Saímos da casa dela um pouco antes das dezessete horas, teríamos que atravessar a terceira ponte, e o risco de enfrentar um trânsito pesado era grande. Mas, por milagre, estava bem tranquilo, fizemos o percurso em vinte minutos, e teríamos tempo pra fazer o check in com calma e tomar um café.

Sentei enquanto ela fazia o check in, e quando ela veio em minha direção, observei alguns homens com o olhar fixo quando ela passava. Ela vestia uma um terno extremamente feminino e justo, e sem nenhum esforço, acabava despertando os olhares de cobiça. E tenho certeza que ela também percebeu, porque quando levantei para irmos até o café, ela encostou os lábios nos meus, foi apenas um selinho, mas o suficiente para mostrar que ela estava comigo.

_O Rick já deve estar no café, vamos? _ ela me olhou e abriu um sorriso.

_Por que o sorriso?

_Você fica linda com ciúmes?

_Viu como eles olharam pra você? _não consegui segurar

_Não posso impedir que olhem, mas somente você me tem.

Fomos ate o café de mão dadas e quando avistamos o Rick, nos dirigimos a mesa.

_Finalmente, saíram do brejo, começo de namoro é um grude, credo, olha pra vocês.

_E garoto, tenho culpa se você não trans*? Você e a Lu resolveram me perturbar foi_ Aline falou me abraçando.

_Deixa comigo, em São Paulo vou tirar o atraso.

_Achei que tivessem indo para um congresso? _falei erguendo uma das sobrancelhas.

_Meu bem, sempre sobra tempo pra uma balada.

_Sem chance, no máximo um jantar, esqueceu que agora sou uma mulher comprometida_ Falou me abraçando

Pagamos a conta, e fomos na direção do portão de embarque. Despedi-me do Rick e quando fui me despedir dela, ganhei um abraço apertado, parecia que ela iria ficar muito tempo longe.

_Se cuida _ falei no ouvido dela .

_Aproveita e se diverte um pouco, eu falei aquilo só pra encher o saco do Ricardo, eu confio em você.

_Mais tarde eu ligo.

_Vou morrer de saudades.

_Eu já estou com saudades_ Falou e me deu um beijo.

Voltei para casa com o coração apertadinho, mas teria que sobreviver quatro longos dias sem a minha morena linda. Iria mergulhar de cabeça no trabalho, pra ver se o tempo passava mais rápido.

Fui deixar o carro na casa do Paulinho, e pegar a minha moto, se eu tivesse um pouco de sorte encontraria ele em casa e teríamos a conversa que foi adiada, Eu sentia que o Dr. Igor, estava envolvido em alguma coisa muito suja , ou escondia algum segredo, que pudesse atingir a Aline. Mas infelizmente o Paulinho havia saído, parecia até que algo conspirava contra, a moça que cuidava da casa informou que precisou viajar com um amigo e voltaria em dois dias, ou seja, conversa adiada mais uma vez.

Por estar muito cansada, assim que cheguei em casa cai na cama, não tive disposição nem mesmo pra comer. E somente pela manhã vi, algumas ligações e chamadas de vídeo da Aline. Eu apaguei de uma forma, que não escutei o toque do telefone, e provavelmente ela estaria chateada, até tentei falar com ela, mas o telefone só dava caixa postal.

Por não ter conseguido falar com ela, trabalhei o dia inteiro irritada comigo mesma, por não ter ligado pra ela assim que cheguei em casa. Agora, até explicar o porque do sumiço, seria um longo caminho. Se eu que sou experiente em relacionamentos lesbicos me sentia insegura, imagine ela que acabou de entrar nesse mundo.

Logo que cheguei na obra, fui avisada que o Dr. Igor já estava de volta, e que queria falar comigo. O que pra mim foi muito estranho, pois a reunião estava marcada para o dia seguinte. Depois que recebi aquela informação, tive a sensação de que muita coisa iria mudar naquela construtora, na minha vida e na vida da Aline.

Quando cheguei no outro dia, antes mesmo de ir tomar café, fui para o escritório, se ele já tivesse chegado resolveria logo aquela situação, não iria ficar a manhã inteira me martirizando, se podia resolver tudo logo. Mas nem mesmo a Alice havia chegado, o que daria tempo de tomar café e dar uma circulada na obra.

_Bom dia! _ falei ao entrar no refeitório, e observei que quase todos olharam pra mim, o motivo eu já sabia.

_Bom dia Dra Nicole, madrugou hoje?_ Maria falou quando me aproximou.

_Maria, eu tenho algumas coisas urgentes pra resolver no primeiro horário.

_Entendi, a obra pelo jeito está indo bem, parece que a alvenaria começa no praz.

_Com certeza, o esforço de todos valerá a pena.

_Graças a Deus. E a senhora como está?

_Estou bem Maria, alguns probleminhas para resolver, mas vai dar tudo certo.

_Coloque Deus na frente, e tudo se resolve.

_Tenho absoluta certeza disso, obrigada pelo café.

Por volta das dez horas, vi o carro do Dr. Igor entrando, e fiquei em alerta esperando pra ir falar com ele. Pouco tempo depois, Alice ligou e pediu que eu fosse até o escritório, pois ele estava me esperando.

_Bom dia Dr. Igor

_Bom dia Dra. Nicole, sente-se. A conversa é importante porem vai ser rápida.

_Pode falar!

_O assunto dessa conversa você já deve imaginar qual seja.

_Sim, provavelmente a sua irmã.

_Eu gostei muito da sua contratação, você tem um excelente currículo, é uma profissional respeitada, porém, cometeu aqui na construtora, um erro gravíssimo. Você foi se envolver justamente com a sua chefe.

_Não estou entendendo o que o meu namoro com a Aline tem a ver com o meu trabalho, quando eu a conheci, já estava contratada_ falei olhando diretamente pra ele.

_Eu queria que você repensasse sobre esse namoro, e...

_Espera, você disse o que?

_Eu quero que você dê um basta nessa brincadeira, nesse passatempo, até mesmo porque a minha irmã não se relaciona com mulheres. Você termina, se afasta dela e mantém o seu emprego e no final todo mundo sai ganhando.

_Você deve estar brincando_ falei duvidando do que tinha acabado de ouvir.

_Minha irmã vai acabar acordando, e é melhor você garantir o seu emprego.

_O único motivo que me levaria a me afastar da sua irmã seria por vontade dela, o que você pensa, o que você acha não me interessa. E pra polpar o seu tempo e o meu tempo, estou pedindo demissão._ falei retirando o crachá e colocando em cima da mesa dele.

Não esperei e não deixei ele falar mais nada. Eu já imaginava que a situação ficaria insustentável. Desde o começo ele deixou bem claro que usaria todas as armas para me separar da Aline. Me virei e caminhei em direção a porta, e quando eu segurei a maçaneta da porta, ele voltou a falar.

_Diga o seu preço, quanto você quer pra sumir da vida da minha irmã.

_Eu sabia que você não tinha caráter, mas querer pagar pra ver a sua irmã sofrer, é um pouco demais. Por que não aceita o fato dela estar feliz, ela já sofreu demais.

_Quem é você pra falar em caráter. Saiu de um buraco no meio do nada, deveria aceitar a minha proposta.

_Seu cretino, desgraçado, você tá vasculhando a minha vida_ falei apertando as mãos.

_Achou mesmo que iria se enfiar na vida da minha irmã e eu não mandaria investigar você.

_Escreve o que eu vou te falar, ninguém vai me fazer desistir dela, absolutamente ninguém, e pegue o seu maldito dinheiro e envia no seu cu.

_Sabe que não vai ficar assim! não sabe! _Ele falou em tom ameaçador.

_Foda-se!! _sai batendo a porta.

Sai da sala enfurecida, não falei nada com ninguém, mas provavelmente todos escutaram a discussão. Fui direto para o vestiário e comecei a arrumar as minhas coisas na mochila, quando a Aline entrou.

_Pediu demissão mesmo? Vai perder o seu emprego por causa de um namoro que nem sabe se vai dar certo.

Se eu já estava no limite naquele momento, transbordou.

_Achou pouco servir de leva e trás, e ainda se acha no direito de vir me encher o saco com as suas opiniões. Por que eu tenho certeza que você servia de informante pra ele, antes mesmo de nos ver juntas. Tudo isso porque? Obviamente porque eu não dei bola pra você, estou errada?_ despejei o que estava juntando a dias.

_Acha mesmo que ela vai assumir você?

_Isso é um problema meu_ Falei saindo com  a mochila nas costas.

Eu jamais poderia imaginar que aquela conversa chegaria a aquele ponto, mesmo percebendo que o Igor seria um problema, eu jamais pensei que ele seria tão baixo, que usaria uma chantagem, ou tentaria me comprar para que eu me afastasse da Aline.

O pior de tudo ainda estava por vir, como eu iria contar pra Aline tudo que aconteceu. Apesar de estar magoada com ele, com certeza ela jamais imaginaria que ele chegaria a esse ponto. Eu não sabia o que seria pior de falar pra ela, que ele tentou me comprar, que estava investigando a minha vida ou que havia me ameaçado.

A situação era tão séria, que eu jamais poderia esconder dela, seria melhor ela saber por mim do que por outra pessoa, e mesmo correndo o risco dessa história se voltar contra mim, eu precisava falar a verdade.

Ainda pensei em dar uma volta, tomar uma água de coco, mas resolvi ir pra casa. Seria bom ficar um tempo quieta no meu cantinho pra reorganizar as ideias. Teria mais três dias para tentar encontrar a melhor maneira de ter aquela conversa com a Aline. Iria torcer para ela não descobrir o que havia acontecido, pois seria bem provável que ela voltasse antes do tempo.

Antes de qualquer coisa eu precisava me cercar de toda e qualquer informação a respeito do Dr. Igor, e a úinica pessoa capaz de me ajudar era o Paulinho. Tomei um banho rápido e fui até a casa dele, e para minha sorte ele já havia chegado de viagem.

_Que milagre é esse? Está de folga hoje?

_Pedi demissão.

_Como assim? Aconteceu alguma coisa?_ falou dando passagem pra que eu entrasse.

_Acredita que aquela cretino me ofereceu grana pra terminar com ela?

_Eu te falei que ele não valia nada.

_Mas eu não pensei que chegasse a esse ponto. Precisa saber com  quem eu estou lidando.

_Quando eu fiz a segurança da família, foi na época que ela namorava com um tal de Frank, eu andava mais com os dois, e quase não via ela e a mãe. Mas presenciei uma discussão dele e do pai, só entendi que tinha alguma coisa a ver com esse namorado. Pouco tempo depois ele agrediu ela, e ela terminou com ele.

_Tem alguma coisa muito errada nessa história, e eu vou descobrir o que é, não sei como, mas vou descobrir.

_Toma cuidado e qualquer coisa me avisa,

_Obrigado _ dei um abraço nele e sai.

Fim do capítulo