– Depois de todos aqueles problemas, nós não conversamos mais sobre o que aconteceu entre a gente. – Patrícia me olhou com uma cara de interrogação imensa. – Antes de eu contar para Flávia, havia dito para ela que aquilo era um erro e que não deveria ter acontecido. Não faz sentido voltar a tocar nesse assunto só porque estou solteira.

– Na verdade, não faria sentido se você continuasse casada, Vitória. – Fiz uma expressão ofendida. Obviamente ela estava certa. - A tensão entre vocês era palpável... – Patrícia soltou uma gargalhada. – O tesão de vocês era palpável, melhor dizendo. – Foi impossível não relembrar. Realmente Lívia conseguia me tirar do sério facilmente.

Conversamos algumas vezes depois da minha separação, mas não voltamos a tocar no assunto. Apesar de querer falar sobre, não tivemos nenhuma oportunidade para isso ou apenas não tive coragem mesmo. Talvez no fundo eu não fosse tão "segura de mim" como alguns acreditam, inclusive Lívia.

– Realmente... Eu nunca soube explicar o porque me deixei levar por ela. Parece bobo e clichê, mas não conseguia resistir quando estávamos próximas. - Soltei um suspiro. - Mas com isso veio os piores dias com a maior traição da minha vida. É complicado explicar esse misto de sentimentos.

– Imagino... – Patrícia sorriu. – Na verdade, eu nem imagino. Acho que o importante agora é focar em você, cuidar da sua saúde, principalmente a mental. Foi a Dra Célia? - Neguei, finalizando o resto do vinho. - Ela é incrível. Apesar da gente sair de cada sessão derrotada.

– Ainda não tive tempo para ir, mas preciso de fato cuidar da minha mente.

– Essa semana vamos começar a olhar seu apartamento e aos poucos você vai conseguir ir encaixando as consultas em seus horários.

***

Passamos mais um tempo conversando e resolvemos sair para jantar em um restaurante que tinha ali perto. Além de todos os palpites que ela tinha sobre minha casa e saúde mental, ela resolveu que eu deveria começar a sair e conhecer novas pessoas. Tinha que confessar, as últimas semanas foram extremamente difíceis. Durante anos tive uma vida sexual ativa e não ficava tanto tempo sem um contato físico. Além de carinho e cuidado, obviamente. Foi muito difícil me acostumar a chegar em casa e não encontrar ninguém. Ainda não me acostumei. Quase adotei um cachorro, mas desisti a tempo. Tinha medo de não conseguir dar atenção suficiente para ele.

***

Os dias foram passando e cerca de duas semanas depois, estava de mudança para minha casa nova. Optei por comprar uma casa, por ela ficar um pouco afastada da cidade, em um lugar mais calmo. Quem sabe a ideia de adotar um cachorrinho não daria certo agora.

Minha carência estava chegando a níveis que não sabia até quando iria aguentar. E também não fazia ideia de onde ir, por mais que Flávia e eu sempre saíssemos, éramos um casal. Nos locais até poderiam ter paqueras e coisas do tipo, mas ainda sim era um ambiente frequentado majoritariamente por casais. Aplicativos de relacionamentos para mim não daria certo, acreditava fielmente que minha idade não se encaixava nessas coisas. A verdade era que eu não sabia ser solteira mais.

– Vitória, tudo certo com a mudança? – Patrícia estava parada na porta da minha sala.

– Sim... – Olhei que horas eram. – Provavelmente nesse horário já terminaram ou estão terminando.

– Ótimo. Estava pensando em uma coisa... – Relaxei meu corpo na cadeira esperando o que Patrícia estava aprontando. – Podíamos fazer uma comemoração... – Franzi o cenho. Já sabendo que não iria gostar do rumo daquela conversa.

– Comemoração? – Ela assentiu.

– Sua casa é grande o suficiente para juntarmos algumas pessoas do escritório. Você sabe, iríamos fazer aquela confraternização para o início do ano, mas acabamos não fazendo nada. – Ela sorriu. E eu só queria um lugar para me esconder. – O que acha?

– Acredito que você já tenha decidido tudo... – Ergui a sobrancelha direita. Vendo Patrícia confirmar com um assento. – Então, minha querida amiga, não tenho como correr. – Bateram na porta e era Lívia. Ela precisava me entregar alguns documentos.

– Com licença, Vitória. – Lívia entrou estendendo alguns papéis. – Olá, senhora Patrícia. - Ri internamente. Patrícia tinha horror de ser chamada de senhora.

– Lívia, por favor! – Patrícia exclamou, incrédula. – Senhora??? – Vi Lívia corar instantaneamente. – Eu não sou casada e nem tão velha assim. – Ela sorriu. – Já te falei que apenas Patrícia está ótimo. Se preferir, apenas Pati. – Tentei disfarçar minha cara ao ouvir aquilo. Lívia assentiu e sorriu.

– Claro, Patrícia. – Ela fez uma espécie de comemoração. Me deixando sem entender absolutamente nada. – Começamos por Patrícia... – Ok. Eu não tinha nada com Lívia e até onde sabia Patrícia preferia o sex* oposto, mas aquele papo estava no mínimo estranho. – Vitória, aqueles documentos do processo do senhor Tarnizo. Acredito que na semana que vem teremos novidades. – Assenti para Lívia.

– Obrigada, Lívia. Logo darei uma olhada com calma.

– Certo. Com licença. – Ela sorriu para mim e logo após para Patrícia.

– Ah, Lívia... – Patrícia começou. E se virou para olhar para ela. – Para provar que não sou tão velha assim, que tal uma festa? – Ela ficou nitidamente confusa. – Vitória fará uma comemoração na nova casa dela. Algumas pessoas do escritório iram. Podemos contar com a sua presença? – Lívia procurou meu olhar, mas logo voltou sua atenção para Patrícia.

– Ahn... Bom... – Ela mordeu o lábio inferior. Não comece, Lívia, por favor... Foi a única coisa que eu me permiti pensar. – Claro, irei sim. Agora com licença. – Ela saiu fechando a porta em seguida.

– Pati? – Fiz um cara de interrogação olhando para Patrícia, sem entender.

– Você viu a diferença? – Detestava quando ela fazia isso. – Nenhuma tensão sexual, enquanto vocês nem precisam falar para que todos sintam. – Patrícia insistia que eu deveria tentar algo com Lívia, já que agora estava solteira. – Vitória, vocês treparam enquanto estavam casadas, porque diabos isso não pode acontecer agora???

Fim do capítulo