Capítulo 2 - Surpresas desagradáveis
Lara andava pensativa em direção à sorveteria quando foi abordada por um homem alto e forte, que segurou em seus ombros e a sufocou em seguida num abraço apertado.
-Larinha! Há quanto tempo! - Exaltava feliz durante o processo. Lara forçava um sorriso surpreso.
- Então, Felix, se você não me soltar vou acabar morrendo e você não vai poder matar a saudade. - Protestava sem ar.
-Desculpa. - Se desculpou euforicamente o grandalhão. - Eu não pensei que te encontraria assim, na rua. Estava indo para sua casa agora mesmo, só estava comprando um sorvete.
-Todo mundo parece ter decidido tomar sorvete hoje, né? - Pensou alto, Felix a encarou confuso.
- É sorvete, é bom e esta calor... - Esclareceu sem entender o comentário. - Você quer um?
-Ah, não. Estou cheia de sorvete por hoje.
-Então tá. - Respondeu compreensivo.
Lara o encarou por um tempo internamente decepcionada por ele ter voltado pra Sent'Cler. Eles namoravam há dois anos e ano passado, Felix entrou para o exército e foi para um quartel em outra cidade afastada. Durante esse tempo, se falavam pouco, pois Lara evitava quase sempre que podia. Não gostava mais dele como no início e não sabia se seria bom contar isso para ele. Mesmo não gostando mais, algo a prendia aquele cara grande de olhos escuros. E agora ele estava ali.
-Vem comigo pegar meu pedido e eu te levo pra casa, ta bom?
A loira assentiu sem animação e o seguiu até lá. Deixaria o que tinha para resolver na sorveteria para outra hora, mas ainda assim, quando o Berg entregou o sorvete de Felix, a loira lançou um olhar sério e cheio de significado para ele, que por sua vez, ao perceber, baixou a cabeça, submisso.
-Porque não me avisou que estava chegando?
Estavam entrando na casa de Lara. Felix deixou uma mala na sala e se jogou no sofá, a loira sentou do seu lado em seguida.
A casa estava silenciosa como sempre esteve desde a morte trágica dos pais dela no dia 1 de Abril, dia que a mesma completou 18 anos. Fazia nove meses que ela morava sozinha naquela casa, tinha recebido convites para morar em outra cidade com alguns parentes, mas havia recusado. Vivia bem com o dinheiro que tinha herdado dos pais depois do acidente que os levou embora, acidente esse que nunca havia sido explicado por falta de provas que incriminasse alguém. A delegada foi obrigada a arquivar o caso.
Eles haviam sido encontrados já mortos e boiando na piscina nos fundos da casa. Havia sangue pelo chão, nos corpos sinais de luta de quem tentou sobreviver durante ao ataque, mas três tiros em cada um terminaram com o visível sofrimento que viveram. Lara não falava com ninguém sobre o que tinha acontecido. Foi interrogada por Lívia para saber se os pais dela tinham inimigos, mas ela não colaborou, Lívia também não insistiu. Sabia a dor que a menina estava sentindo por mais que soubesse esconder dentro de si.
Tudo estava no mesmo lugar ainda. As roupas, o quarto sempre ajeitado, como se ela esperasse uma possível volta impossível... Mas no fundo entendia que aquilo não ia acontecer.
-Eu quis te fazer uma surpresa, meu amor. - Passou a mão pelo rosto macio da garota.
- Passou tanto tempo fora que esqueceu que eu não gosto de surpresas...
-Não esqueci, só decidi mudar as coisas um pouco... - se explicou - Como você está?
-Estou ótima. - A falta de emoção em sua voz era visível.
-Que bom... - Ele ignorou a falta de animação da namorada. - Vamos fazer algo juntos durante o tempo que vou passar aqui, quero saber o que andou fazendo nesse último ano. - Felix tinha vindo para o velório dos pais de Lara, mas não permaneceu ao lado dela para compartilhar o luto. Lara não permitiu.
- Quanto tempo vai ficar? - Perguntou incisiva.
-Ficarei por três dias... - Respondeu sem pressa e envergonhado imaginando que ela ficaria irritada por ser tão pouco tempo, mas ela se manteve plácida.
-Tudo bem, mas não quero sair hoje e amanha irei trabalhar.
-Trabalhar? Que novidade é essa? - Sorria com surpresa.
- Consegui um emprego na delegacia, vou ser assistente da Lívia.
-Seu Marcos vai sair?
-Sim, se aposentar, já estava mais do que na hora. - Deu um risinho do próprio comentário.
-Lara... - Felix a repreendeu achando graça. - Mas é verdade, que eu me lembre, ele sempre ocupou esse cargo. Desde que eu era um moleque.
-Agora eu assumo o lugar dele.
-Parabéns! Não sabia que tinha interesse por esse tipo de trabalho.
-Decidi a pouco tempo que quero entrar para a polícia.
-Não deveria fazer um concurso?
- Concurso só depois, estou satisfeita com a ideia de ser assistente da delegada.
-Tudo que você decidir fazer, eu te apoio, sabe disso, não é?
Lara o observou por um tempo, pensativa e por fim perguntou;
- Apoia mesmo? Qualquer coisa?
-Claro Larinha... Por quê? - Perguntou curioso, com um risinho charmoso no rosto, não estaria sorrindo se soubesse o que se passava pela cabeça da garota de olhos azuis.
-Por nada, só queria ter certeza. - Focou o olhar aparentemente no nada, ainda pensativa. Felix a observava.
-Você está distante...
-Não estou não. Eu estou aqui. - Tocou de leve a mão dele. O rapaz sorriu.
-Eu sei que seu corpo está aqui, mas sua mente parece longe. Algum problema?
Lara negou com a cabeça.
-Nada que queira me contar?
-Nada que eu queira te contar. - Disse séria e depois sorriu, quebrando o clima tenso. - Você está muito neurótico hoje, Felix.
-Você que está estranha. - Puxou a loira pelos ombros e a abraçou. Com uma mão, tocou em seu queixo, subiu o seu rosto e tentou a beijar, mas foi impedido com uma mão empurrando seu rosto.
-Me chama de estranha e depois quer um beijo? Soldados são mesmo muito folgados. - Levantou fingindo fazer birra, ele a seguiu e a segurou contra seu corpo por trás, encostando os lábios no pescoço esguio da loira em seguida.
- Eu estou com tanta saudade... - sussurrou baixinho e Lara virou de frente para ele, sem se afastar.
-Eu também estava... - Falou sem saber o quanto daquela afirmação era verdade.
- Que bom ouvir isso. - Os lábios do rapaz tocaram os dela, a beijando de vagar, sem pressa. Passou um dos braços dela por cima do ombro e a ergueu do chão em seguida, levando-a no colo em direção ao quarto que ele conhecia bem. Subiu as escadas como se segurasse um travesseiro de tanta facilidade que parecia ter para carregar a loira alta.
Ao entrar no quarto, a deitou na cama e passou a depositar pequenos beijos por cima de sua roupa, que logo após já estavam jogadas pelo chão.
Lara fechava os olhos calmamente e convencia a si mesmo que aquilo era sua folga, uma folga de tudo. Dos planos, dos pensamentos. Queria se sentir preenchida e buscava naquele momento com Felix sentir aquilo... Mas ele não conseguia suprir o que ela precisava. O que precisava ser preenchido era bem mais complexo.
Era quase nove e meia da manhã quando Lara acordou com Felix deitado ao seu lado na cama e com o braço pesado por cima dela. Sentiu um pouco de dificuldade para se desvencilhar do rapaz que dormia profundamente e o observou por um tempo já de pé. Ele estava nu e descoberto, a pele morena era iluminada pela luz do sol que entrava pela janela. As costas eram fortes e longas, as coxas malhadas. Deitava de bruços tranquilamente como se o mundo não existisse lá fora. Mas para Lara, existia. Ela foi direto para o banheiro, entrou direto embaixo do chuveiro pois já estava nua também, para tomar um banho rápido. Não fazia ideia de onde as suas roupas estavam, talvez embaixo da cama, pensava distraidamente.
Decidiu por uma calça jeans escura e um camisão de mangas longas, calçou a primeira coisa que viu pela frente e saiu na sua moto deixando Felix ainda dormindo.
-Bom dia, Delegada!
Lara havia chegado as dez em ponto e esperava Lívia chegar sentada atrás da sua mesa. A morena olhou surpresa por encontrar a nova assistente já ali.
-Bom dia, Lara! Não esperava que fosse chegar primeiro que eu. - Deixou sua bolsa na mesa e parou de braços cruzados olhando a loira. Ela vestia uma jaqueta de couro vermelha, com uma camisa preta por dentro, a deixava estranhamente mais parecida com uma delegada. Seus cabelos longos e negros estavam presos num rabo de cavalo alto.
-Pensei que estava atrasada quando acordei, sai de casa correndo que nem uma maluca. Não queria chegar tarde no meu primeiro dia. - Deu um risinho.
- E eu que cheguei.
- Devia está se produzindo. Você está linda! - Elogiou olhando a morena dos pés a cabeça, Lívia sentiu seu rosto queimar.
- Só se for. Nem passei nada, não curto muito maquiagem.
- Então você é linda assim mesmo ao natural? Nossa! - Lara estava se divertindo ao ver o embaraço da chefe.
-Você só está sendo muito gentil. - Se limitou a dizer.
A loira sorriu em silêncio e esperou as ordens, não sabia nem por onde começar.
- Tenho uns papéis pra organizar nas pastas, Seu Marcos estava quase terminando quando saiu. Você pode começar terminando o trabalho dele. - Entregou uma pilha de papéis e outra pilha de pastas em cor marrom.
-Se terminar daqui para a hora do almoço, te levo para almoçar comigo. - Disse dando as costas.
-E se eu não terminar?
- Você fica ai.
Lara olhou incrédula para a morena por um tempo. Lívia sorriu ao ver a cara de espanto da menina.
-Eu estava brincando.
-Você tem muito senso de humor. - Balançando a cabeça negativamente, começou a separar os papéis.
- Você não tem? Qual o seu signo?
- Meu signo?
-Sim, qual é?
-Não me diga que acredita nisso...
- Vai, é de Abril, não é?
- Sou sim, de Abril. - Colaborava, Lívia estava descontraída. - Mas não sei qual é o meu signo, não ligo pra isso.
- Dia 1, certo? Você é uma Ariana. Estranho... - Comentava enquanto procurava algo no armário.
-O que é estranho? - Lara olhou de soslaio para ela.
- Arianas gostam de liderar, de dar e não receber ordens... Estranho você querer ser minha assistente, está aqui para roubar o meu cargo? - Brincou, mas permanecia séria.
- Claro, até porque eu conseguiria. - Contratacou Lara. - Eu não sou assim. Sou de boa.
No fundo Lara se identificava totalmente com o que ela havia dito. Nunca estaria ali, como assistente, se não tivesse bons motivos.
-Então, mas não esqueça, seu signo é aries. - Lívia olharia pra ela, com um risinho.
Lara cederia ao sorriso meigo da morena e devolveria do mesmo jeito, só que um sorriso meio bobo. Balançaria a cabeça e voltaria a olhar para os papéis quando se percebesse olhando fixamente para Lívia.
- E você, qual o seu signo? - Tentou puxar assunto.
-Sou de touro. - A delegada pegava algumas pastas no armário. - Completo ano algumas semanas depois que você.
-Eu não sei sobre signos, mas ser de touro me parece ser bem forte. Você é forte, decidida, deve ser teimosa também.
-Percebeu isso tudo só de olhar pra mim? Acho que alguém está mentindo sobre não gostar de signos. - Lívia desconversaria.
-Porque eu mentiria?
- Sei lá.
-Talvez eu tenha lido uma coisa ou outra, mas achei meio bobagem.
-E por qual motivo?
-Não gosto do fato de por a culpa das nossas burradas ou das nossas qualidades num plano astrológico . A gente é o que a gente é, não acho que a posição das estrelas influenciem nisso.
-Essa opinião é digna de arianas. - A delegada viu a garota a olhar com espanto e depois revirar os olhos. Elas com certeza viam a vida de forma bem contrária. Ela se viu gostando disso.
Começaram a fazer os seus deveres do dia, em silêncio. Lara perguntava de vez enquanto o que devia fazer, onde deveria colocar algumas coisas, mas conversar mesmo só sobre o trabalho.
Lívia se pegou observando a loira algumas vezes. Achava interessante o jeito que ela escrevia, era canhota e colocava a caneta entre o dedo indicador e o médio, parecia fazer com a maior facilidade, mas obviamente deveria ser por causa da prática. Em silêncio Lívia tentou imitar e estragou uma das folhas. Se sentiu idiota.
Sentia uma vontade enorme de perguntar como ela conseguia ser tão forte. Fazia tão pouco tempo desde o acidente dos pais, ela estava praticamente sozinha desde lá, nunca falava com ninguém sobre o ocorrido, morava na mesma casa onde aconteceu, parecia tão firme, tão bem... Mesmo o crime nunca tendo sido resolvido, parecia não querer descobrir os culpados. Às vezes parecia tão fria, que passou pela cabeça de Lívia se ela tinha perdido a empatia depois da morte dos pais e agora era uma sociopata ambulante. Sorriu ao pensar naquele absurdo e Lara percebeu.
-Também quero sorrir. - Se intrometeu, chamando a atenção de Lívia.
-Não, não, é... Besteira. Lembrei de uma coisa aqui. Vamos? - Desconversou.
-Pra onde?
-Almoçar. Não quer?
Lara checou a hora no celular. Já eram 11; 30.
-Nossa como passou rápido. - Disse surpresa, levantando e andando até Lívia que vestia a jaqueta.
-O tempo passa rápido quando está fazendo algo que te agrada. - Comentou piscando pra Lara. - Isso é um bom sinal, mostra que você curte isso aqui.
A loira ficou em silêncio, pensou que talvez não fosse o trabalho e sim a companhia.
-Gosta de algum restaurante em especial? - Perguntou à delegada quando saiam da delegacia.
-Eu gosto de um que fica próximo a cachoeira. É lindo lá, eu sempre acho que faz bem comer olhando uma boa paisagem. - Dizia olhando o céu azul com poucas nuvens, mas a claridade a impedia de abrir totalmente os olhos.
-Então é nesse que iremos. - Confirmou, olhando para ela.
- Eu vou pegar o carro da Polícia. - Lívia ia saindo em direção ao carro quando Lara segurou em seu braço.
- Vamos na minha moto. Podemos ir por uma estrada mais estreita, onde tem paisagens mais bonitas. Você vai gostar. - Sugeriu e Lívia aceitou sem pensar duas vezes.
A moto era uma XRE 300 preta, Lara tinha uma mais cara e maior na garagem, mas não usava pois o pai sempre a levava para passear nela. Trazia lembranças boas e dolorosas.
A estrada ficava por dentro da floresta, era estreita e ficava bem ao lado de uma descida de pedras, um barranco que terminava num grande lago cristalino a 30 metros a baixo.
Lara dirigia de vagar, deixando que Lívia observasse tudo. A cachoeira ao longe, as árvores se sobressaindo do nevoeiro que se formava pela queda d'agua. Os pássaros sobrevoando, suicidas, pelas aguas que corriam ferozmente cachoeira a baixo. Os olhos de Lívia brilhavam, morava naquele lugar a mais de três anos, mas sempre se surpreendia com uma vista nova.
-Eu nunca tinha visto essa estrada. - Comentou ao descer da moto e tirar o capacete. Lara fez o mesmo. Estavam no estacionamento do restaurante. Ficava no topo de uma montanha alguns quilômetros da queda d'agua. Era uma construção simples e aberta, mas aconchegante. Toda em madeira com mesas dentro e fora do restaurante. Lara logo se sentou em uma ao ar livre.
- É. Não é muito conhecida por ser considerada perigosa. Mas meu pai sempre vinha comigo por ela... - Disse pensativa, com um risinho no rosto.
-Vocês eram bem apegados. - Afirmou Lívia, sentando também.
-Ele era um pai atencioso, não só comigo. Mas minha mãe não sabia aproveitar... - Se abria para Lívia quase como se tivessem alguma intimidade. Era como tirar um pouco do fardo que carregava, mas logo se fechou novamente, mudando de assunto. - O que gosta de comer aqui?
- É... - Lívia observou com pesar a loirinha sensível que emergiu por um instante se esconder. Não insistiu novamente. - Eu gosto do bife. Bife, salada e batatas fritas.
-Salada e batatas fritas? Não é meio contraditório? - Sorriu.
-É, mas muito gostoso também.
-Vou querer o mesmo.
Elas fizeram o pedido e esperaram observando a paisagem. Não demorou muito a chegar e elas começaram a comer em silêncio. Mas as duas percebiam o barulho ensurdecedor dentro daquele silêncio todo. A primeira a ceder foi a Lívia.
-Então... - Começou a chamar a atenção da loira. - Você realmente não queria sair e viajar? Agora que está livre da escola?
- Livre da escola? - Acharia graça. - A escola era a única coisa que ocupava minha mente. Agora, que acabou...
-Bom, tem os poucos problemas da delegacia agora. Você pode ocupar a cabeça com eles se é o problema. - Lívia não tirava os olhos dos olhos azuis de Lara. "Como podem ficar ainda mais lindos?" pensou. - Não é nada grande nem difícil, mas acho que pode ser o suficiente.
- É verdade, vai ser bom para me distrair. Você principalmente...
-Eu? - Lívia ficou surpresa e acabou interrompendo antes da loira terminar a frase.
- É uma ótima companhia.
- Ah, bom é claro. - Se sentia idiota pela segunda vez naquele dia. "Deuses, qual é o meu problema?" - Bom, vou servir para sua distração. - Lívia deixou soltar com sarcasmo.
-Não quis dizer isso. Você é alguém importante, é uma pessoa boa. - Tentou consertar. - De forma alguma serviria apenas como distração.
-Tudo bem, eu não... - Se enrolou Lívia e pigarreou em seguida para disfarçar. - Ok.
A loira sorriu.
-Você tem família aqui? - Tentou mudar de assunto.
- Não. Quer dizer, mais ou menos.
- Como assim? - Lara achou graça.
-Família, tipo, pai, mãe só em outra cidadezinha.
-E qual o outro tipo de família que tem aqui? Você tem filhos?! - A loira perguntou sem conter a surpresa.
- Não! - Negou quase alto demais. - Eu não seria uma boa mãe, eu acho.
-Ninguém sabe de nada até tentar ou experimentar.
-É, mas mesmo assim, quem sabe um dia? - Fez uma pausa. - Eu tenho um noivo. - Não entendia o motivo daquela frase ter saído tão estranha.
-Um noivo? - Lara quase engasgou com a alface da salada. - Nossa!
-O que foi? - Lívia perguntava constrangida.
- Desculpa, é que eu, ou melhor, você não parecia ser casada.
-Eu sou noiva. Noiva, não casada. - Enfatizou a palavra noiva mais do que o suficiente.
-Sim, mas vocês não moram juntos?
- Sim... Ele mora comigo, no meu apartamento.
-Então, quase casados. - A loira descontraiu com um risinho.
-Não, mesmo assim, somos só noivos que dividem uma casa, não quero a responsabilidade de uma esposa nem tão cedo...
-Há quanto tempo estão juntos? Se não for me meter demais.
- No final desse mês completamos cinco meses.
-Cinco meses que estão morando juntos?
-É, a gente se conheceu na delegacia. Ele vive viajando. Trabalha na federal. - Contou sem muito entusiasmo.
-O casal da lei. - Lara brincou.
Lívia apenas sorriu.
-Não é querendo me meter, mas... Vocês devem se amar muito para terem decido morar junto tão rápido. Eu não me vejo dividindo a casa com mais ninguém.
-É, ele queria muito, eu morava sozinha há tanto tempo e ele é um cara legal. Estava procurando um apartamento para alugar e como estávamos juntos e eu tinha espaço sobrando... - Suspirou, avaliando melhor a situação. - Eu sou muito impulsiva.
-Coisa de taurina?
- Coisa de Lívia.
As duas sorriram juntas, beberam um suco que pediram depois de terminar de comer e voltaram para a delegacia pelo mesmo caminho estreito e lindo pelo qual vieram.
-E você? - Lívia perguntou assim que desceu da moto, chamando a atenção de Lara.
-Eu o que? - Sorriu confusa.
-Tem alguém? - Perguntou se praguejando mentalmente, que pergunta era aquela? Ela não queria saber.
-Não sei, mas ou menos. Nada realmente sério, eu acho. - A loira analisou a delegada com um risinho e depois que ela assentiu, suspirou. - Ainda temos meia hora livres certo? - Lara perguntou sem descer da moto.
-Temos sim.
-Vou aproveitar para ir num lugar, ok? Volto na hora, não se preocupe.
-Eu não vou me preocupar, moça. Fique à vontade. - A morena ficou um tempo parada olhando Lara se afastar da delegacia, depois que ela virou a esquina, só conseguiu ouvir o ronco da moto por um momento, depois que o barulho acabou, entrou.
Lara estacionou na frente da sorveteria, deixou o capacete na moto e entrou em passos firmes até o balcão.
Um homem barbudo e grisalho a olhou entrar e esperou que ela fizesse o pedido.
-Berg está, por favor? - O homem era o tio de Berg, o dono do lugar.
-Está sim, menina. Está almoçando lá dentro, quer entrar ou chamo ele aqui?
- Eu gostaria de entrar se não fosse incomodo. - Disse educadamente e o homem abriu uma portinha no balcão para que ela passasse.
Berg estava sentado no sofá da sala, com um prato cheio de macarrão e carne em cima do colo e os olhos fixos no programa de esportes na TV. Só percebeu que a loira estava lá quando ela sentou ao seu lado.
- Nossa! - O rapaz quase gritou. - Que susto. Por onde entrou?!
- Pela porta?
-Grossa.
-Eu vim tratar de um assunto importante. - Falava em tom formal, ele a olhava confuso.
-É sobre as armas?
-Sim. Eu não quero mais que arranje para mim, agora que estou trabalhando na delegacia tenho acesso fácil a qualquer uma que eu quiser.
-Mas você é só assistente, não é?
-Mesmo assim, não preciso explicar pra você. - Disse séria.
- Vou cancelar o pedido então. - Berg tinha uns amigos barra pesada na cidade grande e conseguia favores do tipo quando precisava, favores que custavam uma grana. Lara havia descoberto há pouco tempo, mas ninguém mais sabia. Se soubessem no que ele se metia, trafico de armas, drogas, nem dava para imaginar o que o tio dele faria. Lara o usava desde então, para conseguir atingir o que desejava.
- Mas pra que você quer as armas, Lara? - Ousou perguntar. Ela levantou em silêncio, andou pela sala um pouco e ensaiou falar alguma coisa, mas ficou paralisada ao ver uma foto em cima de um balcãozinho de madeira ao lado do sofá. Na foto, havia três pessoas, uma mulher gordinha e pequena, com cabelos escuros, um garoto baixinho e cheinho que tinha a mesma cor de cabelo do Berg, e um homem alto e magro. Os cabelos estavam longos até os ombros, mas o rosto era o mesmo. Ela conhecia. Sentiu um nó na garganta e um ódio descomunal queimar o seu corpo.
A primeira e ultima vez que tinha visto aquele homem, foi no dia 1 de Abril, na casa dela, com uma arma não mão e os pais dela como reféns.
Berg percebeu a tensão na menina e estranhou ela está encarando a foto há tanto tempo.
Até que ela virou o rosto lentamente e olhou para o rapaz que estava confuso.
- Gutenberg, quem é esse homem?
- Ah, esse? Ele é o meu pai.
Fim do capítulo
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