Colocando as ideias no lugar
Capítulo 15: Posito ideas
Diana não sabia ao certo quem procurar, ou aonde ir, precisava usar a sensatez e a resignação que nunca tivera, para refletir e decidir como conduzir aquela avalanche de sentimentos e sensações que vivia. Perguntava-se como uma garota que representava tudo que ela não queria para amar, conseguira dentro de algumas semanas balançar suas estruturas, acabar com seu namoro estável, dividir seus melhores amigos e ao mesmo tempo lhe magoar tanto com comentários que ela naquela altura já tinha aprendido a driblar.
Depois de horas pilotando pela cidade, chegou a sua casa e se deu conta que era incapaz de ficar a sós com tantos pensamentos conflitantes. Cheia de receio de não ser atendida, sacou o celular e ligou para Julia.
-- Alô?
-- Oi Julia.
-- Oi Diana.
-- Você está em casa?
-- Não, por quê?
-- Por nada... – Diana ficou encabulada.
-- Aconteceu alguma coisa? Estou achando sua voz meio triste.
Antes de qualquer coisa, Julia sempre foi uma grande amiga, por muitas vezes o porto seguro de Diana, por isso, a ex-namorada lhe conhecia muito bem, a distância sempre presente no namoro delas por conta do trabalho de Julia desenvolveu nesta a sensibilidade de conhecer os diferentes tons de voz da outra.
-- Só queria conversar um pouco, pensei em ir a sua casa, mas estou escutando barulho, você deve estar ocupada, deixa pra lá.
-- Você acanhada? Nossa, deve ser sério mesmo... Vamos fazer o seguinte, estou bem perto da sua casa, daqui vou para o aniversário do Rodrigo, passo na sua casa no caminho, pode ser?
-- Fico esperando, obrigada Ju.
Diana desligou o telefone, aliviada por ainda poder contar com a amizade da ex.
Natalia deve ter pegado uns três ônibus errados, até conseguir chegar ao prédio que Diana morava. Esfregou as mãos tentando aliviar o nervosismo enquanto caminhava até a entrada, avistou uma ruiva na portaria, que caminhou até o elevador. Natalia apertou os olhos para focar melhor a visão e atestou o que suspeitava, era Julia, a suposta ex-namorada de Diana, com certeza não estava ali por acaso.
Desceu os degraus da portaria lentamente, frustrada, enciumada, machucada. Natalia desconhecia aquele sentimento, e desejou nunca tê-lo sentido, mas ele foi sua companhia naquela noite.
******
Julia fez questão de ser anunciada, mesmo tendo as chaves do apartamento.
-- Oi loira!
-- Oi ruiva... Obrigada por ter vindo.
-- Precisava vir aqui mesmo te entregar as chaves. Mas, me diga que carinha é essa?
-- Umas paradas aí... Estou tão perdida, não estou me reconhecendo Ju...
Diana foi evasiva, seria um abuso desabafar com a ex-namorada, sua angustia provocada pelo sentimento que fora motivo do término da relação com Julia.
-- É ela não é? – Julia perguntou séria.
-- Não é por ninguém especificamente Julia, são as pessoas em geral que me decepcionam me machucam com rótulos... Hoje mesmo ouvi sem querer duas meninas falando sobre mim, sobre minha sexualidade... Esses termos pejorativos, a ideia que estar perto de uma lésbica pega mal...
-- Diana... – Julia interrompeu impaciente. – Eu sei que isso é chato, desgastante, mas, eu também te conheço, você tirou de letra os primeiros comentários, já está acostumada com isso e já ouviu ofensas bem piores... O que tem diferente dessa vez?
-- Nada diferente, só que isso às vezes cansa!
-- Diana me poupa vai... Estou aqui me esforçando pra cumprir o que sempre combinamos, de me manter sua amiga se um dia terminássemos, ainda estou magoada com você, então, respeite meu esforço, e para de me enrolar por que tem uma festa me esperando!
-- Ai Julia não é fácil falar disso!
-- Fala, é ela não é?
-- É! Pronto, queria saber, pronto, é ela sim!
-- Eu sabia! – Julia ficou de pé irritada.
-- Ah agora você vai ficar com mais raiva de mim?
-- Não é raiva, é revolta... Ou sei lá o que! – Deixou escapar um riso. – Ai, não tenho palavras pra explicar, só odeio quando minha intuição é confirmada! Nunca é a meu favor!
Diana sorriu sem graça.
-- Eu sabia Diana que aquela garota representava algo mais pra você. Você sempre foi de flertar, de usar as armas que você tem consciência que tem, pra ser o centro das atenções, pra despertar o desejo das outras pessoas, mas era uma atitude de autoafirmação, por puro egocentrismo ou simplesmente por que faz parte de você esse instinto de conquistar, seduzir, e você usa isso até nas suas fotos, é parte de você... Mas, daí a trair, ser desleal, eu sabia que você não seria capaz.
-- Mas, eu te traí Ju... Você não merecia isso...
-- Não mesmo! Mas você não traiu seus sentimentos Diana... Você estava com aquela garota aqui na sua casa, por que o que sente por ela, ultrapassou a barreira da vaidade, da atração pura e simples... Isso me machuca também, saber que alguém mexeu com você o suficiente pra você trair nossa relação, mas, ao menos tenho o consolo que agi corretamente terminando com você.
-- Eu estou tão envergonhada! Agindo assim como uma idiota por causa dessa caipira! Quem ela pensa que é? Ela disse que tinha nojo de mim... Posou de hetero pra amiguinha crente... E ainda está galinhando dando mole pra Lucas e Pedro ao mesmo tempo! Pra piorar tudo, o Pedro ainda me pede ajuda pra conquistá-la!
Julia fez uma careta, quando teve a dimensão da encrenca sentimental que a ex-namorada estava metida.
-- Diana, eu sei que isso pode não ajudar muito, porque a ultima coisa que você é capaz nesse momento é de entender quem te machucou... Mas, você tem noção que a cabeça dessa menina deve estar mais confusa do que a sua? Ela tem o que? 18, 19 anos? Uma adolescente, você provavelmente foi a primeira experiência lésbica dela, foi flagrada pela namorada mais velha da primeira garota que ela beija, e ainda ouviu dessa garota que não significou nada pra ela...
Diana baixou os olhos.
-- Quanto à confusão com Pedro e Lucas... Você sabe o que é certo a fazer não?
-- Sei? – Diana fez careta.
-- Contar a verdade Diana.
-- Nunca! Você está doida?
-- Quanto mais você demorar a contar, mais o seu amigo ficará iludido e a situação só vai se complicar mais. Imagina se ele começa a namorar a menina...
Diana chegou a sentir um arrepio, só de imaginar tal hipótese.
-- Dê um tempo pra você organizar suas ideias, seus sentimentos, depois você decide como agir.
A loirinha acenou em acordo.
-- Obrigada por ser tão altruísta Ju... Mesmo depois do que fiz você ainda ser tão amiga...
-- Não sou isso não, meu intuito era pisar em você, te ver sofrer.
Diana arregalou os olhos surpresa.
-- Mas, quando te vi, mais calma depois que passaram esses dias, percebi que nosso namoro já tinha acabado há tempos... Meus sentimentos por você mudaram Diana, hoje a noite fui o que tenho sido há alguns meses: sua melhor amiga.
Julia sorriu, e puxou Diana para um abraço desarmado. Se aquela noite parecia irremediavelmente tenebrosa para Diana, a conversa e o abraço de Julia se configuraram em uma ponta de esperança que no final tudo ficaria bem.
*****
Natalia acordou cedo. Depois de uma semana conflituosa, tudo que precisava era descarregar toda tensão dentro de uma quadra. Foi uma das primeiras a chegar ao treino marcado para o sábado.
-- Vamos ver se lá no interior sabem tratar essa redonda com carinho...
Carla brincou entregando a bola a Natalia no início do treino depois de apresentá-la ao restante da equipe. Natália não precisou se esforçar muito para mostrar o quanto dominava aquele esporte, aproveitando praticamente cem por cento das bolas que chegavam até suas mãos, revezando os ataques com cortadas, bolas de segunda, bloqueios e largadas, impressionou não só as colegas veteranas, como também quem assistia inclusive Lucas, o mais empolgado gritando elogios a cada ponto da moça.
A empolgação do rapaz não era só pela técnica da moça, Lucas não pode deixar de perceber as curvas encantadoras do corpo de Natalia, especialmente suas pernas que chamavam a atenção pela beleza e forma.
-- Aee gatinha! Você manda muito bem!
-- Ai deixa de ser exagerado! Jogo direitinho e só.
-- Estou dizendo a verdade, você é muitooo boa.
Lucas fez uma expressão safada, olhando para as pernas de Natalia, que estapeou seu braço sem graça.
-- Então Natalia, próximo sábado, há mesma hora?
Uma das meninas perguntou.
-- Claro! Estarei aqui sim.
Despediram-se de maneira descontraída, ao que parecia, Natalia fora muito bem aceita pelas meninas do time, esse fato, minimizou a angústia que lhe assolara nos últimos dias.
-- Vai fazer o que agora? – Lucas perguntou ajudando Natalia com sua mochila.
-- Tomar um banho! Depois correr pra casa, fazer uma faxina na gaveta que eu chamo de casa e depois, se eu sobreviver, comer alguma coisa e cair na cama exausta, eis o meu resto de sábado!
-- Ah você não pode estar falando sério gatinha!
-- Estou sim.
-- Tenho uma proposta melhor a te fazer.
-- Estou ouvindo.
-- Você toma seu banho, e vem comigo experimentar a melhor feijoada do mundo!
-- Imagina! Não posso!
-- Ah não faz isso comigo, aceita! Prometo que te ajudo na faxina amanhã!
-- Lucas você não pode estar falando sério.
Natalia balançou a cabeça sorrindo.
-- Vamos?
-- Posso saber onde essa feijoada fantástica será servida?
-- Na casa de um amigo, a mãe dele nos oferece todo início de semestre, e hoje, é aniversário dele.
-- Então, seu irmão também estará lá, não acha que vai ficar uma situação meio chata você me levando?
-- Ele vai é me dar um beijo quando vir que te levei!
Natalia arqueou uma das sobrancelhas duvidando da previsão de Lucas.
-- Se eu for, vai mesmo me ajudar na faxina?
-- Na sua mochila também tem um bíblia pra que eu jure com a mão sobre ela?
Natalia riu e respondeu:
-- Tirei-a hoje de manhã por que não caberiam meus tênis... Vou confiar na sua palavra então.
Fim do capítulo
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