Capítulo 2
- Marina -
Na quarta-feira eu cheguei à agência com a cabeça praticamente explodindo de tanta dor de cabeça, consequência de uma reunião infindável e uma noite mal dormida. Tudo o que eu mais queria era entrar em minha sala e tentar relaxar um pouco, porém, eu sabia que assim que colocasse os pés na agência Verônica viria falar comigo, me cobriria de perguntas e claro um milhão de cobranças.
Não sei onde estava com a cabeça quando me deixei seduzir por aquela mulher. Mas não pude resistir, Verônica apareceu em minha vida em um momento completamente difícil pra mim, na mesma época em que Larissa, minha ex-noiva me trocou por um almofadinha da alta sociedade, filho de um bancário. Verônica estava sempre por perto, sempre me oferecendo seu ombro, cheia de palavras de carinho e cuidados. Isso mesmo que eu ainda não tivesse permitido a sua entrada em minha vida de um modo pessoal, na época ela era apenas uma colega de trabalho, funcionária da JUMP, e na minha vida ela tinha espaço apenas se viesse tratar comigo algo da agência.
Mas a verdade, é que no momento em que deixei transparecer a minha fraqueza e minha tristeza, eu havia sim permitido a aproximação de Verônica de uma forma diferente. Eu nunca havia olhado para ela com olhos de cobiça ou desejo até um dia que ela me beijou enquanto eu estava deitada em um sofá em minha sala de olhos fechados. “Você não precisa sofrer assim, você merece algo melhor, e tudo o que eu quero é uma chance de estar ao seu lado de uma forma diferente, porque eu estou completamente apaixonada por você Marina!” – Lembro-me de tê-la ouvido falar momentos antes de voltar a me beijar, e eu no alto da minha carência, cansada de chorar e sofrer por quem não queria nem mesmo um resquício do meu amor, me entreguei aquele beijo.
Nunca errei tão feio em minha vida como naquele dia em que aceitei ser beijada e beijei Verônica. Após aquele dia, passamos a sair, e aos poucos eu fui deixando que ela entrasse de vez em minha vida, mas isso não sem antes ser completamente sincera com ela.
Deixei tudo claro, avisei que meu coração ainda estava ocupado, por uma pessoa ingrata, mas ainda sim ocupado, e que eu ainda era completamente apaixonada por minha ex-noiva. Eu perguntei se ela queria estar comigo mesmo que eu não pudesse oferecer o que ela queria, se ela aceitaria estar com uma pessoa que amava outra. Ela apenas me disse que queria tentar, que não me cobraria nada mais do que eu já estivesse oferecendo, mas, que queria tentar.
Sendo assim, entramos em relacionamento aberto, não pertencíamos uma a outra, isso era injusto eu sei, mas era só isso que eu podia oferecer.
Nunca fiquei com nenhuma outra mulher, mesmo que meu relacionamento com Verônica fosse aberto, eu nunca me interessei por nenhuma outra. Eu não tinha cabeça pra nada, ou melhor, pra mais ninguém que não fosse Larissa.
Várias mulheres se aproximaram de mim com outras intenções, no entanto, nenhuma tentativa foi bem sucedida, nunca fui alcançada.
Eu não queria saber de mais ninguém, a única que eu havia deixado se aproximar de um modo diferente foi aquela que me oferecia amor em troca de migalhas, que me aceitava até mesmo pela metade, Verônica!
Após mais de dois anos eu já tinha superado Larissa, ainda mantinha aquele relacionamento sem pé nem cabeça com Verônica, eu não conseguia me desvencilhar dela, me sentia presa a ela, mas eu sabia que no fundo isso era apenas medo de um dia me apaixonar por outra pessoa e sofrer novamente. Eu não sentia nada por ela, nada além de desejo e tesão, e isso fazia com que eu me sentisse completamente errada, suja e egoísta.
Tinha consciência de que eu estava a prendendo a mim, mantendo-a perto de mim por puro egoísmo, eu jamais sentiria nada que pudesse ser comparado ao que um dia senti por Larissa, era inútil tentar, e ela sabia disso. Durante todo aquele tempo Verônica nunca deixou de alimentar aquele sentimento.
Com o tempo as coisas foram mudando, eu não via mais aquela Verônica carinhosa, cheia de cuidados, e compreensiva, ela havia mudado bastante. Nunca juramos amor uma a outra, ela sabia exatamente o que sentia por ela, ou melhor, o que eu não sentia por ela, mas ela se sentia com direitos sobre mim, me cobrava, tinha ataques de histeria quando uma mulher se aproximava de mim, chegava a ligar umas 20 vezes ao dia quando eu não estava na agência. Queria saber onde eu estava 25 horas do dia, meu celular não podia descarregar que ela enlouquecia, e tinha ciúmes de uma forma doentia até de minha própria sombra.
A paixão que ela um dia sentiu acabou se tornando em obsessão. E o que me destruía era pensar que talvez tenha sido eu a criar aquele “monstro”. Afinal, foi eu que despertei aquela obsessão ao aceitar aquele relacionamento. Ela me queria, e me queria por completo, e por mais que eu tivesse tentado no último ano me apaixonar por ela, não funcionou, e eu não tinha como forçar aquilo.
Meus amigos, Juliano, Pablo e também Nanda – amiga e minha secretária - sempre tentaram abrir meus olhos para aquela loucura que eu estava vivendo. Diziam que Verônica era maluca, havia se tornado obsessiva de forma doentia, e eu, de certa forma estava alimentando isso.
Aquela estória já havia ido longe demais, eu não poderia mais me esconder atrás daquela confusão por medo. Eu deveria colocar um fim nisso, já havia passado da hora.
Minha agência quase foi ao chão no dia em que acabei me precipitando e no meio de uma discussão apressei as coisas e terminei tudo. Ela esbravejava, me batia, gritava, chorava, me xingava, rogava pragas e mais pragas contra mim, e no final saiu batendo a porta da minha sala dizendo “Isso não vai ficar assim Marina, você é minha, eu não vou te deixar tão fácil assim, eu ainda te amo, e você vai ver que também me ama!”
Pensei que ao terminar tudo, as coisas melhorariam, àquela obsessão toda cessaria e ela entenderia de uma vez por todas que nós duas não tínhamos nenhum futuro, que o melhor para nós duas, era cada uma seguir com a sua vida. Mas as coisas não foram bem assim, tudo ainda era um tormento...
Quando cheguei ao estacionamento da empresa, ainda era um pouco cedo, não estávamos em horário de expediente, mas o carro de Pablo, meu querido amigo – sempre pontual – já estava lá, inclusive, o carro dela, de Verônica. Eu já imaginava o que estava por vir, só me restava me preparar para mais um desgastante embate com ela.
Entrei em minha sala, sentei em minha confortável cadeira, suspirei, olhei para a porta e contei exatos dez segundos.
-- Você pode me dizer onde você estava ontem a noite que não atendia a droga do seu celular?
Pronto! Tive apenas 10 segundos de paz e jamais teria a chance de relaxar, o furacão Verônica havia acabado de entrar em minha sala, com um rompante e já esbravejava enquanto me olhava com fúria.
-- Verônica, por favor, bata antes de entrar, já conversamos sobre isso. Existem dois lados, o profissional e o pessoal, e você precisa aprender a separar. – falava calma, de forma suave - E ontem, eu estava em uma reunião com os clientes de Washington, você deveria saber disso já que também tem acesso a minha agenda de compromissos da empresa, não?
-- Não tente me enrolar, não fiquei sabendo de nenhuma reunião! Você está mentindo pra mim, estava com alguma biscate em seu colo, isso sim! – sua voz começava a se alterar ainda mais.
-- Eu estava em uma reunião Verônica, eu não estava com ninguém, a não ser que a “biscate” a quem você se refere seja algum dos executivos de Washington.
-- Não tente me enrolar Marina! – dessa vez ela gritou. – Você estava me traindo! – gritou arremessando a agenda que tinha nas mãos em minha direção. Desviei abaixando-me sobre a mesa.
Olhei para a loira a minha frente completamente incrédula. Assim como ela, levantei em um rompante, aquilo acabou com toda a paciência que eu havia reservado para todo o meu dia.
-- Chega! – gritei.
Ela arregalou os olhos diante de minha atitude, acho que essa foi a primeira vez que eu gritei com ela, nunca havia levantado a minha voz, sempre fui calma ao falar com ela, aliás, sempre fui calma a falar com qualquer pessoa. Tudo tem um limite, e eu já estava chegando ao meu, estava cheia das cobranças e dos ataques dela, ela não tinha esse direito, não tínhamos mais nada, assim como eu não tinha nada com ninguém. Eu já estava cansada de tudo aquilo, e a minha dor de cabeça não estava ajudando no meu humor.
-- Chega Verônica. – falei tentando me controlar – Saia da minha sala, por favor.
-- Meu amor você tem que entender que eu te amo, e...
-- Por favor, saia! – disse apontando a porta enquanto falava um pouco mais alto e firme.
-- Isso não fica assim Marina, não fica! – saiu pisando duro e batendo fortemente a porta.
Levei as minhas mãos a cabeça, minha dor de cabeça que já estava insuportável, aumentou uns 10% ao discutir com Verônica, mais 10% ao ter que gritar com ela e mais uns 10% quando bateu aquela porta fazendo o barulho ecoar no interior de minha cabeça.
-- Nanda, será que você pode me trazer um copo com água e algum remédio para dor de cabeça por favor? – pedi ao interfonar para minha secretária – Obrigada.
Nanda, era minha secretária desde o início da JUMP, ela sempre me acompanhou de forma fiel, sempre foi uma excelente profissional, nunca precisei chamar a sua atenção, e de uma funcionária brilhante, ela passou a ser também minha amiga, a quem eu me confidenciava e chorava em seu colo.
Ela tinha quase a mesma idade que eu, ela tinha 34, e eu 31, sabia de tudo da minha vida, inclusive minha orientação sexual, o que nunca a assustou ou fez com que algum dia chegasse a me olhar de uma maneira diferente, fosse como sua chefe, ou como sua amiga. Ela era mãe do pequeno João Pedro de 2 aninhos de idade, um garotinho totalmente alegre, sapeca, e carinhoso. O pequeno era meu afilhado. Fiquei muito feliz quando Nanda me fez o convite, senti-me honrada.
Em menos de dois minutos, Nanda entrou em minha sala, com a uma expressão que transparecia preocupação, e nas mãos uma pequena bandeja que continha um copo de água e um frasco de remédio.
-- Mais uma discussão com aquela louca? – perguntou ao me entregar o copo e um comprimido.
-- Mais uma pra coleção. Eu não sei mais o que fazer com ela.
-- A demita oras! Tire-a de uma vez da sua vida.
-- Não é tão fácil assim Nanda, apesar dessa loucura toda que ela tem por mim, ela é uma boa pessoa, eu me sentiria a pior pessoa do mundo se a demitisse sem um bom motivo. Quer dizer, eu me sentiria pior ainda, já me sinto péssima.
-- Um bom motivo você já tem Marina, ela já está passando dos limites misturando as coisas. Aqui, você é a presidente da agência, é a chefe dela. Qualquer dia todo mundo aqui nessa agência vai ficar sabendo dessa estória de vocês, por que ela não faz questão nenhuma de falar baixo, aliás, ela só grita!
-- Não sei como fazer isso Nanda, ela é uma ótima funcionária, é a minha coordenadora quando me ausento, não seria tão prático assim, eu teria que treinar outra pessoa, e isso levaria muito tempo já que ela conhece tudo aqui dentro. – suspirei.
-- Cuidado com ela Marina, essa mulher é louca e está ficando cada vez mais louca. Procura logo uma outra pessoa pra ser sua coordenadora, e a demita, ou pelo menos mande ela pra outra filial, de preferência bem longe daqui.
-- Acho que vou ter que começar a fazer isso, ao menos adotar como uma possibilidade real. Por falar em demissão e treinamento, como anda os testes dos candidatos a publicitário?
-- O Pablo chegou hoje cedo pra dar mais uma olhada nos portfólios e escolher os que vão para a próxima etapa.
-- Juliano já chegou?
-- Ainda não.
-- Você pode me avisar assim que ele chegar? Quero participar da escolha dos portfólios e quero que ele também participe.
-- Aviso sim. Precisa de mais alguma coisa? – ela deixava o lado amiga para assumir o lado profissional.
-- Não. Obrigada Nanda.
-- Por nada. Licença! – ela já caminhava na direção da porta quando voltou-se para mim novamente – E por favor, procure imediatamente um sucessor para o lugar de Verônica, ou isso vai acabar em uma coisa bem pior.
Engoli a seco quando fiquei sozinha em minha sala. Meus amigos estavam certos, eu tinha que afastar de vez aquela mulher de mim, ou aquilo acabaria da pior forma possível.
Era meio negativo pensar dessa forma, eu sei, mas não dava pra fingir que isso jamais poderia acontecer. Jornais e mais jornais estavam cheios de estórias de obsessão que acabavam mal, fosse em algum tipo de tragédia ou não.
Verônica ainda estava de uma forma contida, mas com o passar do tempo a tendência era só piorar. “Meu Deus o que foi que eu fiz?” – me perguntei ao fechar os olhos e recostar em minha cadeira. Minha cabeça parecia abrigar uma escola de samba durante um ensaio, ela doía cada vez mais. Me deixei ficar desse jeito por algum tempo, e não teve outra, o sono que acumulei depois da noite exaustiva de ontem acabou me vencendo e eu acabei adormecendo.
Não sabia precisar quanto tempo eu dormi, mas despertei quando senti alguém tocar meu rosto. Eu não abri os olhos, tive medo de abri-los e dar de cara com Verônica parada bem perto de mim. Não consegui reconhecer o toque, não sabia quem estava em minha sala, só sabia que era um toque suave, tão suave que acabou me fazendo dormir novamente.
Acordei novamente com o telefone de minha mesa tocando, era o ramal do Pablo. Ainda meio sonolenta olhei o relógio em meu pulso antes de atender o telefone, marcavam 10:30hs. Nossa, dormi por mais de duas horas!
-- Oi Pablo.
-- Desculpa te acordar dorminhoca, mas Juliano e eu precisamos de você aqui na sala, precisamos escolher os portfólios ainda hoje, e queremos a sua opinião quanto aos candidatos.
-- Foi você que veio a minha sala?
-- Tive pena de lhe chamar, eu seique não dormiu quase nada ontem, aqueles executivos são “osso duro de roer”, e...te conhecendo como eu te conheço sei que devia estar com a maior dor de cabeça.
-- Ainda bem que você me conhece!
-- Agora você pode deixar de papo pelo telefone e vir até aqui por favor? – perguntou com um risinho.
-- Claro! 5 minutinhos e já estou ai.
-- Ok presidenta! – desligou.
Ter dormido um pouquinho, me fez bem, minha dor de cabeça havia diminuído consideravelmente, e meu humor havia melhorado também. Fui até o banheiro de minha sala, passei uma água em meu rosto e retoquei a maquiagem. Peguei meu celular, passei por Nanda e pedi pra que anotasse qualquer recado, disse que estaria no celular somente se fosse caso de vida ou morte.
Caminhava no corredor na direção da sala de Pablo, quando vi que Verônica vinha no mesmo corredor em minha direção, apressei o passo para chegar logo à sala, não queria mais um embate que com certeza acabaria acontecendo, e na sala de Pablo ela jamais entraria, eles se odiavam imensamente.
-- Está fugindo de alguém? – perguntou Juliano quando adentrei a sala apressadamente sem nem mesmo bater.
-- Verônica? – Pablo perguntou de forma irônica.
-- Com certeza, quero evitar contato. – os dois suspiraram de forma pesada quando respondi.
-- Não queremos discutir aqui, então será que podemos ir direto ao assunto?
Eu assenti, e os dois que estavam sentados, Pablo em sua mesa, e Juliano na cadeira a frente da mesa se encaminharam para uma grande mesa que havia na sala, e eu os segui.
-- Ok, em que a minha humilde opinião pode ser útil?
-- Temos 12 candidatos e 2 vagas, certo? – assenti com um manear de cabeça - Bom, temos três candidatos que se encaixam no setor do Juliano, três que se encaixam no meu setor, e no seu setor temos quatro. O seu setor e do Juliano são os que precisam ser preenchidos com mais urgência, e esses foram os melhores portfólios que escolhemos, porém nem todos tem um bom currículo, com experiência entende? O que fazemos, escolhemos pela experiência, ou pelo trabalho em si? – perguntou Pablo.
-- Esses sete candidatos foram escolhidos somente pelo portfólio? – perguntei enquanto olhava um.
-- Sim, todos eles! – respondeu Juliano.
-- De quem é este aqui? – perguntei impressionada pelo portfólio que tinha acabado de abrir.
-- Deixe me ver. – disse Juliano com uma prancheta na mão – Giulia Monteiro! – disse olhado para mim.
-- Este foi escolhido?
-- Foi o primeiro que Juliano e eu escolhemos. Essa moça tem muito talento! E ela se encaixa perfeitamente em qualquer setor.
-- Não me importa a experiência dessa moça, eu a quero na próxima etapa! Ela tem talento, seus trabalhos trazem delicadeza, foco, alegria...e exatamente isso que preciso em meu setor. Podem passar os outros seis para a próxima etapa também, vejamos como eles se sairão no segundo teste. Precisamos de talento e não de experiência.
-- Ok, então vamos ligar para eles e pedir para que compareçam aqui amanhã. – disse Pablo.
-- Antes de ligarem para eles, podem me dar as fichas de cada um deles para que eu olhe?
-- Todas as fichas estão com Verônica. – disse Juliano.
-- Quem a incumbiu disso? – perguntei com os olhos arregalados.
Os dois rindo apontaram na mesma hora pra mim.
-- Droga! Tudo bem, vou pedir que Nanda busque as fichas com ela.
-- Faça isso o quanto antes Marina, eles precisam ser avisados ainda hoje. – disse Juliano.
-- Tudo bem. Qualquer coisa estarei na minha sala.
O meu intuito era de olhar somente a ficha de Giulia Monteiro. O trabalho dela era espetacular, queria conhecer um pouco mais dela, por onde passou, onde era formada. Só não podia dizer isso aos meus amigos, que com certeza iriam me questionar e veriam motivos irreais pelo meu interesse em Giulia Monteiro.
Fui para a minha sala, interfonei para Nanda e pedi para que ele pegasse as fichas dos candidatos. Nanda, eficiente como sempre, em menos de 5 minutos pediu licença e entrou em minha sala com todas as fichas em suas mãos.
A ficha de Giulia foi a primeira que peguei. Li minunciosamente sua redação, que aliás era perfeita assim como todas as artes que tinham em seu portfólio. Sua redação mostrava uma pessoa delicada, decidida, firme, inteligente, comunicativa entre outras coisas que eu pude “enxergar” apenas lendo a sua redação.
Li cada informação sua com o maior cuidado ea maior atenção, vi que ela não era do estado de São Paulo, era de uma pequena cidade do Ceará, havia trabalhado em uma gráfica durante um bom tempo, era formada em designer gráfico, e recém formada em publicidade, ou seja, não tinha experiência. Isso com certeza não me impediria de contratá-la.
Fui hipnotizada quando vi a sua foto na ficha, ela era novinha, mas extremamente linda. Fiquei impressionada com tamanha beleza. Passei um tempo olhando aquela foto, olhando para aqueles lindos olhos cor de mel, acompanhando cada traço de seu rosto com o dedo indicador.
-- O que tanto olha nessa pirralha? – Verônica falava parada a frente de minha mesa.
Estive tão distraída, tão impressionada com aquela menina que eu não havia nem percebido Verônica entrar em minha sala e muito menos ficar parada ali a minha frente me olhando, talvez até me chamando.
-- Estou olhando a ficha dela Verônica! – disse de forma séria.
-- Você está parada a um tempão olhando essa foto, não está olhando ficha nenhuma.
-- Estou olhando a ficha dela e apenas percebi que ela é uma garota muito linda.
-- Como é que é? Quem é linda Marina?
-- Verônica da um tempo tá bom? E aproveitando que você está aqui na minha sala, por favor liga para esses candidatos e peça para que eles venham até a agência na sexta feira no início da tarde para a segunda fase do teste.
-- Inclusive para a sua pirralha?
-- Minha o quê?
-- Estou falando dessa ridícula ai que você ficou admirando feito uma boba, quase de boca aberta. Se encantou com a garotinha foi?
Suspirei, contei alguns segundos e me detive para não gritar com ela novamente.
-- Apenas faça o que eu pedi, por favor.
Já tinha se tornado comum ela sair da minha sala daquele jeito, batendo a porta fortemente. Assim que ela saiu de minha sala me dediquei aos assuntos da agência até o horário do almoço. Como de costume sai para almoçar acompanhada de Juliano, Pablo e Nanda.
Almoçávamos e conversávamos animadamente enquanto minha mente ainda estava ocupada com a imagem da garota, de Giulia. A todo instante eu me pegava pensando dela, pensando em sua beleza, e claro, torcendo para que ela se saísse muito bem na segunda fase, como tinha feito até ali.
Seria muita loucura perder um talento como aquele, eu sabia em meu interior que aquela garota ainda iria longe, ela tinha tudo para brilhar, era um diamante que só precisava ser lapidado, e que dessem a ela a chance de mostrar todo o seu brilho. Isso é uma coisa da qual eu amo me gabar, eu enxergo diamantes brutos de longe, sei reconhece-los, e ela eu tinha a certeza absoluta de que era um deles.
Nanda estava nos contando sobre as artes do meu pequeno João Pedro, quando meu celular começou a vibrar em cima da mesa. Eu olhei o visor somente para confirmar, eu sabia quem estava me ligando àquela hora, só podia ser uma única pessoa.
-- É a Verônica não é? – perguntou Nanda.
-- A própria! – respondi após um suspiro.
-- Você não vai atender? – perguntou Juliano.
-- Claro que não! Ela quer saber onde estou, com quem estou, o que estou fazendo, que horas vou voltar...só isso.
-- Ela tá careca de saber que todo santo dia você almoça com a gente Marina! – exclamou Pablo com cara de enfado.
-- Essa mulher já está me dando nos nervos. – disse Nanda.
-- Eu vou providenciar a saída dela da agência, se vocês não aguentam mais, imagina eu.
Pablo me olhou com a maior cara de interrogação, então tratei de explicar.
-- Vou começar a procurar uma pessoa que possa substituí-la, vou treiná-la, passarei tudo para ela pra que ela possa assumir o lugar de Verônica tranquilamente.
-- E o que você vai fazer com a louca? – perguntou Juliano.
-- Vou manda-la para alguma filial.
-- Muito bem Marina, já estava na hora de tomar uma atitude que pudesse frear essa mulher louca. Lhe apoio completamente, o que precisar pra encontrar uma nova coordenadora pode contar comigo. O que eu quero é que você se livre dessa mulher o quanto antes, que viva a sua vida e que seja muito feliz. – disse Juliano todo sorridente.
-- Uma mulher como você merece uma mulher extremamente linda, gentil, inteligente, educada, que lhe ama muito e que te faça a mulher mais feliz desse mundo. – disse Nanda.
-- Você merece se apaixonar e amar novamente minha amiga, você merece a felicidade! – exclamou Pablo.
Era bom saber que meus amigos torciam por mim, me queriam bem, e cuidavam de mim como ninguém mais cuidava, como nem mesmo meus pais cuidavam. Eles me deram as costas quando me assumi lésbica, aliás, quando eles me pegaram aos beijos com uma colega de faculdade no meu quarto. Durante muito tempo escondi isso deles, escondi a minha orientação sexual justamente por saber que eles fariam o que fizeram, me deram as costas dizendo que eu não mais era a filha deles, e me jogando a própria sorte, sem dinheiro, sem ter onde morar, sem nada, apenas meus amigos, que me acolheram e me deram apoio e suporte. Mas isso só me fortaleceu, o que eles fizeram comigo fez com que eu jurasse pra mim que eu venceria na vida, que teria a minha própria empresa, e que eu viveria de meu trabalho, não precisaria jamais voltar com o rabo entre as pernas pedindo abrigo na casa deles.
Meu celular voltou a vibrar em cima da mesa, e mais uma vez era Verônica, era a 6 chamada dela que eu não atendia, e parecia que quanto mais eu ignorava mais ela insistia. Terminei meu almoço com meus amigos e voltei para a agência.
Passei a semana adiando, protelando aquilo, mas não deu mais, eu teria que viajar ainda hoje para Washington para tratar diretamente com o diretor de uma empresa com a qual fechamos um contrato recentemente.
Eu odiava viajar assim em cima da hora, e tinha mais um motivo para me lamentar, eu queria participar ativamente de todo o processo de seleção e contratação de Giulia, eu queria estar lá frente a frente com ela no dia de sua entrevista juntamente com Pablo e Juliano. Intimamente eu rezava para que desse tempo resolver tudo e voltar o quanto antes, de preferência a tempo do início da terceira fase dos testes.
Pedi para que Nanda comprasse minhas passagens de ida e volta, queria me resguardar, então pedi para que comprasse uma passagem de volta para sexta-feira de manhã, o voo mais cedo que tivesse.
Em uma pequena reunião tudo foi resolvido. Foi rápido, fácil e prático, eu já podia voltar para casa, e o melhor de tudo é que daria tempo de chegar para a entrevista de Giulia. Mas a minha surpresa não podia ser maior quando cheguei ao aeroporto e fui informada de que meu voo havia sido cancelado por problemas na pista. Totalmente contrariada liguei para Pablo avisando sobre o voo e dizendo que não chegaria a tempo, que ele desse continuidade nos testes.
Me hospedei em um hotel bem próximo ao aeroporto na tentativa de descansar um pouco, pegar um voo na correria, o fuso, tudo aquilo me deixou bastante cansada. A empresa aérea disse que me colocaria no voo mais próximo que tivesse e me informariam com antecedência para que eu pudesse voltar ao aeroporto. Estava deitada naquela enorme cama de hotel, de olhos fechados quando ouvi meu celular tocar na mesinha ao lado, olhei o visor, era Pablo que me ligava, ainda bem, cheguei a pensar que fosse Verônica.
-- Oi Pablo.
-- Marina, estou te ligando só pra te informar que Giulia Monteiro se saiu de forma excepcional na segunda fase, ela foi aprovadíssima, e caso você não concorde com a contratação dela, teremos uma briga aqui, porque Juliano e eu a queremos no nosso quadro de funcionários.
-- Eu sabia! Sabia que ela se sairia muito bem nesse teste, ela é um diamante bruto meu amigo, e eu quero dar essa chance a ela. De maneira nenhuma eu discordaria na contratação dela, seríamos loucos se a largássemos. Contrate-a ainda hoje! Eu a quero!
-- Você a quer é dona Marina?
-- Eu a quero na agência Pablo, na agência!
-- Ela é uma linda mulher Marina, ela é muito linda mesmo.
-- Pablo! – o recriminei. – Ela é uma garota ainda.
-- Ih nem vem que isso não tem nada haver, em assunto de amor, isso não conta nada, é apenas um número. Idade não importa.
-- E quem te disse que ela iria querer uma velha que nem eu?
-- Marina, eu tenho a mesma idade que você, e eu não sou velho! – ele gargalhou e eu também – E é como eu já disse, em assunto de amor a idade não conta nada, e você é linda Marina, quem não olhar pra você ou é louco ou é cego.
-- Tá certo Pablo, você me ligou só para falar do teste dela...Quando terminar a entrevista direta, a mande logo para o departamento pessoal, e depois me avisa tá?
-- Pode deixar. Assim que ela sair daqui para o departamento pessoal eu a aviso.
-- Obrigada.
-- Se cuida. Tchau.
-- Tchau.
Eu não tinha dúvidas quanto a capacidade e talento de Giulia, tinha plena convicção de que ela passaria no teste com êxito. A única coisa que não sabia naquele momento era qual o motivo de estar tão feliz com aquilo, e porque eu não para de pensar nela. Eu fechava meus olhos e a primeira imagem que vinha a minha cabeça era a dela. Como ela era linda!
Uma hora depois que desliguei a chamada com Pablo, meu celular voltou a tocar, era um funcionário da empresa aérea me avisando sobre o meu voo, ele sairia dentro de 2 horas.
Pablo me mandou uma mensagem avisando que Giulia já fazia parte da JUMP, sua contratação já havia sido feita. Peguei a bolsa de meu notebook e o liguei, abri o arquivo em que tinha os dados de Giulia, inclusive a sua foto, que mais uma vez me deixou totalmente encantada com tamanha beleza. Eu queria muito algum contato com ela, meu coração me pedia aquilo. Eu não sabia o porquê, mas eu precisava muito falar com ela, nem que fosse em “nome” da JUMP. Depois de minutos e mais minutos olhando para a foto dela, resolvi lhe mandar um e-mail. Escrevi e apaguei algumas vezes até que decidi o que realmente queria escrever.
Passei um tempo com o dedo suspenso sobre a tecla “enter”, não sabia se realmente deveria fazer. Como será que ela iria receber isso? Ah, não importa! ENTER! Mandei. Eu lia e relia o que tinha acabado de enviar para Giulia, e quase cai da cama quando vi uma janelinha que anunciava um novo e-mail subir com o nome dela.
De: Giulia
Para: Marina
Olá,
Boa Tarde ou Bom dia senhorita Marina
Não se irá considerar isso como uma enorme audácia, mas eu precisava lhe devolver a gentileza de ter me mandado um e-mail pessoalmente. Estou muito feliz por agora fazer parte da JUMP, lhe agradeço a oportunidade que me destes. Confesso que tinha uma pequena vontade, pequena não, enorme vontade de tê-la visto sentada em sua cadeira, queria muito ter te visto hoje, sou uma grande admiradora sua. E será uma enorme honra da qual eu não sei se sou merecedora ser recebida por Marina Amorim em sua agência. Honra maior ainda ser treinada e receber auxílios seus. Até segunda-feira de manhã. Muito obrigada mais uma vez, e me desculpe pela audácia, mas não resisti, jamais resistiria.
Um abraço e um beijo
Atenciosamente, Giulia Monteiro.
P.S. Tenha uma ótima viagem.
Jamais entenderia aquilo como uma audácia, fiquei extremamente feliz com aquele ato, mas acho que estava ficando louca, eu lia a relia aquele e-mail de Giulia e algumas vezes eu me contentava com suas palavras.
Ela era minha admiradora, mas isso com certeza devia-se ao meu lado profissional, nada mais que isso. Uma menina linda como ela jamais olharia pra mim. Onde eu estava com a minha cabeça? Não adiantava ficar me alegrando ou não com as palavras de Giulia, ela era uma funcionária, eu a presidente da empresa, e não poderia me envolver com ela, aliás, com mais ninguém!
Não podia me entregar, não podia sofrer novamente, não de novo.
Fim do capítulo
Mais um capítulo. Começando a desenrolar a estória.
Gente tô contando com vocês como um tipo de termômetro, preciso saber o que estão achando, a opinião de vocês para dar o rumo certo para estória -apesar de já ter alguns capítulos escritos, prontinhos...
Comentem, por favor.
Um beijo!
Comentar este capítulo:
Miss_Belle
Em: 11/07/2018
Realmente começou a desenrolar...quero ver o primeiro encontro da Giulia e da Mari. Promete ser bem marcante!!
Verônica é bem cobrinha, agora entendo porque ela tratou a Giulia daquela forma escrota...ela vai causar muita confusão!
Poste mais querida autora!!!
Beijos
Resposta do autor:
Sobre o primeiro encontro: segredo. Será no próximo capítulo, vamos ver o que você acha.
Verônica é uma peste! E ainda vai mostrar muito o lado cobra dela.
Beijos!
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]