Capítulo 64 -- Deixai vir a mim os pequeninos
A ILHA DO FALCÃO -- CAPÍTULO 64
Deixai vir a mim os pequeninos
Sofia ficou horrorizada ao ouvir o que a amiga dizia. Não queria nem pensar nessa hipótese. Morreria se algo acontecesse a Andreia.
-- Não fale assim, Andreia! Logo, tudo já terá passado e você estará com o Marlon nos braços.
Andreia não falou nada, pois uma nova contração obrigou-a a gritar e a contorcer-se.
-- Prepare-se, Andreia. Tão logo a dor passe, nos avise -- pediu, o médico.
Andreia apenas fez um sinal com a cabeça. A dor ainda era intensa.
-- Natasha... Natasha, minha filha.
Natasha abriu os olhos, ainda entorpecida pelos remédios e pelo sono. Queria se virar na cama e continuar dormindo, mas a voz voltou a chamá-la:
-- Natasha!
Uma mão agarrou seu pulso, e ela levantou a cabeça, assustada.
-- Hum? Pai? É você?
-- Sim, sou eu mesmo, minha filha.
Natasha, com os olhos brilhantes e o coração transbordando de alegria e saudade, abraçou-se ao pai.
-- Papai! -- exclamou com a voz trêmula -- Que saudade!
Ele retribuiu o abraço. Não falou, mas seus olhos estavam cheios de amor. Demonstrava no gesto uma consolação divina, recostado ao abraço carinhoso da filha. Era mais união espiritual que percepções sensoriais, propriamente ditas. Ele olhou para a mulher que estava de pé próxima a janela -- Essa é Aurora, ela é um Espírito amigo que me trouxe até aqui.
A mulher aproximou-se e estendeu a mão direita para ela e a esquerda para ele.
-- Segurem firme a minha mão. Agora vamos voar.
Eles voaram pelo espaço, acompanhados e envoltos em uma espécie de transporte eletromagnético. O voo pareceu longo e Natasha teve a sensação de que não terminaria nunca, mas, finalmente, pousaram em um lugar que parecia um pequeno sítio.
O pai de Natasha virou-se para ela e sorriu.
-- Sei que você não quer perder o nascimento do seu filho. Acompanhei o seu sofrimento e pedi muito para que os Espíritos Puros dessem a permissão para essa sua experiência fora do corpo.
Natasha ficou em estado de êxtase, sem acreditar muito que aquilo estava ocorrendo, mas feliz. Naquele momento, ela só pensava em Andreia e em Marlon. Ela tinha muitas perguntas a fazer, mas não dava mais tempo. A futura mãe já estava em trabalho de parto.
Com um misto de angustia, preocupação e felicidade, caminharam até a casa onde a criança estava para nascer.
"A gestação não é um período de céu de brigadeiro. Ela é recheada de incertezas, de angústias e de pequenas grandes comemorações temporais. A preocupação nos ultrassons, evitar doenças e qualquer coisa que prejudique a formação do bebê. São alguns exemplos. Ou seja, você está sempre comemorando uma vitória e se preocupando com outro problema no instante seguinte". Ela e Andreia experimentaram de tudo um pouco, com muita paciência e amor. Nada mais justo que estar presente.
Chegaram à pequena casa de poucos cômodos, mobília simples, tudo muito limpo. Apesar de ser noite e tudo estar escuro, não tiveram problemas de ver tudo com clareza. A curiosidade de Natasha ascendeu e ela começou a olhar os poucos quadros na parede para ver alguma coisa da família, mas nada era conhecido.
Seu pai foi levado para o quarto e Natasha ficou esperando do lado de fora. Foram os mais longos e angustiantes minutos. Um filme de sua vida se passou diante dos seus olhos. Desde pequena até aquele momento, a sua infância na ilha, as brincadeiras e as responsabilidades, as pessoas que foram importantes e tudo que a fez chegar até ali. Será que estava preparada para ser mãe? Será que a criança a aceitaria como mãe? Será que tudo sairá bem?
Enquanto discutia consigo mesma, Aurora a chamou da porta.
-- Venha. Você merece participar desse momento.
Atrapalhada, Natasha a seguiu pelo corredor até chegar ao quarto.
-- Ela não consegue lhe ver nem ouvir, porém, você pode transmitir impressões agradáveis, suaves, tranquilas.
Neste momento, ela foi tomada por uma felicidade absurda. Quase passou mal, mas tinha que segurar as pontas e não transmitir o seu nervosismo para Andreia, que naquele momento, lutava bravamente para dar à luz. Só que não resistiu.
-- O que está acontecendo? Alguém faça alguma coisa. Ela está sofrendo! -- Natasha berrou, aflita.
Ninguém dirigiu uma só palavra para ela, era como se não estivesse ali. Haviam muitos espíritos, todos vestindo branco. Eles estavam em pé, em silêncio, como se estivessem em oração, virados na direção à cama.
-- A dor passou -- disse Andreia ao colocar-se aos pés da cama.
-- Agora é a sua vez, Sofia. Ajude ela -- pediu o médico.
Sofia rodeou o corpo da amiga com os braços e segurou-a bem forte, e mais uma vez, mentalmente, rezou.
-- Esse imbecil não vai fazer o parto? -- indagou Natasha, com antipático sotaque açoriano. Porém, mais uma vez não foi ouvida -- Droga! Vou arrastar a cara da Sofia no asfalto.
-- Tudo vai indo bem, Andreia. Não vai demorar muito mais. Vou contar até três e, então, você grite bem forte -- pediu Leandro -- Vamos lá: um, dois e três!
Com a agonia presa dentro de si, desde a fuga da Ilha do Falcão, Andreia gritou. Gritou por ter sido acusada injustamente por Carolina, por Natasha, pelo filho. Gritava pela vida de seus amores, não pela sua.
Ao ouvi-la, Natasha sentiu os olhos cheios de lágrimas. Andreia e Marlon eram seus presentes enviados por Deus. Sem eles a vida não teria mais sentido.
-- Pronto! O bebê já está em posição normal -- o médico avisou com voz arfante -- Agora, Andreia, quando sentir a próxima contração, faça a maior força possível.
A contração seguinte começou quase imediatamente. O rosto dela contraiu-se, e Andreia respirou fundo com a dor.
-- Força, força -- instigou o médico.
Andreia e o médico lutavam juntos para salvar o bebê. Natasha não podia se aproximar, mas percebia o esforço deles e sofria junto.
-- Força amor! Eu amo vocês! -- ela tentava ser ouvida, mas apesar de todas as tentativas não teve sucesso.
Os minutos que procederam foram tensos demais. Até que Andreia amoleceu o corpo enquanto a nova vida vinha ao mundo. E, as três horas em ponto, ouviu-se o estalar de uma palmada seguido pelo choro convulsivo do recém-nascido.
O choro do bebê fez todos os espíritos aplaudirem. Natasha ficou muito emocionada naquele momento e ela teve a permissão de se aproximar da cama.
-- Ai, olha só Andreia é um menino! Você tem um filho lindo! -- exclamou Leandro, encantado.
Andreia mexeu-se e mesmo gem*ndo, sorriu.
-- Ouviu, meu amor? O Marlon nasceu. Escute o choro dele -- disse Natasha, comovida. Ela sentia que mesmo sem ser ouvida, de alguma forma, suas palavras chegavam ao coração de Andreia -- Estou tão orgulhosa de você, minha guerreira. O que sinto por você, é o maior amor do mundo. Um amor sem limites.
-- Deixe eu ver, doutor -- pediu Andreia.
-- Espere até eu cortar o cordão umbilical e enrolar a criança numa manta -- respondeu Leandro enquanto pegava os instrumentos.
Pouco depois, Andreia estava com o bebê nos braços. Ela sussurrou baixinho para ele.
-- Apesar de estar longe, mamãe Natasha, com certeza, está ao nosso lado. Não fisicamente, e sim de alma.
Natasha sorriu e beijou a cabeça da criança.
Pois, embora ausente quanto ao corpo, contudo, em espírito, estou convosco, alegrando-me e verificando a vossa boa ordem e a firmeza da vossa fé em Cristo. Colossenses 2:5
O dia estava amanhecendo. O espírito que conduzia Natasha disse baixinho:
-- Essa criança veio ao mundo para trazer paz aos corações -- ela sorriu, com meiguice -- Está na hora de você voltar para o seu corpo.
-- Não! Eu não posso deixá-los aqui -- Natasha bradou.
-- Essa viagem foi um presente maravilhoso que você recebeu, não seja insensível.
Natasha foi para o lado da frente da casa, querendo achar o nome da rua, algo assim, mas sem que desse tempo de pensar, começaram a voar de volta para o hospital. Ela deu uma última olhada no lugar, que nunca esteve nesta vida.
O espírito que a acompanhava bateu levemente em suas mãos e ela sentiu seu corpo espiritual adormecer.
Elisa olhou para o relógio e finalizou a oração:
-- Que a Ciência do Espiritismo seja a luz brilhante a iluminar o caminho dessa criança. Que ele saiba pai, compreender toda a extensão do teu amor, que nos submete à prova para nos purificar. Senhor, lança o teu olhar paterno sobre a família a que confiaste esta alma, para que ela possa compreender a importância da sua missão, e faze germinar nesta criança as boas sementes, até o momento em que ela possa, por si mesma, Senhor, e através de suas próprias aspirações, elevar-se gloriosamente para ti. Digna-te, ó meu Deus, ouvir essa humilde prece, em nome e pelos méritos daquele que disse: "Deixai vir a mim os pequeninos, porque o Reino dos Céus é daquele que se lhes assemelham!"
Créditos:
https://www.paimoderno.com/diario/emocao-indescritivel-de-ver-seu-filho-nascer
https://estudantespirita.com.br/espiritismo-sonhos-com-desencarnados/
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Anny Grazielly
Em: 14/09/2020
Que capítulo lindo... amei de paixão... adorei Nat ta presente no nascimento de Marlon... simplesmente, perfeito...
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