela não dá aulas há muito tempo, né?
-Acho que faz uns quatro anos que trabalha aqui na faculdade, mas o nome dela já é bem conhecido e respeitado no mundo científico. Ela é muito competente e, além disso, uma gata, não acha? Meu pai deu sorte...
-É bonita? Nem reparei direito... – menti descaradamente. Eu quase babei olhando para aquela deusa. Claro! Agora me lembro porque o nome dela era familiar. Já havia lido vários artigos seus, porque adorava o tipo de pesquisa que ela fazia.
-É uma pena que eu não tenha tanta intimidade com ela...
-Porque não, Ana?
- Apesar de ser gente boa, ela é bem reservada, não abre muito espaço para conversas mais íntimas.
O curto intervalo acabou assim e o resto do dia transcorreu sem grandes novidades.
Cheguei em casa exausta e acabei cochilando no sofá. Sonhei. Um par de olhos verdes intensos percorria o meu corpo sem pudor, enquanto eu só conseguia arfar desesperadamente. Implorava para que ela continuasse deixando minha pele arrepiada com o caminho traçado por sua boca, ao mesmo tempo em que me contorcia para que, finalmente, ela parasse com aquela tortura deliciosa...
Sim, fica fácil imaginar o estado em que acordei. Um banho de meia hora não conseguiu aliviar meu desejo e muito menos minha indignação em perceber que tive um sonho erótico com uma mulher, e pior, com a professora Marcela.
Fim do capítulo
Primeira história aqui, espero que gostem!
Comentar este capítulo:

Marta Andrade dos Santos
Em: 05/08/2023
Misericórdia! Professora do inferno.

GMS
Em: 06/08/2023
Autora da história
Hahaha Concordo!
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