Cap. 1 – A chegada
Administrar uma escola, não é tão fácil como julgam algumas pessoas. Claro que eu sabia da responsabilidade quando aceitei o cargo, tendo eu, atuado como pedagoga há muitos anos, mas estar à frente administrando tudo, claro que em conjunto com o corpo docente, mas a responsabilidade legalmente é minha.
Porque estou divagando sobre isso, quando eu deveria estar assinando a papelada sobre minha mesa?
Porque era a minha função, também, entrevistar todos os profissionais que fazem parte da nossa equipe, e cá estou eu “fugindo” de uma entrevista em particular. Isso porque aceitei a transferência dela de uma filial que temos em outra cidade, e conversando com a diretora da outra escola, não hesitei em aceitar.
Apesar de nova, seu currículo era impecável, além de comprometida com seu trabalho... Como eu sabia? Nos encontramos em uma social um ano atrás, e todos a sua volta se derramavam em elogios, e desde então, ela não saía da minha cabeça. Não tenho como explicar o que foi que aconteceu comigo depois daquele encontro.
Enfim... O sinal tocou, ouvi as crianças correndo do outro lado da porta, tentei voltar a atenção ao trabalho. Não demorou muito estava com o pensamento nela de novo.
“Ela chegou como se não quisesse nada, tomou meus pensamentos e invadiu a minha existência, com tanta ousadia que nem sei como permiti que o fizesse...”
– Diretora?
Olhei em volta, alguém me chamava.
– Sim!
– Precisa assinar esses papéis.
– O que seria?
– É sobre a contratação da nova professora, ela já começou a trabalhar e a senhora ainda não assinou esses documentos.
– Desculpa... – inspirei fundo, peguei os papéis das mãos da secretária, li por cima, até porque já tinha lido tudo antes, e assinei. – Mais alguma coisa?
– Não senhora, obrigada!
A secretária saiu da minha sala, e minha cabeça voltou ao início dos meus pensamentos. Revirei os olhos tirando aquilo da mente, precisa sair. Ajeitei a mesa e fui para a reunião.
Sei que precisava falar com a professora, porém, algo sempre me impedia. Medo? Não, porque eu teria medo disso?
A cabeça longe e totalmente desconcentrada, me perdi em vários momentos e a reunião precisou ser remarcada, sorte que algumas pessoas faltaram e acabei usando isso como desculpa. Não que seja certo, claro.
Voltando a Ana, a professora que andava tirando o meu sono ultimamente, no fim, foi impossível adiar por muito tempo aquele contato. No começo do mês em que ela completava dois meses na escola, foi o dia. Não que eu tivesse escolhido, aliás, não entendi ainda o porquê de adiar tanto aquele encontro.
Mais uma vez estava a caminho da minha sala quando ouvi alguém me chamar:
– Diretora Lívia!
– Pois não?
– Será que podemos conversar?
Aquele olhar fixo nos meus, definitivamente parecia que não tinha mais controle do meu corpo, a pasta que estava em minhas mãos foi parar no chão. Voltei a mim, abaixei pegando os papéis que se espalharam pelo chão, dizendo apenas.
– Desculpa, às vezes isso acontece comigo... – quando levantei e voltei a mim, disse firme: – Conversar sobre?
– Sobre mim... sobre a escola... sobre os alunos... – ela desviou os olhos, parecia chateada, porém, voltou a falar firme. – Desde o primeiro dia em que conversamos, a senhora tem me evitado, às vezes penso que não sou bem-vinda nessa escola.
– Não achei que você fosse tão carente de atenção assim?
Falei, mas me arrependi no mesmo instante ao notar o olhar de avaliação dela sobre mim. Deu um passo para trás, e disse apenas:
– Eu... não quero atrapalhar.
Virou as costas, balancei a cabeça e dei dois passos em sua direção, minha mão segurou firme um de seus braços e ao se virar em minha direção, falei:
– Peço que me desculpe, esses dias não tem sido fáceis, como pode ter visto. – Inspirei fundo, ela não me olhava diretamente, segui dizendo: – Essas obras estão acabando com a minha paz, eles não terminam logo a sala de informática e sem contar os pais que estão...
Alguns alunos passaram por nós, balancei a cabeça apenas, em sinal de “oi”. Gentil, a professora abriu um sorriso lindo cumprimentando-os. Quando se afastaram, me olhou dizendo:
– Sei que a escola está em reforma e estão todos muito agitados aqui, mas precisamos conversar, e está me parecendo que é só comigo que a senhora não quer falar, então, não irei impor minha presença até ser chamada.
Ela era afrontosa, sorri internamente, disse:
– Às 14h está bom para você? – Pareceu pensar e concordou.
– Estarei na sua sala, obrigada e até.
Saiu e nem esperou que me despedisse, também, o que eu esperava? Revirei os olhos e segui pelo corredor.
A papelada me segurou quase a manhã toda, mal tive tempo de sair para almoçar, e não demorou muito, ouvi batidas na porta.
Lá estava ela novamente, pedi que entrasse e começamos a conversar, confesso que quase não prestei atenção ao que ela falava, sua voz e sua boca... O leve movimento de seus braços sinalizando algo que dizia. O que estava acontecendo comigo?
Levantei enquanto ela falava, fui até a janela olhar para algum lugar que não fosse ela, assim comecei a realmente prestar atenção. Debatemos por alguns minutos, concordamos em algumas coisas, discordamos de outras.
Percebi que ela não gostava de ser contrariada, porém, concordava e chegamos ao final daquela reunião, apostando que foi mais dolorosa para ela do que para mim. Eu estava insuportável aquele dia. Ela já tinha uma impressão ruim de mim, e agora, certeza tinha piorado.
Depois daquela, só conversávamos nas reuniões dos professores ou vez, ou outra quando nos encontrávamos na escola. Notava seus olhares às vezes, desviava quando a olhava. Os dias foram passando e quando dei por mim, meses desde a última vez que ficamos sozinhas juntas.
E então, veio aquela social que uma das professoras organizou, meio de ano, férias e finalmente um descanso. Ouvi boatos de que a professora Ana, não iria, até pensei em não ir. Afinal, não gostava muito daquelas sociais, porém, na última hora resolvi comparecer. Apesar de poucas pessoas e todas conhecidas, preferia o sossego da minha casa. Mas, nem eu conseguia tanto luxo assim.
Como sempre, optei por uma camiseta social azul-marinho, um blazer preto, calça de alfaiataria, também na cor preta. Sapato estilo Oxford, um dos meus favoritos. Para finalizar um relógio grande e metálico. Bem no estilo que escolhi usar há alguns anos, por achar confortável e combinar comigo.
Estava pronta? Em partes, quase desisti, mas segui mesmo assim, precisava aprender a me socializar mais.
Fim do capítulo
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