Ato 1
Um grupo de jovens mulheres alcoolizadas fazia uma algazarra no lounge do bar, irritando Nicole, que fumava lentamente seu cigarro no balcão. Não gostava daquele lugar, mas tinha um encontro marcado.
— Mais um Bourbon? — Perguntou o bartender apontando para seu copo quase vazio.
— Agora não. — Respondeu cobrindo o copo com a mão que segurava o cigarro.
Parecia um tanto desanimada, desfez o coque soltando os cabelos loiros e rebeldes, suspirou consultando as horas no celular, correndo o flip para cima com o polegar. O ano era 2002 e algumas TVs pelos cantos exibiam lances dos jogos da Copa do Mundo, que acontecia naquele mês. Nicole detestava futebol e agradecia em silêncio por as TVs estarem sem áudio.
Ao resmungar algum xingamento pelo futebol que inundava o país naquela época se deu conta do quanto andava mal-humorada, cheia de tudo e todos. Estava se aproximando dos trinta e se via numa crise interior, principalmente profissional.
— Que gralhas insuportáveis... — Resmungou novamente, por conta do barulho vindo do lounge, um espaço ao fundo com dois sofás.
Consultou mais uma vez as horas no celular e foi tirada do seu transe desanimado por uma mulher que chegou eufórica no balcão, esbarrando em sua perna.
— Moça, me desculpa. — Disse uma sorridente mulher já um tanto bêbada.
Nicole apenas entregou um sorrisinho forçado e afastou-se um pouco dela.
— Três pinas coladas, amigão! — A maquiagem da moça já estava um pouco bagunçada, trajava uma tiara com uma pequena grinalda de tule.
Nicole logo se deu conta que aquela mulher estava no grupo da algazarra, e pela mini grinalda, deveria ser a despedida de solteira dela. Já havia perdoado o esbarrão, estava curiosa.
— Vai casar hoje? — Perguntou com ironia, apontando para a cabeça dela.
— Com a primeira pessoa que me pagar uma bebida! — Riu com vontade.
— Ninguém te pagou um drink até agora?
— Hoje eu que estou embebedando todo mundo. Quer uma pina colada também?
— Não gosto de misturar. Mas agradeço.
— Por que você está sozinha aqui?
— Estou bem acompanhada. — Ergueu seu copo e deu um gole.
— Qual seu nome, pessoa bem acompanhada?
— Nicole.
Um homem de meia idade com camisa social e gravata listrada interrompeu a conversa.
— Você é a Nicole, certo?
A elegante mulher de quase um metro e oitenta (com saltos) deu uma boa olhada no indivíduo.
— Não, acho que você me confundiu com alguém. — Nicole respondeu, a moça de grinalda não segurou o riso, estava atrás do homem acompanhando a conversa.
— Tem certeza? Acho que você marcou comigo aqui às nove.
— Não sei do que você está falando.
— Eu vi sua foto no site, é você sim.
— Deve ter sido alguém semelhante, eu sinto muito.
O homem deu uma última olhada ainda incrédulo.
— Você que sabe. — Bufou e saiu.
Nicole voltou a encaixar-se no balcão, com os cotovelos sobre o balcão.
— Onde achou esse cara? Foi naqueles sites de encontros, não foi?
A retraída mulher acabou rindo, girando no banco na direção da noivinha.
— Esses sites de encontro são uma caixinha de surpresa. Achou seu noivo em algum desses? Par Perfeito? Yahoo Encontros?
— Não, achei o Marcos numa formatura de uma amiga. Não tenho uma história mirabolante para contar, foi mal.
— Casa quando?
— Sábado que vem, se até lá ninguém mudar de ideia. — Falava com desembaraço.
O bartender colocou dois copos sobre o balcão.
— Falta um, já vai sair. — Ele comunicou.
— Brigada, moço. — Deu um pequeno gole em um dos copos. — Acho que já vou levar esses dois para Maurícia e Renatinha, depois busco o meu.
— Maurícia? — Perguntou Nicole com curiosidade. — Que nome diferente.
— No sentido de estranho?
— É, estranho, não acha?
— É a minha irmã, então já me acostumei.
— É sua irmã? Desculpe, não quis ofender. Mas agora fiquei curiosa para saber seu nome.
— Andrea, prazer. — Estendeu a mão.
— Prazer. Andrea é um tanto mais comum, tem mais irmãos?
— Tenho um irmão, Renato.
Nicole franziu o cenho, assimilando.
— É coincidência ou os nomes de vocês é alguma homenagem a Legião Urbana?
Andrea explodiu numa risada, cheia de surpresa.
— Caramba! Você matou nosso mistério sem que eu precisasse dar nenhuma dica!
— Sério? É isso?
— Sim, meus pais são fãs de Legião Urbana.
— Seu nome é Andrea Doria então?
— Só Andrea, mas meu irmão se chama Renato Russo Bezerra de Carvalho.
— Mentira. — Riu incrédula.
— Juro.
— Prontinho. — O barman colocou o terceiro copo no balcão e anotou na comanda dela.
— Valeu, fera! — Andrea disse e tentou pegar os três copos ao mesmo tempo, sem sucesso.
— Quer que eu ajude a levar?
— Aceito a ajuda, aproveita e já fica lá com a gente, já que seu encontro minguou.
Nicole topou, e passaram as horas seguintes engatando conversas e risadas, na companhia das amigas da noiva que estavam mais preocupadas em se embebedar e falar besteiras aleatórias.
— Vou buscar uma bebida. — Nicole disse se levantando.
— Traz uma pra mim?
Voltou minutos depois com duas águas.
— Água?
— Para se hidratar, depois você volta a beber suas pinas coladas.
Andrea aceitou a água estampando um sorrisinho, e depois riu alto.
— Que foi?
— Você vai ter que casar comigo.
— Por que?
— Eu disse que me casaria com a primeira pessoa que me pagasse uma bebida.
Antes que Nicole respondesse aquela garota de cabelos castanhos já sem grinalda, as amigas começaram uma brincadeira no estilo verdade ou desafio, porém voltado apenas à noiva.
Lá pela sexta ou sétima pergunta, após errar, Andrea deveria pagar uma prenda. Colocou a mão no cesto (onde previamente havia batatas fritas) e tirou o desafio.
— Beijar alguém agora. Sério? Ces tão loucas, né?
— Paga! Paga! Paga! — Gritavam as amigas eufóricas.
Andrea ria sem parar com as brincadeiras e brados das amigas, quando ergueu os braços.
— Tá bom! Eu pago!
Virou-se e sem se fazer de rogada tascou um beijo na boca de Nicole, que levou um baita susto, mas aceitou a prenda com animação.
Os gritos aumentaram e continuaram mesmo após o beijo, todas vibravam e riam.
— Foi mal. — Andrea disse em seu ouvido.
— Quem aqui está querendo desculpas? Eu não. — Riu.
Andrea ergueu o copo com água, satisfeita por ter pago a prenda.
— Hoje eu posso tudo!
Já passava da meia-noite quando Andrea foi ao banheiro e Nicole se prontificou a acompanhá-la.
Ninguém sabe se a intenção surgiu antes ou durante, mas Nicole enfiou Andrea de volta à cabine de onde havia acabado de sair, lhe tomando num beijo ardente que tirou o fôlego da pretensa noivinha.
— Hoje você pode. — Brincou Nicole ao final.
Andrea nada respondeu, apenas lançou um olhar surpreso e saiu do banheiro.
(Continua no segundo desafio)
Fim do capítulo
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NandaSulivan
Em: 28/08/2018
Já prendeu desde o começo, o título já é uma das minha músicas favoritas ...Agora é curtir cada compasso deste super conto.
Parabénssss
Resposta do autor:
Quase sem querer tb é uma das minhas preferidas <3
Brigadão por me ler, Nanda!
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IzaHass
Em: 27/08/2018
Eita! Será que Andrea vai descobrir que é "tempo perdido" casar com Marcos e que "de nada vale fugir" de Nicole e dela mesma, pra viver "e não sentir mais nada"...? ;-)
Inspirar-se em Legião Urbana sempre dá rock. Adorei! :-*
Ahahahhah eu amei seu comentário entrando na onda! Legião é sempre uma ótima inspiração, né? Brigada por comentar!
Resposta do autor:
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