Ice Quinn por Carol Barra
Capitulo 45 - O gelo
Sophie já tinha voltado de comprar seu vestido e assim que viu a namorada e o pai chegarem, correu até eles preocupada. Quinn chorava e seu rosto ainda tinha um pouco de sangue.
– O que aconteceu? – perguntou nervosa enquanto a abraçava.
– Tivemos um incidente com a mãe dela – ele falou sem querer dar muitos detalhes – Eu vou pegar gelo e o kit de primeiros socorros para fazermos um curativo. Leva ela para o sofá.
Em poucos segundos ele se colocou em frente a Quinn, que com o gelo na barriga, tentava controlar o choro para que Brian pudesse fazer o curativo.
– Não seria melhor levar ela ao hospital? – perguntou Sophie preocupada com o corte no rosto e as contusões em sua barriga.
– Não podemos – Brian falou – Se levarmos ela para o hospital eles vão ser obrigados a chamar o serviço social.
– Que chamem! Aquela mulher não pode continuar machucando ela assim! – falou com ódio.
– Ela não vai mais – falou Quinn triste – Ela me expulsou de casa.
Sophie ficou em silêncio sem saber o que dizer. Assim que Brian terminou o curativo, Quinn colocou gelo também na altura do olho.
Brian deixou as duas sozinhas oferecendo um pouco de privacidade e Quinn ainda tentava se controlar para segurar as lágrimas.
– Eu sinto muito – falou Sophie sem saber o que poderia fazer para consolar a namorada naquele momento.
Quinn ficou em silêncio. Ela não queria falar nada. Não fazia ideia do que faria a seguir. Ela havia sido expulsa de casa com nada além da roupa do corpo. Por sorte tinha algumas mudas na casa da namorada, mas fora isso não tinha nada! Seu carro ficará lá, seus livros, seus sapatos, suas roupas, suas lembranças... Será que a mãe ainda mudaria de ideia? Isso seria muito improvável. E mesmo que mudasse, ela realmente voltaria? Uma possível volta para casa teria muitas condições que ela não estava disposta a pagar. E agora que estava livre para parar de fingir, jamais conseguiria voltar atrás. E além do mais, aquela podia ser a sua casa, mas nunca fora o seu lar. Ela nunca conheceu um lar de verdade e aquilo não era novidade. A única diferença é que naquele momento não apenas ela não tinha um lar como não tinha nem uma casa. Nenhuma âncora naquele mundo.
As duas ficaram em silêncio por vários minutos que pareciam infinitos. Sophie ajudava a segurar o gelo no rosto da namorada, enquanto ela segurava o outro em sua própria barriga. Até que Quinn não aguentou mais aquele silêncio, aquela realidade e aquele gelo. Ela não queria mais gelo em sua vida.
– Eu preciso tomar um banho – anunciou e subiu sem esperar.
Sophie guardou as bolsas de gelo de volta no congelador e ficou alguns minutos sem saber o que fazer. Tentando dar algum espaço para Quinn, ficou na sala em pé, olhando para o nada e pensando no que aconteceria dali para frente.
– Ela está melhor? – Brian perguntou retornando à sala.
– Não sei – falou perdida – Ela foi tomar banho – e então sentando-se no sofá novamente pediu que o pai lhe contasse com mais detalhes o que havia acontecido.
Conforme ele falava, Sophie sentia o ódio crescer juntamente com um sentimento de impotência. Ela odiava não poder tirar toda aquela dor da namorada.
– E agora? – perguntou.
– Não se preocupe com isso! Vamos resolver tudo! Mas hoje você precisa focar na Quinn. Vai ficar com ela!
– Eu acho que ela quer espaço.
– Eu sei, mas é melhor que ela não fique sozinha. Ela precisa saber que não está sozinha. Vai ficar com ela, mesmo que ela não queira falar nada...
– Você está certo – ela falou subindo até o quarto.
Chegando lá viu que a namorada já havia tomado banho e vestido um de seus pijamas, como de costume quando dormia lá. Ela chorava bem baixinho debaixo das cobertas. Sophie não disse nada. Apenas trocou de roupa e deitou-se ao seu lado. Quinn a abraçou como se sua vida dependesse disso e Sophie sentiu as lágrimas lhe molharem o pescoço. Ficaram em silêncio por um tempo incontável, até que Sophie sentiu as lágrimas secarem e a respiração de Quinn mudar, indicando que havia dormido.
– Está tudo bem? Você nunca liga – Helen perguntou ao atender Brian.
– Na verdade não – ele disse e começou a narrar os acontecimentos do dia.
– Tadinha dessa menina – Helen falou com sincera compaixão.
– E agora eu não sei o que fazer – ele disse perdido.
– Você sabe o que tem que fazer! – ela falou firme – Você precisa ligar para o serviço social. Ela é menor de idade.
– Eu não sei... – ele falou incerto.
– Brian, isso pode acarretar sérios problemas legais para você! Se vocês ainda morassem em uma cidade grande isso poderia passar despercebido, mas em uma cidade pequena todo mundo fala! Por quanto tempo acha que vão conseguir esconder isso? – falou preocupada.
– Eu sei tudo isso, mas ela vai fazer dezoito anos em menos de seis meses! Não é justo ela precisar entrar para o sistema e ter a vida virada de cabeça para baixo estando tão perto da maioridade! Tudo que ela menos precisa nesse momento é perder o pouco controle que tem sobre a própria vida.
Helen ficou em silêncio por alguns segundos e Brian sentiu sua longa respiração do outro lado da linha.
– Por que você me ligou para perguntar o que fazer se você já se decidiu? – aquela pergunta o deixou sem chão por alguns segundos.
“Força do hábito”, pensou.
– Acho que não estou acostumado a tomar decisões importantes sem você – ele falou sinceramente.
– Mas você precisa! Nós sabemos disso! – ela falou um pouco sem paciência, mas depois se recompôs – Você sabe melhor do que ninguém o que essa menina está passando, mas eu me preocupo que por conta disso você não consiga tomar uma decisão objetiva.
– E desde quando eu sou objetivo? – brincou e a ouviu rir do outro lado.
– Talvez tenha outra solução – Helen disse tendo uma ideia repentina – Você pode fazer com que ela seja emancipada.
– Para que deixem isso acontecer ela precisa estar trabalhando e mostrando que consegue se manter sozinha. É muito difícil e leva tempo. Até lá ela precisaria ficar em um lar adotivo e acabaria que faria dezoito até mais rápido.
– Ela não precisa de nada disso para se emancipar se tiver a autorização da mãe – lembrou Helen.
– E até parece que aquela mulher faria alguma coisa para ajudar a filha – falou irritado.
– Ela só precisa de um pouco de incentivo! – Helen falou como se fosse óbvio – Essa mulher é uma oportunista! Oferece uma boa quantia de dinheiro para ela assinar e pronto!
Claro que Helen iria sugerir isso. Essa era a forma como sua família resolvia as coisas.
– Não é uma má ideia – Brian falou pensativo – Funcionou para o meu pai... – lembrou triste.
– E ela é uma caipira do interior, nem vai precisar ser muito dinheiro. Aposto que mal sabe negociar – falou esnobe – E além do mais, fazendo isso ela se livra de problemas legais por ter expulsado a filha. É uma vitória para os dois lados!
– Está vendo? É por isso que eu liguei! Sabia que você ia ter uma boa ideia! – ele falou.
– Eu sempre tenho ideias maravilhosas! – ela falou em tom de brincadeira.
– Muito obrigado – ele falou sincero.
– Como eu disse antes: eu estou aqui sempre que precisar – falou também sincera.
Os dois ainda ficaram alguns segundos em um silêncio significativo antes de desligarem.
Dia seguinte, Quinn não quis ir à escola. Ela ainda estava se sentindo muito sensível e como era a última semana de aula do semestre e já havia passado em todas as matérias com nada menor que A, permitiu-se ficar na casa da namorada.
Sophie tentou faltar a escola também, mas Brian foi irredutível. De qualquer forma, Quinn não se preocupou com aquilo, queria mesmo ficar um pouco sozinha com seus pensamentos. Dormiu até tarde, depois ficou repassando em sua cabeça os acontecimentos do dia anterior. Quando não os aguentou mais, ligou a televisão e deixou sua mente se ocupar com outras realidades.
Como a temporada de futebol tinha acabado, Brian tinha bem menos coisa para fazer na escola e pôde voltar cedo para casa. Sabia que Quinn não tinha comido nada então pediu uma pizza e enquanto esperava chegar, sentou-se ao seu lado.
– Como você está? – ele perguntou.
– Eu não sei – ela falou sinceramente – Um pouco perdida. Não sei o que fazer, para onde ir, o que pensar...
– Você sabe que você é bem-vinda para ficar nessa casa, certo? – ele falou.
– Obrigada, mas eu não posso simplesmente morar aqui – ela falou.
– Claro que pode! Você realmente acha que eu ia te deixar na rua? O que esperou que fosse acontecer? Qual o seu plano?
– Eu não sei – ela falou confusa – Conseguir um emprego... Eu não pensei em detalhes.
– Quinn, você é adolescente! Seu único trabalho no momento deve ser estudar!
Ela ficou alguns segundos em silêncio.
– Você pode ligar para o serviço social. Eu não vou ficar chateada. Preciso lidar com as consequências da minha decisão. E ficar aqui pode te prejudicar...
– Ei – ele interrompeu – Não é seu trabalho se preocupar comigo, ok? Vamos resolver tudo!
Ela sentiu lágrimas encherem-lhe os olhos.
– Eu não sei o que fazer – falou sem conseguir controlar mais o choro.
Ele a abraçou de forma paternal e deixou que ela chorasse tudo que tinha para chorar.
– Você não está sozinha, Quinn. Estamos do seu lado para o der e vier – ele reafirmou.
Ela não tinha mais forças para lutar contra nada daquilo. Intimamente achava que deveria dizer que não podia morar ali, que não podia incomodar, mas para onde iria? Levaria aquele mesmo problema para a mãe do Kevin? Entraria em contato com seu pai que nada queria com ela há anos? Trabalharia e se manteria sozinha? Teria que abandonar a escola? E a faculdade? Diria adeus a todos os seus sonhos? Não, definitivamente não. Ela não queria adicionar aqueles problemas à sua lista. Se Brian estava oferecendo-lhe uma casa, por que não aceitar? Ela precisava de um porto seguro e até aquele momento, nada em sua vida lhe fazia sentir-se mais segura do que aquele abraço paternal. Ele já era mais um pai para ela do que seu próprio pai sempre fora. Ela não tinha forças nem vontade para dizer não ao que ele oferecia. “Não é minha culpa”, repetia para si mesma. “Não é minha culpa que a minha mãe tenha me expulsado. Então por que eu teria que lidar com todas as consequências desagradáveis?”. Ela não merecia nada daquilo que a mãe lhe infringiu por tantos anos. Então naquele momento, ela sentiu que poderia aceitar a sorte que a vida lhe dera e morar ali, onde sentia-se segura.
Depois que ela estava mais calma a pizza chegou e os dois comeram em silêncio. Cada um perdido em seu próprio pensamento.
Quando Sophie voltou da escola, trouxe consigo Kevin como uma surpresa para animar a namorada. Quinn sentiu-se extremamente aliviada ao ver o melhor amigo naquele momento. Enquanto Sophie foi tomar banho, os dois ficaram no jardim dos fundos conversando e Quinn narrou detalhadamente tudo que havia acontecido, pela primeira vez sem chorar. Parecia que suas lágrimas haviam secado e ela estava sentindo uma espécie de dormência naquele momento.
– Como você está se sentindo com tudo isso? – ele perguntou abraçando-a carinhosamente.
Quinn descansou a cabeça em seus ombros e ficou ali aproveitando aquele carinho.
– Acho que a ficha ainda não caiu completamente – ela falou com o olhar perdido em uma nuvem escura do céu – Mas eu sinto um misto de alívio, dor, culpa e liberdade...
– Eu sei que ela é sua mãe e isso machuca, mas você vai ficar bem melhor sem aquela bruxa na sua vida! – ele falou com notável ódio.
– Racionalmente eu sei disso, mas ela era tudo que eu tinha. Era minha única família – justificou.
– Eu sou sua família e eu nunca vou te deixar sozinha! Nunca! – ele falou apertando ainda mais o abraço.
– Eu não sei o que seria da minha vida sem você! – falou agradecida.
– E você sabe que pode ficar lá em casa, não sabe? – ele falou sincero – A gente conta tudo para minha mãe e sei que ela vai te receber.
– Obrigada, Kevin, mas eu não quero ter que colocar sua mãe nessa posição. Ela teria que ligar para o serviço social ou ficaria em perigo e além do mais, Brian já ofereceu para eu ficar aqui...
– Você não precisa se preocupar com a minha mãe! Você sabe que ela te ama! E nossa casa é sua casa também! Sempre foi! – argumentou.
– Isso significa muito! – ela sorriu – Mas o pai da Sophie entende o que eu estou passando – então falando baixinho completou – Você não pode contar para ninguém, é um super segredo, mas o pai dele também era abusivo e alcóolatra igual a minha mãe.
– Caramba! – falou chocado – Que fofoca!
– Pois é... eu me sinto muito compreendida com ele, entende?
– Eu entendo! Mas saiba que você nunca vai ficar sem casa para morar porque nós te amamos e você não está sozinha!
– Obrigada! Você é e sempre será a pessoa mais importante da minha vida! – ela falou.
– Você fala isso agora! Depois que casar com a Sophie e tiver vários filhos vai ser diferente – falou fazendo-a rir.
– Seu bobo!
– Se eu não for padrinho desse casamento eu mato vocês! – ele falou.
– Claro que você vai ser! Vai rolar até briga entre a gente para decidir se vai ser meu padrinho ou dela. Mas todos sabemos que você vai me escolher! – brincou.
– Com certeza! – ele concordou.
Os dois passaram a conversar coisas mais animadas e de repente Quinn lembrou-se que não havia comprado o vestido para o Winter Formal.
– Não se preocupe com isso, amiga. Eu vou resolver isso para você – ele prometeu.
Kevin ficou lá até tarde, voltando para casa apenas tarde da noite quando Quinn havia ido dormir. Ter seu melhor amigo naquele dia havia sido essencial para que ela se sentisse menos pior.
Fim do capítulo
A situação não é nada fácil para a Quinn, mas ela tem sorte de ter uma grande rede de apoio!
Comentar este capítulo:
Anny Grazielly
Em: 12/08/2020
Cara... que momento para Quinn... mas que bom que ela tem amigos de verdade...
Resposta do autor:
Ter amigos é tudo na vida!!!
sonhadora
Em: 24/07/2020
O saldo é positivo! Claro que nada vai apagar a dor de escutar aquelas palavras horríveis que a mãe pronunciou...Mas ela encontrou calor ali na casa da Sophie!! E o mais importante ela não está sozinha!!!
Beijos!!!
Resposta do autor:
A melhor parte é não estar sozinha! Uma rede de apoio é fundamental!
bjs
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lay colombo
Em: 24/07/2020
Fico muito feliz dela ter tantas pessoas boas cuidando dela, espero q de certo o lance da emancipação, Quin não merece ter q lidar com toda essa merda por causa de uma coisa q a Eleanor fez.
Resposta do autor:
Sim! Ela mrerece! Agora é deixar o Brian resolver e cuidar dela =)
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