O dia do SIM!

Pov Enya

O dia nascia. E dentro do meu útero uma semente, um sol também nascia. Eu estava grávida. A inseminação havia dado certo e eu esperava gêmeo, era um casal. Ingrid não tinha conseguido levar a dela adiante. Mas eu não estava entristecida por isso, Enzo ficou no começo, queria um filho seu. O tempo passou e ele foi entendendo que o filho de Edson seria seu filho também. Eu estava linda! Ingrid repetia isso sempre, minha barriga era a mais bonita de todas, eu achava, eles também. Edson me mimava, cuidava de mim com dedicação. Eu cheguei a pensar que Ingrid estivesse com ciúmes.

   — Enya meu amor, por favor, não pense besteiras. Eu sei que Edson não é chegado nessa fruta, portanto eu não tenho motivo para me enciumar. – ela riu e eu também. — Edson me faz sentir alegria, pelo jeito que ele cuida de vocês, - ela acariciou a minha barriga que já contava quatro meses. Eu fazia questão de vestir roupas que insinuassem ainda mais a minha gravidez. Eu tinha sofrido nos dois primeiros meses, vômitos, tonturas, mas agora eu me sentia muito bem e era como se não estivesse grávida. As consultas atestavam que os bebês estavam bem.

   — Eny... – era Edson.

   — Entra Bicha, - eu estava deitada acariciando a barriga enquanto as crianças dançavam dentro dela, — venha cá, sinta como eles estão. – e tomei a mão dele que sorria feito menino que acabava de ganhar doce, sentindo o movimento deles.

   — Meu Deus Eny que emoção, - ele disse e seus olhos estavam marejados quando eu acariciei o rosto dele. Meu melhor amigo, meu irmão na alma, o pai dos meus filhos. E vi no olha dele um misto de alegria e preocupação.

   — O que houve Bicha?

   — Nada demais, emoção. Mas, eu queria lhe falar Eny, eu estou feliz demais, meu Deus, vamos ter dois filhos lindos, porque sei que elas irão parecer com você...

   — Ahhh e com você também. Você é lindo! Mas fale...

   — Você acha que eles vão entender? Que somos os pais deles, mas que vivemos ambos com companheiros do mesmo sex*? Será que vão nos perdoar um dia?...

   — Eiii nos perdoar por quê? Eles serão amados por dois casais de pais, não vejo onde eles tenham que nos perdoar, Bicha, pare com isso. Desde cedo nossos filhos vão aprender o valor do respeito à diversidade.

   — Temo que eles tenham vergonha... de nós... do nosso jeito de viver. Eny se isso acontecer, se eles desejarem ficar com você e não comigo...

   — Edson! Pare com isso, Bicha, eles vão amar você, porque você é um ser maravilhoso! Não fique queimando sua massa cinzenta com besteiras. Venha cá, - e peguei a mão dele de novo, os bebês mexiam conforme ele ia acariciando minha barriga.

   — Eny eu quero resolver com você algumas coisas de ordem prática, por exemplo, eu acho que será melhor para os bebês não se separarem, como havíamos combinado no começo. Então... você pode ficar com eles no primeiro período, até eles estarem maiores, depois podemos ter guarda compartilhada, para que eles permaneçam juntos, ora comigo e Enzo, ora com você e Ingrid, o que você acha disso?

   — Eu concordo com você Bicha. Agora sinta, - eu tomei a mão dele e coloquei sobre a minha barriga de novo, — esse homem é o papai e ele ama muito vocês... – eles mexiam, minha barriga subia e descia e Edson ria, eu também, era maravilhoso sentir vida ali. Era uma sensação inexplicável! Eu me sentia abençoada, dar a vida a alguém era algo grandioso e cada vez que eles mexiam dentro da minha barriga eu experimentava sensações nunca vividas. Edson beijou minha barriga e conversou com nossos filhos e depois saiu.

A noite chegava devagar. Ingrid acolheu-me em seu abraço. Cada vez que ela fazia isso eu sentia que o céu descia sobre mim. Uma sensação deliciosa de pertencimento tomava conta de todo meu ser. Eu era de alguém, e tinha alguém.

   — Está ansiosa? – ela me indagou se referindo ao dia do nosso casamento.

   — Não posso negar meu amor, esse vai ser o dia mais lindo da minha vida. Eu quero viver com você para sempre Ingrid e seremos felizes, enfrentando os desafios que a vida nos proporcionar, assim uma ao lado da outra.

   — Sim meu amor. – sua mão acariciou meu cabelo e depois repousou sobre a minha barriga. — Oi meus amores, - ela falava baixinho com eles quando minha barriga revirou, eram nossos filhos ouvindo a mamãe Ingrid. Ficamos minutos falando do nosso amor por eles que com certeza nos entendiam, pois faziam festa na minha barriga. Ingrid me contava como tinha sido a visita ao seu pai.

   — Ele me pediu perdão Enya, disse que me amava, que amava os filhos, mas que na época que a mamãe morreu ficou com medo, que estava desesperado com a solidão... Enfim... nós conversamos muito. Meu amor, - ele finalizou tomando meu rosto entre as suas mãos, — eu estou feliz demais para continuar guardando mágoa. Eu acho que ele fez o que deu conta na época, então eu não quero mais carregar esse fardo.

   — Você tem razão meu amor, ele fez o que deu conta. – E depois da mais algum tempo de conversa, adormecemos.

O sol ia acordando. Seus raios iam cobrindo todo o universo como se fosse uma colcha de retalhos coloridos. Uma brisa suave adentrava pela janela e eu aconcheguei meu corpo ao de Ingrid que me abraçou. O cheiro do café ia atingindo meu nariz, fazendo meu estômago rebuliçar de desejo e eu levantei. Tomei um banho demorado ao lado de Ingrid depois que fizemos amor. O bolo de milho verde com coco estava maravilhoso e eu comi quase gem*ndo. Ingrid seguiu para o restaurante e eu fui para a loja. A manhã foi cheia de trabalho e voltei para casa na hora do almoço. Depois de comer fui descansar um pouco. Maria me ajudou fazer as malas, no dia seguinte seguiríamos para a chácara de Edmundo onde seria a nossa cerimônia de casamento junto à festa. Ingrid voltou mais cedo e também arrumou seus pertences. Assim que o dia amanheceu nós seguimos para a chácara. Enzo e Edson iriam ao final da tarde. Edmundo me abraçou com um carinho ainda maior, ele era o padrinho de um de nossos filhos, da menina era Moisés e Natacha. E Edmundo seria do menino, junto com Vera. A chácara estava perfeita, a decoração estava maravilhosa! No dia seguinte seria um dia inenarrável, eu iria me unir pelos laços do matrimônio com a mulher que eu amava e isso não tinha preço. Olhei tudo carregada de uma emoção imensa e agradeci o carinho de Edmundo. Sentei-me diante o jardim e respirei profundamente o aroma que vinha das rosas. O dia estava lindo e eu olhei para o céu onde nuvens brancas dançavam indo uma ao encontro da outra. Algumas gaivotas voaram no céu e estavam todas em par e grasnavam felizes e nesse momento senti minha barriga mexer, eram meus filhos que talvez ouvissem as gaivotas, acariciei minha barriga e falei do amor que já me unia a eles. Fiquei ali por mais algum tempo e depois segui para o interior da casa onde Edmundo, Moisés e Ingrid conversavam animados.

A tarde já ia deitando. O sol ia se despedindo do universo deixando seus raios coloridos a tingir o espaço celeste quando Enzo e Edson chegaram. Tudo estava pronto para o grande dia, o dia que Ingrid e eu iríamos dizer sim ao nosso amor diante o juiz de paz. Eu estava ansiosa, era visível. Edson me abraçou e depois se ajoelhou diante mim e beijou a minha barriga. Os bebês mexeram e ele riu alto, dizendo que eles já reconheciam seu toque. A noite foi chegando. A lua no céu imperava majestosa e dourada e eu a contemplava do jardim, sentada ao lado de Ingrid que me acolhia em seu abraço. Seu cheiro suave adentrava meu nariz e eu respirei profundamente aquele aroma que era tão parte da minha vida e sorri.

   — Eu te amo... muito Ingrid...

Ela sorriu e tomou meu rosto em suas mãos e disse que me amava e que seríamos felizes. Já era tarde quando seguimos para o quarto e adormecemos abraçadas.

A manhã chegou como o canto dos pássaros anunciando que era dia de festa. O sol já acordava e no céu uma cor amarela ia se mesclando de rubro e eu olhava tudo aquilo da janela do quarto, deitada ao lado da mulher que eu amaria para sempre. O cantar do galo misturou-se ao dos pássaros e uma sinfonia ia tomando conta do ar. Ingrid acordou. Seus olhos lindos e grandes deitaram sobre mim, quando ela disse:

   — Será para sempre... meu amor, mas ainda dá tempo de desistir...

   — Será para sempre. – eu disse.

Nós levantamos e depois de um banho seguimos para a sala de refeições onde a mesa já estava repleta. Edmundo olhava alguns detalhes no grande espaço onde seria celebrado o casamento, tudo estava lindo! Eu admirava a organização tão harmoniosa das rosas colombianas que embelezavam o altar. Flores pequenas formavam buquês e entre fitas coloridas ligavam um banco ao outro, formando um lindo corredor por onde andaríamos até chegar ao altar. Eu observava tudo isso depois de ter terminado o desjejum. Ingrid estava emocionada e por segundos eu pude ver seus marejados, mas ela não permitiu que as lágrimas descessem.

A tarde havia chegado. Ingrid estava linda numa calça de linho preto, uma camisa branca e um mocassim preto. Eu vestia um vestido longo branco com espaço para mostrar a presença dos nossos filhos. Edson me levou até o altar, enquanto Enzo seguiu com Ingrid e nos encontramos lá.

A cerimônia foi linda.

   — Sim. – ela disse quando o juiz indagou se ela me aceitava com esposa e depois eu disse.

   — Sim, meu amor e será para sempre.

Nós nos beijamos e uma chuva de pétalas de rosas caiu sobre nós. A valsa foi tocada e nós dançamos enlevadas no sentimento mais puro que era o amor que nos unia. Eu estava casada. Agora pertencia a Ingrid Maralha e ela a mim, não como posse, mas por amor.

FIM.

Fim do capítulo