Capítulo 1 -  Família

Se perguntarem pra mim, como consegui entrar na roubada que é minha vida? a resposta mais sincera que posso dar é: Eu não sei! Amor? Lealdade? Burrice? Tem anos que tento e não consigo decifrar, como cheguei a esse ponto.

Dou uma última conferida no visual frente ao espelho, amo o estilo despojado:

_ Perfeito, agora vamos lá, enfrentar a vida de frente.

Saí do quarto e logo dou de cara com minha sobrinha, Beatriz passa por mim apressada, indo em direção as escadas, debochada diz:

_ Acho melhor você se apressar tia, hoje ela está uma fera!

_ E quando não está?  Estampo um sorriso travesso, você sabe que adoro provocar sua mãe, vai dizer que ela não fica o máximo irritada? Minha sobrinha, Beatriz e eu, ainda estamos rindo em cumplicidade, quando fomos surpreendidas por Helena lá embaixo: 

_ Você gosta mesmo é de desafiar a morte Toni, ela diz, apertando os olhos como uma fera pronta a atacar sua presa, andem, venham logo tomar café, vamos chegar atrasadas na empresa no ritmo de vocês, ainda descendo a escada ela fica me encarando, desafiadora diz:

 _ Depois a gente dona Antonella, eu e você, vamos conversar sobre essa saída das duas ontem, lembro muito bem, fui extremamente clara sobre o horário da Bia estar em casa.

Desço a escada lentamente, encarando corajosamente o seu olhar, então fico frente a frente com a fera, olho no olho, erguo minha sobrancelha e provoco: 

_ Você está irritada assim exatamente, por quê?

_ Eu ter atrasado a entrega do pacote em uma hora? aponto pra minha sobrinha indicando ser ela o pacote, Beatriz a essa altura está nos fitando acompanhando pra ver quem vai sair vencedora em mais um embate que costumamos travar, quando se trata das minhas saídas e namoradas. 

_ Ou será que por algum outro motivo que eu desconheça? aperto ainda mais o olhar em provocação. 

_ Claro que foi pelo atraso!  Por qual outro motivo seria? ela devolve a pergunta e esquiva da resposta com maestria como sempre faz.

A gente ficou em enfrentamento com olhares afiados, por alguns segundos, enquanto Bia segurava o riso entre os lábios presos, minha sobrinha sabia perfeitamento o porque da irritabilidade de Helena.

Sem deixar de encarar, ela aproxima-se mais do meu corpo, bem mais perto que devia, bem mais perto que eu poderia aguentar, ela se mantém firme em sua postura desafiadora, já eu? eu não desisti, como boa lutadora mantive o olhar a altura sem piscar, segurei a mesma postura, mas confesso que ter Helena próxima assim, encarando com aqueles olhos cor de esmeralda, costuma deixar todo o meu corpo fraco e sem ação, fiquei sem respirar por alguns segundos e foi um alívio quando ela relaxou, suspirou e decretou:

_ Não abuse Tone, sabe que nessa conversa, você perde. Deu meia volta e saiu sentindo-se vitoriosa, já perto da cozinha abriu um sorriso sacana e disse: 

_ Você sabe que eu não curto sua namoradinha!

Ela deu as costas e partiu rumo a cozinha, quando fora de sua visão finalmente consegui soltar o ar que mantinha preso e relaxei,  mas  não deixei de resmungar correndo atrás dela: 

_ E que namorada minha até hoje você já gostou? 

_ Nenhuma! Ela foi direta como um soco, não tenho culpa por seu gosto pra mulheres ser é terrível.

Nessa altura Bia passa por mim e vendo meu aborrecimento, me abraça, dá um sorriso malicioso e diz baixinho ao pé do ouvido:

_ Fica triste não tia, saiba que eu curto de montão sua namorada, como curto!

_ Toma tento Beatriz! Digo estapeando a cabeça da criatura.

Na cozinha, todos já estavam em seus lugares.

Essa é um pedaço da minha família, que apresento agora a vocês, sentada ao lado direito está Helena, 39 anos, é minha melhor amiga, paixonite de adolescente, quando eu ainda nem havia me descoberto lésbica, somos amigas desde sempre, nos conhecemos no colegial, acabamos fazendo faculdades juntas, não exatamente a mesma graduação, fiz computação gráfica especializei como Designer de jogos, ela adminstração, hoje é produtora da empresa que somos sócias, a TomGamer, a mesma onde minha sobrinha é estagiária como tester,  Beatriz que está sentada ao seu lado direito, tem 16 anos, extremamente inteligente, sagaz, linda, bom eu sou tia coruja mesmo, se deixar vou elencar mais de mil adjetivos que só enaltecem a criatura, ao seu lado está meu gato e sobrinho Benjamim, meu tesouro, minha vida, filho do meu único irmão Tom, que nos deixou por conta de uma acidente de carro,  Beatriz tinha 06 e Ben 08 anos na época, hoje ele está com 18, sou a melhor tia de todas as tias que os dois tem, como diz Bia, tudo bem que sou a única tia deles, isso porque Helena não tem irmãos, e por fim nem o pela-saco do atual marido de Helena, Marcos, 49 anos, contador, filho único, chato, irritante, arrogante e preconceituoso, o senhor da verdade, já perceberam que não suporto o cidadão, certo? então não vou dar mais ibope pra ele do que essa junção de os melhores adjetivos que consegui separar pra descrevê-lo, e por fim, eu,  39 anos, designer de jogos, gata claro, e por que na minha vida vivo com eles? Voltamos neste ponto a pergunta que fiz no início deste capítulo, cuja resposta é: EU JURO QUE NÃO SEI, okay, eu sei, meus sobrinhos e por uma promessa que fiz a meu irmão, hoje, moro na mesma casa com todos eles, mas isso eu conto em outro momento.

_ Bom dia, meu gato! Passo pelo meu sobrinho que sorri, mas reclama quando bagunço seu cabelo. 

_Mãe, você me espera, vou ter que pentear o cabelo de novo.

Helena balança a cabeça negativamente, enquanto fala, claro meu lindo! Termina seu café e vai lá, enquanto eu fico aqui e explico de novo para sua implicante tia, que ela sempre nos atrasa quando faz isso quando desarruma seu cabelo. Ele sorri, e diz em réplica sorrindo: 

_ Ela sempre faz isso!  Amo o sorriso de Ben e faço tudo pra vê-lo sempre em seu rosto.

_ Aprenda Leninha, seguro sua mão sobre a mesa, a encaro rindo e afirmo:

_Ele gosta! faz parte da nossa rotina, e para meu sobrinho: 

_ Certo moleque? Toca aqui? Estendo a mão e quando ele passa por mim,  sorri, bate sua mão com força na minha e vai saindo. 

_ Você consegue ser mais criança que ele Antonella, assim você não ajuda no seu desenvolvimento, Marcos desdenha.

Benjamim, para antes de sair da cozinha, volta e com o sembrante sério:

_ Não sou criança, vou fazer 18 anos, sou um adulto, a tia Tone vai me ensinar a dirigir e vou ter carteira de motorista.

Pronto, se a coisa já estava feia pro meu lado, por ter atrasado a chegada em casa após a festa que fui com minha namorada e sobrinha, agora lascou, com certeza hoje vai ser um dia tenso pra ca... pra nem santo conseguir aguentar.

_ Claro que não é criança, filho! Helena fala, enquanto fecha a condenando Marcos.

_Vai lá querido pentear novamente seu cabelo. 

Ben retorna até mim e diz:

_ Preciso saber quando vão começar as aulas, tenho que anotar na minha agenda. 

_Logo, muito breve gato, respondo dando um beijo em seu rosto.

_ Certo, ele limpa o rosto com cara de nojo e dessa vez  sai por completo da cozinha.

_ Você é uma irresponsável Antonella, como já se viu prometer isso a um menino que não tem capacidade nem para cuidar dele sozinho? Novamente Marcos solta suas frases, que e u julgo poderiam muito bem não serem ditas.

_ ih! Pronto, agora fechou geral, Beatriz fala enquanto leva seu suco a boca esperando a terceira grande guerra começar.

Olho de Marcos para Helena esperando e cobrando dela uma atitude, como ela não reage, confronto:

_ Não vai dizer nada pro troglodita do seu marido? 

_ Dessa vez não Antonella, já disse mil vezes a você pra conversar sempre comigo antes de decidir algo importante como isso, sabe que agora ele vai cobrar essas aulas, sabe que é uma decisão que precisamos tomar em conjunto, estudadas, analisadas pro bem do Ben.

_ Ele não é, e não tem que ser tratado como um bebê Lena, ele é capaz de muita coisa.

_ Dirigir Antonella? Dessa vez você exagerou.

Olhei pra cara de satisfação do Marcos, e aquilo me irritou, joguei o guardanapo na mesa, afastei meu café, levantei e decretei, melhor ir logo para empresa onde convivo com pessoas inteligentes e compreensivas.

Claro que Marcos não poderia deixar de dar uma última palavra, bem quando estou perto de sair, fala secamente:

_ Naquela empresa? A que ganha dinheiro criando jogos, para pessoas sem cérebro, perdendo tempo precioso, vegetando em frente de games que chamam de diversão?

Parei na hora, respirei fundo, dei meia volta, com fúria nos olhos,não pude deixar passar: 

_ Sim, exatamente essa! Aquela, empresa que paga no fim do mês paga seu salário hiper-valorizado e que dá lucros exobirtantes para sua esposa a qual sustenta essa casa, essa aí, aponto pra Helena, a sua frente, que de vez em quando perde noção das coisas e só para me irritar, prefere ficar ao seu lado nessas suas afirmações indigestas, disse olhando diretamente para Helena. 

_ Chega vocês dois! Era Helena novamente intervindo no que seria outra grande discussão entre o ameba do seu marido e eu, pelo amor que tenham por mim, os dois, será que não poderiam ter um diasem ficar trocando alfinetadas?

Nesse momento Ben chega com o cabelo penteado de lado e pergunta: _Já vamos? 

_ Sim querido, vem hoje a tia te deixa na escola, e, Helena? respondendo a sua pergunta, a resposta por mim é sim, mas por amor a essa coisa linda da tia aqui, tá? Não a você, direciono toda minha frustração e aborrecimento com um olhar a ela.

_ Hoje vou no meu carro, vou deixar o Ben na escola e falo com você na empresa, para termos essa conversa, sobre o assunto que você sabe qual é.

Beatriz passa por mim, beija meu rosto e solta mais uma das suas bem baixinho: ham ham, sei bem que não é por ela, continua dizendo isso, quem sabe um dia você mesma acredita tia, e saiu correndo, rindo e perguntando, vamos família? Já que vai deixar o ben na escola vou aproveitar a carona, que pelo visto o dia hoje mais tarde na empresa promete!

É isso, como consegui entrar na roubada que é minha vida? 

_Eu não sei! Amor? Lealdade? Burrice? você vai precisar acompanhar minha história para ter essa resposta ou me ajudar encontrá-la.

Fim do capítulo