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An Extraordinary Love por Jules_Mari

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Palavras: 8260
Acessos: 5043   |  Postado em: 29/07/2018

Notas iniciais: Boa noite a todxs. 

Finalmente mais uma noite de domingo e com ela temos um novo capítulo de AEL. 
Esse em particular, é bastante especial para mim, pois contem uma de minhas músicas favoritas. E isso nos leva ao meu pedido. 
Gostaria que vocês ouvissem a música durante a leitura da passagem que é narrada pela letra da canção. O link dessa e de outra estão nas Notas Finais. Acredito que o clima ficará completo com a experiência da canção em sincronia com a estória. 
Continuo sendo muito grata a vocês pela companhia e comentários generosos. 

Tenham uma ótima leitura e uma excelente semana. 
Xeros!

Capítulo 56: Your House (Sua Casa)

- O que porr* está acontecendo aqui? – Não mediu suas palavras, apenas as deixou fluir empurradas pela enxurrada de sentimentos que se digladiavam dentro dela. Apesar de não precisar de que mais nada pudesses ser dito, pois estava mais do que evidente o que acontecia ali. O que a estava deixando profundamente magoada era o fato de uma daquelas mulheres ser a pessoa que ela mais confiava em todo o mundo e que agora parecia ser uma completa estranha.

- Cosima?! – Ingrid assustou-se com a entrada violenta da mulher que não conseguia tirar os olhos de Amanita. Essa estava tão surpresa quanto as outras, porém não se manifestou. Permanecendo em silêncio, muito devido ao fato de não ter a certeza do que poderia falar naquele momento.

- Calma Cos. – Anne se colocou ao lado da sua parceira e instintivamente ambas se prostraram entre ela e Amanita, como se quisessem proteger a mulher da ira que estava estampada no rosto de Cosima. – Não é o que você está pensando.

- Não! – Ela disse secamente. – Eu sei exatamente o que está acontecendo aqui! – Havia um rancor doído naquelas palavras e todas foram atingidas por ele. – No fundo, eu sempre desconfiei da aproximação repentina de vocês. – Foi a primeira vez que ela deixou o olhar de Amanita para fitar as outras duas. – Da presença constante e da “amizade” quase forçada. Mas não me incomodei com isso. – Riu sarcasticamente – Secretamente isso até me deixava... Feliz. – Baixou os olhos e depois olhou para algum ponto no quarto. – De alguma maneira eu pensava, em um devaneio infantil, que isso me deixava mais próxima a ela. – Todas ali sabiam a quem ela estava se referindo. – Que vocês estavam aqui porque ela mandou! – As duas mulheres se entreolharam. – E eu estava certa. – Riu novamente e deu dois passos para trás. – Depois de tudo o que descobri em Paris sobre a Ordem, nada disso poderia me surpreender. Afinal de contas, vocês se aproximaram de mim há muito tempo não é mesmo? – As três pareceram estar confusas. – A Srta. Gibson! – Ela as esclareceu. – Aquela que frequentava o café tão assiduamente e é, na verdade, um membro da alta cúpula da Ordem do Labrys. – Gesticulou com os braços. Havia um ácido sarcasmo em sua voz e ele tinha um alvo imediato. Amanita.

- Cos... – Finalmente ela se pronunciou e pareceu que o som da voz da amiga era algo extremamente desagradável em seus ouvidos. Ela cerrou os olhos e se encolheu com os lábios retos. Amanita percebeu que aquela conversa seria muito mais difícil do que ela jamais imaginou, e sempre o fizera nas inúmeras vezes que sentiu vontade de contar a verdade a amiga. E sentiu que devia toda honestidade a ela e talvez isso não deveria ser compartilhado com mais ninguém. – Anne, Ingrid... Vocês poderiam nos deixar a sós? – Soava muito mais como uma ordem e não um pedido. As duas mulheres se entreolharam e esbouçaram algum protesto, mas esse ficou pelo caminho com o aceno mais incisivo de Amanita.

- Tudo bem! – Ingrid caminhou junto de sua parceira, mas parou ao lado de Cosima. – Tente compreender o nosso lado. Só isso que lhe peço. – Ousou tocar o braço dela, mas esse foi bruscamente puxado. A mulher suspirou, percebendo que aquela mulher, como lhes foi alertado, não era nada fácil. Ainda olharam para Amanita e silenciosamente lhe desejaram força para a batalha que estava prestes a enfrentar.

- Por que Nita? – Mal esperou que as mulheres saíssem do apartamento e foi logo questionando o que tanto parecia lhe sufocar.

- Cos... Entenda, por favor... – Tentou lhe segurar nos braços, mas ela se afastou com dureza no olhar, apesar das lágrimas denunciarem o seu estado emocional. – Muita coisa nem eu mesma posso lhe responder... – Começou de forma evasiva.

- Como assim? Que merd* você está me dizendo? – Era evidente a decepção que preenchia cada palavra.

- Bom... Acho melhor lhe contar tudo desde o início... – Esfregou uma mão na outra e mordeu seu lábio inferior. – Eu faço parte da Ordem do Labrys há mais de dez anos. – Cosima bufou diante daquela informação.

“A mentira era antiga.” Pensou.

- Quando terminamos a escola e fomos para a faculdade... Lembra que ganhei uma bolsa na Universidade de Washington? – Cosima apenas anuiu com a cabeça e arregalou os olhos. – Pois bem, na verdade eu estava sendo recrutada pela Ordem. – Nita falava enquanto caminhava de um lado para o outro diante de uma descrente Cosima que já havia arriado num canto do sofá. – Eu desconhecia completamente a Ordem até então, assim como você. Mas a minha vaga na faculdade era verdadeira, só que não exatamente nos EUA. Fui para a Irlanda.

- Você faz parte do Exército de Ártemis... – A morena disse em tom de espanto.

- Sim! Bom, mais ou menos... – Nita gesticulava quase tão efusivamente quanto à amiga, pois partilhavam aquele traço. – Não sou exatamente do tipo “guerreira.” – Gesticulou as aspas. – Você tinha de ver o quanto eu fui uma negação no hipismo e no arco e flecha. – Riu e quase conseguiu obter o mesmo resultado na amiga, que se recompôs rapidamente. – Mas minhas habilidades com a computação foi e continua sendo muito útil. Contudo... – Hesitou no que estava prestes a contar, pois era o que de fato dizia respeito à Cosima e o que a fizera ser recrutada. – O real motivo de terem vindo até mim foi... Você! – A reação de constatação que viu no rosto da amiga, mostrou o que já presumia. Ela já havia juntando os pontos em sua mente.

- Você foi recrutada por minha causa. – Ela nem esperou a conclusão inevitável, levando a outra a apenas assentir com a cabeça. - Siobhan? – Ergueu os olhos e novamente uma troca de olhar cumplice entre elas confirmou aquela informação. Riu novamente de si mesma, sentindo-se a mais idiota das pessoas. Estava percebendo que muito de sua vida estava sendo pautada em mentiras e questionou-se quantas mais não haveria a sua volta. -  Mas Cos... Por favor, acredite em mim, quando eu digo que não sei exatamente o porquê disso. Mas tudo o que eu a Siobhan sempre me disse era que você era muito importante para a Ordem. E que isso era tudo o que eu precisava saber. – Amanita procurou carregar de sinceridade aquelas palavras, pois era de fato o que ela estava dizendo.

- Tantas mentiras... – Disse com o olhar perdido causando o temor na outra mulher. – Toda a minha vida parece ter sido cercada de mentiras.

- Cosima... Eu...

- Estou cansada disso tudo! – Disse secamente, assustando ainda mais Amanita. – Sabe o que é pior? – Questionou, mas nem se preocupou em esperar resposta alguma. – Eu não sei mais em quem confiar... Qualquer pessoa que se se aproximar de mim... Ou... – Ergueu-se e perambulou a esmo pelo pequeno apartamento. – Até mesmo quem já está ao meu lado... – Arregalou os olhos e levou ambas as mãos à testa. – Tudo mentira!

- Eu lhe garanto que não há mais ninguém! – Amanita tentou amenizar a situação.

- Pelo menos que você saiba... Coisa que parece ser bem pouco. – Desdém em demasia. Queria ferir a mulher, e para tanto havia decidido não medir palavras. – Delphine Cormier não é o tipo de mulher que gosta de compartilhar todos os seus segredos. – Tentou rir de si mesma, mas o amargor que aquele nome deixava em sua boca a impediu.

- Você sabe muito bem que não é assim! – Amanita abandonou a postura passiva que não combinava em nada com ela e partiu para revidar as atitudes quase imaturas da amiga. – Apesar de todos os mistérios que cercam a Cormier, ela é uma mulher justa e se fez tudo isso para mantê-la em segurança, deve ter um bom motivo para tal. – Elevou a voz.

- Realmente você não sabe de nada mesmo... – Falou ainda mais alto tomando o cuidado de carregar de ira cada palavra. Estava furiosa, mas não era exatamente com a mulher diante dela. Estava claro que Amanita também era apenas um peão naquele intricado jogo que Delphine comandava com maestria.

Sua ira agora tinha apenas um alvo. Aquela que parecia não parar de machuca-la, pois até em sua mais sincera e antiga amizade ela interferiu. Maculou algo que era extremamente precioso para ela e por quê? Foi então que se permitiu sentir pena da amiga, que insistia em defender algo indefensável.

- Cos... Por favor, entenda! – Sua amiga demandou e finalmente ela a olhou com algo diferente de ira e decepção. – Precisamos proteger a Ordem...

- E isso significa? – Enrijeceu sua postura que havia vacilado um pouco. A mulher diante de si gaguejou algumas vezes, demonstrando que não tinha a resposta exata para aquela pergunta e após algumas tentativas, arriou os ombros e balançou lentamente a cabeça em negativa.

- Não podes expor a Ordem... – Disse com um filete de voz, aquilo que Cosima já presumia que ela pediria.

- Sabe o que é mais maluco nisso tudo Nita? – A mulher a olhou com uma pontada de esperança ao ouvir seu apelido dito pela amiga. – Eu já havia praticamente desistido de publicar os livros. – A mulher diante dela arregalou os olhos e quase se pode ouvir seu suspiro de alivio. – Vim aqui apenas para lhe pedir um ultimo conselho. – A expressão sombria em seus olhos voltou a lançar um alerta para Amanita.

- E?

- Consegui! – Disse secamente enquanto caminhava lentamente em direção à porta. Não foram preciso palavras ditas para que a troca de olhares entre elas deixasse claro para Amanita o que a amiga havia decidido, pois desde sempre tentou se colocar no lugar dela, e imaginar qual seria a reação da amiga àquela descoberta. Não poderia condená-la! Por mais que o seu sentimento de dever para com a Ordem gritasse em sua mente, o amor que sentia por Cosima era muito maior. Desistiu! Apenas acenou positivamente com a cabeça e lamentou pelas escolhas tomadas, por ter machucado a quem tanto amava.

- Me desculpe Cos... – Foi tudo o que conseguiu dizer.

- Eu sei Nita... Não tenho raiva de você minha amiga. Apenas estou farta e tudo isso. – Gesticulou com as mãos a esmo. – Preciso exorcizar toda essa estória de uma vez por todas. – Sorriu tristemente e saiu sem ser impedida por Amanita. Silenciosamente ela soube que a amizade delas falou mais alto e o que quer que tenha sido pedido a ela, acabara de ser contrariado.

Desceu os degraus com passos cada vez mais pesados e precisos, sentindo-se preencher por uma segurança profunda. Havia finalmente tomado a sua decisão. Já do lado de fora do prédio, caminhando sem destino pelas ruas do Castro, buscou um contato em seu celular. O olhou atentamente antes de clica-lo e em seguida digitou uma mensagem.

“Vamos em frente. Podem publicar!”

 

______

 

O terrível vídeo que assistia já pela quinta vez fazia com que suas entranhas se revirassem dentro de si. A cena grotesca da violência absurda que aqueles homens infligiam aquelas mulheres a estava deixando verdadeiramente nauseada.

- Já está tudo pronto Helena? – A dureza em sua voz assustou até sua Protetora e amiga.

- Faltam apenas algumas confirmações Delphine. – Helena se aproximou dela trazendo seu sobretudo preto nas mãos. Apesar de estarem no verão russo, a temperatura havia caído subitamente nos últimos dias e a ocasião pedia que estivessem vestidas com sobriedade, pois estavam a caminho da suprema corte russa, onde um aguardado julgamento estava prestes a acontecer.

Delphine estava séria e resignada e tinha um olhar duro por baixo de seus finíssimos óculos escuros Gucci. Vestia um terninho cinza feito sob medida para ela e o som pesado de seu scarpin vinho contra o piso de granito do saguão do luxuoso hotel onde estavam hospedas, indicavam a ira que fluía por seu corpo e era desferida em cada passo.

- Nossa defesa é sólida e estamos confiantes que o apelo ao supremo será ouvido. – Uma mulher corpulenta de meia-idade e cabelos alaranjados disse assim que se encontraram.

- Isso mesmo Pietrova! E também temos as recomendações da ONU. – Stella Gibson juntou-se a elas, parando ao lado de Helena e tomando a mão dela na sua. Perceberam que Delphine as olhou com denotada aprovação, mas a tensão da situação que enfrentavam não permitiu que o pensamento leve de ver sua amiga feliz perdurasse por muito tempo.

- E tudo o que você conseguiu Stella, será de suma importância. – Recebeu o sorriso orgulhoso de sua irmã como resposta. - Então vamos? – Delphine as chamou e os porteiros do hotel abriram as portas para elas. Do lado de fora, uma enxurrada de repórteres com suas máquinas fotográficas e câmeras, avançou contra elas. Foram desferidas perguntas em vários idiomas, mas nenhuma foi respondida, pois Stella e Helena trataram de abrir caminho por entre todos até que atingissem a segurança de uma limusine que as esperava.

Anna Pietrova, membro da alta cúpula da Ordem era russa e dona de um dos mais renomados escritórios de advocacia da Europa Oriental e estava cuidando pessoalmente do caso das três ativistas feministas que formavam uma banda que atendia pelo nome de Pussy Riot.[1]

Nadezhda Tolokonnikova, Yekaterina Samutsevich e Maria Alyokhina haviam sido presas após uma série de protestos e uma invasão que culminou com a morte de importantes políticos russos. Essa era a informação que a mídia em geral possuía e que era propagada para a população. O que pouquíssimas pessoas sabiam era que as três pertenciam a Ordem e foram capturadas durante uma missão de resgate de um grupo de ucranianas que serviam como escravas sexuais. O problema é que os políticos mortos eram membros do Martelo, contudo quem os matou foram seus próprios irmãos, com o intuito de incriminar as ativistas e desacreditar o movimento. Tudo a mando de John Lamartine.

E foi justamente por isso que Delphine precisou adiar os seus planos e ir aos EUA e focar toda a sua atenção em mais aquela batalha contra Lamartine. E essa já durava semanas e estava prestes a ter o seu desfecho quase cinematográfico. Ela sabia que aquela era mais uma provocação daquele homem desprezível. Que ele estava mostrando que, assim como ela, estava se fortalecendo e disposto a vencê-la em cada uma das batalhas que estavam por vir, nem que para isso tivesse que sacrificar seus próprios homens.

E assim que chegaram diante do carrancudo e imponente prédio da justiça viram que uma multidão protestava a favor das mulheres que estavam prestes a serem julgadas e se condenadas, morreriam. Mais e mais jornalistas as esperavam, mas novamente elas passaram por todos em silêncio. O interesse da mídia só aumentou quando alguém com a influência de Delphine Cormier juntou-se a um batalhão de personalidades públicas que saíram em defesa das ativistas.

Já dentro do salão, as quatro mulheres chamavam a atenção de todos, mas um grupo em especial as atraiu. E assim que os advogados e promotores se afastaram, mostraram quem estava junto a eles.

- John Lamartine! – Delphine disse entredentes assim que parou há alguns metros dele.

- Delphine Cormier! – Disse com fingido respeito enquanto se dirigia até ela. Helena, Stella e Pietrova se olharam preocupadas do que aquele encontro poderia causar. A própria Siobhan as havia alertado para a presença da mestra da Ordem naquela situação. Uma vez que ela estava passando por um momento difícil e temia, sabiamente, uma nova perda de controle dela. E ali, tendo seu grande inimigo diante dela, os temores se tornaram concretos.

Mas antes mesmo que ele chegasse mais perto, Stella e Helena se prostraram entre eles, provocando uma reação de repulsa no homem.

- Não se aproxime mais seu verme! – Stella disse com fúria nas palavras. Ele gargalhou alto em resposta, demonstrando todo o desdém que tinha dela e das demais e a ignorou. Ousou dar mais um passo, porém foi impedido por uma mão em seu peito. Ele a olhou e seguiu o braço até o rosto da dona dela.

Helena o encarava com firmeza e sem demonstrar um resquício se quer de medo. Não tremia! Não temia! Não hesitava! Ao contrário dele que se permitiu sentir uma pitada do gosto amargo do medo e esse se converteu em pavor quando ele inclinou um pouco a cabeça e fitou a expressão presente na face de sua grande inimiga.

Delphine retirara os óculos escuros com lentidão e a medida que seus verdes olhos adquiriam um tom escuro e sombrio, um sorriso de canto de boca lançou um alerta gelado direto ao coração inumano dele.

Em sua mente perturbada e doentia, ele teve um vislumbre de algo que lhe causou pavor. Algo que jamais pensou ser possível. Para a sua sorte, ninguém ali conseguia ver em sua mente o que ele via, pois se aquilo fosse possível a sua derrocada se daria ali mesmo. Procurou se recompor e afastar aquela visão de sua mente. Mas antes dela se dissipar, deixou vestígios de sua passagem no descompasso de seu coração e essas batidas desconexas foram sentidas por Helena.

- Com medo Lamartine? – Helena disse e fui além, aproximou-se bem dele, ao ponto de se debruçar para alcançar-lhe o ouvido. – É bom mesmo que o tenha! – E o empurrou, abrindo passagem para Delphine e as demais. A loira o olhou de soslaio e seguiu com um sorriso triunfante nos lábios.

- Eu a encontrarei! – Aquelas palavras ditas por ele percorram a distância entre eles e a alcançaram, lhe atingindo em cheio. Delphine paralisou de imediato apertando fortemente o braço de Stella, que estava ao seu lado.

- Saia daqui! – Ela disse. – Tire todos daqui! Agora! – A poderosa mestra da Ordem demandou com firmeza, embora também pudesse ser sentido uma nota de súplica. Stella trocou um olhar desesperado com Helena.

- Controle-se. Por favor! – A morena segurou Delphine pelos braços e pode ver nos olhos amados da amiga que ela estava duelando consigo mesma. O verde musgo de suas íris iam e viam, dando lugar aquela sombra negra. – Lute! Não dê esse prazer a ele! Você é mais forte do isso! – A sacudiu algumas vezes e as pesadas nuvens que fizeram a tarde de sol parecer noite começaram a se dissipar. E a respiração pesada de Delphine, indicou o quão exausta ela estava, pois havia lutado contra ela mesma.

A voz de um funcionário do tribunal anunciou que a sessão já iria começar e que todos deveriam tomar os seus lugares. Aos poucos as pessoas foram entrando no grande salão, deixando apenas as quatro mulheres diante de Lamartine e alguns de seus homens.

- Preciso entrar Delphine! – Anna informou e seguiu após receber um aceno positivo de sua Mestra.

- Vão com ela! – A loira disse para Stella e Helena que se mostraram hesitantes. – Podem ir... Não se preocupem. Ficarei bem. – Lhes olhou com expressão serena. Ainda tentaram protestar, mas seguiram mesmo assim.

Ela parou com ambas as mãos depositadas nos bolsos de seu casaco e encarou seu inimigo com o queixo erguido e expressão segura. Numa clara postura de desafio.

- Vão! – Foi tudo o que ele disse para seus homens. Ao contrário de Stella e Helena, eles saíram quase em disparada, como se fugissem de algo.

Finalmente ficaram apenas eles dois. Frente a frente, se encarando como fizeram tantas vezes no passado e logo aquele poderoso duelo teve início. E como sempre, as forças se equivaliam e como de costume, Lamartine sempre apelava para algo que pudesse ferir Delphine em seu intimo.

- Você é fraca! Precisa de sua cadelinha de estimação para lhe controlar... – Ela não respondeu. Havia decidido não ceder às tentativas toscas dele de desequilibrá-la. Não poderia incorrer no erro de deixar as sombras voltarem a envolvê-la. – Esse olhar de superioridade não me engana. Você estar aqui só demonstra o quão desesperadas vocês estão. – Ele começou a caminhar ao redor dela que permanecia impassível. – A toda poderosa Mestra da Ordem do Labrys presente num caso tão banal como esse. Certamente porque não cofias nas suas vagabundas para resolverem suas merd*s. – Desferia seu veneno, mas ela estava resignada.

- Posso dizer o mesmo de você! – Disse simplesmente. Ele interrompeu a frase seguinte e esboçou um sorriso sarcástico. O fato é que a presença de ambos ali ia muito além daquele caso. Eles sentiam em suas entranhas que algo muito grande estava prestes a acontecer. O vislumbre que ele teve e queria evitar pensar nisso só potencializavam essa sensação. E as visões de Manu também indicavam o mesmo à Delphine. Parecia que os destinos os estavam guiando para o desfecho daquela longa jornada que precisaram travar juntos.

- Aconteceu com você também não foi? – Havia loucura no olhar dele. – Você também sentiu a doce imortalidade escorrer por entre seus dedos. – Disse bem próximo a ela. – Não posso acreditar que até mesmo você não queria perder isso. – Um tremor em uma de suas sobrancelhas indicou que finalmente ele havia atingindo algum nervo exposto dela. – Rá! Ai está! Não seja hipócrita. – Ele gargalhou.

- Você sabe muito bem que eu detesto essa porcaria de maldição! – Seu controle estava parecendo vacilar. Ele a encarou demoradamente tentando ler algo em sua mente, mas como sempre esbarrava numa poderosa muralha.

- Como?! – Ele elevou seu tom de voz, chamando a atenção de algumas poucas pessoas que estavam no andar de cima. – Como você fez isso? – Baixou sua voz. – Como feriu o poderoso véu da imortalidade? – Ele exigiu uma resposta parado bem diante dela e com o tronco inclinado para frente. Delphine engoliu em seco com aquela pergunta, pois a resposta a ela representava aquilo que mais a apavorava. Agradeceu às deusas por ele não poder ler sua mente, pois se o fizesse veria nitidamente o rosto de Cosima lhe sorrindo de volta.

- Não faço ideia do que você está falando! – Virou em seu próprio eixo e começou a caminhar em direção ao salão do tribunal.

- Aquela bruxa fez algo para garantir isso... – Ela sentiu seu coração disparar. – Emanuelle Chermont... Sua mãe! Aquela vagabunda nojenta fez algo... – Ele caminhava de um lado para o outro. – Só pode ter sido ela... Não havia nada no livro. Tudo o que eu sei é... – Fez questão de pausar sua fala para observar qual seria a reação de sua inimiga. – “Grande amor...” – Delphine virou-se para ele bruscamente, num movimento quase involuntário. E em seu rosto ele viu algo raro. – Medo! – Ele riu e jogou a cabeça para trás. – Mas se bem me lembro... O seu “grande amor” morreu há séculos. Lembra-se disso? – O deboche usado por ele lhe atingiu em cheio.

Valendo-se de todo o seu alto controle, procurou endireitar sua postura e readquirir a sua frágil expressão de segurança. Lançou-lhe um sorriso também debochado e seguiu caminhando para o salão.

- Eu descobrirei o que é! – Disse, mas ela não parou, embora estivesse suando frio e todo o seu corpo tremia. – E quando o fizer... Porei fim ao que quer que seja! – Foi a ultima coisa que ouviu assim que passou pela porta e ela se fechou atrás dela. Esgueirou-se pela parede para não ser percebida e também para que ninguém percebesse o quanto estava afetada.  Sentou-se na penúltima fileira de cadeiras e de lá assistiu o belíssimo trabalho de Anna Petrova e sua equipe que defenderam com maestria as três mulheres em julgamento.

E o que parecia ser um caso dado por vencido para a acusação, foi revertido graças a uma sequência de vídeos de segurança que mostraram que não foram as acusadas as responsáveis pelas mortes dos políticos russos. E esses vídeos foram conseguidos graças a toda a influência de Stella e seus contatos dentro da KGB. Foi gloriosa a vitória que secretamente era mais uma da Ordem contra o Martelo e nada poderia ser mais prazeroso do que ver a cara de revolta de Lamartine e seus homens quando a sentença foi dada. Porém, a alegria partilhada por Anna, Stella e Helena junto as agora inocentadas garotas do Pussy Riot não era plenamente partilhada por Delphine.

A ameaça em tom de promessa feita por Lamartine estava reverberando em sua cabeça. E a sua vã esperança de que o afastamento de Cosima e o retorno da plenitude de suas imortalidades, tivesse conseguido fazê-lo esquecer daquela questão, se foi por completo.

Ainda naquela noite, de volta ao hotel, estavam todas no salão de festas ocupado por elas em uma espécie de festa de comemoração. As moças cantavam várias de suas músicas, dando continuidade a um improvisado show que teve início ainda nas escadarias do tribunal para a multidão que protestava por elas e celebravam a absolvição.

- Você não está aqui! – Helena sentou-se junto a ela numa mesa mais afastada. – O que está bebendo? – Tomou o copo dela e provou de sua bebida. Tossiu diante da intensidade do teor de álcool, causando um leve sorriso em Delphine.

- Vodka Absolut Elyx! Das poucas coisas boas desse país! – Pegou seu copo de volta e bebeu o restante num gole só.

- Não sei como consegues beber dessa forma e sair daqui caminhando com exuberância.

- Das vantagens da imortalidade. – Serviu mais uma dose e novamente a bebeu de uma vez. – Me iludo achando que minha mente será entorpecida pelo álcool, mas não passa disso. Ilusões. – Desistiu de se servir novamente, depositando o copo emborcado sobre a mesa e se debruçou sobre ela apoiando-se em seus braços.

- O que ele lhe disse? – Foi direto ao ponto. Delphine apenas ergueu os olhos para a amiga e deu de ombros.

- Nada que eu já não esperasse, embora me enganasse achando que seria o contrário.

- Mais ilusões! – Helena disse.

- Ele não desistiu. Muito pelo contrário, ele continua procurando o motivo da perda de sua imortalidade. – Ponderou um pouco. – Da nossa! – Ergueu-se e passou as mãos pelos cabelos. – E estou pressentindo que ele está tramando algo.

- Você está dizendo que ele planeja algo contra Cosima? – Questionou com temor.

- Não exatamente contra ela, pois ele ainda não sabe exatamente do que se trata. Contudo... – Hesitou antes de dar voz ao seu mais concreto e urgente temor, como se temesse que assim ele pudesse se concretizar. – A publicação daqueles livros coloca um alvo gigantesco na testa dela. – Disse uma derrotada Delphine.

- Então não podemos deixa-la publicá-los! – Helena disse pondo-se de pé.

- Tarde demais! – Entregou seu celular para ela cuja tela mostrava o ultimo relatório enviado por suas agentes, dizendo que a primeira edição de um dos livros seria lançada em poucos dias. O e-mail trazia inclusive uma foto do que seria a capa do livro.

- Isso não pode acontecer. Precisamos fazer algo!

- Acredite, eu já tentei. Inclusive procurei comprar a porcaria da editora, mas fui recusada. E, sinceramente, isso só adiaria o problema, pois ela iria até outra, e outra... E qualquer uma delas os publicaria. – Baixou a cabeça como se sentisse o maior dos pesos sobre os ombros. – A porr* do texto dela é muito bom. Eu li. Droga Cosima, porque tinhas de ser tão boa? – Perguntou ao vazio.

- Vai desistir? – Uma incrédula Helena a questionou caindo sentada diante dela. A loira lhe olhou com a cabeça inclinada levemente e a expressão preocupada deu lugar a uma gélida dureza.

- Não mesmo! Agora que está tudo resolvido por aqui, irei de fato aos EUA. – Helena arregalou os olhos. – Preciso ter uma conversa séria com a Srta. Niehaus!

 

______

 

A belíssima capa dura da “boneca” de seu livro a encarava de forma quase inquisidora. Cosima estava experimentando um misto de sensações quase impossíveis de serem explicadas, pois alternava a alegria exuberante pelo lançamento de seu trabalho, mas ao mesmo tempo se sentia a pior das pessoas em estar fazendo aquilo.

Novamente se deixou levar pela emoção ao autorizar a publicação de seu trabalho. Estava profundamente magoada e ressentida após descobrir mais e mais mentiras engendradas por Delphine e suas irmãs. Elas foram capazes de inclusive interferirem em sua amizade mais antiga e, por muito pouco, não a estragaram definitivamente. E, apesar de Amanita deixar claro que a vontade de Delphine e da Ordem era de que aqueles livros não fossem publicados, ela mesma disse que a decisão cabia a Cosima e por não ser uma iniciada, não estava cometendo crime ou traição alguma.

Contudo, não era assim que enxergava. Parecia que estava sendo a pessoa mais sacana do mundo e, a despeito do entusiasmo exagerado de suas editoras e de seus amigos, ela não conseguia compartilhar com a mesma intensidade toda aquela alegria. Mas mesmo assim estava organizando uma festa intima para os amigos mais próximos, para comemorar com eles o sucesso prévio de seu livro.

Acabara de receber uma ligação de Samantha lhe informando que uma importante rede de livrarias havia encomendado uma quantidade significativa de exemplares de seu livro e inclusive haviam solicitado e oferecido o auditório  de uma de suas maiores lojas, a filial de São Francisco para o grande lançamento público. Todo esse sucesso devia-se a estratégia de divulgação das donas da Purple que tomaram o cuidado de enviar exemplares exclusivos para alguns críticos literários que conheciam...

 “Logo, no boca a boca, já havia sido criada uma verdadeira rede comentando e divulgando o quão bom era aquela obra que estava prestes a arrebatar os EUA e, quem sabe, o mundo.”

Aquelas exatas palavras de Melissa reverberavam na mente de Cosima e fazia a pouca comida que havia ingerido naquele dia revirar em seu estômago. Ajeitou seus óculos no rosto e tentou domar seu quase indomável cabelo que ousava desrespeitar seu comando e lhe fazia parecer que sempre estava acordando. E mesmo todos repetindo o quão linda ela estava, custava a acreditar.

- Onde vai querer esses cartazes Cos? – A voz de Scott a atraiu. Ele estava com rolos de cartazes que traziam estampada a capa de seu livro e uma foto sua que demorou dias para escolher.

- Deixe aqui atrás do balcão mesmo. – Indicou meio sem paciência.

- Como assim? – Izzy apressou-se e desenrolou um dos cartazes. – Essas lindezas têm de ficar a mostra em todos os lugares por aqui. – A mulher o esticou contra uma das paredes.

- Nem pensar Izzy! Deixe isso para os lançamentos oficiais. Hoje a noite será algo mais intimo. Algo do meu jeito ok? – Tomou o cartaz da mão da amiga gentilmente.

- Sua modéstia sempre foi um dos seus piores defeitos. – A amiga deu de ombro.

- Tudo bem... Mas não quero tanto reboliço por isso. Além do mais não quero atrapalhar os clientes. – Falou de forma séria e incisiva e indicou com o olhar as pessoas que lotavam o Rabbit Hole naquele inicio de tarde de sábado. Mas demorou seu olhar nas duas mulheres que estavam sentadas próximas a janela e retribuíram o olhar. Eram Anne e Ingrid, que apesar de tudo, permaneceram por perto, mesmo a contragosto de Cosima, mas essa sabia que não poderia obrigar as mulheres a irem embora. Sem contar que, além delas e de Amanita, mais ninguém sabia quem elas realmente eram. Então seria estranho para os demais o afastamento repentino das duas.

- Boa tarde a todos! – As vozes de Amanita e Nomi se fizeram ouvir.

- Esse lugar está ficando incrível Cos! Não vejo a hora de ler seu livro. – Nomi a beijou na testa e acariciou a capa do livro sem as páginas. Cosima e Amanita trocaram olhares significativos, mas não disseram nada.

- A que horas mesmo começara hoje à noite? – Nita quis desconversar.

- Por volta das 22h. – Respondeu. – Pretendo fechar o café um pouco antes para os clientes e depois ficaremos só nós.

- Ansiosa para ouvi-la cantando novamente! – Nomi suspirou.

- Só se dessa vez você cantar comigo! – Devolveu o gracejo a amiga.

- Só se você desejar assustar a todos. – Amanita brincou e provocou sua noiva e logo todos riram.

- Ei Cos, cuidado para não perder a hora de sua entrevista. – Scott gritou da cozinha.

- A entrevista é hoje? – Nita surpreendeu-se e ficou verdadeiramente preocupada, tanto que foi inevitável não virar e fitar as duas mulheres que estavam atentas a toda aquela conversa.

- Por favor, prometa que não será uma daquelas celebridades esnobes quando ficar famosa! – Izzy a abraçou pela cintura.

- Gente, é só uma entrevista para uma rádio local. Nada demais. – Disse se afastando e seguindo para seu apartamento sendo seguida pelas amigas.

- Por enquanto! Assim que seu livro for lançado, o céu será o limite minha amiga. – A empolgação de Izzy não era compartilhada por Cosima, que apenas riu sem graça. Trocou de roupa em poucos minutos.

- Ei...

- Sim Cos, te damos carona até a rádio. – Nita respondeu já antevendo o que a amiga pediria. Funcionava assim entre elas.

- Posso pedir carona também? – Izzy se intrometeu.

- Claro! – E logo as quatro estavam descendo as escadas e passaram por Anna e Ingrid que estavam próximas ao balcão pagando a sua conta. Cosima as olhou e suspirou pesadamente, pois sabia que elas pretendiam segui-la para a sua segurança.

- Estamos indo Scott! – Cosima anunciou ao amigo que colocou a cabeça para fora da cozinha.

- Deixe tudo aqui comigo. – O rapaz respondeu sorridente.

- Só devo retornar no início da noite ok? – Ele sorriu para ela.

- Boa sorte na entrevista.

- Sei que ela irá arrasar. – Nomi massageou seu ego.

As quatro mulheres saíram rindo dos comentários espirituosos de Izzy acerca da suposta fama de Cosima, que estava mais interessada na movimentação de Anna e Ingrid que acabaram de entrar em seu carro e foram embora, indicando que talvez não fossem segui-la. Achou aquela atitude muito estranha. Olhou ao redor e a movimentada avenida não lhe permitiu ver muita coisa, mas ainda assim teve aquela desagradável sensação de estar sendo observada.

- Ei Cos... A Shay não virá para a comemoração de hoje à noite? – Izzy perguntou já entrando no carro.

- Virá sim. Ela saiu hoje bem cedo. Antes mesmo de eu acordar e me deixou um bilhetinho. – Sorriu do gesto da mulher.

- Shay é uma amante a moda antiga. – Nomi suspirou.

- Ela só poderá chegar à meia-noite, pois terá plantão hoje. – Cosima disse finalmente entrando por ultimo no carro para que ele partisse logo em seguida. Fizeram a volta quando o sinal fechou e passaram bem rentes a um Jeep preto de vidros fumê.

Assim que o carro delas se afastou e dobrou a dois quarteirões depois, a ocupante do Jeep preto desceu do carro, permitindo que o sol lhe esquentasse a face.

Delphine retirou os óculos escuros e os depositou no topo da cabeça. O calor do verão de São Francisco a obrigou a retirar a jaqueta de camurça marrom que usava, deixando a mostra uma leve camiseta branca sobre calças jeans claras. Espreguiçou-se um pouco e tomou um susto quando um jovem tropeçou nos próprios pés, caindo sobre um canteiro de trepadeiras. Tudo porque o rapaz foi mais uma vitima do efeito Cormier. Mas ela não lhe deu muita atenção, apenas atravessou a rua quando o trânsito parou e ficou de pé, diante da vitrine do Rabbit Hole.

Permitiu-se demorar bastante tempo ali admirando, pensando ao certo se deveria ou não entrar. Havia chagado à cidade na noite anterior e estava criando coragem para procurar Cosima. Havia deixado a Europa segura do que deveria fazer, resignada em sua decisão de ser dura e severa com aquela mulher, na tentativa de dissuadi-la da ideia de alardear ainda mais sobre a Ordem. Mais do que já fizera. Contudo, assim que chegou, fez questão de ir direto até ela, mas assim que a viu através da vitrine, perambulando entre as mesas, sorrindo e sendo gentil com as pessoas, toda a certeza que carregava consigo veio por terra.

Bastou a simples visão dela, ali tão perto, com apenas um vidro as separando para tudo voltar como uma enxurrada. Todo o ódio e o orgulho pareceram lembranças distantes, diante do poderoso amor que fez o seu coração voltar a bater descompassado. Mal conseguia se lembrar do que realmente fora fazer ali, pois a alegria de voltar a vê-la era maior do que qualquer outra coisa. Porém, não conseguiu entrar e mais uma vez fugiu. Tão somente para passar a noite em claro e retornar nas primeiras horas da manhã para ficar ali, a observando de longe.

Vê-la sorrindo... Tão diferente, com um novo visual lhe pareceu algo estranho inicialmente, mas era ela. O seu grande amor ainda mais radiante e linda. Assim que voltou a se aproximar dela pôde sentir algo estranho, algo mudando dentro de si e sabia exatamente o que era. E ali, parada novamente diante do café dela, hesitou, contudo precisava se sentir mais próxima dela e finalmente decidiu entrar.

O tilintar do sininho que ficava no topo da porta de entrada, anunciou sua chegada, mas o que normalmente passava desapercebido por todos, dessa vez foi diferente. Cada uma das pessoas presentes ali, sem exceção, foi atraída por ela causando-lhe um estranho embaraço. Parecia que todos sentiam que estavam na presença de alguém sobre-humano e aliado a essa aura quase sobrenatural havia a beleza absurda dela.  Quase em sincronia, todos suspiraram e foram acordados de seu transe pelo estridente barulho de metal chocando-se contra a pedra. Scott havia derrubado a bandeja com alguns pratos e talheres bem diante de Delphine.

- Você está bem? – Ela debruçou-se para ajuda-lo.

- Eu... Eu... – Ele ajustou os óculos no rosto e procurou se recompor. Ela o ajudou a recolher as coisas espalhadas e a se levantar. – Posso lhe ajudar em algo? – Esforçou-se para articular palavras coesas.

- Eu... Gostaria de um café. – Mentiu. – Ouvi dizer que esse é um dos melhores cafés da cidade. Mas vejo que estão lotados.

- De maneira nenhuma. Tem um lugar ali no balcão... Caso esteja sozinha... Está sozinha? Está esperando alguém? – O atabalhoado Scott estava conseguindo fazer Delphine rir, o que só piorou o estado do rapaz que suspirou deslumbrado diante do sorriso dela.

- O balcão me parece muito bom. – Disse educadamente e o seguiu, passando por entre as mesas e novamente capturando a atenção de homens e mulheres por onde passava. Observava atentamente o lugar, podia ver Cosima em cada detalhe daquele ambiente. Cada quatro, luminária, toalhas de mesa, cortinas... Tudo lhe remetia a ela e aquilo lhe proporcionou um prazer doído. Era quase como se pudesse senti-la em cada pedacinho daquele lugar.

- Nosso cardápio. – O jovem lhe entregou o encarte de papelão reciclado e de muito bom-gosto. Ela o segurou e foleou admirando o capricho empregado nele, assim como tudo naquele lugar. Era realmente acolhedor, charmoso e agradável. Pensou em tomar um chá gelado devido ao forte calor, mas o cansaço da noite mal dormida lhe indicava que precisava de uma boa dose de cafeína.

- Acho que vou de um bom spresso duplo para começar. – Sorriu. Scott entreabriu a boca para responder, mas só conseguiu concordar com um aceno de cabeça e encaminhar o pedido para a jovem que comandava a máquina de café.

Delphine sentiu seu estômago reclamar assim que chegou a sessão de guloseimas daquele cardápio. Olhou cada uma das opções e escolheu um sanduiche de queijo brie e salame italiano. Riu intimamente das memórias que lhe trouxeram. Completou seu pedido assim que recebeu seu café. Quando o rapaz foi até a cozinha, revelou que atrás dele havia uma porta que estava aberta, mostrando uma escada. O sorriso causado pelo jeito desajeitado do rapaz sumiu de seu rosto e ela foi arrebatada por uma vontade descomunal de subir aqueles degraus.

Sabia que não deveria. Que era errado, mas cada fragmento seu ansiava por Cosima, por voltar a senti-la e sabia que aquela escada lhe levaria até um pouco mais dela.

Debruçou-se sobre o balcão e viu pela janela da porta que Scott estava ocupado preparando o seu pedido e o de outras pessoas. Olhou por sobre o ombro e percebeu que ninguém mais prestava atenção nela. Sorrateiramente esgueirou-se contornando o balcão e ultrapassou a porta, deixando o burburinho do salão cada vez mais para trás.

Olhou para seus pés e... 

(play na música)

 

Eu fui à sua casa
Subi as escadas
Abri sua porta sem tocar a campainha
Atravessei o hall
Entrei no seu quarto onde podia sentir seu cheiro

E eu não deveria estar aqui
Sem permissão
Não deveria estar aqui

Você me perdoaria, amor, se eu dançasse no seu chuveiro?
Você me perdoaria, amor, se eu deitasse na sua cama?
Você me perdoaria, amor, se eu ficasse a tarde inteira?

Eu tirei minha roupa
Coloquei seu roupão
Mexi nas suas gavetas
E encontrei seu perfume
Fui ao seu “covil”
Achei seus cds
E toquei seu Joni

E eu não deveria ficar por muito tempo
Você poderia voltar para casa logo
Não deveria ficar por muito tempo

Você me perdoaria, amor, se eu dançasse no seu chuveiro?
Você me perdoaria, amor, se eu deitasse na sua cama?
Você me perdoaria, amor, se eu ficasse a tarde inteira?

Eu queimei seu incenso
Eu sai do banho
Eu reparei num bulhete que estava na sua escrivaninha
Ele dizia:
"Oi, amor.
Eu te amo tanto, amor.
Encontre-me à meia-noite."

E, não, não era minha letra
Seria melhor eu ir logo
Não era minha letra

Então me perdoe, amor, se eu chorar no seu chuveiro
Então me perdoe, amor, pelo sal na sua cama
Então me perdoe, amor, se eu chorar a tarde inteira.

 

Com o corpo tremulo e o rosto lavado de lágrimas, Delphine soltou aquele bilhete e se envergonhou! Não devia estar ali, sentiu-se como uma invasora. E a dor que parecia estar adormecida em seu peito, voltou com tudo. Tropegamente desceu os degraus. Precisava desesperadamente sair dali, necessitava de ar.

Passou pela porta e não viu Scott, ainda percebeu que o seu pedido lhe esperava sobre o balcão, mas nem se quer o tocou. Queria sair dali, pois sentia como se fosse desmoronar a qualquer momento. Sacou seus óculos escuros e os enfiou no rosto, tentando camuflar seu estado. Passou apressadamente pelas mesas e pelas pessoas e quase esbarrou com o rapaz, que tentou chamar sua atenção, dizendo que o pedido dela estava pronto, mas pareceu não ser ouvido.

Sob um esforço hercúleo, Delphine saiu do Café e ficou respirando pesadamente, como se tivesse dificuldade para buscar o oxigênio que precisava. Lançou-se na avenida sem nem esperar que o trânsito parasse e escapou de ser atropelada algumas vezes, recebendo duros xingamentos e buzinas furiosas.

Finalmente alcançou seu carro e mergulhou dentro dele. Assim que a privacidade dos bancos de couro e das portas blindadas lhe envolveram, permitiu-se ser sacudida pelo mais copioso dos choros.

- Cosima... Meu amor... – Sussurrou repetidas vezes em meio aos soluços que lhe sacudiam o corpo e a alma. E naquele estado permaneceu por horas. Completamente dilacerada pela dor que lhe confrontava, que lhe mostrava seus erros, sem piedade. Os sacrifícios, as perdas... Então não mais aguentou e sucumbiu.

 

______

 

Aplausos calorosos festejavam o final de mais uma música tocada pela dupla de cantores que se apresentavam esporadicamente no Rabbit Role e que acabaram de conseguir um contrato para gravar o primeiro álbum deles com uma pequena gravadora.

- Obrigada Joey e Matt! E parabéns pelo álbum – Amanita, que como de costume fazia às vezes de mestre de cerimônia, agradeceu aos amigos que acabaram de encantar a todos com o seu talento ao melhor estilo folk rock. – Mas agora, eu gostaria de chamar a nossa mais nova celebridade para que nos brinde com mais essa faceta de seu talento. Cos? – Chamou a amiga que estava sentada numa mesa entre sua mãe e Shay. Sob gritos de entusiasmo da plateia composta por todos os seus amigos mais chegados, ela foi até o pequeno palco.

- Oi gente... Mais uma vez eu gostaria de agradecer a presença de todos nessa noite. – Disse timidamente enquanto encarava as suas botas de canos curtos e saltos médios. – Alguns de vocês sabem o que estamos celebrando hoje à noite, mas para muitos de vocês ainda é uma surpresa. – O baterista que acompanhava as apresentações simulou o som de tambores tocando, aumentando o clima de ansiedade. Cosima sorriu da expressão das pessoas presentes e esticando o braço pediu a Melissa que lhe entregasse algo. – E... É isso! – Ergueu o primeiro exemplar finalizado de seu livro. Um sussurro partilhado por todos se fez ouvir e foi seguido por aplausos e assovios. – Esse aqui é meu! – Abraçou seu livro e o encarou por alguns segundos.

- Mas em poucos dias todos poderão comprar o seu! – Samantha se ergueu e anunciou, causando risos empolgados de todos.

- Pois é gente... Finalmente saiu o meu livro sobre A Ordem do Labrys! – O depositou com cuidado sobre o caixa de som ao lado. – E como prometido... – Sentou-se num banquinho de madeira e sacou seu violão que descansava em um suporte. – Vou retribuir o carinho de vocês. – Ajustou a afinação do seu instrumento enquanto se permitiu, pela primeira vez, sentir a plenitude da felicidade de ter conquistado algo que tanto desejou. Desde que decidira publicar seus escritos sobre a Ordem que enfrentou dilemas internos constantes, mas ali, diante do fruto de seu trabalho e em frente a alegria e orgulho dos amigos, finalmente se sentiu leve. Nem mesmo a tempestade tropical que despencava do lado de fora, seria capaz de abalar seu ânimo.

Olhou para o rosto de todos os amigos queridos, Scott, Izzy que trouxe seus dois companheiros Emma e Jack com ela. Sua mãe estava radiante de orgulho ao lado de Shay que sorria também orgulhosa dela. Samantha e Melissa somavam-se à plateia que ainda contava com Nomi e Amanita, além de Anne e Ingrid. Cosima deixou sua mente viajar e lembrou-se dos amigos que deixou no velho continente. Havia falado com Marc e Amélia há pouco contando a novidade e ficou feliz ao saber que eles estavam tentando ir para o lançamento oficial do seu livro.

E então foi inevitável lembrar-se dela. Fantasiou em sua mente romântica que, se o mundo fosse um lugar diferente, Delphine poderia estar ali, festejando com ela. Partilhando da sua alegria e não do outro lado do oceano, vivendo num universo perigoso e repleto de mistérios. Sentiu uma pontada em seu peito.

“Você poderia estar aqui...” Pensou enquanto iniciava os acordes da música que havia escolhido e que não tocava há muito tempo.

I hear the clock, it's six a.m.

I feel so far from where I've been

Got my eggs and my pancakes too

Got my maple syrup, everything but you


 

Break the yolks, make a smiley face

I kinda like it in my brand new place

I wipe the spots off of the mirror

Don't leave the keys in the door

Never put wet towels on the floor anymore

'cause

 

Muitos a acompanhavam cantarolando o refrão daquela balada e se divertiam enquanto ela entoava com maestria a letra da música que possuía uma clara mensagem inconsciente.

(...) Dreams last for so long

Even after you're gone

I know you love me

And soon you will see

You were meant for me

And I was meant for you (...)

 

 Todos estavam tão envoltos no agradável ambiente que nem se deram conta do tilintar do sino da entrada anunciando a chegada de algum retardatário para a festa. Foi então que bruscamente foram surpreendidos por um erro grotesco das notas tocadas no violão e a súbita interrupção da voz de Cosima os alertou. Perceberam que ela estava paralisada, com os olhos arregalados e tinha todo o seu corpo tremulo. Buscaram o local onde ela olhava e viram aquela figura que perambulava lentamente por entre as mesas.

 Completamente encharcada, aquela mulher deixava pequenas poças de água por onde passava e caminhou entre as estarrecidas pessoas, muitas sem compreender de fato do que se tratava. Parou há poucos metros do palco e afastou mechas de cabelos molhados de seu rosto, revelando a sua expressão desolada.

 - Oi Cosima... – Delphine disse com voz vacilante e tudo ao redor delas perdeu a importância.

 

 

 

[1] Mais conhecido por seu ativismo do que pela música, o coletivo de artistas foi formado em 2011, já com o objetivo de misturar arte e política em vídeos e performances rápidas, na maioria das vezes, não autorizadas. As integrantes geralmente se apresentam com os rostos cobertos por balaclavas, espécie de touca ninja. Na música, o Pussy Riot diz se inspirar principalmente em bandas inglesas de punk rock e no movimento feminista americano Riot Grrrl, surgido nos anos 1990.


Fim do capítulo

Notas finais: Your House (Alanis Morrissete): https://www.youtube.com/watch?v=qIwFsYyroJ0 
You Were Meant for Me (Jewel): https://www.youtube.com/watch?v=zrK-IxLv-LU

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Comentários para 56 - Capítulo 56: Your House (Sua Casa):
patty-321
patty-321

Em: 05/08/2018

 meu coração falhou uma batida. Caraca. E agora? Frente a frente. Quantas emoções.

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LeticiaFed
LeticiaFed

Em: 01/08/2018

Boa noite. Encontrei sua história ha menos de uma semana e resolvi começar a ler despretenciosamente, estava ja bastante adiantada e me chamou atenção.  Pois foi uma super agradável surpresa a qualidade da escrita e o enredo. Estou ainda no capítulo 38, retornando sempre que tenho um tempinho (e os capítulos são grandes, uma maravilha!), mas quis lhe escrever logo para dar um retorno. Parabéns! Mesmo! Vi que é uma fanfic, não sei de onde exatamente, mas ja me parece melhor que o original, seja la qual for rsrsrs

Enfim, elogios à parte, vi que começou a ser escrito em duas mãos, e agora vc segue sozinha. Espero que apenas o primeiro de muitos outros contos. Uma ótima semana, torcendo pelo próximo capitulo (embora ainda tenha varios ineditos pela frente rsrs). Beijo!


Resposta do autor:

Nossa, esse tipo de descoberta é sempre melhor não é mesmo? Torna a experiência mais surpreendente. 

E sim, tenho me esforçado para manter os capítulos mais extensos, me atendo a detalhes. E agradeço mesmo teres me escrito, pois é sempre muito bom receber o retorno de quem lê. Ajuda a indicar se estou no caminho certo. E vejo que sim rs...

É uma fanfic sim, mas que tem pouquissima coisa a ver com a série original (Orphan Black que é sensacional) dela só peguei mesmo as protagonistas da minha história e alguns poucos personagens para ilustrar a estória. Caso queiras papear mais sobre a fic e a série, segue o meu face para adicionares:

https://www.facebook.com/profile.php?id=1223930183

Sim, acredito que já estás lendo só meus capítulos. E fico feliz que vocês não me abandoram rs...

Se virão outros? Espero muitíssimo que sim. Meu sonho seria poder viver só da escrita...

Um xêro e muito obrigada pelo carinho.

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EriOli
EriOli

Em: 31/07/2018

FANTÁSTICO... Seu enredo é maravilhoso! E obrigada por nos presentear com algo tão bom, quanto surpreendente, além de lindo!

Há braços

P. S.: Espero ansiosamente pela continuação!


Resposta do autor:

Gratíssima pelos elogios e pelo carinho. 

Quis escrever algo que eu gostaria de ler rs... Estava meio que cansada de mais do mesmo.

E a continuação já está a caminho.

Xeros.

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