Quem tiver interesse em acompanhar minha rotina de escrita e saber mais sobre o processo de lançamento desse livro (pois vai virar livro físico ><), me segue no insta: diario_deumaescritora_
BOA LEITURA! ><
CAPÍTULO 22
Quando acordei, as lembranças da conversa com Hera na noite anterior repassaram em minha mente como cenas de filme, por incrível que pareça não me senti tão mal pela conversa e pelo que havia revelado a Hera, sentia que agora que ela sabia o que aconteceu comigo, podia seguir em frente com a união, mas isso não significa que eu vá conversar sobre o assunto outra vez, uma vez foi mais que suficiente. Me senti mais leve por ter desabafado sobre tudo o que me aconteceu, mesmo assim não pude evitar de me sentir envergonhada e constrangida, mesmo que saiba que nada do que aconteceu foi culpa minha.
O corpo de Hera se remexeu embaixo do meu, ainda estava deitada em seu peito e o calor do seu corpo foi muito bem vindo por mim. O sol entrava por algumas brechas na janela, deixando o ambiente um pouco claro, a nostalgia aumentou a saudade que sentia da minha casa. Todas as manhãs costumava olhar as partículas de poeira que dançavam no fecho de luz, a posição da luz do sol, as partículas, o silêncio, tudo, me lembrou a calma que era minha vida a quase três semana atrás. Sem me mexer muito para não acordar Hera, levantei a mão e passei pelo fecho de luz, fazendo a poeira no ar se agitar.
- Bom Dia. - Me assusto.
- A quanto tempo está acordada? - Encaro Hera, que bocejou preguiçosamente.
- Não muito tempo. - Seu olhar passeia pelo meu rosto, provavelmente está avaliando meu humor, para saber se ainda estou mal pela conversa de ontem. - Vou preparar o café. - Franzo o cenho.
- Tentando se redimir por ontem? - Em pé Hera veste a calça que estava no dia anterior, Já que antes de dormir ficou somente com uma cueca e o top. Hera se vira de frente para mim e se senta na beirada da cama. Ela estende a mão acariciando meu rosto.
- Não quero nada entre nós. Somos companheiras, quero e vou cuidar de você. Assim como você fez por todo mundo na invasão, não pode me culpar por querer cuidar da minha alma gêmea. Não quero e não vou te perder, e se para isso tiver que acabar com algumas pessoas, para que você esteja segura comigo, farei. - Hera se aproxima depositando um beijo rápido em meus lábios. - Me perdoe por ontem, não vai mais acontecer, não vou cobrar mais de você sobre esse assunto, eu só queria... entender.
- Entender como me sentia?
- Entender porque você tem tanto medo.
- E conseguiu entender? - Hera suspira, seu olhar fixo em minha boca.
- Entendi porque devo matar todos eles para você estar segura. - Com isso ela se levanta da cama e sai do quarto. Permaneço parada olhando o lugar que ela estava instantes atrás.
Depois de debater em mim inutilmente sobre as promessas de Hera em exterminar meus pais, fui tomar banho para despertar o corpo, no entanto, não despertou como queria. Meu corpo continuou mole, pesado e cansado, e decidi me preocupar com aquele cansaço em outro momento. Abri meu guarda roupa para encontrar alguma peça de roupa para voltar para mansão, mas me deparei com o móvel vazio.
"Hera..."
Vestindo as mesmas roupas do dia anterior fui em direção a cozinha, o cheiro de café se espalhava pela casa, junto com o cheiro de pão fresco. Quando entrei no cômodo me deparei com a mesa posta mais uma vez. Bolo, frutas, broas brigavam por espaço na pequena mesinha, junto com uma jarra de suco. Hera estava de costas para mim, se movimentando com habilidade na pia da cozinha enquanto coava o café e manuseava a leiteira. Observei em silêncio seus ombros largos, seus braços malhados cheios de tatuagens, seus cabelos longos presos num coque muito mal feito, com fios caindo pelos ombros. Hera usava somente o top na parte de cima do corpo, deixando em minha visão as cicatrizes e tatuagens com símbolos da antiga língua lycan, espalhadas pelas suas costas expostas. Hera nota minha presença quando se vira para por a leiteira e o bule de café na mesa.
- O quê você gosta de comer no café da manhã?
- Nada específico. - Me dirijo a mesma cadeira que me sentei na noite anterior.
- Café com leite? Café puro? Com ou sem açúcar? Ou prefere suco? - Sorrio com as perguntas.
- Café com leite, com açúcar, três colheres. Café forte. - Hera concorda e prepara meu copo.
- Onde você conseguiu tudo isso? - Deixo meus olhos correrem pela superfície da mesa mais uma vez, reparando numa torta de limão que não tinha visto anteriormente. Como tudo aquilo estava cabendo em cima da pequena mesa de plástico em minha cozinha, eu não fazia ideia.
- Liguei agora de manhã para padaria, pedi para trazerem os pães, o resto trouxe ontem. - Depois que ela termina de preparar o café com leite, ela deposita a caneca sobre um prato em cima da pia. - Pão ou bolo?
- Pão.
- Manteiga ou requeijão?
- Qualquer um. - Hera concorda mais uma vez alcançando uma faca para cortar o pão. Ver Hera preparando as coisas para mim dessa forma é estranho, nunca passei por nenhuma situação semelhante. As poucas vezes em que dormi com outra pessoa em casa, não tomávamos café da manhã juntas como um casal, era cada um para o seu canto depois que acordávamos. Mas percebi que não é tão ruim assim ter alguém preparando meu café da manhã, posso me acostumar com isso. Sorri discretamente para que Hera não visse minha cara abobalhada. Depois de preparar o pão ela o deposita no mesmo prato onde está a caneca e me entrega o prato, para só então começar a preparar o próprio desjejum.
Tomamos o café da manhã em um silêncio confortável, quando as lembranças da discussão na noite anterior teimaram em voltar, me esforcei para ignorar em empurrá-las para o fundo da mente. Ao terminar o café Hera põem as duas mãos atrás da cabeça, e se inclina para trás na cadeira, seu olhar me inspecionando. Sempre me inspecionando.
- Quer fazer a cerimônia da nossa união agora? - Deixo escapar um tosse para disfarçar o quase engasgamento com o café, que na realidade não disfarçou nada.
- Não sei... Acho que não.
- Por que não? - O olhar de Hera se torna irritado. Hoje seus olhos estão com as bordas esverdeadas, mais escuras do que o dia anterior.
- Porque acho que agora não é o momento apropriado, por causa dos ataques na alcateia, e acho que irá chamar muita atenção. - Foco meu olhar na caneca em minhas mãos, fingindo avaliar o pouco de conteúdo que restava para não olhar diretamente naqueles olhos incríveis de Hera.
- Agora ou depois vai chamar atenção do mesmo jeito. - Hera cruza os braços na frente do peito, seus músculos se contraindo.
- Agora não. - Hera alcança sua caneca e beberica me olhando com uma sobrancelha arqueada.
- Ok.
- Quero uma coisa. - Bato as mãos para tirar os restos de farelos de pão que ainda restavam. - Sei que já conversamos sobre isso, mas precisamos conversar de novo. Quero voltar para o meu trabalho. - A cadeira que Hera se sentava range quando ela se inclina para frente, pegando um pedaço do bolo perto de mim, seu olhar intenso já me dizia qual seria sua resposta, no entanto, também não estou disposta a aceitar um não. A não ser que possa fazer outra coisa para passar o tempo, ficar trancada na mansão não é algo que pretendo fazer.
- Não.
- Não estou pedindo permissão. - Um rosnar baixo sai de Hera, mas isso não me deixa intimidada.
- Se for por uma questão de segurança, então também não quero que você trabalhe. Para sua segurança, claro. - Acrescento com um sorrio simpática.
- Sei me defender, nada vai acontecer comigo, sem contar que tenho que andar vinte e quatro horas por dia com escolta. - O olhar semicerrado de Hera percorre meu corpo antes de voltar para os meus olhos.
- Também sei me defender, passei todos esses anos sozinha e nada aconteceu comigo. - Não aceitarei um 'não' como resposta, Hera está sujeita aos mesmos riscos e perigo que eu, por que eu tenho que ficar trancada em casa como uma princesa indefesa e ela não? Riscos iguais, direitos iguais. - Luís e Marcos, meu treinador de luta corporal pode comprovar que sou uma das melhores alunas, posso muito bem me defender sozinha. - Dessa vez arqueio uma sobrancelha e ostento uma expressão arrogante.
Hera suspira insatisfeita, passamos alguns minutos em silêncio, onde não desviei meus olhos dos dela.
- Vou pensar. - Hera se levanta levando os copos e talheres para pia, depois volta para a mesa a arrumando.
- Não vai trabalhar hoje? - Pergunto ajudando a guardar as coisas na mesa.
Mesmo que convença Hera de que posso trabalhar ou fazer alguma coisa, o que vou fazer? Contive um suspiro resignado. Todos esses anos, sempre me imaginei trabalhando na sala de câmeras, nunca imaginei nada além disso, nunca imaginei tão no futuro, na verdade, nunca imaginei um futuro. Quero fazer alguma faculdade? Quero ser alguma coisa? Minha mente ficou em branco. Sempre pensei que não poderia me esconder para sempre dos meus pais, que em algum momento eles me encontrariam e me matariam, até que isso acontecesse meus planos eram só de continuar trabalhando na sala de câmeras, sem chamar atenção. Agora que tenho Hera, e supostamente faço parte de uma família, e que minha vida realmente tomou um rumo que nunca esperei, me sinto arrependida por nunca ter sonhado com algo antes. Sequer imaginei que teria uma companheira, e agora além de uma companheira faço parte de uma família. Não consigo evitar a careta com a última palavra.
- Não. Hoje é lua cheia, todo mundo está convocado para caçar. - Minha mente se embola quando tento me lembrar em que dia estávamos. - Vamos voltar para a mansão e esperar dar a hora, com exceção das equipes de Segurança e Contenção, ninguém trabalhará hoje para caçar.
Depois de terminarmos o café e deixarmos a cozinha arrumada, voltamos para a nova mansão da família do Supremo, dessa vez, uma com um abrigo subterrâneo. Quando chegamos já passavam das dez horas da manhã, todos estavam acordados, Anna está na sala de estar com duas mulheres que não consigo identificar de onde estou, os irmãos de Hera e o Supremo estão fora de vista. Os Guardas Reais estão como sempre distribuídos pela sala. Quando Hera e eu nos aproximamos, reconheço Elisângela, mas a outra mulher que está sentada perto de Anna conversando tranquilamente, não conheço. Quando Hera e eu entramos na sala, todos os olhos voltaram-se para nos.
"Francamente..."
Anna como sempre, usava um vestido longo de alças finas, com uma tonalidade azul escuro, seus cabelos estão soltos, caindo até e cintura. Elisângela e a mulher desconhecida, usavam roupas sociais. A mulher desconhecida tinha os cabelos loiros curtos na altura do queixo, o corte Chanel e os óculos aparentando ser de grau, ressaltou seu semblante sério. Enquanto nos aproximamos do centro da sala, o reconhecimento foi se fazendo claro em minha mente. A semelhança da mulher com Elisângela é muita, rapidamente conclui que aquela mulher é ninguém mais, que Miranda. A Profeta.
Uma ansiedade se apoderou da minha barriga depois da conclusão. Finalmente conhecerei a famosa Profeta da nossa alcateia. Anna, Elisângela e Miranda se levantam ao nos aproximarmos. Anna da um beijo no rosto de Hera, que após cumprimentar a mãe, cumprimenta as outras duas com a cabeça, dando espaço para que eu passe.
- Lorena. - Anna se aproxima de mim, dando um beijo em minha testa assim como fez com Hera. Em seguida ela segura uma das minhas mãos e se vira para a dupla em nossa frente. - Lorena, você já conhece Elisângela, essa é Miranda, a Profeta. Miranda, essa é Lorena. - Miranda da um passo a frente sorrindo para mim.
- É um prazer Lorena, finalmente nos conhecemos, já faz um tempo que estou tentando te conhecer. - Sorrio sem muita animação de volta.
- Prazer. - Vejo Elisângela me olhar de cima a baixo como se procurasse por alguma coisa, a cumprimento com a cabeça, ela devolve o cumprimento com um sorriso que some rápido.
Hera e eu nos sentamos em um sofá de frente para o que Anna estava com Miranda e Elisângela.
- Miranda e eu estávamos conversando sobre você Lorena.
- É mesmo? - Me empertigo no sofá.
- Seus poderes Lorena, são... - Miranda pensa por uns segundos antes de responder. - São diferentes do que estamos acostumados ver. Normalmente, quando um lycan nasce com dons, eles sempre estão relacionados a um de três poderes, ou ele nasce com telecinese, ou telepatia, ou cura. Um lycan que nasce com poderes nasce somente com um desses três, e seus poderes não estão relacionados a nenhum desses, é totalmente diferente que já existiu. - Miranda cruza as pernas se ajeitando no sofá. A informação que Miranda acabou de compartilhar penetra minha mente criando tantas perguntas que não soube o que pensar de início.
"Então, sou uma anomalia?"
"Muito obrigada destino, muito obrigada Gaia, muito obrigada ser supremo que quis foder comigo de vez."
- Apesar de não sabermos a origem dos seus poderes, todos entramos num consenso de que você precisa treinar e praticar seus poderes para não por a vida das pessoas ao seu redor em risco. - Concordo com a cabeça lentamente, ainda refletindo sobre o fato de ser uma anomalia completa. - Você precisa começar a treinar seus poderes para não perder o controle. - Quando Miranda termina o que dizia todos me encaram esperando uma resposta.
- Com quem farei esse treinamento? - Olho de Miranda para Anna.
- Com Miranda. As Profetas são um grupo de pessoas com habilidades além do que imaginamos, algumas Profetas segundo Miranda tem poderes diferentes assim como você, apesar de nenhuma ter existido com um poder tão volátil como o seu. Então acreditamos que a pessoa mais capacitada para esse treinamento seja uma Profeta. - Anna completa.
- Existe um rapaz, com dons de telecinese que pode te ajudar a controlar seus poderes, vou conversar com o Supremo para eu poder contatar ele. Mesmo que os poderes de vocês não sejam a mesma coisa, a intenção de controlar é a mesma, ele controla objetos, e você controla luz, a manipulando conforme sua necessidade, Luís me disse que você mencionou já ter criado um escudo antes, então imagino que o ato de controlar de ambos sejam iguais. Terei que me informar com o Supremo se posso chamá-lo para ajudar em seu treinamento, afinal estamos num momento delicado, não sabemos quem é o informante, e teremos que tomar cuidado se por acaso o Supremo permitir que ele ajude, todas as pessoas com dons estão escondidas pelo Supremo, o informante não pode saber que ele vai estar aqui. - Hera confirma com a cabeça em resposta a Miranda.
- Onde serão feitos esses treinamentos? - Tiro os olhos de Hera e volto minha atenção para Miranda.
- Luís cederá um dos ginásios da alcateia que usam para treinar as equipes de Segurança. - Concordo lentamente com a cabeça. - Precisamos garantir que ninguém sequer imagine que você tem esses dons. Luís me disse que até então, as únicas pessoas que sabem sobre seus poderes, além da Família Real, dele e do Alfa, é Lia, certo? - Concordo novamente. - Ninguém ter testemunhado quando você usou seus poderes é ótimo, apesar de boatos terem se espalhado ninguém pôde provar, consequentemente já esqueceram o assunto. - Faço uma careta.
- Mesmo que ninguém tenha testemunhado, ainda tem pessoas falando. - Todos olham para mim. - Quando saí da mansão sem escolta, fui visitar um amigo de trabalho, a companheira dele ouviu boatos de que tenho poderes, e pelo o que ela me disse, todos já estão sabendo e algumas pessoas não estão contentes com isso. - Vejo o musculo do maxilar de Hera se retesando quando ela aperta os dentes com força. Ela está irritada. Não contei a ela sobre o ocorrido, que somente agora voltou em minha mente. Seguro a mão de Hera chamando sua atenção. - Só me lembrei disso agora, por isso não falei antes. - Ela confirma com a cabeça ainda irritada.
Quando meu olhar se volta para Miranda, tanto ela quanto Anna e Elisângela tem expressões preocupantes em seus rostos.
- Isso é um problema. - Miranda olha para Anna. - Seja lá quem for esse informante, ele sabe demais para ser um segurança qualquer. - O olhar de Miranda se volta para Hera, ambas se encaram em silêncio, conversando com olhares.
- O Supremo e eu temos quase certeza sobre quem é o informante, sobre isso, nós já estamos resolvendo. - Hera comenta e Miranda concorda com a cabeça mais relaxada.
- Bom, para nossa sorte não existe testemunha, então não tem como provarem os boatos. - Miranda suspira pouco aliviada. - Junto a tudo isso ainda temos o fato de você ser uma híbrida, se esse informante souber disso e espalhar, acredito que teremos um grande problema. - Uns segundos de silêncio se passam até Miranda se pronunciar novamente. Hera ao meu lado está distraída, mergulhada em seus próprios pensamentos. Por mais que não conheça Hera a muito tempo, sei que a mente dela está trabalhando sobre os riscos e as possibilidades, enquanto ela mantém seu olhar fixo em um ponto qualquer em sua frente. - Da próxima vez que vier, trarei o máximo de informação possível sobre a espécie vampira, você precisa saber sobre essa outra parte de você.
- Sim, além disso, Luís quer fazer um treinamento corporal com você para saber se sua resistência física mudou depois que você passou pela segunda transformação, acreditamos que sim, mas precisamos ter certeza, híbridos são um terreno totalmente desconhecidos para nós, precisamos coletar o máximo de informações que pudermos sobre você. - Anna gesticula dando ênfase no que dizia. - Jeremy vai tentar descobrir o que puder sobre os seus pais Lorena. A partir de agora eles estarão sobre o nosso radar, sempre saberemos onde estão em tempo real, com quem estão falando, o que estão fazendo. Estarão sendo vigiados por uma das equipes que Hera treinou nessa alcateia.
- Lorena? - Miranda chama nossa atenção assim que Anna termina de explicar. - Você acredita que existe uma possibilidade de não ser filha dos seus pais? - Engulo em seco, e abro a boca para responder mesmo não querendo.
- Não tenho certeza. Tenho muitos traços da minha mãe para não ser filha dela, já do meu pai não tenho certeza. Até onde sei eles são companheiros. Tem uma ligação, acho difícil que minha mãe o tenha traído.
- Ela pode ter tido você antes da união. - Anna completa.
- Não acho que Mario teria a aceitado sabendo disso. - Digo pensativa, relembrando de alguns momentos da infância. Mario é explosivo e totalmente abusivo com minha mãe, não me surpreenderia em saber que meus irmãos foram gerados de estupros.
- Ela pode ter mentido para ele. - Todas olhamos Elisângela, que até então estava quieta ouvindo a conversa. Ela nos olha como se fosse óbvio.
- Como? - Miranda a questiona.
- Talvez se ela tivesse conhecido o companheiro assim que engravidou da Lorena. - Considerei a possibilidade. É possível. Nunca troquei qualquer palavra com meus pais, nunca soube as condições do meu nascimento, a única coisa que se dignaram a me contar foi a data do meu aniversário, e que sou a filha mais velha, mas considerando quem são, não posso nem mesmo ter certeza se me disseram a verdade.
- É possível que Lizandra tenha engravidado de você antes de conhecer Mario. Se seguirmos a lógica de Elisângela é possível que seu pai seja outra pessoa. - Miranda reflete.
- É provável. Eles nunca me contaram nada sobre eles, o que sei sobre eles é o que todo mundo sabe. - Dou de ombros desinteressada. Ouve uma época em que queria saber mais do que as pessoas comuns sabem sobre eles, houve uma época em que tentava questioná-los do porque me tratavam daquela forma, minhas respostas eram sempre socos e tapas, e parei de perguntar conforme fui crescendo e percebendo que nunca teria nada além daquilo deles: raiva e desprezo. Hoje, não dou a mínima importância para as coisas que queria saber anos atrás, para mim, viver como estou já é suficiente.
- Jeremy abriu uma investigação sobre eles. Ele tem arquivos que relatam as árvores genealógicas, e também jornais informativos de uma época antes de você nascer, sua mãe é de uma família importante, vamos investigar se não existe ninguém na árvore genealógica dela que tenha nascido com poderes diferenciados, assim como você. - Anna me diz confiante, seu olhar não vacila um segundo sequer. - Talvez também consigamos descobrir quem é seu pai verdadeiro. - Concordo despreocupada.
- Sinceramente, não me importo de não conhecer meu pai biológico. Se por acaso não for Mario. Essa não é uma prioridade para mim. - Todos ficam em silêncio me encarando.
- Tudo bem, mas de qualquer forma precisamos saber se existe a possibilidade de seu pai ser um vampiro, o que acho difícil, mas não duvido de mais nada ultimamente. - Miranda diz. - Se descobrirmos que os pais da Lorena são lycans e que nenhum parente dela tenha nascido com poderes, só posso deduzir que Lorena foi criada por Gaia por algum motivo que ainda não sabemos. Não entendo porque Gaia criaria agora uma híbrida, quando poderia ter criado no mesmo dia que criou todas as espécies. Porém, ainda não sabemos nada, vamos ver o que o Supremo descobrirá sobre a família da Lorena e vamos começar a deduzir a partir daí. - Todos concordamos com o raciocínio de Miranda. - Até o Supremo e Hera permitirem que eu chame o rapaz com dons para ajudar no treinamento de Lorena, nós faremos alguns treinamentos na floresta quando ninguém estiver por perto.
- Com esses ataques acho perigoso irem para floresta sem um grande grupo para escoltarem vocês. - Hera diz, visivelmente insatisfeita.
- Iremos durante o dia, nenhum vampiro vai atacar, mas vamos aceitar se você quiser mandar alguns Guardas que já sabem sobre Lorena conosco. Quanto menos pessoas de fora souberem sobre Lorena melhor.
- Vou preparar uma equipe. Quando começam?
- Quando Lorena se sentir confortável, estarei pronta. Quando precisar viajar para resolver os assuntos das Profetas avisarei.
- Certo. - Hera cruza os braços ainda insatisfeita.
Apesar de a conversa ter sido rápida, não nos demos conta de que já era horário de almoço. A Família Real, aparentemente tem quatro empregadas, duas são cozinheiras, e as outras duas cuidam da limpeza da casa. Me perguntei como não as vi nenhuma vez antes. No entanto não tive muito tempo de divagar sobre a equipe de funcionários. O Supremo retornou com uma tropa de Guardas, juntamente com Bernardo, seu Beta e os dois irmãos de Hera. Todos fomos para a sala de jantar, que é quase tão grande quanto a sala de estar, uma mesa retangular com mais de dez lugares dispostos para convidados nos aguardava. Anna convidou Miranda e Elisângela para almoçar conosco, e Miranda prontamente aceitou. Mais tarde, soube por Hera que Miranda e Anna são amigas desde a infância e fiz o possível para esconder minha cara de espanto, isso significa que Miranda é velha, velha como a Suprema e o Supremo Alfa. Dois lugares a mais foram postos na mesa para Miranda e Elisângela.
O almoço transcorreu tranquilo, todos conversavam entre si, por mais que quisesse prestar atenção na conversa de Anna, Miranda e Elisângela, meus ouvidos estavam atentos a conversa baixa que Hera tinha com o Supremo, sobre a segurança da alcateia. Aparentemente, tinham capturado um vampiro durante o último ataque, e planejam interrogá-lo. Discretamente sorria e sorvia do suco de laranja posto em uma taça em minhas mão, olhando entre Anna e Miranda, como se prestasse atenção na conversa, contudo minha atenção estava na conversa de Hera. Se qualquer uma das duas perguntasse para mim sobre o assunto que conversavam, não saberia responder, sequer prestei atenção no decorrer do assunto depois que me dei conta de que falavam na cerimônia da Lua Azul, que acontece a cada dois anos e toda a alcateia comemora pelo aumento da nossa força nesse mês em específico.
Depois do almoço, Hera e eu fomos para o quarto, tomamos banho e dormi até as onze da noite, uma novidade para mim, considerando meus problemas para dormir recentemente. Me acostumar ao sono excessivo não será um problema, já que sono acumulado é o que tenho de sobra considerando os últimos meses conturbados em que não conseguia dormir. Hera me acordou para me preparar para caçar, hoje é a primeira lua cheia que caçarei com a Família Real, e tentei inutilmente não ficar ansiosa, ou pensar no que aconteceria. É uma tradição a Família Real apresentar para alcateia um integrante novo na família, e sei que infelizmente não escaparei dessa tradição.
- Ele me perguntou quando faríamos nossa cerimonia de união. - Hera diz, distraidamente vestindo um roupão de seda negro, que terminava um pouco abaixo dos joelhos.
- E o que você disse?
- Que você não quer fazer agora. - Mesmo Hera tendo aceitado esperar, isso não significa que ela concorda, seu semblante fechado deixou claro que não queria conversar sobre o assunto, e não conversamos depois que ela mencionou a pergunta do Supremo.
Depois de vestir um roupão com tecido semelhante a ceda, e igual ao de Hera, todos nos encontramos no primeiro andar. A Guarda Real não saiu do nosso redor em nenhum momento do trajeto da sala de estar até o carro. E dentro do carro, eles permaneceram conosco, até chegarmos ao portão da floresta, da mesma forma como no dia em que chegaram a alcateia, rápidos e organizados.
Uma multidão de pessoas se acumulava nas ruas a caminho da floresta. Normalmente, durante as luas cheias, Lucas, nosso Alfa, divide a alcateia em grupos iguais, e todos os meses, nos dias de lua cheia, cada pessoa caça com seu grupo, no dia determinado pelo Alfa:
Dia 1: Grupo 1 - Dia estabelecido para os aristocratas, concelho e família dos Alfas e Betas.
Dia 2: Grupo 2 - Dia estabelecido para os funcionários das equipes de Contenção e Segurança.
Dia 3: Grupo 3 - Dia destinados aos civis.
Dia 4,5,6... - São livres para quem quiser caçar novamente e normalmente as caçadas são lideradas por Alfas sem alcateia, chamados de Líderes de Caçada. O Alfa tem muitos assuntos para resolver e na maioria das vezes não consegue estar presente em todas caçadas, por isso, os Líderes de Caçada, escolhidos pelo Alfa e Beta, tem permissão de liderar nesses dias.
Hoje é exceção. A primeira lua cheia em nossa alcateia com a presença da Família Real desde que cheguei aqui. Hoje, todos irão caçar juntos, como um.
Quanto mais perto chegávamos dos portões, mais a multidão se intensificava. O carro estava numa velocidade lenta para não atropelar ninguém, as pessoas se amontoavam ao redor do carro ansiosas para olhar quem estava dentro, mesmo que os vidros escuros impedissem isso, e mesmo que já soubessem que a Família Real estava dentro. Depois do motorista buzinar duas vezes, a multidão se abriu ao redor do carro, e o carro voltou a andar numa velocidade moderada.
Mesmo com os vidros escuros fechados, não consegui deixar de me incomodar com a atenção das pessoas do lado de fora. A maioria fazia uma mesura, se inclinando até cintura enquanto o carro passava. Toda essa atenção me sufocou. Quis sair correndo e me misturar no meio da multidão e ficar longe dos olhares inquisidores. Engoli em seco quando reconheci a sensação familiar de quando participava de eventos importantes com meus pais. As pessoas sempre queriam estar perto, bajulando, sufocando. Por ser a única filha mulher do Fundador Mario, sempre recebia mais atenção que meus irmãos homens, porque as mulheres na sociedade lycan são consideradas valiosas. Hera apertou minha mão que até então não percebi que contorcia no colo. Fixo meu olhar no chão do carro para evitar olhar para todas aquelas pessoas do lado de fora, e empurro para o mais fundo da minha mente todas aquelas malditas lembranças.
Quando o carro estacionou, todos nos preparamos para sair. Uma equipe da Contenção de pelo menos quinze pessoas se posicionaram ao lado do carro junto com a equipe da Guarda Real. Com um sinal de um dos Guardas Reais do lado de fora, os irmãos de Hera saíram primeiro, em seguida Hera e eu saímos, o Supremo e a Suprema sendo os últimos. A multidão de pessoas se agitou ao ver a Família Real, e muitos ao notarem minha presença ao lado de Hera não esconderam os olhares curiosos e confusos, que ignorei com maestria, da mesma forma que fazia quando acompanhava meus pais. Hera sorriu ao ver como minha expressão tinha mudado de apavorada para desinteressada, mas eu não sorri de volta. Agir dessa forma na frente das pessoas, fazia as lembranças pressionarem ainda mais minhas barreiras internas para voltarem a superfície. Uma rápida olhada para Anna e o Supremo, e vi que assim como eu, ele e ela também mudaram a postura na frente da alcateia, engoli mais uma vez o desespero que crescia cada vez mais em meu interior, ao reviver tal experiência que sempre odiei tanto.
Mesmo tendo muitas pessoas para a caçada, o silencio pairou entre a multidão desde que o Supremo e a Suprema saíram do carro. Nenhuma voz era ouvida, além do farfalhar das árvores que eram balançadas pelo vento noturno. Quando fomos para dentro da floresta, o Supremo se dirigiu para a grande pedra que Caio havia subido para falar com as pessoas no dia do jogo. A Suprema permaneceu ao lado do Supremo em todo momento, com Hera, eu, Matheus e Igor logo atrás. Hera segurou meu pulso para ficarmos para trás quando o Supremo caminhou até a ponta da pedra, ficando mais visível para todos. Apesar de ser uma simples pedra, é uma pedra bem grande, coube toda a família do Supremo Alfa, e alguns dos Guardas Reais. A Equipe de Contenção se posicionou ao redor da pedra no chão. Na primeira fileira de pessoas no chão, estavam Luís e sua parceira, Lucas e sua parceira, outros Líderes de Caçada, e pessoas importantes na alcateia, seguindo a hierarquia se posicionaram um ao lado, ou atrás do outro. Vi quando o Supremo tomou fôlego para falar com a multidão e todos permaneceram calados.
- Alcateia do Norte! É com muita alegria e prazer que caço com vocês dessa vez! E é com mais alegria ainda, que anuncio uma nova integrante em nossa família. - Nesse momento a Suprema e os irmãos de Hera abrem espaço para que eu passe por eles. Engulo a saliva nervosa.
"Por favor... Isso não... Atenção demais, atenção demais..."
Hera pressiona meu pulso novamente, me puxando para a frente. Nos posicionamos ao lado do Supremo, comigo no meio, Hera do meu lado direito, e Anna ao lado de Hera.
- Lorena, companheira da minha filha primogênita Hera! - Um coro de gritos de alegria chega aos meus ouvidos e eu luto com a vontade de sair correndo e não dar um show, no pior dos sentidos. O Supremo continua a falar com a multidão, e me concentro em meu próprio nervosismo. Sinto a mão de Hera apertar a minha carinhosamente e me deixo levar pela sensação das mãos cálidas e quentes dela nas minhas. Foco nas batidas descompassadas do meu coração e na minha respiração que parecia querer seguir o exemplo do mesmo.
Agora faço parte da Família Real. Oficialmente e definitivamente.
Fim do capítulo
Oi! Oi! Gente!
Finalmente apareci com um bônus aqui né? kkkk
Espero que tenham gostado do cap, me perdoem os erros que encontrarem, minha vida tá bem corrida.
Curtam e comentem para eu saber o que estão achando! Comentem principalmente, amo os comentários de vocês ><
Fiquem bem, até quarta feira!
Se cuidem!
Bjinhos ><
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Marta Andrade dos Santos
Em: 23/05/2021
Adorei o extra
Resposta do autor:
><
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