Delírios
Isabel
– Carmen, precisa de sua ajuda, Isabel! – Gelei na mesma hora.
Me sentei ao seu lado no sofá. Margot balançava as pernas nervosa e impaciente. Segurei em suas mãos e ela sorriu.
– O que aconteceu? – A senhora estava com os olhos marejados.
– Isabel, tu sabes que na nossa vida nada é fácil...
Apertei delicadamente suas mãos encorajando-a a continuar.
– Carmen ficou grávida. – Disse de uma vez e fiquei meio desnorteada, mas não tão surpresa, ela era o amor da minha vida, mas também era uma mulher da noite e deduzi que isso não era raro. – Não é a primeira vez... As meninas sempre interrompem a gravidez, mas Carmen dessa vez foi displicente... – Disse irritada. – Ela não se atentou aos sinais e quando resolveu tomar alguma atitude já era tarde demais... Ela tentou abortar através de um método um tanto arriscado, muito perigoso e doloroso... – Margot deixou as lágrimas caírem e sua voz falhou, meu peito doeu e uma sensação ruim tomou conta do meu corpo.
– Onde ela está, Margot? – A mulher soluçava e meu desespero foi aumentando. – Por favor, não me diga que Carmen... – Levei as mãos à cabeça.
– Não! – Margot disse entre as lágrimas. – Ela está viva. – Respirei aliviada.
Levantei ainda em choque.
– Ela está muito mal, Isabel! Levei-a de volta para o bordel depois do procedimento, ela desmaiou de dor e desde então está com febre... O médico já não sabe mais o que fazer, ela desperta as vezes, mas sempre delirante. Eu não sei quanto tempo... quanto tempo ela aguentará. – Margot se levantou e segurou em minhas mãos. – Por favor, Isabel, tu és minha última esperança, traga Carmen para cá, chame outros médicos... Na tua condição conhece muita gente, especialistas! No bordel não posso fazer mais nada por ela. Salve, a minha menina, Isabel! Por favor... – Ela voltou a chorar.
Eu não aguentei e me permitir chorar junto com Margot. A simples ideia de perder Carmen para sempre, me deixava desnorteada.
– Vamos agora mesmo para a capital buscá-la! – Margot me abraçou e sorriu em meio às lágrimas.
– Sabia que poderia contar contigo, Isabel! Tu és como teu pai... Generosa e uma boa pessoa. – Ela acariciou meu rosto. Sorri e agradeci. Ela não sabia ainda, mas eu já conhecia sua história de amor com o Barão.
– Faço isso antes de tudo porque eu amo Carmen!
– E Carmen tem sorte por ter em sua vida! – Disse limpando as lágrimas.
Fui até meu quarto e troquei de roupa o mais rápido possível. Lucília furiosa entrou batendo a porta.
– Vai mesmo trazer essa mulher para cá? – Disse brava.
– Sim! E por favor prepare meu quarto para recebê-la! - Me limitei a dizer, não tinha tempo para discussões.
Lucília me olhou ainda em choque.
– Mas Isabel o que as pessoas vão falar...
Não deixei ela continuar
– Não estou nem aí para opinião de ninguém e tu melhor do que ninguém deveria saber disso! Nesse momento a única coisa que me importa é salvar a vida de Carmen! – Ajeitei minha roupa e sai do quarto deixando Lucília no quarto ainda calada.
– Vamos, Margot! – Peguei a mulher pela mão e chamei o cocheiro que logo se prontificou em buscar a carruagem.
A governanta apareceu novamente na sala.
– Lucília, por favor deixe tudo pronto e mande chamar o Doutor Plínio... Peça para que venha o mais rápido possível! – Ela apenas concordou com a cabeça um tanto contrariada.
Seguimos viagem caladas e tensas. Carmen era muito importante para nós duas e perdê-la estava fora de cogitação.
Chegamos a capital com o dia nascendo. Margot me levou direto ao quarto dela. Haviam duas meninas ao seu lado, secando o suor do seu rosto. Ver Carmen daquele jeito acabou comigo. Seus olhos estavam fundo, a pele dourada estava pálida e a boca quase sem cor. Ela delirava de febre e dizia coisas sem sentido. Por vezes, chamava meu nome entre os delírios.
– Bom dia! – Cumprimentei as duas meninas que estavam ao seu lado.
– Bom dia, Baronesa! – Falaram juntas.
Me ajoelhei ao seu lado na cama e passei meus dedos pelo seu rosto que queimava em febre. Reparei em sua barriga, já estava dando os sinais da gravidez. Uma pequena protuberância aparecia. Um pouco de ciúme me consumiu, aquela criança era de um homem que ela se deitou em qualquer noite dessas... Balancei a cabeça afastando aquele pensamento, não era momento para ciúmes, não podia ser egoísta. Carmen precisava de mim e eu estava ali para ajudar e não julgá-la.
– Margot, preciso que arrume as coisas dela.
– Meninas, peguem as coisas pessoais de Carmen e coloquem na sua mala, já está aberta ali na cadeira.... – As suas se apressaram em arrumar algumas coisas e encher a mala e por último, colocaram uma roupa em Carmen com dificuldade.
– Vamos? – Falei com Margot que prontamente concordou.
– Vou chamar um dos empregados para levá-la até a carruagem...
– Não precisa eu a levo... – Peguei Carmen no colo e devagar desci as escadas com ela.
Margot me seguia com a mala de Carmen em sua mão. Com a ajuda do cocheiro, coloquei-a deitada no meu colo.
– Isabel, preciso deixar as meninas avisadas de que voltarei apenas a noite, me espere um segundo, por favor... – Concordei e Margot sumiu de vista.
Acariciei o rosto pálido de Carmen e ela despertou novamente delirando.
– No te vayas, Isabel... – Repetia sem parar.
Encostei minha testa na dela e me permitir chorar.
– Eu estou aqui, meu amor... Não vou a lugar nenhum! – Deixei um beijo de leve em seus lábios.
Margot voltou minutos depois e assim partimos para a fazenda.
– Desde quando ela está assim? – Perguntei acariciando seu rosto.
– Faz uma semana ela está nesse delírio da febre. O médico disse que provavelmente ocorreu uma infecção... Passou remédios e disse que só nos restava aguardar, mas ela não melhorou nada! – Disse preocupada. – Eu não podia deixar Carmen morrer... Por isso fui atrás de ti!
– Fez bem, Margot! – Ela sorriu. – Por que ela se submeteu a essa cirurgia? Isso é loucura, Margot! O açougueiro que fez isso com ela, deveria ser preso! – Falei irritada.
– Por favor, não faça nada contra o Doutor Paulo, ele é o único médico que se propõem a ir até o bordel cuidar das meninas, é uma boa pessoa, fez tudo que podia para ajudá-la! – Disse aflita. – Eu tentei de todas as maneiras possíveis fazer Carmen desistir disso mas sabe como é teimosa!
Concordei. Eu conhecia bem a teimosia da Madame.
– Cheguei a dar a ideia dela ter a criança... Mandaríamos ela para um colégio interno fora do Império... Até cheguei a falar que pediria sua ajuda se fosse preciso! Ela se revoltou quando toquei em seu nome e disse que sua decisão estava tomada, não teria o bebê de jeito nenhum. – Falou suspirando.
– Teimosa... – Beijei sua testa.
– Eu prefiro Carmen viva... O bebê nós cuidamos de algum jeito! – Margot disse pensativa. – Já perdi uma das meninas dessa mesma forma, eu temia pela vida dela e agora eu estou quase perdendo a minha menina. – Margot segurou em uma das mãos de Carmen.
– Não vamos perdê-la, prometo! – Margot me agradeceu e se calou o resto da viagem.
Chegamos algumas horas depois na fazenda e com a ajuda do cocheiro desci Carmen da carruagem e a levei direto para o meu quarto, que como solicitei a Lucília, estava arrumado para recebê-la. Passando pela sala, Doutor Plínio se levantou para me cumprimentar.
– Baronesa! – disse cortês.
– Obrigada por vir tão rápido, Plínio! – Ele era médico da família há anos e eu confiava plenamente, sei que poderia salvá-la.
Acomodei Carmen na cama e me afastei deixando o médico examiná-la. Margot andava de um lado para o outro, preocupada. Passou alguns minutos e ele chamou nossa atenção.
– Ela não está nada bem, Isabel! – Disse suspirando. – Pelo tempo que me disseram que ela está com febre, a infecção deve ter se espalhado...
– Por favor, Plínio! – Cheguei perto do médico. – Faça tudo que puder para salvá-la. Não posso perder Carmen. – Ele apenas concordou. Ele era um homem discreto, por isso o chamei, além de ser um médico muito conceituado. Nós tivemos que contar a ele tudo que aconteceu e sobre a vida que ela levava. Margot passou detalhes dos procedimentos que elas faziam, com ervas e remédios específicos e a cirurgia que recorriam quando o chá abortivo não surtia efeito.
– Quem fez isso a ela deveria perder o direito de exercer a medicina! – Disse um pouco irritado. – Essa mulher está toda mutilada! Será um milagre se essa criança ainda estiver viva. Ela pode ter um parto prematuro ou então sofrer um aborto a qualquer momento... Ainda é difícil precisar, temos que aguardar e ver como seu corpo reagirá ao medicamento. Eu fiz tudo que podia, Baronesa! – Plínio apertou minha mão e nos passou os remédios e cuidados que deveríamos ter com Carmen.
Nada mais podíamos fazer a não ser aguardar e ter fé que ela reagiria bem a esse novo remédio. Plínio foi embora me deixando com Margot e Carmen no quarto.
– Minha querida... – Margot sentou ao seu lado na cama e acariciou seu rosto. – Seja forte! Viva!
Eu estava tensa e com muito medo.
– Preciso voltar à capital, Isabel! – Margot disse deixando um beijo na testa de Carmen.
– Achei que fosse ficar aqui...
– Bem que queria, mas a casa não tem ninguém além de mim para administrar. Carmen, era minha pessoa de confiança... – Disse suspirando. – Vou agora, mas voltarei todo dia de manhã para vê-la. – Margot me puxou para um abraço e disse emocionada. – Muito obrigada, Isabel! – Beijou minha testa. – Em outro tempo, adoraria ver Carmen casada com alguém assim... Ela merece uma vida boa com alguém que a ame de verdade! – Limpou uma lágrima e se despediu de Carmen de novo. Levei Margot até a porta e antes de entrar na carruagem ela segurou minhas mãos.
– Qualquer coisa me avisa, por favor. – Disse com a voz falhando, eu sabia o que ela temia. A morte de Carmen.
Improvisei uma cama ao lado da sua e passei as noites ali zelando por ela. Não poderia deixar Carmen sozinha, tinha esperanças de que ela acordasse a qualquer momento. Na sua segunda noite na fazenda, ainda com muita febre ela acordou no meio da madrugada delirando.
– Eu te amo... – Ela dizia confusa. – Eu aceito, Isabel! – Falava a última parte sem parar.
Eu desconfiava do que era aquele delírio. Carmen, estava dizendo que aceitava meu pedido de casamento. O que só me confirmava que seu desejo verdadeiro, era aquele afinal. Deitei ao seu lado e a puxei para meu colo.
– Me perdonas... – Ela dizia chorosa. – Isabel...
Repetia meu nome sem parar.
– Eii, calma... Eu estou aqui! Assim como meu pedido será sempre válido... – Beijei sua testa e aos poucos ela foi se acalmando até dormir outra vez.
As noites geralmente eram assim, ela ficava mais agitada, tinha pesadelos e chamava por pessoas que um dia fizeram parte de sua vida.
****
Alguns dias se passaram desde que Carmen chegou a fazenda e ela começou, aos poucos, a apresentar alguma melhora.
Plínio examinava ela no quarto, enquanto eu e Margot esperávamos na sala aflitas.
– E então? – Corri até o médico assim que o mesmo apareceu na sala.
Ele respirou fundo aumentando mais ainda nossa tensão.
– A febre está diminuindo o que é um ótimo sinal, o remédio está fazendo efeito e parece que a criança também está bem. – Margot deu um suspiro de alívio e alegria. - O quadro de infecção ainda existe, mas isso levará mais tempo até curar por completo. O importante é que com o remédio agindo positivamente em seu organismo, logo Carmen acordará melhor! – Abracei o médico que riu com o gesto e retribuiu.
– Muito obrigada, Plínio! Sabia que podia confiar em ti! – Ele riu sem graça.
– Os cuidados continuam e os curativos todos os dias, da mesma forma... – Balancei a cabeça concordando.
– Não se preocupe Carmen está sendo cuidada 24 horas. – Ele apertou minha mão se despedindo e partiu da fazenda.
O médico aparecia quase todos os dias, acompanhando de perto o caso de Carmen. Margot agora mais aliviada, ainda vinha todas as manhãs e ia embora antes de anoitecer, era visível o quanto ela estava cansada, mas não deixou de vir nenhum dia.
Quando eu não estava em casa, por conta das tarefas da fazenda, alguém sempre ficava ao seu lado, Margot, alguma empregada e por vezes Lucília, que fazia quase sempre contrariada. Ela deixou claro que não concordava com isso e eu deixei claro a ela que Carmen seria tratada como uma rainha enquanto estivesse na minha casa.
Mais dois dias se passaram e ela vinha melhorando gradativamente. Havia saído cedo para lidar com as tarefas da fazenda e voltei para casa pela hora do almoço. Desci do cavalo e deixei um dos empregados o levarem até o estábulo. Corri até a entrada ansiosa para saber de Carmen.
– Isabel! – Margot vinha correndo em minha direção com um enorme sorriso no rosto. – Só pode ser o destino, chegaste bem na hora que Carmen acordou! – Sorri e andei rápido até o quarto. Abri a porta devagar e ela me olhou surpresa e assustada.
– Isabel?! – Andei até a beira da cama e peguei em sua mão.
– Que bom que acordou, Carmen! – Disse beijando sua mão.
Ela ainda estranhava a situação e olhava para Margot desconfiada. Normal, ela veio para cá desacordada, não sabia onde estava e nem o que tinha acontecido esses dias.
– Carmen, minha querida! – Margot se aproximou e a beijou na testa. – Graças a Deus está viva! E a Isabel também! – Disse sorrindo para mim.
– Alguém pode, por favor, me dizer o que está acontecendo?! – Ela pediu aflita. – ¿Donde estoy?
Ela tentava se sentar.
– Não se mexa, ainda está muito machucada... – Margot disse e respirou fundo. – Carmen, tu desmaiou de dor no dia da cirurgia... Então te levei para o bordel, mas teu quadro piorou muito. – Disse triste. – Estávamos te perdendo. Foi quando resolvi pedir ajuda a Isabel – Ela me olhou e sorriu. Carmen ainda nos olhava confusa. – Ela prontamente foi até a capital comigo e te buscou! Tu estás na fazenda da Baronesa, desde então! – Carmen me olhava e eu sabia que ali tinha um misto de sentimentos.
– Não devia ter incomodado a Baronesa, Margot. – Falou sem me encarar.
Segurei novamente em sua mão.
– Margot fez o que era certo, Carmen! Não a perdoaria se não me avisasse do teu estado.
– Isabel chamou um médico amigo da família que tentou um novo remédio e felizmente deu certo.
– Cuantos días fiquei desse jeito? – Ela disse assustada.
– Quase duas semana! – Margot disse.
Carmen respirou fundo e tentou se mexer, mas logo gem*u de dor.
– Não se mexa muito... – Peguei Carmen com cuidado e ajudei a se sentar.
Ela sorriu fraco e um pouco sem graça.
– Muchas Gracias, Isabel! –
– Só não tente fazer tantos movimentos bruscos... – Ela me interrompeu.
– Gracias por tudo, Baronesa! Por salvar mi vida... – Ela pegou na minha mão e a beijou delicadamente.
Eu sorri e tímida não encarei Carmen.
– Isabel foi muito generosa contigo, Carmen... Ela te trouxe para sua casa, para seu quarto... – Disse olhando em volta. – Te deu o melhor tratamento que poderia ter.
– Vocês duas podem parar com isso... Estão me deixando sem jeito. – As duas mulheres riram.
– Serei eternamente grata a usted por isso, Isabel!
Me levantei ainda sem jeito.
– Faria tudo de novo se fosse preciso, Carmen! – Vi seu olhar terno para mim e depois para Margot. – Vou deixar vocês duas sozinhas um pouco, acho que precisam conversar... – Sai antes que as duas falasse mais alguma coisa. Fechei a porta do quarto e sorri sentindo aquela sensação boa no peito, aquele calor e amor que sentia toda vez que estava na presença dela.
Voltei a sala e fui até a garrafa de licor. Carmen estava viva e isso era motivo de comemoração. Bebi algumas doses e aguardei até que Margot me chamasse novamente. Passou quase meia hora quando a porta do quarto foi aberta e a senhora me chamou. Ela parecia um pouco irritada.
– Isabel, diga a essa teimosa que ela não pode sair daqui por enquanto! – Disse brava.
Revirei os olhos.
– Baronesa, não precisa me ter como un fardo em tú casa! Eu agradeço o que usted fez por mim, sempre serei grata, mas não posso mais incomodá-la... – Não deixei ela continuar.
– Primeiro, meu nome é Isabel não Baronesa! Isso é somente um título bobo. Segundo, a senhorita não pode se deslocar até a capital, não no estado em que se encontra! Plínio já tinha nos avisado, foi um risco te trazer até aqui, não a colocarei em risco novamente por teimosa tua! – Ela me olhou irritada. – Pare de ser teimosa uma vez na vida! Entenda que ainda não está totalmente recuperada, tem um filho no teu ventre, pense nele então! – Carmen me olhou preocupada. Acho que até para ela a ficha ainda não caiu. Respirei fundo. – Faremos assim, quando puder viajar novamente, tu voltas a capital, não quero de maneira nenhuma mantê-la aqui sem a sua vontade...
– Isabel, não foi isso que quis dizer...
Não a deixei continuar.
– O importante é que está se recuperando. Se quiser ir embora daqui algum tempo, entenderei, mas se quiser ficar aqui comigo... – Meu coração disparou – Se quiser ficar aqui comigo até o bebê nascer, será muito bem-vinda! Não é incomodo nenhum tê-la em minha casa, por favor não pense mais dessa forma! – Mentiria se falasse que não fiquei chateada com toda essa pressa de Carmen, mas de forma alguma a manteria ali sem sua vontade.
Carmen ficou sem palavras por um tempo e Margot a encarava séria.
– Não quero parecer ingrata, Isabel... Ficarei aqui por enquanto e sobre prolongar minha estadia até o nasci... – Ela travou. – Até o nascimento, decido isso mais para frente, pode ser? – Ela sorriu para mim. Apesar de abatida, continuava linda.
Balancei a cabeça concordando e Margot respirou aliviada.
– Como quiser, Carmen! – Disse sorrindo e encerrando aquele assunto por enquanto.
– Eu preciso voltar a capital! – Margot disse se aproximando de Carmen.
– Como assim? Não está ficando aqui todos os dias? – Carmen perguntou confusa.
– Eu disse para ela ficar... – Falei me colocando ao lado de Margot.
– Sabe que não tenho ninguém de confiança na casa, Carmen... A minha mulher de confiança está aqui se recuperando... – Disse sorrindo.
– Margot, é loucura ficar vindo da capital até aqui todo dia... Debes de estar exausta!
– Não se preocupe comigo, eu ficarei bem! Quero que se concentre na tua saúde agora! – Margot deixou um beijo na testa de Carmen. – E Isabel, novamente muito obrigada! Serei eternamente grata a ti por tudo! – Disse beijando meu rosto. Apenas sorri agradecida.
Levei Margot até a porta e me despedi de novo antes da carruagem partir. Fiquei alguns minutos ali fora, tomando ar e coragem para encarar a mulher em meu quarto. Eu sabia que uma hora ela iria embora, mas enquanto estivesse aqui, eu aproveitaria cada minuto de sua presença.
– Está com fome? – Carmen, estava claramente sem graça e na maioria do tempo não sabia como agir.
– Sí... e com muita sede. – Sorriu tímida. – Parece que não como há um ano! – Disse nos fazendo rir.
– Já volto com seu jantar... – Ela apenas concordou com a cabeça.
Minutos depois entrei no quarto com uma bandeja em minhas mãos. Ajeitei em seu colo.
– Eu queria trazer algo melhor do que essa sopa sem vida... – Carmen riu. – Mas são recomendações médicas...
Ela bebeu um grande gole do suco de laranja e depois, tomou um pouco da sopa.
– Não está ruim... – Disse sorrindo.
Eu fiquei ali somente admirando Carmen, o que deixou ela um pouco irritada.
– Pare de me olhar assim. – Falou revirando os olhos. – Pode ir jantar, eu ficarei bem!
Levantei da cama e sai sem falar nada o que deixou ela um pouco surpresa. Fui até a cozinha e pedi o mesmo que levei para ela.
– Mas Baronesa, sua comida está pronta e a mesa preparada para a senhorita jantar.... – A cozinheira falou.
– Não se preocupe, Marta, eu vou comer no quarto com Carmen! E tenho certeza que a sopa está ótima, és uma ótima cozinheira, faz de uma simples sopa um prato especial! – A mulher sorriu agradecida e mais conformada me serviu da comida.
Entrei no quarto e Carmen me olhou surpresa. Coloquei uma cadeira ao lado da cama e comecei a comer.
– Por que está comendo isso? – Disse surpresa.
– Não comerei um banquete enquanto come refeições simples! Fora que meu pai me ensinou que é falta de educação deixar uma senhorita comendo sozinha... – Carmen balançou a cabeça e riu alto.
– Tu no existes, Isabel!
Jantamos juntas e conversamos um pouco deixando o clima entre nós duas mais leve. Não toquei no assunto de Petrópolis e nem sobre a gravidez. Na hora que estivesse pronta ela falaria.
Dormi novamente no quarto com ela, na cama de solteiro improvisada. Depois de muita reclamação de Carmen, de que deveríamos trocar de cama já que ela estava ocupando a minha.
Plínio voltou a fazenda no dia seguinte e elogiou a melhora de Carmen.
– Está reagindo muito bem, Madame! Seus machucados estão fechando sem maiores problemas...
– Muchas gracias, Doutor! – disse sorrindo.
– Acredito que daqui a alguns dias já pode se levantar e andar um pouco.
– Isso é maravilhoso! – Disse animada. Carmen riu alto.
Plínio foi embora depois de fazer os curativos e prescrever mais alguns cuidados para os próximos dias. As suas visitas ficaram mais espaçadas, já que Carmen melhorava cada dia mais. Margot também diminui suas visitas, estava muito cansativo para a mulher já com certa idade, fazer aquela viagem longa todos os dias.
Carmen aos poucos foi se soltando e sempre passávamos horas no quarto conversando sobre minha vida na fazenda e minha infância. Quando o médico enfim liberou sua saída do quarto, fiz questão de apresentá-la a casa. A casa que seria dela se assim quisesse.
– Vamos sair um pouco desse quarto! – Entrei pela manhã e ela já estava arrumada me esperando para tomar café.
– Não vamos tomar café aqui?! – Disse confusa.
Virou uma rotina nossa fazer as refeições juntas. Peguei Carmen no colo.
– Isabel, acho que já posso caminhar... – Disse rindo. Abri a porta com ela ainda em meu colo.
– Eu sei, senhorita, mas passei tanto tempo a carregando no colo que está difícil deixar meu papel de cocheiro! – Carmen riu alto preenchendo todo o corredor com a sua risada.
A mesa do café estava arrumada na varanda da casa. Coloquei-a no chão e ela com cuidado se ajeitou na cadeira, me agradecendo.
– Gracias, mi cocheiro! – Disse brincando.
– Ao seu dispor, senhorita! – Fiz uma reverência e rimos. Ali de pé tive um vislumbre de uma das minhas ilusões com ela ali na casa, uma vez cheguei a vê-la sentada na varanda daquela casa, da mesma forma que está agora.
– Não vai sentar? – Disse ajeitando o guardanapo de tecido no seu colo.
Sentei na sua frente e nos servi o café.
– Usted me viciou em café, Baronesa! – Disse pegando a xícara e levando a boca.
– Café é uma das maravilhas do mundo, Carmen! – Bebi apreciando o gosto forte do café. – E enquanto a senhorita estiver aqui, vai fazer todas as refeições da maneira correta!
Carmen revirou os olhos e riu.
– Confesso que não tenho disciplina com o horário das minhas refeições, mas estou me adaptando muito bem a sua rotina...
Carmen se encaixa naquela casa tão bem que seria difícil tirar sua imagem dali quando decidisse ir embora. Suspirei triste.
– O que foi? – Perguntou preocupada.
– Não é nada! – Disfarcei sorrindo. Não falava muito sobre o tempo de sua estadia, tinha medo dela querer ir embora o quanto antes.
– Aqui é lindo! – Disse admirando a paisagem a frente.
– Sim... A fazenda é magnífica! Daqui a alguns dias, quando estiver liberada te levo para um passeio.
Carmen apenas sorriu e concordou.
– Baronesa! – Um dos empregados chegou a cavalo. – Precisam da senhora, parece que deu algum problema com a colheita da parte sul da fazenda.
Bufei. Se pudesse me afastar de todos os problemas, só para ficar com Carmen o dia todo, faria isso sem pensar muito.
– Me desculpe, mas preciso ir! – Ela murchou um pouco.
Limpou o canto da boca com o guardanapo.
– Entendo... – Falou um pouco desanimada.
– Não se preocupe, eu logo estou de volta! – Ela concordou sorrindo.
O mesmo homem que chegou me chamando, voltou com meu cavalo.
– Marta! – Chamei a mulher na varanda.
– Baronesa! – disse se aproximando da mesa.
– Por favor, peço para que atenda todos os pedidos de Madame Carmen! – Ela sorriu concordando.
– Não precisa disso, Isabel! – Falou sem graça. Ignorei Carmen e continuei a falar.
– Pergunte a senhorita tudo que ela gosta de comer e atenda seu pedido para almoço, volto em seguida!
Me aproximei de Carmen e levantei seu rosto delicadamente, deixando um beijo em sua bochecha. Ela sorriu lindamente.
– Bom trabalho, Baronesa! Ficarei ansiosa esperando sua volta! – Era dessa motivação que precisava.
Subi em meu cavalo e sorri uma última vez para ela antes de partir. Os dias foram passando agradavelmente. Sua barriga crescia, era nítido, mas ela não falava muito sobre isso e eu respeitei sua vontade. Decidi que era hora de levá-la para conhecer a fazenda. Selei meu cavalo e com cuidado coloquei ela a minha frente.
Passamos boa parte da manhã, visitando os pontos mais bonitos das duas fazendas.
– Está cansada? – Perguntei quando vi ela se escorar aos poucos no meu ombro.
– Un poquito. – disse sorrindo e com os olhos fechados.
– Vamos parar um pouco.
Avistei uma árvore, havia boa sombra e parei o cavalo. Desci e em seguida a ajudei a descer. Carmen segurou em meu pescoço na descida e não soltou. Nossas bocas ficaram tão próximas...
– Carmen... – Disse sentindo a mulher roçar seu nariz no meu.
– ¡Cállate, Isabel! – Sussurou encostando seus lábios delicadamente nos meus.
Era nosso primeiro beijo desde que ela chegou a fazenda e como estava com saudades da sua boca. Nosso beijo foi calmo e cheio de saudades. Aos poucos ela foi se afastou e sorrimos.
– Estava com saudades... – Disse encostando meus lábios em sua testa.
Carmen apenas suspirou e deitou no meu ombro. Sei que para ela era difícil, ainda mais depois de sua decisão em me afastar. Puxei ela pela mão devagar e sentei embaixo da árvore, Carmen sentou no meio das minhas pernas, escorando seu corpo no meu.
Ela puxou meus braços me fazendo abraçá-la. Ficamos alguns minutos ali sem nada falar, apenas aproveitando o momento. Levei minhas mãos até sua barriga e ela imediatamente ficou tensa.
– Me desculpe... – Disse retirando a mão, mas ela puxou de novo e colocou sobre sua barriga. – Está crescendo rápido... – Disse fazendo carinho.
Ela suspirou.
– Sim...
– Quer falar sobre? – Ela ficou calada por um tempo.
– Não sei... Para mim ainda é difícil lidar com isso... Não tenho raiva, só não sei o que fazer! – Falou tensa.
Achei melhor não continuar a conversa.
– Quando quiser conversar estarei aqui! – Ela se aninhou em meus braços e em seguida se virou me beijando.
– Gracias por tudo... Mi amor! – Disse me fazendo sorrir.
Por mim o tempo podia parar naquele momento e eu desejei mais do que nunca que aquela criança fosse meu filho e Carmen enfim minha mulher.
Fim do capítulo
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