Será se dava para escalar as janelas dos outros andares? Acho que eu nunca estive tão encrencada como hoje.

            Tomei banho, vesti uma roupa leve e deitei na cama esperando a bronca. Minha mãe apareceu no quarto depois de trinta minutos e trancou a porta ao passar, ela devia estar se acalmando na sala antes de aparecer aqui porque ainda estava com a mesma roupa.

            Eu sentei na cama totalmente sem jeito e esperei que ela falasse.

— Eu realmente não sei o que falar Alex. – Ela parecia bem desapontada. Eu odiava aquele olhar, saber que desapontei a mulher mais importante para mim era inaceitável.

— Eu...

— Eu ainda não terminei de falar. – Mamãe me cortou. — Porque você não ficou na mesa quando eu mandei? – Eu não respondi. — Você foi atrás dela pra quê? Conseguir as migalhas que ela está te dando ou para arranjar confusão?

— Eu... Eu não sei. Fui pra cobrar uma explicação por ela ter voltado com o marido, acho.

— Você não tinha o direito de cobrar nada dela. – Minha mãe levantou e foi até a janela olhar o lado de fora. Depois se virou e me encarou. — A vida é dela. Se ele a traiu, o problema é dela. Se ela voltou com ele, o problema também é dela.

— Eu não consegui me segurar, sei que ele está fazendo ela de besta de novo. Eu fui tentar ver se ela enxergava isso, mas ela entendeu tudo errado. – Abaixei a cabeça. Mamãe se sentou novamente na cama e levantou meu rosto delicadamente.

— Eu sei que é difícil ver essa situação e não poder fazer nada. Mas somente ela é quem tem que enxergar e tomar uma atitude, Alex. – Algumas lágrimas escaparam de meus olhos.

— O que eu faço então?

— O máximo que você pode fazer é deixar bem claro para essa Lígia, que você a ama e que você é muito melhor do que o tal do Júlio. — Mamãe continuava falando de uma forma dura. — Mas não se humilhe ou se rebaixe. Não corra atrás dela cantando as migalhas que ela joga, você não merece alguém assim.

            O choro veio com gosto dessa vez, um choro sofrido. As lágrimas escorriam pelo meu rosto e pingavam em minha cama. Eu não chorava somente pelo que a minha mãe disse, chorava por toda essa situação com a Lígia. A certeza me atingiu em cheio, eu não poderia continuar com esse sentimento dentro de mim, Lígia jamais iria largar o marido para ficar comigo.

— Eu nunca vou tê-la. – Falei, ainda em prantos.

— Alex... – Mamãe me puxou para que eu deitasse em seu colo.

            Ficamos quase uma hora em silêncio, com ela fazendo carinho em meus cabelos e eu me acabando de chorar.

— Já está melhor? – Ela perguntou, quando viu que eu não chorava mais.

— Sim. – Me sentei novamente. — A senhora não gostou da Lígia? – Perguntei.

— Não sei o que dizer dela, a hora em que eu a vi te dando um tapa, minha vontade era de voar no pescoço dela. – Mamãe suspirou. — Qual a impressão que você quer que eu tenha dela ao vê-la te batendo?

— Uma impressão boa é que não é. – Falei triste. É uma pena minha mãe ter visto aquela cena, ainda bem que ela não viu os outros tapas que a Lígia já me deu.

— Exatamente. – Mamãe fez uma careta. — Mas se te serve de consolo, ela é muito bonita. De todas as que você já se envolveu, ela é a mais linda. – Ela me deu um sorriso e eu sorri de volta.

— Estou muito encrencada ainda? – Perguntei, temendo a resposta.

— Não sei. – Recebi um sorriso dela, mas logo ela ficou séria. — Alex, eu sei que quando nos apaixonamos, fazemos muitas besteiras porque não pensamos direito. Mas por favor, tente raciocinar, minha filha. – O tom dela era quase de súplica.

— Eu vou tentar.

— Vocês não fizeram...? – Mamãe perguntou de repente.

— Quase. – Respondi sem graça.

— Alex! – Ela parecia pasma. — O que aconteceu exatamente?

            Relatei tudo à minha mãe, desde o dia em que conheci Lígia até a última coisa que ela me falou enquanto eu saia do restaurante. É claro que omiti os outros tapas que recebi.

— Você não acha que desde o começo ela possa estar brincando com você, Alex?

— Eu não sei, mãe. – Falei derrotada.

— E se vocês tivessem... Transado no apartamento dela? Você acha que no dia seguinte ela já estaria andando com você de mãos dadas?

Fiquei pensando um pouco. Era esse o plano dela aquela noite? Transar comigo e depois voltar para o Júlio na maior cara de pau? Será se ela seria capaz de fazer isso?

— Acho que ela só queria uma noite e nada mais. – Falei o óbvio.

— É, eu também estou achando isso. Mas antes de tirar conclusões precipitadas, tente saber exatamente o que ela sente por você, talvez nós duas estejamos enganadas. – Fiz uma careta. Isso não ia ser fácil, já que ela não queria me ver nem pintada de ouro. — Talvez ela esteja começando a ter um sentimento por você, mesmo que seja bem pequenininho.

— E agora? Qual vai ser meu castigo? – Perguntei mudando de assunto.

— O que você aprendeu com tudo isso? – Mamãe perguntou.

— Que se apaixonar é uma droga. – Minha mãe deu uma gargalhada.

— Certo, o que mais?

— Quando você mandar eu ficar... eu fico. – Dei um sorriso fraco.

— Ótimo, você já aprendeu tudo. – Ela sorriu e se levantou.

— Isso tudo foi só para eu saber que não devo te desobedecer não é? – Perguntei fazendo uma careta.

— Claro que não, Alex. – Ela estava doida para rir. — Você que chegou a essa conclusão. – Recebi um beijo na cabeça. — Não vai ter castigo, dessa vez. Tenho certeza que você tem muito o que pensar.

            Mamãe saiu do quarto e fechou a porta. Já eram onze e meia da noite. Levantei e liguei meu notebook, queria escutar minha banda favorita: HAIM. Coloquei a playlist para tocar bem baixinho, deitei novamente e fechei os olhos.

Uns minutinhos depois escutei alguém bater na porta.

— Entra.

            Dylan enfiou a cabeça para dentro do quarto, me olhando assustado.

— Que foi? – Perguntei.

— A mamãe te deixou de castigo?

— Não. – Esperei sabendo que ele queria falar mais alguma coisa.

— Posso... dormir aqui com você? – Dylan perguntou sem jeito.

— Vem cá. – Sorri e abri espaço na cama.

            Dylan estava com o pijama favorito dele, do Lula Molusco. Não entendia como ele podia gostar do Lula Molusco, era um cara chato, ranzinza, antipático e sem graça. Confesso que eu preferia o Patrick, meio bobalhão.

            Ele deitou ao meu lado e eu comecei a fazer carinho em seu cabelo.

— Você gosta daquela moça né?

— Sim. Mas ela não gosta de mim. – Falei triste.

— Não liga pra ela, eu gosto de você. – Olhei para Dylan e ele estava sorrindo.

            Como pode, um menino de onze anos tentando me alegrar. Não vou mentir, Dylan é muito especial.

            Ele levantou de repente e correu para fora do quarto, voltando uns minutinhos depois e deitando novamente.

— Toma. – Ele me estendeu um pacote de M&M’s e eu o olhei sem entender. — Chocolate deixa tudo melhor.

— Você é o melhor irmão do mundo, sabia? – Comentei.

— É, eu sei. – Ele falou todo orgulhoso. — E quando eu for grande, vou defender você de todo mundo. – Dei uma gargalhada.

— Ah é, Homem Cueca? Vamos ver até lá.

            Comemos o pacote inteiro de M&M’s e depois fomos dormir. A música ficou tocando a noite inteira.

            Terça feira chegou, e com ela uma bela dor de cabeça. Hoje definitivamente eu não iria à aula. O relógio despertou e eu acordei Dylan para ir tomar banho.

— Você não vai pra aula não? – Ele perguntou sonolento.

— Hoje não. – Respondi sem ânimo.

— E por que eu tenho que ir? – Fiz uma careta.

— Dylan, não começa. Uma hora dessas e você já tá reclamando! – Virei para o lado a fim de dormir mais.

            Nem vi a hora que ele saiu, ou melhor, que eles saíram. Provavelmente mamãe me deu uma folga hoje.

            Acordei às dez e meia e totalmente sem dor de cabeça. Desliguei meu notebook e fui tomar um banho. Me arrumei, passei na cozinha para tomar um café rápido e falar com a Dona Maria.

— Você está com uma carinha tão abatida, Alex. – Dona Maria falou.

— Eu só... Eu estou bem. – Suspirei e lhe dei um sorriso.

— Come mais, você está tão magrinha. – Dona Maria era uma comédia.

— Mas se eu comer mais, daqui um tempo eu não passo nem pela porta. – Dei risada.

— Que exagero. Para você ficar entalada na porta, seria necessário mais cinco de você. – Ri mais ainda.

            Terminei de comer.

— Eu vou andar um pouco na praia. – Me levantei e fui para a sala.

— Não faça exercícios, menina. Você acabou de comer.

— Tudo bem Maria. – Gritei da sala, peguei as chaves e saí.

            Fiquei andando um pouco na praia e olhando aquelas ondas. Eu não conseguia parar de pensar na Lígia. Onde será que ela estava? Será se a raiva dela por mim já havia passado?

            Resolvi voltar para casa, o sol estava rachando coquinho. Estava esperando o elevador quando escutei alguém me chamando.

— Alex? – Olhei para ver quem me chamava e vi Brenda vindo em minha direção.

— O que faz aqui? – Estranhei. — Não deveria estar na aula?

— Deveria, mas fiquei preocupada com você. Por que não foi à aula hoje?

— Eu acordei com uma dor de cabeça terrível, então voltei a dormir. – Sorri.

— Hum. – Brenda fez uma carinha safada. — Bem que você podia me levar pra conhecer a sua casa né?

            O elevador abriu e Lígia saiu dele tomando um susto ao nos ver paradas na porta. Ela me lançou um olhar de raiva e logo desviou, olhando para Brenda. Brenda que não se fez de rogada, entrelaçou seus dedos nos meus sem a Lígia ver.

— O que faz aqui senhorita Louise? – Lígia perguntou com antipatia. Brenda logo fez uma careta por conta do seu segundo nome, ela o odiava.

— Vim conhecer o apartamento da minha namorada, professora. – Brenda sorriu.

            Lígia reparou em nossas mãos entrelaçadas e voltou a me olhar com raiva.

— Algum problema, professora? – Brenda perguntou.

— Nenhum. – Da raiva, o olhar de Lígia passou para a mágoa.

            Com certeza ela devia estar pensando a mesma coisa que eu pensei dela, que eu estava brincando o tempo todo com ela.

— Com licença. – Lígia passou por nós, igual um furacão.

            No impulso eu tentei ir atrás dela, mas Brenda me segurou.

— Você tem que fazê-la sentir a sua falta e que ela se dê conta que gosta de você. – Brenda voltou a apertar o botão do elevador, já que ele tinha subido novamente.

— Ela provavelmente me acha a pior pessoa do mundo. O que será que tá passando na cabeça dela agora? – Me desesperei.

— Ei, ei. Calma, Alex. Vamos continuar com o plano. – O elevador voltou e nós entramos depois que uma senhora saiu. — Nossa, você viu o olhar dela pra você? – Brenda riu.

— Isso não tem graça, Brenda. – Falei irritada.

— É claro que tem. – Ela estava sorrindo agora. — Alex, você não percebe o que isso significa?

— Claro que sei, significa que ela está com raiva, ou melhor, ódio de mim.

— Não, Alex. O simples fato de ela ter te olhado daquela forma é que provavelmente ela já está gostando de você.

— Ah é, mas agora pelo visto, esse sentimento dela por mim vai reduzir a zero. – Saímos do elevador e fomos em direção à porta lá de casa. Nem sei por que eu estava levando Brenda para conhecer minha casa.

            Abri a porta e Dona Maria estava limpando a sala.

— Mas já voltou?

— O sol está muito forte. – Dei um sorriso. — Maria, essa é a Brenda. – Dei passagem para que Brenda entrasse. — Ela veio para...

— Eu vim para fazer o trabalho, lembra Alex? – Brenda emendou a minha frase. — É um prazer conhecê-la Dona Maria.

— Que isso menina, pode me chamar só de Maria.

— Então vamos? – Perguntei. — Vamos para o meu quarto Maria, qualquer coisa é só chamar.

            Chegando lá, tratei de ligar o notebook e colocar minha banda favorita para tocar.

Por falar nisso, HAIM, a banda que eu gosto, é composta por três irmãs: Alana, Este e Danielle Haim. Sou completamente louca pela vocalista, a Danielle, e que ainda por cima toca uma guitarra como ninguém.

— Nossa, seu quarto é lindo. – Brenda comentou.

— Obrigada e desculpa pela bagunça. – Falei amassando o pacote de M&M’s que o Dylan deixou em cima da minha cabeceira e colocando no bolso.

— Não tem problema. – Ela sorriu.

— Hum... – Fiquei sem saber o que fazer ou falar.

— Alex, não precisa ter vergonha de mim. Vamos conversar. – Brenda sentou na cama e eu sentei na cadeira do computador. — Você reparou que a Kimi olha diferente para o Caio?

— Na verdade, não reparei não. – Acho que eu andava pensando muito na Lígia a ponto de não reparar ao meu redor. — Mas só tem alguns dias que eles se conheceram.

— E daí? Nós duas também e isso não impediu de ficarmos.

— É verdade.

— Alex... – Brenda se levantou e veio sentar no meu colo. Eu estava só vendo a hora daquela cadeira não aguentar o peso e nos levar ao chão. — Já que estamos aqui, porque não ficamos novamente? – Brenda me deu um beijo na bochecha.

— Brenda, eu não estou com cabeça pra isso.

— Poxa, Alex. Tenta só por um minuto aproveitar esse momento.

— Brenda... – Ela colocou o dedo indicador nos meus lábios, me silenciando, e logo me beijou.

            Me deixei levar, levantei e levei Brenda para a minha cama, me deitando por cima dela. Ficamos no beijando durante muito tempo. Não era aquele beijo que eu queria, mas na falta, vai esse mesmo né?

            Brenda trocou de posição comigo e tirou a blusa, ficando só de sutiã. Minhas mãos automaticamente foram para seus seios. Ela levou às mãos para o fecho do sutiã, a fim de tirá-lo. Nem teve tempo de Brenda tirar o sutiã, a porta do quarto abriu de repente e por ela passou Dylan. O sorriso no rosto dele foi morrendo e seus olhos se arregalando à medida que ele via a cena a sua frente.

Fim do capítulo