"Aproveite o show"
Alice
Enquanto minhas pernas recebiam eletrochoques, um pressentimento muito ruim me dominou. Um certo desespero, misturado com agonia e aperto do peito. Um desejo incontrolável de ver e estar perto da Laura.
Controlei meus ímpetos e tentei relaxar para poder continuar na sessão. O coração disparado e a mente a milhão por hora não me deixava nem mesmo entender o que a fisioterapeuta contava da sua vida pessoal, com o sorriso aberto.
Tive a impressão de que, de repente, o céu perdeu a cor e o dia ficou sem vida. Interrompi o que falava e pedi para encerrar a sessão pois não estava bem. Ela prontamente encerrou e me levou ao meu quarto. Tomei um analgésico e me deitei.
Tentei ligar para a Laura mas a ligação ficou no vácuo. Mandei mensagem e também não foi visualizada. Certamente estaria em alguma reunião e não poderia me atender. Fechei os olhos e procurei me acalmar. Entendi que estava em uma crise de ansiedade devido tudo o que já aconteceu e ser o primeiro dia de trabalho da Laura. Rapidamente adormeci e os mesmos sonhos perturbados de todos os dias me fizeram companhia. No entanto, diferente de todos até agora, me via em um corredor, encostada na parede e ouvindo a conversa de um casal que brigava no cômodo ao lado. Falavam ofensas um ao outro e nomes russos que eu tentava entender. Tinha ciência de que eram informações importantes e eu corria grande perigo. Em meio a briga, o homem saiu do ambiente e vi que era o Joseph. Ele veio para o corredor e tentou pôr as mãos em mim, mas fugi. Suas mãos eram sujas. Uma sujeira de lama misturada a sangue seco,uma gosma mal cheirosa. Eu corria e descia as escadas com degraus altos que pareciam desaparecer quando eu pisava. Quando consegui me segurar em um dos degraus, voltei para o corredor que estava anteriormente e este me pareceu familiar. Era a casa em Paris onde fiquei presa por um tempo. A conversa que ouvira era de Joseph e Marrie, a mulher bonita e afrontosa. Eles discutiam e em meio à discussão, Marrie disse ao Joseph que ele estava metendo os pés pelas mãos apenas para tentar atingir a irmã, Laura. Imediatamente acordei!!
Com dificuldade me sentei na cama. Me faltava ar e parecia estar em um brinquedo de gira-gira. Meu corpo todo molhado de suor. O coração acelerado. Passei as mãos no rosto em um ato de desespero e alívio. Eureka!! Me lembrei do que precisava mas não queria.
Laura e Joseph são irmãos.
Como em um filme em velocidade avançada, memórias curtas de todos os encontros com o Joseph e suas falas descabidas começaram a se encaixar feito um quebra-cabeças.
Maluco! Doente! Insano! As únicas descrições possíveis para o ser em questão.
Tentei sair da cama mas meus braços estavam tão trêmulos que não tive forças para o fazer sozinha. Apertei a campainha que fica ao lado da cama e imediatamente Lia, a fisioterapeuta apareceu para me ajudar.
- Preciso tomar um banho! - falei sem paciência - Pode por favor me ajudar?
- Claro! - respondeu educada - Está se sentindo melhor após dormir?
- Um pouco. Só dei uma cochilada..
- Cochilada? - me interrompeu sorrindo - Já passam das quatro horas da tarde. Você dormiu das nove até agora.
- Nossa! - falei confusa - Tive a impressão de que mal fechei os olhos.
- Vamos! - falou ao me colocar na cadeira de banho - Está toda suada e realmente precisando de um banho - sorriu - A dona Laura não pode chegar e te encontrar assim.
Estou acordada mas com a mente no sonho. A ideia descabida da minha Laura ser irmã do mentecapto do Joseph me atormenta a alma.
Não vejo a hora dela chegar e poder lhe contar o que lembrei.
-----------x-------------
Laura
- Senhorita Laura - falou o Sr Carlos com pesar - Não temos boas notícias.
- Isso já está estampado na expressão de vocês - falei sem paciência - Quero saber o que aconteceu.
- O Gil, Laura - engoliu em seco Tom - Não resistiu.
- O quê? Como assim? - indaguei surpresa - O Gil morreu?
Ambos confirmaram positivo com a cabeça.
- Sinto muito, senhorita Laura - falou o inspetor.
Sentei-me atônita no banco disposto no corredor. A lembrança dele segurando em minhas mãos me atravessou o espírito.
- A causa foi overdose, Laura - continuou Tom e o olhei ainda espantada - Uma grande quantidade de cocaína diretamente no estômago..
- Para Tom - o interrompi- Preciso de um tempo. Licença - Saí em direção à escada de emergência. Tirei meus sapatos e comecei a subir para meu escritório sozinha e desolada. A cada degrau que subia, imagens do Gil no meu dia a dia surgiam. Nossas risadas enquanto os treinos corriam. Os segredos explanados. Os abraços quentes e fortes. Nada disso fazia sentido com o que acabara de ouvir. Overdose? Como pode um personal morrer de overdose? Ainda mais o Gil que tantas vezes me ajudou nas minhas bebedeiras. Meu coração disparado devido o exercício forçado de subir cinco degraus se misturava ao disparo causado pela notícia arrasadora.
Cheguei em meu escritório e a lembrança dele a algumas horas atrás, deitado em meu colo e se debatendo ficou ainda mais forte. Dessa vez não pude evitar o amargor na boca e na alma e fui direto ao frigobar. Me servi uma dose de wisky e virei todo de uma só vez.
O líquido desceu queimando e as lágrimas começaram a rolar igualmente quente pelo rosto. Sentei-me no sofá e incrédula, permaneci por algum tempo, permitindo sentir o pesar pela morte de um amigo querido.
Meu silêncio e solidão foi atravessado com a presença do Tom, que pé por pé adentrou a sala, sentou-se ao meu lado e me abraçou.
- Laura - falou ao sair do abraço - Sinto te incomodar mas..
- Mas o que Tom? - o interrompi dando de ombros - O Gil foi um grande amigo e eu preciso de um tempo pra assimilar isso e..
- Eu sei disso, Laura - me interrompeu, desbloqueando o tablet em sua mão - Mas temos um problema de fato a resolver com esse ocorrido.
- Problema? - levantei brava com a dificuldade do Tom em não respeitar meu espaço - Ainda não sou uma máquina, Tom, por mais que pareça, eu ainda sinto as coisas.
- Laura - falou com tom firme e levantou-se também - Veja e assista isso! - me entregou o tablet dando play no vídeo.
Na tela, uma repórter em frente a entrada do meu prédio, noticiava: “Um funcionário das empresas de Laura Veigas teve uma overdose de cocaína durante o expediente. Ele foi socorrido pela própria Laura, mas não resistiu e veio a óbito”.
- Mas que porr* é essa? - gritei ao terminar de ouvir a notícia e entregar o tablet de volta para o Tom - De qual emissora é essa repórter? - perguntei furiosa, sentindo meu sangue ferver - Quero providências imediatamente - andei apressada até o telefone.
- Laura! - falou alto Tom, me fazendo prestar atenção - Me ouve!
- Tem mais ainda? - respondi furiosa.
Ele me entregou o tablet novamente, com os olhos arregalados.
- Veja você mesma!
Na tela, as prospecções das ações com os gráficos em declínio, sendo atualizados em milésimos de segundos.
- Não pode ser! - as pernas bambearam a vista escureceu. Sentei rapidamente e deslizei o dedo na tela mudando as interfaces do aplicativo desenvolvido para acompanhar as ações - Merda!! - piscava vagarosamente na tentativa de entender o que via - Não!! - cada milésimo de segundo a curva de declínio aumentava e os dígitos em contagem regressiva dos valores de mercado pareciam postar corrida - Tom! - meu coração disparado e o ar faltando me faziam ficar zonza - Que merd* é essa que está acontecendo?!
- Temos que reunir o pessoal imediatamente e congelar os fundos de investimento Laura.
- Sim! - respondi no automático, sem conseguir reagir ao que via.
Um profundo transe. Um dos meus maiores pesadelos se consolidando bem à minha frente e eu paralisada, sem conseguir reagir. Toda a minha história e carreira, construída dia após dia, tornando-se pó em minhas mãos e eu sem conseguir fazer uma ligação para tentar fazer qualquer coisa para impedir um dano colateral ainda maior. Ouvia a voz do Tom falando ao fundo mas não conseguia entender nada do que dizia. Meus olhos focados no declínio e no regresso dos dígitos me direcionavam mais e mais a um buraco negro presente na minha própria consciência. Assustei quando Tom deu um tapa na mesa, me fazendo olhar para ele ainda atônita.
- Liga agora - ordenou com voz alta - É só você que pode!
- Ligar onde, Tom? - perguntei ainda zonza e voltei a olhar a tela.
- Laura! Reage caralh*! - gritou e deu outro tapa na mesa - Liga logo na bolsa e congela os fundos.
Tom me dar ordens do que fazer foi como me chacoalhar para a realidade. Foram muitas notícias profundas chegando quase ao mesmo tempo e colapsei. A racionalidade do Tom me trouxe de volta à terra firme e comecei a raciocinar outra vez.
Imediatamente fiz o que era preciso para evitar que perdesse muito do que com muito suor conquistei e solicitei reunião com a equipe de consultores com urgência. Em minutos a equipe estava entrando em minha sala. Todos agitados fazendo seu trabalho. Chamei a atenção de todos.
- Pessoal, o sucesso de todo o complexo dependerá do melhor que cada um puder fazer hoje - dona Chica entrou na sala e me desconcentrou - Um momento! - olhei para o Tom que deu de ombros e a encarei sem entender o que fazia ali. Ela veio em minha direção e me entregou um papel.
-Desculpa interromper, Laura - falou em sussurro - Mas entregaram na portaria e pediram urgência para te entregar.
Nem respondi. Meneei a cabeça e suspirei. Peguei o papel que estava dobrado e o abri. A garganta secou e o amargor feriu o âmago. Com letras escritas em letra cursiva garranchada com caneta preta estava a resposta para esse pesadelo:
“Espero que tenha curtido os minutos de fama que saíram contrário do que previ. Agora aproveite o show da sua ruína. Estou caindo, mas você vem junto.”
Fim do capítulo
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olivia
Em: 14/06/2022
Bom dia Autora, será que , não está na hora ,da Laura ter pelo menos uma pequena vitória? O romance inteiro ,ela sofreu,sofreu e mequetrefe só faz maldades ? Poxa a realidade é dura mas , ela merece paz , não? Pelo menos um equilíbrio nas maldades!!! Continuo confiando na vitória de Laura , pelo amor dos guardiões de sua doutrina.....
Resposta do autor:
Pedido feito, pedido realizado! Estamos em fase de fechar os pontos da história. Por isso que ainda temos que ver o Jospeh por aqui e a Laura enfrentar alguns embates. Se pular essa "fase" vai ficar sem sentido. Perdoa judiar da nossa menina, mas ela é forte e aguenta e é necessário para seu crescimento ;) gratidão por ter vc por aqui!
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Krikadreammy
Em: 13/06/2022
Oiii,
Ainda bem que foi o Gil, ele fez muitas coisas contra a Laura!!!
Mas agora é correr pra evitar um caos maior!!!
Pelo menos a Didi continua viva!!!!
Aguardando ansiosamente pelos próximos....
Ate
Resposta do autor:
Não sou maluca que tocar na Didi! Kkkk As/os leitores/as colocariam minha cabeça à prêmio kkkk
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