Capítulo único
O vento soprava frio contra a pele de seu rosto, pouco importava se seus cabelos estariam sendo bagunçados naquela noite de segunda-feira, com as mãos no bolso da sua surrada jaqueta jeans ela andava olhando para o chão chutando vez ou outra as pedrinhas que apareciam em seu caminho. Passou em frente a um barzinho que tinha bem cara de boteco, observou que o movimento naquela noite estava fraco e foi isso que a motivou entrar, sentou-se junto ao balcão notou que ao fundo havia uma velha vitrola tocando, o som emitido era de uma velha canção de dor de amor, ouvindo a letra começou a sorrir de forma amargurada de sua própria sorte.
Um senhor não muito simpático talvez o dono do bar, perguntou-lhe se poderia servir algo e contrariando todas as possibilidades, ela dentro de um bar cercada de uma infinidade de bebidas pediu que lhe fosse servido um café. Enquanto esperava resolveu acender um cigarro, esse era mais um velho costume que não conseguia deixar, sabia que lhe fazia mais mal do que bem, essa ação a fez concluir que sempre tivera uma natureza um pouco autodestrutiva. Bastava analisar seus hábitos, dormia pouco e pensava demais, bebia além da conta quando ficava triste, ser triste já era quase uma rotina e quando a ansiedade lhe visitava era no cigarro que buscava arrego.
Mas seu pior costume estava em amar as pessoas que não lhe queriam, se apaixonava pelas mesmas pessoas só que em corpos diferentes, seguiam sempre os mesmos padrões: davam-lhe pouca ou nenhuma atenção, elogiavam seus olhos quando na verdade estavam olhando para seu decote, pagavam-lhe uma bebida na esperança de prova-la de seus lábios minutos depois. Mas o engraçado ou não tão engraçado assim é que ela sempre acabava as transformando em versos, poemas e até mesmo contos.
Havia uma em especial que tinha se tornado um livro, essa era seu costume de fatos antigos que não conseguia esquecer. Olhou para o cigarro preso entre seus dedos e constatou uma semelhança que assim como ele estava presa, era uma refém. Prisioneira de memórias que já deviam ter sido apagadas, apesar do nome Vitória ela havia sido sua real derrota.
Inconstante, selvagem e inconsequente um verdadeiro espirito livre, se sentia tão tola por ter pensado que poderia doma-la, idiota por ter imaginado que poderia ser sua âncora ou até mesmo um porto seguro. O café chegou, tomou a primeira golada sentindo o calor lhe aquecer a garganta e desejou sentir a mesma sensação no coração que desde a partida dela permanecia frio como as noites de inverno. Com uma xícara de café pela metade e três cigarros depois constatou algumas verdades que a partida de Vitória tinha lhe ensinado.
Velhos costumes não podem ser esquecidos, coisas passadas não são facilmente apagadas, enganar a si mesmo é uma tarefa árdua, as poucas palavras dela faziam falta, doía não ter mais seu bom dia seguido de uma conversa boba, há coisas que o tempo não nos faz esquecer porque as lembranças nos impedem de ficarmos 100% sozinhos, e ela descobriu que ser livre lhe assustava porque tudo que mais queria era ser novamente prisioneira dentro de um coração que não lhe cabia mais.
Deu uma última tragada no cigarro entre seus dedos e o deixou no cinzeiro do canto com um pensamento fixo na cabeça. Havia fumado por tempo demais e estava consciente do mal que estava fazendo a si mesma, sabia que prejudicava respirar e muitas outras coisas, como seus dentes que eram a fonte de seu sorriso, Vitória se assemelhava ao cigarro, pois um dia também havia sido seu vício, mas acabou transformou-se em uma lembrança de algo que lhe fazia mal, e com esse pensamento quase lógico disse a si mesma: "Não te trago mais no peito".
Fim do capítulo
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Endless
Em: 14/02/2019
A profundidade que tem o desejo de sobreviver ao passado, principalmente quando ele é nocivo, e imensa. Belas palavras de uma recuperação brindada com um café e a despedida de duas presenças negativas: um vício e um amor tóxico. Parabéns, autora um ay e boa sorte na jornada.
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