Capitulo 1 "Mas afinal, o que escrever?"
Eu estava mais uma noite em um bar qualquer, o cheiro de cigarro se misturava ao do whisky que descia queimando o que estava morto dentro de mim.
Nossa música começou a tocar e respirei fundo, mas foi inevitável, lembrei das noites dançando ao som da nossa canção favorita e de ti sussurrando ao meu ouvido coisas que hoje não posso lembrar;
Sacudo a cabeça e por um instante saio do meu transe, respiro fundo e olho ao redor, ainda estou aqui.
Olhei no relógio, a madrugada já me alcança e a promessa que me fiz na noite passada de não dormir bêbada já foi quebrada. Olho para mim mesma em um pedaço de espelho que encontro atrás do barman, que observa enquanto eu me encaro no espelho.
Que idiota!
Falo para mim mesma, perdida em uma confusão de solidão e tristeza, misturadas a uma ilusão de liberdade na qual, pra falar a verdade, eu não tenho, pois estou presa em mim mesma.
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Que pensamento idiota, até falando sozinha eu consigo não ser empática comigo.
Finalmente tomei o último gole daquela bebida quente e me enchi de coragem para sair dali.
Fui até o caixa e paguei a conta, coloquei as mãos no bolso e caminhei vagarosamente até em casa, a noite era quente e tudo me fazia lembrar da gente.
O calor daquela noite me lembrava o do teu corpo, mas as minhas mãos, quase sempre geladas, lembravam meu coração.
Enquanto eu caminhava o curto caminho do bar para o meu apartamento, minha mente continuava perdida, esquecida de toda a realidade e vivendo num passado que não será mais nosso.
Continuei caminhando e quando dei por mim estava na portaria do condomínio de casa, me identifiquei com o porteiro e me voltei com passos lentos para o meu apartamento.
Entrei e fui direto para o quarto, tirei a roupa a jogando na cadeira e me atirei na cama, de bruços.
Fechei os olhos e as lembranças tomaram novamente conta da minha mente... Eu literalmente contei carneiros até dormir, apagar... o corpo cansado sucumbiu ao sono.
*
Aqui estou eu tentando começar o meu livro, o café está quase acabando e a xícara quase vazia é minha companhia.
Sorrio ao ver os casais de adolescente passeando pelo centro da cidade, o amor nessa idade é por vezes tão forte, porém efêmero.
O dia não foi tão produtivo pra mim, não sai da primeira página.
Respirei fundo.
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Mas afinal sobre o que escrever?
Me fazia essa pergunta em tom firme, as pessoas me olhavam esquisito e eu apenas arqueava a sombrancelha, afinal não posso cobrar a mim mesma? Acho que posso não é? Posso e está decidido!
Eu continuo nessa indecisão, tenho uma pesquisa imensa sobre os deuses gregos, mas também queria escrever um romance... quando digo que não sai dá primeira página, na verdade me refiro ao assunto que eu ainda nem faço idéia do que será.
Suspiro e tento achar a calma e a resposta dentro de mim enquanto olho aquela folha em branco, subo meu olhar novamente para a rua e vejo aquela mulher linda, com os cabelos na altura do ombro, loiros, com uma calça jeans e uma camiseta simples branca, com a cabeça baixa e nenhuma pressa em seus passos, naquela noite ela fora o que mais me chamou a atenção, a olhei até perder ela de vista, sacudi a cabeça retomando a minha atenção ao meu futuro livro, ajeitei os óculos no rosto e tomei um gole de café.
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Acabou de novo?
Olho no relógio e me espanto com o horário, já passa da 1hr e eu ainda estou bebendo café, hoje a noite vai ser longa.
Peço a conta e começo a recolher meus pertences, pago a conta e penso no quanto eu gastei com café, dou uma risada baixa com meus pensamentos e vou indo em direção ao estacionamento, entrei no carro e coloquei uma música baixa enquanto dirijo e rezo para que eu possa decidir sobre o que escrever.
*
Acordei, com o coração descompassado, peguei o celular e olhei as horas, respirei fundo e me acalmei.
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São só 3:20, graças a Deus ainda não me atrasei.
Falei sozinha, meus atrasos já não seriam mais tolerados e só eu sei o quanto a minha chefe tá no meu pé.
Revirei os olhos, respirei fundo novamente.
Ser jornalista tá começando a se tornar chato, ser cobrada demais está me corroendo por dentro, continuei pensando...
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Daniela, volte a contar carneiros...
Falei pra mim mesma, o cansaço tomou conta da minha mente e consegui apagar.
Parece que nem fechei os olhos direito e pude ouvir o despertador tocando.
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Que vontade de jogar esse celular na parede.
Bufei e levantei, preguiçosamente fui até o banheiro tomar banho, hoje seria um dia longo, espero que ao menos interessante, pensei enquanto sentia a água correr os meus cabelos, espantando o cheiro de álcool da noite seguinte.
Tentava não pensar em ti, mas as minhas mãos percorrendo pelo meu corpo eram quase como sentir as tuas mãos ali... Confesso que o pensamento dessa vez foi bem canalha, lembrei da última vez que tomamos banho juntas e foi inevitável surgir um sorriso safado no meu rosto.
Sai do banho e me vesti com uma roupa confortável, como já era costume, uma camiseta preta e uma calça jeans, peguei uma camisa xadrez, minha mochila, a chave da moto e o capacete.
-
Tô atrasada, vou ter de tomar café no jornal pra variar.
Falei pra mim mesma enquanto descia com certa pressa as escadas até a garagem.
*
Estacionei o carro em frente de casa com uma idéia já fixa em minha mente, como eu poderia escrever sobre amor se eu só tenho a teoria? Fingir amor não é o mesmo que amar, pensei.
Eu nunca senti o coração palpitar ou borboletas no estômago, quando falo de amor não é uma experiência, mas é sobre o que me contam e além do mais minha pesquisa está pronta para ser escrita e virar outro sucesso.
No ano passado eu tive um livro sobre a minha viagem de auto-descoberta na qual estive na Índia e tudo mais... Pura baboseira, na verdade não sei nem o que eu estou fazendo da minha vida, mas tudo bem, digamos que colou né?
Ri baixinho, perdida em meus pensamentos enquanto eu entrava naquele apartamento grande, escutava o vazio dos meus passos naquele chão frio, me senti sozinha, mas só por um instante, logo coloquei Ana Carolina para tocar em um som ambiente e me atirei no sofá, a voz da Ana foi ficando mais longe e eu apaguei ali mesmo.
Fim do capítulo
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