Cheguei à casa de minha sócia e melhor amiga Andréia Rocha nem sei como, estava abalada com a guinada que a minha vida estava prestes a ter!

Estacionei o carro em frente residência principal da Fazenda Mandacaru, na qual eu era sócia; fiquei uns cinco minutos parada buscando forças pra descer e começar a dar andamento naquela farsa que eu forçadamente seria protagonista principal... Andréia é o meu porto seguro desde que a conheci na adolescência. Não existe ninguém que eu confie tanto quanto ela e era em quem buscaria auxilio nesta empreitada.

Saltei do carro e me dirigi a porta de entrada da casa que se escancarou num ímpeto. Uma negra de 1,64 de altura, corpo voluptuoso, olhos castanhos escuros e cabelos negros cacheados à altura dos ombros; assim que me vê abre um lindo sorriso e os braços:

- Oi minha coisa fofa! - me abraçou com carinho - como você está? Vem, vamos entrar, quero saber o que aconteceu pra estar com esse rostinho tão lindo triste assim... - pegou na minha mão puxou-me pra dentro da casa.

- Minha vida sofreu um revertério, Déia! - suspirei cansada - Estou sem saber que rumo tomar...

- Vamos conversar em meu quarto - disse ela subindo as escadas em direção ao quarto.

Entramos e Déia me direcionou a sua cama, sentando-se ao meu lado.

- Agora me diz... o que houve? - perguntou - Você estava nervosa ao telefone e eu não compreendi nada amiga! E o Pietro, como está hoje? Eu lamento tanto, meu bem, o que está acontecendo com sua família nestes últimos tempos... E agora esse acidente pra completar! Como você está amiga em meio a mais este turbilhão com o seu gêmeo?

- Ah Déia, é muita pressão em cima de mim! - respondo sentindo meus olhos lacrimejarem - estou com medo de perder o Pietro! E como se não bastasse isso, estou numa situação dificílima!

Narro a ela toda a conversa que tive com meu pai. Só omitindo a parte relacionada a minha mãe. Minha amiga ouviu tudo com atenção.

- Você fingir ser Pietro? - Ela boquiaberta - que é isso, Pietra! eu até que na faculdade fiquei com meninas, mas você não! Como fará esse arranjo funcionar?

- Amiga, eu não quero me casar com uma mulher!! Principalmente com uma que não conheço, que nunca vi. - falei indignada - E o pior: fingir que sou homem! Logo não vê que isso não vai dar certo?!

Suspirei controlando minha indignação enquanto andava circulando pelo quarto nervosa.

- Calma, tudo vai dar certo! Mas, como seu pai e o italiano fizeram para a italianinha concordar com um casamento arranjando?!! - Questionou Andréia revirando os olhos - Porque estamos em pleno século XXI!

- Eu não sei como conseguiram isso e tenho raiva de quem sabe! - bradei, alterando meu tom de voz - Só sei que o meu pai não pensou em mim, nos meus sentimentos, nos meus sonhos, no que eu quero pra minha vida! Que eu posso sair dessa machucada ou machucar alguém!

- Meu amor, você não precisa disso! - Andréia duramente - temos o nosso negócio aqui, que por sinal vai muito bem! Exportamos frutas pra diversos países. Não tem que aceitar essa loucura de seu pai. Ele que trate de consertar a merd* que fez!

- Só tem um detalhe, minha rocha - digo cabisbaixa.

- Que detalhe? - Ela me olhou sem entender.

- Minha mãe - respirei fundo e continuei - meu pai me mostrou uma carta dela, em que fala de suicídio...

Andréia me olhou assustada perguntando:

- Suicídio? Como? - olhos arregalados - Tia Patrícia é uma mulher forte, amorosa, sensata, que ama os filhos. Ela não faria isso.

- Amiga - passei a ponta da língua sobre os lábios - o senhor Geovanni pensa que eu não sei que minha mãe entrou em depressão porque seu digníssimo marido estava tendo um caso com uma cliente da vinícola! E você sabe que, às vezes, a depressão leva ao suicídio. Isso não tem nada a ver com sensatez e amor à família. A pessoa se sente quebrada. Então, diante de tantos problemas que estamos enfrentando não duvido que a minha mãe tenha se sentido assim e optou por escolher este caminho. Portanto, não tenho outra escolha a não ser dançar conforme a música do meu amado pai.

- Filho da Puta! - vociferou, Andréia, indignada

- Olha a boca, mulher! - a repreendi - bom, o fato que agora você vai ter que ajudar nessa.

- Ajudar? Como vou fazer isso? - revirou os olhos, rindo sem humor.

A fitei de olhos cerrados

- Na composição do personagem "Pietro" - respondi suavemente - Preciso me transformar...

- E como seria isso? - Questionou olhando-me séria.

Continuei a andar no quarto enquanto organizava os pensamentos.

- Vamos começar com as roupas, a postura, cabelo e a barba. Posteriormente... - fui interrompida por Andréia

- Oxente!! Barba?! Sério? - me fitou assustada - Como você vai fazer isso?

- Isso, vou pesquisar depois- respondi - Vou procurar também uma fonoaudióloga pra trabalhar a impostação da voz. Tenho que fazer tudo isso em menos de 15 dias; pois é quando estarei viajando pra Itália.

- Estou contigo amiga - diz Andréia levantando e me abraçando apertado - Teremos que viajar pra São Paulo, lá faremos toda essa transformação... Tenho algumas amigas que fazem teatro; alguma nos ajudará na composição do personagem "Pietro"!

Fechei os olhos relaxando alguns minutos nos braços de minha melhor amiga. Depois de um tempo me afastei e a olhei nos olhos.

- Déia, você me conhece muito bem e sabe que não sou e nunca fui uma pessoa vingativa, mas lhe garanto uma coisa... - pausei endurecendo o queixo decidida - o Senhor Giovanni De Santis não vai sair impune dessa! Vou agir pra neutralizar ou minimizar sua influência nos negócios da família e em nossas vidas! Ele não perde por esperar...

- Acho justo... - Andréia apreensiva - Só tem uma coisa que me preocupa...

- O quê? - olhei-a desconfiada.

- Er... - Deia desconcertada - Como "noivo" terá que ter certas intimidades com a italianinha, no mínimo terá que beijá-la. Eu sei que você nunca curtiu meninas... Como irá fazer?

Fiquei sem ar por um momento pensando naquilo, realmente nunca tive desejo de beijar; ficar com outra mulher... Não por preconceito; mas por nunca ter me sentido atraída por nenhuma antes.

- Bem... - mordi o lábio, pensativa enquanto fingia uma tranquilidade imensa ao responder - Tentarei evitar tais intimidades, protelarei esse beijo o máximo que puder. Vou torcer para o Pietro recuperar-se veloz e assumir o seu lugar neste noivado o quanto antes. Não tenho certeza se conseguiria beijar; trocar carícias com uma mulher...além do mais...tenho a impressão que a italianinha se encontra na mesmo situação que eu...casar por "livre e espontânea" pressão.

- Certo... - Andréia me olhou preocupada - Vamos torcer que dê tudo certo!

- Sim... Vai dar! - falei incerta e tentando me tranquilizar com o porvir - Só tenho que ganhar tempo para o Pietro.

Respirei fundo me tranquilizando enquanto pensava:

É só ganhar um pouco de tempo... Eu POSSO fazer isso!!

Fim do capítulo